Um tema de grande relevância
nacional permanece ausente dos debates da grande mídia e da sociedade
brasileira. Trata-se das relações entre as religiões e o estado laico, que tem
chamado a atenção dos estudiosos pelo avanço crescente dos interesses e grupos
religiosos sobre os poderes legislativos e executivos, configurando demandas
religiosas como políticas de Estado.
Não bastassem os casos de rivalidade
e intolerância religiosa registrados em vários estados, especialmente de grupos
evangélicos – mais especificamente neopentecostais – contra praticantes de
umbanda e candomblé, despontam grandes preocupações com a questão do ensino
religioso na escola pública. O Acordo Brasil-Vaticano (2010), ao determinar que
o ensino religioso deva ser “católico e de outras confissões religiosas”,
provocou ação de inconstitucionalidade pela Procuradoria Geral da União. Já o
Conselho Nacional de Educação enviou comissão ao Supremo Tribunal Federal (STF)
reforçando o pedido de suspensão dos efeitos do acordo sobre o ensino
religioso, que deixa de ser não-confessional para se tornar ensino de religião.
Outra situação relacionada à
questão, mas de profunda gravidade, diz respeito à proposta de Emenda
Constitucional (PEC 99, 19/10/2011), do deputado João Campos (PSDB-GO), que:
“Acrescenta ao art. 103, da Constituição Federal, o inciso X, que dispõe sobre
a capacidade postulatória das associações religiosas para propor ação de
inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade de leis ou
atos normativos, perante a Constituição Federal”. Noutras palavras, um conjunto
de entidades representativas da igreja católica e de diversas igrejas
evangélicas, citadas na proposta, formaria uma corte eclesiástica acima do
Congresso Nacional e do STF, com poderes de referendar ou não as leis do País.
A proposta tanto tem de ousada
quanto de perigosa. A julgar pelas últimas investidas clericais contra o estado
laico, esboça-se não apenas o sepultamento do mesmo, da cidadania e da
democracia, como a germinação obscurantista de uma teocracia.
Via Os
Caminheiros em 04/2012
Por Marcos José Diniz Silva - Historiador
e professor da Universidade Estadual do Ceará