terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Divulgando Aloysio Biondi Parte III

Prosseguindo com a série de curtos textos divulgando parte da obra do Aloysio Biondi*, passo para a parte III.

Na primeira parte do seu livro O Brasil privatizado, Um balanço do desmonte do Estado, o Biondi explicou - como foi fácil e barato comprar as empresas que o governo torrou para um seleto grupo de compradores. Na segunda parte ele enfatiza a estratégia adotada pelo governo para, agora valorizar aquelas empresas, que já haviam sido devidamente entregues de mão beijada ao seleto grupo, garantindo-lhes um lucro ainda maior. Nesta terceira parte ele ilustra Por que é tão fácil as privatizadas lucrarem.

– Ah, mas as estatais sempre dão prejuízos, tiram dinheiro da saúde e da educação... É incrível como essas empresas estão dando lucros, logo no primeiro ano depois da privatização...
Esse argumento também foi largamente repetido para a população.
Ele também é falso. Ponto por ponto, pode-se explicar as razões dos “lucros” rápidos das empresas privatizadas:

• TARIFAS E PREÇOS – os reajustes de 100%, 300%, 500% antes da privatização garantem lucros aos novos donos. E há aumentos até de última hora, como o reajuste de 58% para as contas de energia no Rio, poucos dias antes do leilão da Light.
• DEMISSÕES – também antes de privatizar, o governo tem feito demissões maciças de trabalhadores das estatais, isto é, gastou bilhões com o pagamento de indenizações e direitos trabalhistas, que na verdade seriam de responsabilidade dos “compradores”.
Exemplos: o governo de São Paulo demitiu 10.026 funcionários de sua empresa ferroviária, a Fepasa, de 1995 a 1998. E ficou ainda responsável pelo pagamento a 50 mil (!!!) aposentados da ferrovia. No Rio, o governo do estado, antes da privatização, incumbiu-se de demitir nada menos que a metade – mais exatamente 6.200 – dos 12 mil funcionários do seu banco, o Banerj. Com essas demissões, além de se livrar do pagamento de indenizações e aposentadorias, os “compradores” receberam também folhas de pagamento mais baixas, mês a mês – e isso vale para quase todas as estatais privatizadas.
• DÍVIDAS “ENGOLIDAS” – esse é um ponto que nunca ficou claro para o povo brasileiro: ao longo de 30 anos, desde o final dos anos 1960, o governo freqüentemente usou as estatais para “segurar” a inflação ou beneficiar certos setores da economia, geralmente por serem considerados “estratégicos” para o país. Como assim? Houve períodos em que o governo evitou reajustes de preços e tarifas de produtos (como o aço) e serviços fornecidos pelas estatais, na tentativa de reduzir as pressões e controlar as taxas de inflação. Esses “achatamentos” e “congelamentos” de preços foram os principais responsáveis por prejuízos ou baixos lucros apresentados por algumas estatais, que passavam a acumular dívidas ao longo dos anos – sofrendo então nova “sangria” de recursos, representada pelos juros que tinham de pagar sobre essas dívidas. Certo ou errado, as estatais foram usadas como arma contra a inflação por governos que achavam que o combate à carestia era a principal  prioridade do país. O mal é que nunca foi suficientemente explicado à população que essa decisão arruinava as empresas estatais, dando motivo a falsas acusações de “incompetência” e “sacos sem fundo” contra elas.
Quando veio a onda das privatizações, o governo fez  exatamente o contrário. Primeiro, como visto acima, aumentou os preços (até 300%, no caso do aço) e tarifas (até 500%, repita-se) cobrados pelas empresas que seriam privatizadas. Mas – o que é espantoso – o governo fez muito mais: “engoliu”, passou para o Tesouro, dívidas que eram das estatais, bilhões e bilhões de reais que deveriam ser pagos pelos “compradores” – mesmo que esse pagamento fosse feito a longo prazo, mediante acordo com os credores. Exemplos? Na venda da Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista), o governo ficou responsável por dívidas de 1,5 bilhão de reais (além de o governo paulista ter adiado o recebimento de 400 milhões de reais em ICMS atrasado). Quanto o governo recebeu pela venda? Só 300 milhões de reais. Isto é, o governo “ganhou” uma dívida de 1,5 bilhão reais, e os “compradores” pagaram somente 300 milhões. A venda da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), de Volta Redonda, não foi diferente: o governo “engoliu” dívidas de no mínimo 1 bilhão de reais. Então, pode-se entender que, com essa política, ficou muito fácil para os “compradores” terem grandes lucros rapidamente: já no primeiro ano, além das tarifas e preços majorados, além da folha salarial reduzida, eles se livraram de pagar prestações dessas dívidas, bem como os juros sobre elas. Receberam as empresas “limpinhas”, prontas para os lucros. É a essa política que o governo chama de “saneamento das estatais”, preparatório para a privatização. Quem não quer?
• DÍVIDAS TRANSFERIDAS – aqui, cabe um parêntese importante. O governo, quando divulga os resultados do processo de privatização, sempre gosta de dizer que, além do preço da “venda”, deve-se levar em conta, ainda, as dívidas que aquelas estatais apresentavam, e que foram transferidas para o comprador. Nesse argumento, há uma dupla mentira. Primeiro, como foi demonstrado acima, há dívidas que o governo “engole”, e sobre as quais ele e os meios de comunicação nunca falam... Em segundo lugar, no caso das dívidas que permanecem sob responsabilidade dos “compradores”, é preciso lembrar que eles vão contar com o faturamento da própria empresa para pagá-las. Ao contrário do governo, que  fica com as dívidas “engolidas” e tem de pagá-las com dinheiro do Tesouro, dos impostos, ou seja, de toda a população brasileira.
Dinheiro nosso.
• FUNDOS DE PENSÃO – exatamente como as grandes empresas privadas, também as empresas estatais mantêm planos especiais de aposentadoria ou planos de pensão para seus funcionários.
Em vários casos, os “compradores” ficaram livres também desses compromissos. Como assim? O governo – estados ou União – “transferiu” os aposentados para sua folha de pagamentos ou se responsabilizou, no caso dos fundos de pensão, pelo pagamento dos benefícios aos funcionários existentes. No caso da Fepasa, o número de aposentados que “ficaram” com o governo chega a nada menos de 50 mil. No entanto, o mais escandaloso foi o caso do Banco do Estado do Rio de Janeiro. Para privatizá-lo, o governo “engoliu” todos os compromissos futuros do plano de pensão dos funcionários. Para isso, o então governador Marcello Alencar tomou um empréstimo de nada menos de 3,3 bilhões de reais, mesmo sabendo que o banco seria vendido por apenas 330 milhões de reais, isto é, um preço dez vezes menor. Pior ainda: esse valor foi pago em “moedas podres”, negociadas no mercado com desconto de 50%, ou seja, os 330 milhões de reais representavam mesmo, no final das contas, apenas 165 milhões de reais, ou praticamente 20 vezes menos do que o valor do empréstimo de 3,3 bilhões... Tudo para livrar os “compradores” de futuros gastos. Essa operação escandalosa agravou os problemas financeiros do Rio, como o novo governador, Anthony Garotinho, não se cansa de apontar.

Próxima parada, parte IV
"Mais dinheiro nosso para aumentar lucros"
Até lá!
Aloysio Biondi*Jornalista econômico colaborou durante 44 anos com reportagens e análises para jornais e revistas. Começou na Folha de S. Paulo em 1956, ocupando o cargo de editor-executivo do caderno de Economia, que o jornal (já) mantinha na época. Ocupou os cargos de secretário de redação da Folha de S. Paulo e da Gazeta Mercantil. Foi diretor de redação do Jornal do Comércio (RJ) e do Diário Comércio & Indústria (SP). Também foi editor de economia das revistas Veja e Visão e editor de mercado de capitais (“pioneiro”, em 1969) de Veja e do jornal Correio da Manhã. Foi diretor editorial do grupo DCI/






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