terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Divulgando Aloysio Biondi Parte IV


Prosseguindo com a série de curtos textos divulgando parte da obra do Aloysio Biondi*, passo para a parte IV.

Na primeira parte do seu livro O Brasil privatizado, Um balanço do desmonte do Estado, o Biondi mostrou Como foi fácil e barato comprar as empresas que o governo torrou para um seleto grupo de compradores. Na segunda parte ele enfatiza a estratégia adotada pelo governo para, agora valorizar aquelas empresas que já haviam sido devidamente entregues de mão beijada ao seleto grupo, garantindo-lhes um lucro ainda maior. Na terceira parte ele ilustrou Por que foi tão fácil as privatizadas lucrarem. E agora na quarta parte, ele mostra como o governo ainda não satisfeito Injetou Mais dinheiro nosso para aumentar lucros.


Até aqui, foram apontadas algumas das causas dos lucros que as empresas privatizadas apresentam rapidamente, e que a imprensa gosta de elogiar: aumento de preços e tarifas, demissões antes da privatização, dívidas “engolidas” pelo governo, compromissos dos fundos de pensão e das aposentadorias também “engolidos” pelo governo. Mas há outras vantagens incríveis que engordam os lucros dos “novos donos”, sempre à custa do dinheiro do contribuinte, do nosso dinheiro.

• PREJUÍZOS BONDOSOS – existe uma vantagem, sobre a qual nunca se fala, de que desfrutam os “compradores” de bancos estatais – à custa da Receita Federal, do pagamento de impostos. Eles podem utilizar os prejuízos que os bancos estatais “comprados” por eles tenham sofrido nos últimos anos e acumulado nos balanços. Utilizar como? Eles podem “pegar” esse prejuízo e subtraí-lo do seu próprio lucro, reduzindo-o e, portanto, diminuindo também o Imposto de Renda que deveriam pagar. Com esse mecanismo, chamado de “crédito tributário”, o banco “comprador” do gaúcho Meridional pode utilizar um prejuízo de 230 milhões de reais (do banco “comprado”) em seu benefício. Quanto ele havia pago pelo Meridional? Apenas 267 milhões de reais. Como utilizou os 230 milhões de reais, o seu “gasto” para comprar o banco seria, na verdade, de meros 37 milhões de reais. Quem se interessar por maiores detalhes sobre essas operações deve consultar a magnífica reportagem da jornalista Maria Christina de Carvalho, publicada pela Gazeta Mercantil em 17 de novembro de 1998.

• DINHEIRO EM CAIXA – por incrível que possa parecer, há estatais que foram vendidas com “dinheiro em caixa”, isto é, dinheiro que os compradores receberam de mão beijada. A Vale do Rio Doce foi entregue a Benjamin Steinbruch com 700 milhões de reais em caixa, segundo noticiário da época. Ou, mais inacreditável ainda, simplesmente espantoso: a Telesp tinha nada menos que 1 bilhão (com letra b, mesmo) em caixa ao ser entregue à espanhola Telefônica, segundo entrevista do diretor da empresa “compradora” à Gazeta Mercantil, em janeiro de 1999, logo após a queda do real.
Lembrete: a Telefônica pagou uma entrada de 2,2 bilhões de reais pela Telesp. Descontando-se o dinheiro em caixa, seu desembolso na verdade foi de apenas 1,2 bilhão.

VENDAS A PRESTAÇÃO

Outro motivo para o aumento dos lucros dos “compradores” (e novos “rombos”, se as contas forem bem feitas, para o governo): na maioria das privatizações, o valor está sendo pago em prestações, e com juros vergonhosamente baixos, se comparados com as taxas normais no Brasil ou, mais ainda, com as taxas que o governo tem pago sobre sua dívida cada vez mais alta. Na venda das redes ferroviárias, por exemplo, houve uma entrada de 10% a 20% do valor, com prazo, no total, de nada menos de 30 anos.
Isto é, nesses três primeiros anos o “comprador” recebe dinheiro, fatura, utilizando o patrimônio formado pelo Estado ao longo de décadas, e nada paga (e atenção: ainda recebe empréstimos do BNDES para “investir”). Mesmo no caso das teles houve parcelamento, cuidadosamente escondido por todo o noticiário: a entrada era apenas de 40%, seguida de duas parcelas de 30% cada, a vencerem daí a um e dois anos, respectivamente. Os comentaristas dos jornais e TVs, ou as reportagens sobre a venda, repisavam o tempo todo que o governo iria receber 13,5 bilhões de reais (preço mínimo pedido no leilão), ou “quatro vezes o valor recebido pela Vale do Rio Doce” (sic). Era mentira. A entrada seria de apenas 5,4 bilhões de reais, ou 40% daquele valor. E, quando as teles afinal foram vendidas por 22,2 bilhões de reais, os meios de comunicação trombetearam o tempo todo que o governo usaria aquela “dinheirama” para reduzir a dívida... Continuavam a esconder que, na verdade, o governo só receberia 40% desse valor – 8,8 bilhões de reais. (De fato, receberia menos ainda, considerandose que o governo financiaria, por meio do BNDES, 50% da entrada, quando o comprador fosse uma empresa nacional, mesmo que ela fosse apenas participante de um consórcio).

“MOEDAS PODRES” E TRUQUES...

Nas primeiras privatizações, o governo chegou a aceitar que o pagamento fosse totalmente feito em “moedas podres”, isto é, títulos antigos emitidos pelo governo e que podiam ser comprados por até 50% do seu valor. A própria Companhia Siderúrgica Nacional foi “vendida” no leilão por 1,05 bilhão de reais, mas esse valor foi pago em sua quase totalidade, ou 1,01 bilhão de reais, com “moedas podres”, com apenas 38 milhões de reais pagos em dinheiro. Em outras palavras, foi nula a entrada de dinheiro nos cofres do governo, que na prática apenas recebeu de volta uma parcela de sua dívida em títulos (exemplo: Títulos da Dívida Agrária, espécie de “promissória”, a ser paga ao longo dos anos, entregue a proprietários rurais que tiveram suas fazendas desapropriadas). E os grupos “compradores”? Usaram títulos, que compraram pela metade do preço, para “pagar” ao governo, isto é, na verdade compraram as estatais pela metade do preço anunciado. Há mais surpresas, porém: por incrível que pareça, e o que é geralmente desconhecido pela opinião pública, mesmo “moedas podres” usadas nos leilões também foram vendidas a prestação, financiadas pelo BNDES. Como assim? Era o próprio banco do governo que tinha “moedas podres” guardadas e as colocava em leilão, para os interessados em “comprar” estatais, em condições incríveis: até 12 anos para pagar e com juros privilegiados. No final das contas: o governo vendeu empresas aceitando “moedas podres” que estavam com o BNDES, que vendeu essas moedas para pagamento em até 12 anos, para os compradores das estatais. Ou ainda: os compradores não precisaram desembolsar dinheiro vivo nem mesmo para comprar as “moedas podres” usadas para pagar o governo... Sem gastar, viraram “donos” de estatais construídas com dinheiro – bilhões de reais – de todos nós, brasileiros, ao longo de décadas..

...E MAIS FINANCIAMENTOS. 

Em resumo, o governo está vendendo empresas a prestação, fornecendo “metade” da “entrada” nos leilões, financiando até a “compra” de “moedas podres”... Mas não se contenta com isso. Os felizes“compradores” das estatais brasileiras têm ainda novos presentes à sua espera: o BNDES lhes oferece empréstimos bilionários, depois que eles tomam posse das empresas, para executarem –com dinheiro do banco estatal, logo nosso – os “investimentos” que se comprometeram a fazer. Ninguém se espante: depois do caos nos serviços de energia elétrica no Rio, no começo de 1998, a Light ganhou um empréstimo de nada menos que 730 milhões dereais do BNDES. A Companhia Siderúrgica Nacional, comprada com “moedas podres” financiadas, também foi imediatamente presenteada com um empréstimo de 1,1 bilhão de reais do BNDES para execução de um plano de expansão de cinco anos. Tudo, sempre, com juros privilegiados, abaixo dos níveis de mercado. Explicam-se, assim, os rápidos e crescentes lucros dos “compradores” de estatais... Com dinheiro nosso, a baixo custo

Próxima parada, parte V

“Como aumentar a dívida e abalar o real”

Até lá!

Aloysio Biondi*Jornalista econômico colaborou durante 44 anos com reportagens e análises para jornais e revistas. Começou na Folha de S. Paulo em 1956, ocupando o cargo de editor-executivo do caderno de Economia, que o jornal (já) mantinha na época. Ocupou os cargos de secretário de redação da Folha de S. Paulo e da Gazeta Mercantil. Foi diretor de redação do Jornal do Comércio (RJ) e do Diário Comércio & Indústria (SP). Também foi editor de economia das revistas Veja e Visão e editor de mercado de capitais (“pioneiro”, em 1969) de Veja e do jornal Correio da Manhã. Foi diretor editorial do grupo DCI/





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