Toda
vez que tem crise de ansiedade, a consultora financeira Melissa Mandaloufas, de
40 anos, precisa de atendimento urgente, pois se sente mal fisicamente, com
hipertensão arterial. “Fico com pressão alta, ao ponto de quase desmaiar, vou
parar no hospital e aí que eu vejo que tenho que me tratar.” Ela conta que faz
o tratamento com calmantes, mas depois de um tempo o problema acaba voltando.
“Tenho crises de depressão também, principalmente quando estou sem atividade
profissional.”
A
profissional de marketing Carol Lahoz, que sofre de depressão há oito anos,
ainda tem dor de cabeça e lombalgia, mesmo tomando medicamentos. “Tenho
enxaqueca crônica e dores na lombar, mas quando faço atividade física percebo
que não tenho crises nem de dor e nem de depressão.” Para ela, outros
tratamentos também aliviam a dor física. “Quando passa a crise, já logo faço
análise e acupuntura.”
Quem
sofre desses sintomas já sabe que uma dor leva à outra. Mas agora, um estudo do
Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo (USP) mostra a relação bidirecional entre
ansiedade ou depressão e algumas doenças físicas crônicas. O levantamento
mensurou essa relação em pessoas adultas residentes na Região Metropolitana de
São Paulo e mostra dados preocupantes. O resultado do estudo é que indivíduos
com transtornos de humor ou de ansiedade tiveram incidência duas vezes maior de
doenças crônicas.
A
dor crônica foi a mais comum entre os indivíduos com transtorno de humor, como
depressão e bipolaridade, ocorrendo em 50% dos casos de transtornos de humor,
seguidos por doenças respiratórias (33%) , doença cardiovascular (10%) ,
artrite (9%) e diabetes (7%).
Os
distúrbios de ansiedade também são largamente associados com dor crônica (45%)
e doenças respiratórias (30%) , assim como com artrite e doenças
cardiovasculares (11% cada). A hipertensão foi associada a ambos em 23% dos
casos.
Estresse
Os
dados mostram a necessidade de maior atenção ao tema. “Já era esperado que
houvesse uma relação forte entre essas doenças. O problema é que a prevalência
de ansiedade e depressão em São Paulo é muito alta por causa do estresse. Com
esses números, precisamos atentar para a necessidade de passar a informação
para o médico que está na linha de frente, no atendimento primário. É preciso
reconhecer a comorbidade de ansiedade e depressão com as doenças crônicas que
não se resume apenas à dor”, disse a psiquiatra Laura Helena Andrade,
coordenadora do Núcleo de Epidemiologia Psiquiátrica do IPq e uma das autoras
do estudo.
Dos
cerca de 11 milhões de moradores adultos da Região Metropolitana de São Paulo,
10%, ou 1,1 milhão de pessoas, tiveram depressão nos últimos 12 meses. Já os
transtornos de ansiedade acometem mais de 2,2 milhões de paulistanos, sendo que
990 mil apresentam dor crônica também. Seguindo esse cálculo, no total, mais de
2 milhões de pessoas convivem com depressão ou ansiedade associadas a dor
crônica na região.
Relação antiga
Estudos
anteriores já haviam mostrado de forma consistente a associação de doenças
crônicas com transtornos de humor e ansiedade. Mas ainda não se sabe porque a
relação entre dor crônica e ansiedade ou depressão é tão intensa, pois os
mecanismos fisiopatológicos da dor crônica são pouco conhecidos.
“Uma
das hipóteses é relacionada à questão de comportamento. As pessoas ficam
inativas quando têm depressão, isso causa dor, ou então a própria dor muda a
vida da pessoa, leva à falta de atividades físicas, o que aumenta a depressão e
fica um círculo vicioso.”
A
psiquiatra explica que, assim como as células do sistema de defesa são ativadas
quando há uma invasão por um agente causador de doença, o estresse psicológico
em uma situação ambiental como, por exemplo, viver em uma cidade como São
Paulo, acaba ativando o sistema inflamatório.
“Aumento
da inflamação, lesões do endotélio – camada de célula presente em todos os
vasos sanguíneos – e danos oxidativos são algumas vias que podem estar
relacionadas à ocorrência da comorbidade [doenças relacionadas].
Consequentemente, é imperativo que sintomas depressivo-ansiosos sejam tratados
agressivamente em pacientes com condições médicas crônicas, pois sua resolução
pode ser acompanhada por melhora geral sintomática e uma importante diminuição
no risco de mortalidade e complicações”, disse Andrade.
De
acordo com a pesquisadora, ainda é preciso fazer mais pesquisas com foco na
interação entre depressão, ansiedade e doenças físicas crônicas para elucidar
os mecanismos pelos quais se originam as doenças. “Para descobrir esses
mecanismos precisamos de mais estudos. O que a gente vê é uma associação
grande, mas qual é o mecanismo exatamente a gente ainda não conhece.”
O
artigo, publicado no Journal of Affective Disorders, faz parte do São
Paulo Megacity Mental Health Survey, levantamento concluído em 2009 no âmbito
de projeto temático financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo (Fapesp). Ao todo, foram entrevistados 5.037 moradores da Região
Metropolitana de São Paulo, com 18 anos ou mais.
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