A
ex-presidenta Dilma Rousseff negou hoje (22) que o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva tenha cometido tráfico de influência, durante o governo dela, nos
episódios da compra dos caças suecos Gripen e na aprovação de medida provisória
para beneficiar o setor automobilístico. Dilma foi arrolada como testemunha de
defesa de Lula e prestou depoimento na tarde desta quinta-feira (22), por
vídeo-conferência, à Justiça Federal em Brasília, em processo originado a
partir de investigações da Operação Zelotes.
Saiba
mais:
“O
presidente Lula jamais interferiu em nenhuma atividade do meu governo. Ele
tinha o maior respeito por mim. E, mesmo quando eu era da Casa Civil [ministra
entre junho de 2005 e março de 2010], ele jamais se intrometeu em assuntos que
eram da minha alçada”, disse Dilma.
O
ex-presidente e o filho dele, Luis Cláudio Lula da Silva, são investigados
nessa ação e já foram denunciados pelo Ministério Público por tráfico de
influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa. De acordo com o MPF,
Lula teria atuado para garantir a compra de caças pela Força Aérea Brasileira
(FAB) e na prorrogação de incentivos para a indústria automobilística na gestão
Dilma.
Durante
1 hora e 20 minutos de depoimento, Dilma respondeu às perguntas do MPF e do
juiz Vallisney de Souza, da 10ª Vara da Justiça Federal, sobre sua participação
no processo para editar e aprovar as normas que concederam incentivos fiscais a
montadoras de veículos, especialmente a Medida Provisória (MP) 627/13.
A
medida tratava da tributação do lucro de empresas multinacionais brasileiras no
exterior, em substituição ao chamado Regime Tributário de Transição. Segundo o
MPF, tanto a montadora Caoa quanto a Odebrecht, agiram para influenciar o texto
por terem negócios no exterior. Durante o processo de tramitação da MP no
Congresso Nacional, foram inseridos vários “jabutis”, que são pontos estranhos
ao texto original. Ao final, Dilma sancionou o texto com vários vetos.
Entre
eles, estava a ampliação do parcelamento de débitos tributários (o chamado de
Refis da Crise), a anistia de multas para planos de saúde, a redefinição de
regime de aeroportos e o dispositivo que isenta fabricantes de pneus produzidos
na Zona Franca de Manaus de PIS/Pasep e Cofins. “Eles aproveitaram [para
introduzir jabutis] e isso foi um dos problemas de atrito que eu tive com a
minha base no Congresso. A gente tinha que impedir que ocorresse esses
jabutis”, disse.
A
aprovação da MP 627 teria sido conduzida no Congresso Nacional pelo ex-deputado
federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), relatores
da matéria respectivamente na Câmara e no Senado. Segundo o MPF, Jucá
teria recebido o pagamento de R$ 5 milhões como “contrapartida” pela aprovação
do texto.
No
depoimento, Dilma afirmou que os vetos foram a pré-estreia das chamadas
“pautas-bomba”, apelido dado pela imprensa a projetos votados no Congresso e
que dificultavam a realização do ajuste fiscal pelo governo. “Foi tumultuada a
minha relação com o senhor Eduardo Cunha e com o Romero Jucá e eu tinha que ter
a capacidade de transitar nesse meio político”, disse.
Questionada
porque mesmo assim não vetou os benefícios para a indústria automobilística,
Dilma disse que, após fazer uma análise técnica com integrantes do governo,
chegou à conclusão de que a medida não teria impacto na arrecação e poderia
ajudar na recuperação econômica.
“Eu
não vetei porque, na avaliação de todos nós, ele [incentivo] era o menos
complicado e que podia até dar vantagens para o Brasil e para o governo porque
daria vantagem à indústria automobilística, impactando outros setores como
siderurgia, borracha, petróleo e gás, na comercialização de automóveis, entre
outras”, disse.
Caças
Além
de Dilma, foi ouvido Bengt Janér, representante no Brasil da Saab, empresa
responsável pela fabricação dos caças Gripen. Também prestou depoimento Luiz
Alberto dos Santos, que trabalhou na Casa Civil entre 2003 e 2014 no exame de
matérias legislativas, à frente da subchefia de análise e acompanhamento de
políticas governamentais, a quem compete a análise do mérito das matérias que
serão levadas à decisão presidencial.
Bengt
Janér falou a respeito de sua relação com outros dois acusados, os lobistas
Mauro Marcondes e Cristina Mautoni. Os dois, segundo o MPF, teriam atuado por
meio de influência indevida na compra dos aviões. Eles teriam feito lobby para
a Saab junto ao governo brasileiro.
Para
tanto, de acordo com a denúncia, Marcondes teria utilizado o ex-presidente
Lula. Em troca, Marcondes fez pagamentos de R$ 2,5 milhões a um dos filhos do
ex-presidente, o empresário Luís Cláudio Lula da Silva. Os repasses estão sob
investigação e ambos negam a acusação.
Questionado
sobre o motivo de ter contratado Marcondes, Janér disse que foi pela
proximidade dele com Lula. Segundo ele, a empresa estaria sendo
"barrada" pelo Ministério da Defesa e precisava criar um canal de
diálogo com o ex-presidente. “Ele dizia que tinha contato, mas influência é uma
coisa dificil de se dizer. Ele tinha esse contato [com Lula] e, para nós, ele
era a pessoa mais próxima que a gente poderia ter para passar a barreira do
Ministério da Defesa", disse. "Mas nunca o vi sugerir algo ilegal,
como pagamento de propina”, acrescentou.
A
transação, que custou U$ 5,4 bilhões pela aquisição de 36 novas aeronaves, foi
fechada pelo governo brasileiro durante a gestão de Dilma, mas o processo já
havia passado pelos governos de Lula e do ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso. A previsão é que os 36 caças Gripen NG sejam entregues à Força Aérea
Brasileira entre 2019 e 2024.
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