Por
Marco Damiani
Divisão
do Brasil entre ricos e pobres, Sul-Sudeste e Norte-Nordeste, informados e
ignorantes (como sugeriu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso) já levou
sociedade brasileira à ruptura institucional; prática da visão de mundo baseada
no 'nós contra eles', o popular Fla X Flu, provoca perdas para todos; é bom
lembrar que, hoje em cantos opostos, PT e PSDB já deixaram correr, no passado,
conversas sobre fusão partidária; boicote recíproco é positivo para quem?
Os
dois líderes mais emblemáticos de PT e PSDB, ex-presidentes Lula e Fernando
Henrique, já deixaram correr, nos tempos do governo do primeiro, a conjectura
de que, um dia, no futuro, os dois partidos poderiam se fundir num só. Eram
tempos em que, a partir da base do plano Real de FHC e com o impulso de taxas
mais altas de crescimento obtidas na gestão Lula, os petistas estavam em alta e
os tucanos se debatiam contra a síndrome de se tornarem uma legenda de
expressão apenas regional. O assunto ganhou certo corpo em conversas entre
parlamentares no Congresso, mas, como se sabe, nunca prosperou.
Naqueles
debates informais, o argumento que unia os contrários era o de que não havia
diferenças de fundo ideológico entre os dois partidos, mas sim uma distinção de
acento sobre os compromissos de cada um deles sobre a necessidade igualmente
reconhecida de mudar o Brasil. Nem PT nem PSDB, afinal, haviam nascido para
fazer a chamada revolução brasileira. A intenção de ambos, declarada em todos
os momentos de suas respectivas histórias, seria de reformar o País.
Agora,
a moda é a de apontar o PT como o partido do Brasil pobre e atraso e o PSDB como
a legenda identificada com a parte mais rica e inteligente da Nação. Na
abertura deste segundo turno da eleição presidencial, Fernando Henrique
tornou-se o principal porta-voz desta tese, ao difundir, em entrevista, a ideia
de que o voto petista sai do cidadão menos informado e de menor renda. Os
tucanos, por essa ótica, deteriam o voto mais consciente do brasileiro que
conseguiu tomar o elevador da ascensão social e se estabelecer nos andares mais
altos.
Dessa
diferença de localização na pirâmide social para o estabelecimento de um
renovado Fla X Flu ideológico a distância vai se mostrando bem menor do que a
que existia na fase em que os caciques deixavam correr soltas as chances de uma
fusão partidária.
Registre-se:
nada pode ser pior para os dois partidos do que a imposição dessa lógica de
distinção absoluta entre eles. A prevalecer, ela irá somar para que as
diferenças programáticas entre eles virem abismos de visão de País. Na prática,
acirra as contradições a ponto de impedir que um time reconheça as qualidades
do outro, focando apenas nos defeitos alheios.
O
trabalho de um corresponderá ao boicote do outro.
Divisionismo
Levada
para as ruas, essa divisão entre um partido do bem e outro do mal, uma legenda
dos ricos e outra dos pobres, uma agremiação que defende os interesses do Sul e
do Sudeste e outra que representa o Nordeste e o Norte vai apenas contribuir
para um racha definitivo na sociedade brasileira, como chegou a propor um
colunista social pró-Aécio, nas redes sociais (leia mais aqui).
O
risco não é pequeno, haja visto o que já ocorre em países vizinhos, nos quais a
chamada elite pensante se dissociou completamente da reconhecida base operante.
O maior exemplo dos males dessa dicotomia reside na Venezuela da Nicolás
Maduro.
O
caminho brasileiro, quando derivou radicalmente para o racha social, implicou
em rupturas institucionais. No 'nós' contra 'eles' todos perdemos, como se
constatou nos resultados nefastos, tanto para economia quanto, especialmente,
para as liberdades democráticas, nas perdas gerais provocadas pelo regime
militar (1964-1985). Basta olhar aquele período histórico, ainda tão presente
na memória de muitos, mas quase inexistente para tantos outros, mais jovens,
para se saber onde essa conversa de brancos bem nascidos de um lado e mulatos
desfavorecidos de outros, mais instruídos nessa fila e ignorantes por aquela
porta pode descambar. Quando o Brasil se deixou levar por essa falsa dicotomia,
entrou por um labirinto que precisou de 21 anos para ser ultrapassado. Só
faltava termos chegado até aqui para, a esta altura do campeonato, cometermos
os mesmos erros.
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