Como em vários
momentos da história, a imprensa, quando não invisibiliza a ação dos
estudantes, criminaliza as ocupações e quem luta por direitos.
Por Marina
Pita*
O silêncio
pode dizer mais do que mil palavras. A frase – dessas compartilhadas em grupos
de WhatsApp pela manhã – significa muito na atual conjuntura do país.
Num contexto
de mais de mil escolas ocupadas em todo o Brasil contra a PEC 241 e a Medida Provisória que reforma o Ensino
Médio, o silêncio da imprensa sobre a mobilização dos estudantes é
mais um capítulo sombrio do processo pelo qual passa o país, exemplar quando
falamos de ausência de diversidade e garantia do acesso à informação no Brasil.
Muita gente só
tomou conhecimento das ocupações no último final de semana, quando locais de
votação no segundo turno das eleições municipais tiveram que ser
trocados em função das escolas mobilizadas.
Até ali, as
matérias – principalmente na televisão – foram raras. Agora seguem poucas, sem
dar voz aos estudantes que ali estão, tampouco aos setores da sociedade que
apoiam os protestos contra da PEC e a MP 746/2016.
Um dos maiores
jornais do país, a Folha de S.Paulo ignorou a ascensão das ocupações.
O tema aparece no impresso em matéria do dia 11 de outubro com o foco apenas no
estado do Paraná: ”Estudantes ocupam cem escolas e professores aprovam
greve no Paraná”.
Mais de uma
semana depois, apenas em 19 de outubro, vem o segundo texto, com viés
claramente criminalizador: “Ocupação em 181 escolas pode causar cancelamento de
provas do Enem”. No dia 24 de outubro, o tema volta a aparecer por conta da
morte de um estudante em Curitiba.
Entre o
crescimento de 100 a 800 escolas ocupadas, vigorou o silêncio do jornal sobre o
assunto. Nada se falou sobre as ocupações em outros estados.
Na sexta-feira
25, um novo texto intitulado “Protesto em escola ocupada do Paraná tem tensão,
apitaço e xingamentos”. O movimento dos estudantes é apresentado como
“baderna”.
Considerando a
amplitude do movimento “Ocupa Paraná”, a opção da Folha foi cobrir
desproporcionalmente uma manifestação contra a ocupação em uma das escolas.
Frases genéricas
como “de um lado, pais, alunos e professores que querem a volta às aulas
passaram a organizar protestos contrários. Em algumas cidades, chegaram a
"ocupar" antes os colégios para evitar a tomada do local pelos
manifestantes” demonstram a ausência de rígido critério de apuração.
Afinal, as
ações contra as ocupações – apesar da violência que adotam, algo também não
apontado pela imprensa – são minoritárias diante do crescimento da mobilização
nacional.
A sequência de
matérias como “Com escolas ocupadas, Paraná vai ter Força Nacional na eleição”,
“Alunos são algemados após serem retirados de escola invadida no TO”, “Tumulto
em Escola no Paraná”, “Com escolas ocupadas, até supermercado vira local de
votação no Paraná”, “Escolas ocupadas poderão ter o Enem adiado, diz Ministério
da Educação” mostra a facilidade como os jovens mobilizados por seus direitos
são apresentados como baderneiros, irresponsáveis e que atrapalham a vida dos
cidadãos que simplesmente querem estudar.
A tônica da Folha tem
sido, assim, colocar em oposição o movimento que defende a educação universal,
gratuita e de qualidade e os demais estudantes.
O próprio
Ombudsman do jornal classificou a cobertura do jornal de protocolar:
"A Folha noticiou
de forma tímida a movimentação. Para dar ideia da extensão, na sexta, segundo
entidades estudantis, havia 123 universidades e 1.197 escolas ocupadas no país;
cerca de 850 no Paraná”. Ainda, lembrou o silêncio da imprensa local quanto à
marcante fala da estudante Ana Julia, que incendiou as redes sociais.
“Na quarta,
16, nenhum grande jornal noticiou a inusual presença de estudantes na tribuna.
Na quinta, às 12h53, o site da revista econômica americana ‘Forbes’ captou a
importância da fala da jovem. Só às 19h a Folha colocou no ar perfil
de Ana Júlia, recuperando o discurso”.
O
STF e a criminalização
No jornal
carioca O Globo, a cobertura com viés crítico às ocupações também deu a
linha. Se primeiro o foco era no “distúrbio” que a mobilização poderia trazer
ao Exame Nacional do Ensino Médio (“Com mais de 640 escolas ocupadas governo do
Paraná se diz preocupado com eleições e Enem” no dia 18).
Depois, os
veículos do Grupo Globo fizeram questão de destacar a fala do presidente do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre os eventuais gastos que as ocupações
geraram com a mudança dos locais de votação.
A declaração
de Gilmar Mendes foi exibida à exaustão ao longo da noite do domingo
30 nos telejornais da GloboNews, chegando a irracionalidade de sugerir à AGU
que estude cobrar os estudantes o “custo” das ocupações para as eleições. No
site d'O Globo, a chamada era “Ocupação de escolas gerou gastos nas eleições,
diz Gilmar Mendes”.
Antes disso, a
opção do jornal carioca tinha sido entrevistar com destaque o Secretário
estadual de Educação do Paraná e silenciar os estudantes. As aspas escolhidas
para o título da matéria não são sobre soluções para o impasse, negociações, mas
a simples ameaça: "Wagner Victer: 'Quem diz que não prejudica é leviano'
".
O Jornal
Nacional do dia 27 apresentou reportagem sobre a bárbara apreensão de
estudantes no Tocantins, que chegaram a ser algemados ilegalmente.
Mostraram o
documento do Ministério Público que “justificava” a medida e deram um tempo
irrisório para a opinião contrária da Defensoria Pública do estado, que
criticou a apreensão dos alunos. A matéria sequer informou aos telespectadores
por que aquela escola tinha sido ocupada.
Nesta terça, 1
de novembro, o Bom Dia Brasil preferiu dizer que o cerco da Polícia
Militar para pressionar pela saída de estudantes de uma escola
ocupada em Taguatinga, no Distrito Federal, atrapalhava a
circulação de moradores.
O
desequilíbrio no espaço dado – quando dado – aos estudante também caracteriza a
cobertura na TV. Apenas a título de exemplo, no mesmo Bom Dia Brasil do
dia 26 de outubro, em reportagem de 3 minutos e 40 segundos, apenas 13 segundos
foram dedicados aos estudantes para explicarem por que ocupam as escolas.
Um exemplo
contrário foi a matéria da Agência Estado, “Mais de mil escolas e
universidades estão ocupadas no Brasil”, de 26 de outubro, que ouve não apenas
a presidente da Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), Camila
Lanes, mas cita nota da Associação dos Reitores das Universidades Federais
(Andifes) e da Reitoria da Universidade Federal de Minas Gerais favoráveis ao
movimento dos estudantes. Algo raro até agora na imprensa nacional.
O papel da
comunicação pública e da internet
Foi na Agência
Brasil – com todos os problemas que a EBC sofre depois do desmonte que
tem sido implantado na empresa pública pelo governo Temer – que o cidadão pôde
se informar minimamente sobre o contexto geral das ocupações Brasil afora.
Reportagens
como “Mais de mil escolas do país estão ocupadas em protesto; entenda o
movimento”, “Estudantes secundaristas e meio acadêmico debatem ocupação de
escolas no Rio” e “Alunos do DF ocupam escolas para serem ouvidos sobre
mudanças na educação” fizeram o que se espera da imprensa: jornalismo.
A batalha pela
narrativa das ocupações, entretanto, segue travada mesmo na internet, em blogs,
sites da imprensa alternativa e nas redes sociais. O discurso de Ana Julia –
que ganhou a capa de CartaCapital essa semana – foi ouvido por todos no
Youtube, Facebook e nos grupos de WhatsApp.
Ao participar
de uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos do Senado nesta
segunda-feira 31, a estudante do Paraná fez questão de negar, veementemente, o
papel de passividade atribuído aos estudantes por alguns e replicado por
comentaristas e jornalistas da grande mídia. Não há doutrinadores e doutrinados
neste jogo. Tampouco revoltados sem causa.
A jovem que
fez milhares pararem para ouvir quem está vivendo as ocupações jogou luz a algo
que se repete sistematicamente quando o país precisa debater temas centrais
para o seu futuro: a dificuldade de entender o que está acontecendo quando se
acompanhando o noticiário apenas pela mídia tradicional.
* Marina Pita é jornalista e integra o
Conselho Diretor do Intervozes.
onde essa gente estava quando dilma cortou 10 bilhoes da educaçao depois de ser reeleita ?
ResponderExcluirso posso pensar,que sao massa de manobra !!
basta ver no youtube...99% nao sabe nada sobre o assunto.