Horas antes da
manifestação, convocada em todo o país pelas organizações de Direitos Humanos,
o Senado argentino aprovou por unanimidade, nesta quarta-feira (10), uma lei
que impede a libertação antecipada de condenados por crimes contra a
humanidade. A legislação neutraliza uma decisão, tomada pela Suprema Corte, na
semana passada, que permitia a redução das penas dos que reprimiram movimentos
contrários à ditadura (1976-1983), que estão na cadeia ou esperando julgamento.
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“Foi uma decisão
terrível porque, de um momento ao outro, perdemos o que conquistamos ao longo
dos últimos 40 anos”, disse à Agência Brasil, Haydée Garcia. Ela é uma das 14
fundadoras das Mães da Praça de Maio – organização criada por um grupo de
mulheres argentinas para buscar os filhos que desapareceram nos porões da
ditadura. Em 1977, uma delas teve a ideia de marcar um encontro, toda
quinta-feira, às 15h30 na Praça de Maio, em frente ao palácio presidencial,
para mostrar aos ditadores que não desistiriam da busca. Um ritual que existe
até hoje.
Desse primeiro grupo,
apenas Haydée e Mirta Baravalle, de 93 anos, estão vivas. “Desde 1977, nunca
falto ao nosso encontro semanal, porque na Praça de Maio sinto que nossos
filhos e netos estão conosco e seus sonhos também”, disse. A filha de Mirta
estava grávida quando foi levada pelos militares, junto com o marido. Ela deu
luz a um menino, em cativeiro, que está na lista das 500 crianças roubadas na
ditadura para serem entregues ilegalmente em adoção. “Quarenta anos depois,
continuo sem saber que fim levaram e buscando uma resposta”, disse Mirta.
Nesta quarta-feira, as
Mães da Praça de Maio se juntaram a outras organizações de defesa dos Direitos
Humanos, para um protesto em frente a Casa Rosada. “Queremos mostrar que
estamos juntos e unidos contra a decisão da Suprema Corte, que foi tomada pouco
depois de termos comemorado o 40º aniversário de nossa primeira marcha”, disse
Haydée. No fim da tarde, a Praça estava lotada e muitas pessoas usavam um lenço
branco, símbolo das Mães, que amarravam uma fralda de pano na cabeça com o nome
do filho desaparecido bordado.
A manifestação tinha
sido marcada para exercer pressão politica e impedir que os autores de crimes
contra a humanidade possam se beneficiar da lei, conhecida como “dois por um” e
que – segundo a polêmica decisão da Suprema Corte – valia para todos os
prisioneiros. A legislação permite contar cada ano de prisão preventiva, à
espera da condena definitiva, como dois. Como a Justiça é lenta, muitos dos que
reprimiram os movimentos contrários à ditadura podiam encurtar suas penas.
Os protestos
terminaram em comemoração. “Tivemos a sorte de que a sociedade reagiu com
firmeza e pudemos reverter a situação”, disse Estela Carlotto. “Muitos juízes
rejeitaram os pedidos de redução de pena feitos pelos repressores, apesar da
decisão da Suprema Corte. E hoje os legisladores acabam de aprovar uma lei
impedindo que os genocidas sejam libertados antecipadamente”, disse.
Em outubro serão
feitas eleições legislativas na Argentina. Os resultados dessa votação servirão
para medir o índice de aprovação do presidente Mauricio Macri na primeira
metade de seu mandato e os direitos humanos são considerados um tema sensível
no país. Macri parabenizou os legisladores pela “rapidez com a qual começaram a
solucionar um vácuo legal” e disse que sempre foi “contra qualquer ferramenta
usada em favor da impunidade, especialmente quando aplicadas a delitos de lesa
humanidade”.
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