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domingo, 10 de janeiro de 2016

Democracia

Democracia é uma palavra de origem grega que pode ser definida como governo (kratos) do povo (demo). Dessa forma, a democracia pode ser entendida como um regime de governo onde o povo (cidadão) é quem deve tomar as decisões políticas e de poder. A democracia pode ser direta, indireta ou semi-direta: diante da impossibilidade de todos os cidadãos tomarem as decisões de poder (democracia direta), estas passam a ser tomadas por representantes eleitos (democracia indireta ou representativa) e, nesse caso, são os representantes que tomam as decisões em nome daqueles que os elegeram.

            De modo geral, um governo é dito democrático por oposição aos sistemas monárquicos, onde o poder está centralizado nas mãos de uma única pessoa, o monarca, e aos sistemas oligárquicos, onde o poder está concentrado nas mãos de um grupo de indivíduos. Esta é a classificação dada por Aristóteles, em sua obra Política.

            Historicamente, a democracia surgiu na Grécia antiga (ver mais na sessão Filosofia Antiga). Mas mesmo em Atenas, onde a democracia se consolidou como uma forma de organização política das cidades-Estados gregas (as polis), não havia uma democracia no sentido literal do termo, pois, de fato, a grande maioria da população ateniense não era formada de cidadãos (por definição, aqueles que poderiam participar da coisa pública) e sim, de escravos, mulheres, crianças, além de estrangeiros.

            Em Atenas, vale ressaltar a figura de Clístenes, um reformador ateniense que ampliou o poder da assembleia popular, permitindo a existência do que na época passou a se chamar de isonomia, ou seja, a igualdade sob a lei, além da isegoria, direitos iguais de falar e, por isso, é considerado o pai da democracia.

            No caso do Brasil, só é possível falar no processo de redemocratização levando-se em consideração o período obscuro que teve início com o golpe militar em 1964.

O período que antecedeu a promulgação da Constituição Federal de 1988 deixou marcas profundas no seio da sociedade brasileira, isto se deu em razão de prevalecer no regime ditatorial então vigente, um total cerceamento ao exercício dos direitos de cidadania política. Esse quadro começou a ser mudado a partir da Assemblei Nacional Constituinte, que reconhecendo a importância da participação popular na elaboração do texto Constitucional, proporcionou a oportunidade da concretização dos anseios da população brasileira (FONSECA, 2009, p. 14).

            A fórmula de Abraham Lincoln: a democracia é “o governo do povo, pelo povo e para o povo” é uma das definições que melhor expressam a ideia de uma democracia. Esta definição está bem próxima do sentido etimológico da palavra, do grego antigo. Contudo, é preciso considerar, como já dissemos, que mesmo na Grécia Antiga, a democracia era um regime de governo onde apenas os cidadãos poderiam participar diretamente da coisa pública e, nesse caso, apenas 10% da população ateniense era considerada cidadão, excluídos aí mulheres, crianças, escravos e estrangeiros.

            Carole Pateman afirma (1992) que desde o início do século XX muitos teóricos políticos levantaram sérias dúvidas sobre a possibilidade de se colocar em prática um regime democrático no sentido literal do termo (governo do povo por meio da máxima participação do povo). E Bobbio (2000) indica pelo menos três fatores a partir dos quais um projeto democrático tem-se tornado difícil de se concretizar nas sociedades contemporâneas: a especialidade, a burocracia e a lentidão do processo

O primeiro obstáculo diz respeito ao aumento da necessidade de competências técnicas que exigem especialistas para a solução de problemas públicos, com o desenvolvimento de uma economia regulada e planificada. A necessidade do especialista impossibilita que a solução possa vir a ser encontrada pelo cidadão comum. Não se aplica mais a hipótese democrática de que todos podem decidir a respeito de tudo. O segundo obstáculo refere-se ao crescimento da burocracia, um aparato de poder ordenado hierarquicamente de cima para baixo, em direção, portanto, completamente oposta ao sistema de poder burocrático. Apesar de terem características contraditórias, o desenvolvimento da burocracia é, em parte, decorrente do desenvolvimento da democracia [...] O terceiro obstáculo traduz uma tensão intrínseca à própria democracia. À medida que o processo de democratização evoluiu promovendo a emancipação da sociedade civil, aumentou a quantidade de demandas dirigidas ao Estado gerando a necessidade de fazer opções que resultam em descontentamento pelo não-atendimento ou pelo atendimento não-satisfatório. Existe, como agravante, o fato de que os procedimentos de resposta do sistema político são lentos relativamente à rapidez com que novas demandas são dirigidas ao governo (BOBBIO, 2000 apud NASSUNO, 2006, p. 173-174).

             Hoje em dia a democracia tornou-se um sistema político (e não mais apenas um simples regime) no qual a soberania é atribuída ao povo que o exerce de modo :

Direto : quando o povo promulga ele mesmo as leis, tomas as decisões importantes e escolhe os agente de execução, geralmente revogáveis. Temos aqui a democracia direta ;

Indireto : quando o povo elege representantes, eleitos através do voto, por um mandato de duração limitada, e que devem representar os interesses da maioria. Temos a democracia indireta ou Democracia Representativa;

Semi-direta : no caso das democracias indiretas, onde o povo é chamado a estabelecer algumas leis, através de referendos (que pode ser um referendo de iniciativa popular), ou também para impor um veto a um projeto de lei, ou ainda propor, ele mesmo, projetos de lei.

Referências Bibliográficas

FONSECA, Jumária Fernandes Ribeiro. O Orçamento Participativo e a Gestão Democrática de Goiânia. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Planejamento Territorial). Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Planejamento Territorial da Universidade Católica de Goiás. Goiânia, 2009.
NASSUNO, Marianne. Burocracia e Participação: a experiência do orçamento participativo em Porto Alegre. Tese (Doutorado em Ciências Sociais). Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília. Brasília, 2006.
PATEMAN, C. Participação e Teoria Democrática. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.






Poder Executivo

            O Poder executivo é o poder do Estado que, nos moldes da constituição de um país, possui a atribuição de governar o povo e administrar os interesses públicos (para aprofundar ainda mais esse tema veja a sessão Administração Pública), cumprindo fielmente as ordenações legais. No Brasil o Poder executivo é formado por órgãos de administração direta, como os ministérios, e indireta, como as empresas públicas e demais autarquias.

            Se nós levarmos em consideração o art. 2º da Constituição Federal de 1988 onde é afirmado que os “poderes da União” são independentes mas devem atuar de forma harmônica entre si, então o Executivo deve agir em Harmonia com o Poder Legislativo participando da elaboração das leis e sancionando ou vetando projetos.

            O chefe máximo do Executivo é o Presidente da República, que também é o chefe de Estado e de Governo, já que o Brasil adota o regime presidencialista. O Presidente exerce, ainda, o comando supremo das Forças Armadas e tem o dever de sustentar a integridade e a independência do Brasil, entre outras atribuições.

            Assim como o Presidente é o chefe do Executivo Nacional, os Governadores são os chefes do Executivo estadual e os Prefeitos chefes do Executivo municipal. O Governador e o Prefeito tem sob seu comando secretários de Estado ou Município, assim como o Presidente tem sob seu comando os Ministros de Estado.

            Entre as diversas atribuições do Poder Executivo, destacamos o fundamental papel que ele exerce na formulação e confecção das políticas orçamentárias (o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, o orçamento anual e os créditos adicionais) e de Políticas Públicas para a sociedade.


Presidencialismo x Parlamentarismo

            Quanto ao critério da separação de poderes, contemporaneamente convencionou-se separar os tipos de Governos em: governo parlamentar e governo presidencial. O governo parlamentar se baseia fundamentalmente na igualdade e colaboração entre o poder executivo e Poder Legislativo, enquanto que o governo presidencial resulta num sistema de separação rígida entre os três poderes. É preciso salientar, contudo, que tanto o presidencialismo quanto o parlamentarismo não chegam a representar formas de Estado, mas são um processo da Democracia Representativa que determina atribuições e fixam as relações dos poderes entre si, são formas de exercício do poder.

            O presidencialismo não se explica unicamente pela existência de um Presidente assim como o Parlamentarismo não se explica unicamente pela existência do Parlamento. Os Estados presidencialistas ostentam um Parlamento que em geral se chama Congresso e os Estados parlamentaristas eventualmente podem ter um Presidente, embora isso tenha acontecido apenas algumas vezes na história dos regimes políticos.

            Algumas diferenças, contudo, são essenciais para entender um ou outro tipo de Governo. O presidencialismo não apenas ostenta a figura de um Presidente independente do Parlamento como faz aparecer de forma mais nítida a distinção entre os três poderes: executivo (representado pelo Presidente) legislativo (representado pelo Parlamento) e o judiciário. No presidencialismo todo poder executivo se concentra na pessoa do Presidente que o exerce de forma relativamente autônoma perante o poder legislativo, ajudado por um corpo ministerial que também goza da mesma autonomia em relação ao Congresso. Além disso, no presidencialismo, é o povo quem elege o seu representante maior do poder executivo, através do voto ou sufrágio universal.

            A Constituição de 1988 estabelece as atribuições, competências e responsabilidade do Presidente da República nos artigos 84 e 85, assim como a Lei Orgânica Municipal de Parintins estabelece entre os artigos 56 a 71 as atribuições, competências e responsabilidades do chefe do executivo municipal.

            De modo geral podemos dizer que o Presidente possui atribuições não apenas administrativas mas que podem se estender de alguma forma a esfera legislativa, judiciária, militar e de ordem federativa. Ao Presidente cabe a sanção, veto, promulgação e publicação das leis, bem como existe a possibilidade de editar medidas provisórias (art. 62 da Constituição) com “força de lei”, quando se trata de algum assunto urgente do Poder Executivo. Quanto ao poder militar o Presidente tem competência para declarar guerra no caso de agressão estrangeira, decretar mobilização nacional, celebrar a paz, exercer o comando supremo das forças armadas, entre outros. Já no que diz respeito ao aspecto jurídico, cabe ao Presidente nomear os Ministros do Supremo Tribunal Federal, o Advogado-Geral da União além de conceder indultos e comutar penas.

            O Parlamentarismo, por sua vez, tem suas origens a partir de um longo processo de desenvolvimento político que se deu a partir da Revolução Gloriosa (1688) na Inglaterra, em luta contra as monarquias absolutistas desde o século XIII até o século XVII. Não se pode dizer que tem início aí o sistema parlamentar, mas sim que ele é o resultado de todo um processo histórico que vai se consolidando ao longo dos séculos e que só instaurou-se de modo definitivo a partir do século XIX. A vitória do Parlamento em 1688 sobre a coroa inglesa foi uma das causas, mas não a única.

Com o século XX e o aprofundamento das convicções democráticas de estrutura do poder, com a igualdade política levada às últimas consequências mediante a instituição do sufrágio universal, com a órbita do poder consideravelmente alargada pelos imperativos da intervenção estatal, com as funções da autoridade cada vez mais dominadas pelas exigências de contato com a opinião, onde o poder consentido descobre as bases seguras de seu processo legitimador, viu-se o parlamentarismo compelido a transformações sensíveis no funcionamento de todo o sistema (BONAVIDES, 2000, p. 428).

            Desta forma, onde quer que se haja firmado os princípios democráticos na base das instituições parlamentares a função de Chefe de Governo compete não mais a um monarca (ficando este apenas como Chefe de Estado), mas ao Parlamento, através da maioria parlamentar ou do partido dominante que chegou ao poder, presidido pelo Primeiro-Ministro, mas cujas ações ficam sujeitas à Câmara dos Comuns, eleita pelo povo. No caso do parlamentarismo inglês o Primeiro-Ministro fica com a direção do “gabinete” ao passo que a Câmara dos Comuns tem o controle do aparelho governamental.

Referências Bibliográficas

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 17. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2001.

Poder Legislativo

Origem

            A ideia de um Parlamento como entendemos surgiu no final da Idade Média e meados da modernidade, no contexto das monarquias absolutistas, contudo,

Se é verdade que entre os Parlamentos medievais e os modernos há enormes diferenças, quer se considere sua composição, seus poderes ou duração, também é verdade que, pelo menos um dos Parlamentos contemporâneos, e não certamente o de menor importância, nasceu, por evolução, das instituições medievais (BOBBIO, 1998, p. 878).

            Esse Parlamento a que Bobbio se refere é o Parlamento Britânico que teve um processo de ascensão a partir da Revolução Gloriosa (1688).

            É preciso considerar que no absolutismo o poder era exercido sem dependência ou controle de outros poderes e a autoridade soberana não tinha limites constitucionais. O monarca ou rei instituía, ele próprio, as leis e impostos a seu bel-prazer. Com os abusos da autoridade do monarca que tornava cada vez mais onerosos os tributos, a aristocracia e os comerciantes passaram a se reunir em assembleias para debater essas e outras dificuldades que afligiam a comunidade. Foi da “evolução” dessa assembleia que surgiu o Poder Legislativo, através do Parlamento, e se manteve no modelo da democracia representativa até os dias de hoje.

            Com a existência do Parlamento, o poder do rei começou a ficar limitado. A instituição ou aumento de tributos passou a depender da concordância com o Parlamento e com o tempo o Parlamento passou a representar também um espaço “público” de discussão. Aqui também começa a surgir o embrião da divisão dos poderes em executivo e legislativo.

            Com a divisão de poderes surgiu também a necessidade de estabelecer a competência de cada um deles. Ao Poder Legislativo ficou a incumbência principal, mas não a única, de elaborar leis. De modo geral, ao Poder Executivo cabe a execução e administração da máquina pública e ao Legislativo o papel de legislar e fiscalizar o Executivo.


Os séculos XIX e XX são o período de consolidação do Parlamento:

Alguém o definiu como século [XIX] de ouro do parlamentarismo europeu. Na Inglaterra, na França (excetuados os períodos imperiais), na Bélgica, na Holanda e na Itália, o Parlamento constitui-se o centro do debate político, estendendo progressivamente a sua influência ao Governo que havia sido até então expressão do poder régio. A monarquia constitucional cede o lugar ao regime parlamentar, que tem como fulcro a "responsabilidade" do governo perante o Parlamento. Naturalmente, esta transição acontece não sem inquietações e conflitos: suas etapas estão marcadas por votos de censura parlamentar, por dissoluções antecipadas das câmaras por parte do rei com o fim de lhes bloquear o desenvolvimento, e por verdadeiras crises constitucionais. Mas, no começo do século XX, o conflito entre o Parlamento e a monarquia já se havia resolvido, em quase todos os países europeus, a favor do primeiro (BOBBIO, 1998, p. 879).

Definição do termo Parlamento

            Norberto Bobbio, em seu Dicionário de Política, expõe a seguinte definição do que seja o Parlamento:

Parlamento pode definir-se assim: uma assembleia ou um sistema de assembleias baseadas num "princípio representativo", que é diversamente especificado, mas determina os critérios da sua composição. Estas assembleias gozam de atribuições funcionais variadas, mas todas elas se caracterizam por um denominador comum: a participação direta ou indireta, muito ou pouco relevante, na elaboração e execução das opções políticas, a fim de que elas correspondam à "vontade popular" (BOBBIO, 1998, p. 880).
  
Referências Bibliográficas

BOBBIO, Norberto. Parlamento. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. trad. Carmen C, Varriale et al.; coord. trad. João Ferreira; rev. geral João Ferreira e Luis Guerreiro Pinto Cacais. Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1998. Vol I.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 17. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2001.

Partidos Políticos

Um Breve Histórico

Um partido político é uma organização política que procura influenciar uma política governamental, através de seus filiados que se candidatam em eleições periódicas com o fim de obter um mandato político, seja no âmbito do poder executivo ou legislativo.

            Desde o século XVIII até os dias atuais, através de pensadores como Henri Bolingbroke, David Hume, Benjamin Constant, Karl Marx, Max Weber (1959), Maurice Duverger (1951), Raymond Aron, Giovani Sartori (1976 e 1982), que os partidos políticos vem sendo objeto de discussão entre os teóricos da ciência política e, de modo geral, podemos falar de uma definição de “partido político” do ponto de vista mais ideológico, considerando-o como uma reunião de indivíduos que professam a mesma doutrina política ou uma definição que leva em conta o elemento democrático do jogo político, que consiste em entender os partidos políticos como uma estrutura da organização democrática.  Além dos autores mencionados acima, a questão político partidária tem sido amplamente aprofundada e debatida atualmente na literatura internacional (BROUGHTON; DONOVAN, 1999; DALTON; MCLLISTER; WATTENBERG, 2000; DIAMOND; GUNTHER, 2001; KATZ; CROTTY, 2006; KATZ; MAIR, 1994; KIRCHHEIMER, 1966; LAWSON; MERKL, 1988; MAINWARING; SCULLY, 1995; MAIR, 1997; OSTROGORSKI, 1993; SEILER, 1993; WARE, 1996; WATTENBERG, 1998).

            De modo geral podemos agrupar a definição que alguns estudiosos da ciência política dão sobre os partidos políticos como Nawaiasky, Kelsen, Hasbach, Goguel e Burdeau. Os partidos políticos são:

“Uniões de grupos populacionais com base em objetivos políticos comuns” [Nawaiasky] [...] “são organizações que congregam homens da mesma opinião para afiançar-lhes verdadeira influência na realização dos negócios públicos” [Kelsen] [...] “uma reunião de pessoas, com as mesmas convicções e os mesmos propósitos políticos, e que intentam apoderar-se do poder estatal para fins de atendimento de suas reivindicações” [Hasbach] [...] “é um grupo organizado para participar na vida política, com o objetivo da conquista total ou parcial do poder, a fim de fazer prevalecer as idéias e os interesses de seus membros” [Goguel] [...] o partido representa uma “associação política organizada para dar forma e eficácia a um poder de fato” [Burdeau] (apud BONAVIDES, 2000, p. 449-450).

            Das definições expostas acima, Paulo Bonavides (2000) destaca alguns aspectos que entram, necessariamente, na conceituação de um partido político: a) o caráter de um grupo social; b) um grupo organizado; c) baseado em um conjunto de ideias e princípios orientadores do partido (aspecto mais ideológico); d) um interesse comum que é a tomada do poder e domínio do aparelho estatal e governamental aliado ao sentimento de conservação deste mesmo poder. Em uma conceituação mais contemporânea dos partidos políticos, poderíamos acrescentar ainda a ideia, de acordo com os aportes teóricos de Maria D’Alva Kinzo, de que as atividades dos partidos devem estar associadas à formulação, planejamento e implementação de políticas públicas, algo que estaria relacionado com a plataforma de governo dos partidos, “[...] participando como atores legítimos no jogo de poder e no processo de negociação política” (2004, p. 25).

            Historicamente a Inglaterra “é a pátria dos partidos políticos” (BONAVIDES, 2000, p. 482). Foi na Inglaterra do século XVIII que surgiu a distinção entre “Whigs” e “Tories”, assinalando uma primeira forma de bipartidarismo tradicional ao fim do reinado de Carlos II a partir do conflito entre terra e capital, campo e cidade, o feudo e o burgo:

[...] os “tories”, representando o landed interest e os “whigs” representando o money interest [...] Do lado dos “tories” a igreja e o trono, as grandes prerrogativas régias, o princípio da autoridade e o legitimismo; do lado dos “whigs” o parlamento e o contrato social de Locke, a doutrina do consentimento e os princípios de 1688, eis como Greaves resume substancialmente as posições definidas em cada um desses grêmios políticos (id., ibidem, p. 483).

            Ao longo dos anos os partidos políticos passaram por inúmeras crises dentre elas a crise de identidade e ideologia.  Todavia, os partidos continuam sendo um dos atores fundamentais dos sistemas políticos contemporâneos (SELL, 2006).

            A temática dos partidos políticos muitas vezes foi tratada com desconfiança por muitos teóricos, onde por vezes foi tratado com ideia de “seita” ou “facção”, tendo uma conotação negativa associada à palavra. Sell afirma que este termo foi sendo desconstruído lentamente com o passar do tempo, obtendo uma associação do termo levado a “tomar parte” ou “fazer parte de algo”. Nesse sentido entende-se que;

Mesmo com a desconstrução paulatinamente da expressão negativa do termo partido político, alguns pensadores como Bolingbroke e David Hume possuem uma visão de que os partidos nascem dos interesses e das paixões, além de David classificar partidos em tipos (grupos de pessoas ou grupos oriundos de interesses, princípios e afeições), vai mais além ao dizer que seria desejável abolir os partidos, ainda que isto não seja viável. (2006, p. 52).

            Faz-se necessário uma abordagem da terminologia da palavra para que possamos analisar o sentido positivo atribuído, onde este termo representa uma série de sentidos que contribui de forma relevante ao conhecimento histórico-político da realidade desses partidos que surgiram alicerçados sobre bases ideológicas.  Seguindo os aportes de Sell,
           
A aceitação da palavra e do significado positivo do termo partido político está ligada a própria aceitação do pluralismo como valor cultural. É somente na medida em que a diversidade de grupos, interesses e ideias passaram a ser vistas como algo normal e até necessário para o exercício da liberdade que a pluralidade de partidos foi sendo vista como elemento fundamental para a existência e o funcionamento dos regimes democráticos. (2006, p.152).

            Historicamente podemos dizer que foi a corrente marxista que deu destaque ao papel dos partidos políticos com Karl Marx e Friedrich Engels e com o surgimento dos sindicatos e as lutas dos proletariados por melhorias e contra a exploração. Especialmente a classe que não possuía os meios de produção, o proletariado, passou a criar mecanismos de organização política das classes sociais.

            Neste cenário os partidos políticos assumem a função fundamental tendo como o objetivo de unificar os operários, superando suas divisões. Para Sell esses “partidos revolucionários” tiveram como tarefa principal levar até as massas a consciência de classe e liderar a revolução socialista.

            “No Manifesto Comunista (1848), afirmou Marx que era dever de todos os proletários se organizarem ‘numa classe e correspondentemente num partido político’” (BONAVIDES, 2000, p. 479). E Lênin aprofunda o sentido marxista do partido político colocando-o como “[...] vanguarda organizada e disciplinada do proletariado revolucionário, pois ‘nele vemos a razão, a honra e a consciência de nossa época’” (id., ibidem, p. 479). Mas os partidos políticos teriam um fim, na visão marxista, assim como igualmente o Estado terá um fim na organização comunista. Marx reconhece ao Estado um caráter fundamentalmente histórico, fadado porém a desaparecer com o fim do capitalismo e depois do socialismo, dando origem à sociedade comunista. E em uma sociedade sem divisão de classes e sem Estado não faz sentido o pluralismo partidário. No socialismo impera o partido único: o partido socialista que é o partido do proletariado e não pode repartir a liderança com outros partidos. O partido socialista, “[...] com o desaparecimento da sociedade de classes, acompanhará também o Estado em sua caminhada para o túmulo” (id. ibidem, p. 480).

Com efeito, Mao Tse Tung, numa reminiscência das velhas idéias de Rohmer, no século XIX, sobre a vida orgânica dos partidos, vestidas porém com a linguagem e os conceitos da doutrina marxista, escreveu: “Um partido político percorre tanto quanto um ser humano os estádios da infância, juventude, idade adulta e velhice. O Partido Comunista da China já não é nenhuma criança ou adolescente. Chegou à maioridade. Quando um homem se torna velho, morre depressa; o mesmo acontece também com os partidos políticos. Com a abolição das classes, todos os instrumentos da luta de classes — os partidos políticos e o aparelho estatal perdem também suas funções, fazem-se supérfluos e se extinguem lentamente, após haverem preenchido sua função histórica. A sociedade humana terá alcançado então um grau mais adiantado” (id., ibidem, p. 480).

            Dentre as definições tradicionais dos partidos políticos Max Weber conceitua que:

Partidos são em sua essência mais íntima, [...] organizações voluntariamente criadas e baseadas em livre recrutamento necessariamente sempre renovado, em oposição a todas as corporações fixamente delimitadas pela lei ou pelo contrato. Seu objetivo é hoje e sempre a obtenção de votos nas eleições para cargos políticos (apud SELL, 2006, p.156).

            Esse termo de partidos políticos na ciência política contemporânea salienta os aspectos formais e organizacionais destes grupos organizados, além dos objetivos que os qualificam como instituição política e nesse sentindo há pelo menos 4 critérios que definem um partido político dentro de suas perspectivas: uma organização durável que vai além do período de vigência de um pleito político; uma organização bem estabelecida e que mantém relações regulares e variadas  com o escalão nacional; uma vontade deliberada dos dirigentes nacionais e locais da organização de conquista e exercer o poder; uma preocupação de buscar o apoio popular por intermédio das eleições ou por qualquer outra forma.

            Mediante a contribuição de vários dos autores, podemos dizer que esses critérios difundidos são elementos de legitimação das agremiações levando a mínima definição de partido político. Nessa linha de pensamento Sartori (1982) com base neste procedimento vem apresentar que nessa perspectiva um partido político é qualquer grupo identificado por um rótulo oficial que apresente em eleições, e seja capaz de colocar através de eleições (livres ou não) candidatos a cargos públicos.

            Também é relevante salientar a importância da função dos partidos políticos no interior do sistema político. De acordo com Sartori (1982) a função geral dos partidos políticos é de exercerem o papel de mecanismo de comunicação entre a sociedade e o Estado. Assim atuando em três espaços distintos: 1) o espaço social; 2) o espaço eleitoral; 3) o espaço governamental. Além da função de: 1) representar e expressar o interesse da sociedade; 2) participar e organizar a disputa dos candidatos pelos votos dos eleitores; 3) exercer o governo do Estado.

            Nas definições que dão relevo ao papel eleitoral dos partidos políticos destacam-se suas funções na estruturação da escolha dos representantes segundos as contribuições de Schwartzenberg que salienta que neste âmbito os partidos exercem três tarefas básicas;

1) Formação sobre opinião: apresentação de temas, agendas e perspectivas sobre os problemas sociais e políticos que condicionam a opinião pública e a escolha dos eleitores; 2) Seleção de candidatos: recrutamento e socialização de indivíduos para atividade política; 3) Enquadramento dos eleitos; aglutinação dos seus membros em nome da disciplina, unidade partidária e consecução de objetivos comuns.(1979, p.494 -496).

            Tem-se nesse contexto de reflexões que privilegiam a análise dos partidos políticos na arena social destacam-se o papel representativo.  Entende-se que o papel representativo dos partidos pode ser desdobrado em duas dimensões:

1) Agregação de interesses: sob este aspecto os partidos captam ou recolhem os diversos interesses formulados pelos grupos de pressão ou os problemas presentes no âmbito da opinião pública geral; 2) Articulação de interesses:  sob este aspecto os partidos procuram dar unidade às demandas integrando-as em programas governamentais para serem apresentados no âmbito da opinião pública geral. (SELL, 2006, p. 157)

            Hoje em dia é preciso reconhecer que nas democracias modernas os partidos políticos tem um papel muito importante, no sentido de permitir a um grupo de indivíduos compartilhar objetivos e um programa político em comum. Com efeito, “Sem o partido político, nem as ditaduras nem os poderes democráticos de sociedade alguma do nosso tempo lograriam subsistir, a não ser transitoriamente” (BONAVIDES, 2000, p. 504). Ou como afirma Maria D’Alva Kinzo:

É consenso que partidos políticos e eleições são componentes necessários de um regime democrático. Eleições livres e justas, nas quais os partidos competem por cargos públicos, são um critério crucial para identificar se um sistema político é uma democracia  (2004, p. 23).

       
Referências Bibliográficas

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WATTENBERG, Martin. The decline of American political parties, 1952-1996. Cambridge, Harvard University Press, 1998.
WEBER, Max. Le savant et le politique. Paris: Plon, 1959. (préface de Raymond Aron, 1ère éd. 1920).


[1] Sobre as várias classificações de partidos, presentes em pensadores como David Hume, Max Weber, Georges Burdeau e Hans Nawiasky ver Paulo Bonavides (2000, p. 464-467).

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Como bloquear contatos do Facebook Messenger?


Remover um “amigo” da lista de contatos do Facebook pode causar transtornos. Por isso, a rede social oferece ferramentas para que você não precise mais interagir com aquela pessoa que é chata na Internet, mas por quem você até tem um carinho na “vida real”. O Blog Dag Vulpi vai ensinar, neste tutorial, como usar uma delas: o bloqueio de mensagens no bate-papo. O processo é bem simples e pode te ajudar a evitar incômodos no site.

Passo 1. 

Abra o bate-papo do Facebook e clique na pessoa que você quer bloquear, como se fosse iniciar uma conversa com ela. conforme imagem abaixo:


Passo 2. 

Clique no ícone “opções”, que fica entre o ligação de voz e o de fechar a janela e um drop-down com diversas opções será exibido. conforme imagem abaixo:
Passo 3. 

Em seguida, selecione a opção “Bloquear mensagens... "conforme imagem abaixo:


Passo 4. 

Uma janela confirmando o bloqueio será exibida "conforme imagem abaixo:

Caso desejar reverter o bloqueio basta clicar em Desbloquear. 

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

''Cunha é pilantra de 5ª categoria'', dispara ex-ministro Ciro Gomes


O ex-ministro Ciro Gomes acusou o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de ser “um pilantra de quinta categoria” que está “mandando e desmandando na República.

A declaração foi dada na segunda-feira (17) à noite, na abertura de um encontro interno do Pros, em Fortaleza, no qual o ex-governador cearense e seu grupo político discutiram a migração em massa para o Partido Democrático Brasileiro (PDT).

O Congresso em Foco teve acesso ao áudio do discurso do ex-ministro da Fazenda, no governo Itamar Franco, e da Integração Nacional, no governo Lula.

“Não é fácil o trabalhador chegar em casa e ligar a televisão e assistir à novela mal-cheirosa, diária, da ladroeira [em referência à roubo], que não poupa mais ninguém. Pra bem dizer, o presidente da Câmara Federal do Brasil é um pilantra de quinta categoria que tá aí mandando e desmandando na República”, afirmou Ciro na reunião.

Ele também criticou o governo Dilma, que, segundo ele, tem feito “tudo ao contrário” do que prometeu na campanha eleitoral.

Ciro e seu irmão, o também ex-governador Cid Gomes, receberam convite do presidente do PDT, Carlos Lupi, para se filiar à sigla com vistas às eleições presidenciais de 2018. A ideia de Lupi é lançar Ciro Gomes como candidato.

Outros nomes do partido, entretanto, como os senadores Cristovam Buarque (DF) e Reguffe (DF) não concordam com a filiação dos irmãos Gomes.

Cristovam era tido como nome certo para concorrer novamente à Presidência da República, a exemplo do que ocorreu em 2006.

A crítica de Ciro ocorre meses após Cid chamar publicamente Eduardo Cunha e outros “400, 300 deputados” de “achacadores”, ratificando o que ele havia dito a universitários no fim de fevereiro, quando ele ainda era ministro da Educação.

Após chamar os deputados de “achacadores”, Cid deixou a pasta. Sua saída foi anunciada por Eduardo Cunha em plenário, no momento em que o então ministro ainda discursava.

Na última segunda-feira, começou, pelo menos de forma oficial, as discussões para que vários nomes do Pros cearense deixem a legenda e passem a integrar o PDT.

No encontro, Ciro Gomes disse que seria uma mudança natural sua filiação à sigla de Leonel Brizola.  

Além dos irmãos Gomes, devem aderir ao PDT outros nomes importantes da política cearense como a vice-governadora Izolda Cela e vários prefeitos e vereadores ligados à família.

“O PDT tem sido aliado nosso em todas as eleições. De maneira que é um passo muito natural, que é um passo muito coerente para quem está, como nós, obrigados a tomar essa posição”, defendeu Ciro.

Entretanto, a posição ainda não está oficializada. Embora, o próprio presidente nacional do PDT já conte com Ciro e Cid nos quadros do PDT.

Em outro momento do desabafo, Ciro Gomes também criticou o governo federal. Ele afirmou que o PT não pode fechar os olhos para as manifestações.

“Não é simples, nem é fácil a gente ver uma pessoa e um governo que a gente ajudou a eleger com tanto carinho, com tanto entusiasmo, com sacrifícios… Cid se sacrificou e muito… Todos os que estão aqui se sacrificaram, correram riscos sérios com aquele povo em cima do muro, não sei o que e tal. E, com tudo isso, no dia seguinte, tudo o que a gente achava que ia ser, foi ao contrário”, declarou.

“É o preço da gasolina, é o preço da energia… [Dilma] Nomeia o cara dos bancos pro Ministério da Fazenda [Joaquim Levy]… E aquilo que era um conjunto de valores, a questão nacional, a questão da desigualdade, a questão do valor dos salários como remuneração do trabalho decente das pessoas, foi esquecido. Isso explica porque a sociedade brasileira está aborrecida e qualquer governo que queira ter o mínimo de condições de se reconciliar com sua nação tem que ter humildade para entender isso”, disparou Ciro.

Depois disso, ele ainda afirmou que nas manifestações existem “doido de todo o tipo”, mas que é necessário se respeitar a Constituição.

“Não adianta desqualificar as manifestações. Tem coisa de todo o tipo, doido de todo o tipo e modalidade, mas não adianta desqualificar. Aquelas multidões que foram pras ruas ontem só foram porque tem uma coisa muito errada acontecendo no nosso país”.

Por isso, Ciro defendeu que a militância seja focada não somente no respeito às instituições democráticas e na cobrança sistemática das ações do governo federal. Uma doutrina que, coincidentemente, tem sido pregada pela cúpula do PDT.

“A crise política se descomprimiu um pouco. Não que a gente não esteja no meio de uma crise política muito grave, com potencial muito grave de ameaça ao futuro do país. Mas aquela escalda de golpe deu uma diminuída grande. O próprio governo começou a cair em si e começou tomar aqui e ali, ainda muito desorientado, alguma iniciativa política”, pontuou.

Com informações Uol

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Verdades sobre os protestos deste domingo

"É que tem mais chão nos meus olhos
do que cansaço nas minhas pernas
mais esperança nos meus passos
do que tristeza nos meus ombros
mais estrada no meu coração
do que medo na minha cabeça
"

Cora Coralina


Antes de começar vou abrir meu voto nas últimas eleições. No primeiro turno votei no Eduardo Jorge, e no segundo turno fiz algo que jamais pensei que faria, algo que sempre critiquei meus amigos por fazerem: eu anulei meu voto. Ambos os candidatos não tinham minha confiança e minha simpatia. O Aécio havia feito um péssimo governo em Minas Gerais, e eu não queria ver o PT por mais quatro anos no poder (mesmo reconhecendo que no período houve importantes conquistas sociais, o fato é que uma democracia que engatinha precisa não só da possibilidade de alternância, mas também da efetiva alternância).

Dito isso, posso analisar os protestos deste domingo com a mesma tranquilidade com que analisei os protestos de 2013. Há aspectos interessantes e positivos em ambas as manifestações, e alguns aspectos que me preocupam. Mas sobretudo o que me deixa apreensivo é o fato de que estamos beirando uma crise política perigosa demais para a manutenção da nossa frágil democracia.

Este texto é para você, leitor, que como eu não faz parte de nenhuma das duas torcidas organizadas que se digladiam nas ruas e nas redes sociais. Mas se seu vocabulário usual inclui a palavra “coxinha” ou a palavra “petralha”, esse texto não é para você – na verdade, eu e os outros leitores meio que vamos falar mal de você… só um pouco.

1) O PAÍS ESTÁ DIVIDIDO E COM SANGUE NOS OLHOS.

Durante as eleições presidenciais 2015, ficou evidente que há um racha na sociedade brasileira. Depois das eleições, os partidários de Dilma tentaram negar a existência dessa divisão – porque, óbvio, era muito mais interessante ao lado vencedor governar num clima cooperativo. Querer coisas é bom, mas nem todos os truques de retórica e de marketing conseguem maquiar os fatos por muito tempo.

É um princípio básico da psicologia que tudo aquilo que um indivíduo se recusa a reconhecer sobre sua própria natureza e reprime dentro de si acaba retornando na forma de uma neurose incontrolável. O governo, como um indivíduo neurótico, ao não reconhecer o fato de que venceu as eleições por uma margem muito pequena de votos, ignorou a existência da profunda divisão social, desconsiderou o clima de animosidade e ódio recíproco que ele próprio estimulou durante a campanha como tática eleitoral.

E o que vemos hoje é o racha se aprofundando.

O problema é que não se trata apenas de um racha de ordem política, com dois grupos opositores combatendo-se no campo das ideias, dos argumentos, do debate público. Não, o que temos são pessoas se posicionando de um lado e do outro com a passionalidade de uma torcida de futebol: olhando para os adversários com sangue nos olhos, querendo ver sua caveira, querendo pular na sua jugular.

2) NESSA, OU VOCÊ É ESTÁ ILUDIDO OU ESTÁ FODIDO

Deixa eu explicar a situação de uma maneira que possa ser entendida até por uma criança, ainda que com certo sacrifício de certas complexidades e sutilezas. Há, basicamente, três tipos de pessoa nessa história.
Em primeiro lugar nós temos…

…O CARA QUE CHAMA OS OUTROS DE COXINHA.

Esse sujeito pode até não ter votado na Dilma no segundo turno, mas nesse caso com certeza anulou ou votou em branco, pois ele odeia o Aécio, detesta o PSDB, abomina os eleitores da oposição e chama a todos de coxinha. Ele provavelmente participou dos protestos de 2013 e tem na sua cabeça alguma explicação meramente retórica que justifica os atos de vandalismo realizados naquele período.

Para ele, todos os que participaram dos protestos desse último domingo são “coxinhas” manipulados pela mídia golpista – e isso, na sua cabeça, explica tudo, é o suficiente para dar conta de toda a situação. Ele pensa “são coxinhas manipulados pela Globo” e pode dormir descansado, feliz de não ser um deles.

A seguir, temos…

O CARA QUE CHAMA OS OUTROS DE PETRALHAS.

Esse sujeito pode até não ter votado no Aécio no segundo turmo, mas nesse caso com certeza anulou ou votou em branco, pois ele odeia a Dilma, detesta o PT, abomina os eleitores do PT e chama a todos de petralhas. Ele provavelmente participou dos protestos de 2015 e tem na sua cabeça alguma explicação retórica que justifica a presença, nas manifestações, de gente pregando o retorno da ditadura, ainda que ele próprio possa discordar dessa turma de celerados.

Veja como ele se parece:

Bem diferente do outro cara lá em cima né?
Por fim, no meio dessa briga de foice e facão, nós temos…

VOCÊ FODIDO.

Você até pode ter participado das manifestações de 2013 com seus colegas da universidade e olhar com certo desconforto (principalmente pelos cartazes pró ditadura militar) os protestos de 2015. Ou, ao contrário, você pode até ter observado as manifestações de 2013 com sérias ressalvas (principalmente pelos atos de vandalismo) e ter participado dos protestos de 2015 com sua família. Mas você não se identifica na verdade com nenhum dos dois grupos, porque suspeita que nada é tão simples assim, sente que há muito ódio de torcida organizada envolvido nessa história e que chamar os outros de “coxinhas” ou “petralhas” não só não explica coisa nenhuma como apenas aprofunda a incompreensão mútua.

Você, meu amigo, você está fodido. Imagine-se como um sujeito que está voltando para casa após ir na padaria e de repente dobra uma esquina e se vê num cruzamento onde duas torcidas organizadas de futebol estão correndo uma em direção a outra com sarrafos e tijolos nas mãos, urrando de ódio. E você está ali, parado, segurando sua sacola com pães-de-queijo e leite longa vida bem no ponto em que elas vão se encontrar – e ambas as torcidas vão querer saber afinal para qual time você torce.

Não adianta você sequer esboçar uma tentativa de resposta explicando que não é simples assim, que em parte cada um dos lados tem suas razões mas em parte também está errado. Eles querem uma resposta imediata, inclusive por haver uma falácia  segundo a qual se você não se posiciona então você indiretamente está fortalecendo o time adversário – pois imparcialidade também seria um tipo de tendenciosidade.

Sobre o Blog

Este é um blog de ideias e notícias. Mas também de literatura, música, humor, boas histórias, bons personagens, boa comida e alguma memória. Este e um canal democrático e apartidário. Não se fundamenta em viés políticos, sejam direcionados para a Esquerda, Centro ou Direita.

Os conteúdos dos textos aqui publicados são de responsabilidade de seus autores, e nem sempre traduzem com fidelidade a forma como o autor do blog interpreta aquele tema.

Dag Vulpi

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