De todas as retrospectivas para as decisões do Congresso, a que mais fez falta foi a não votação da reforma política. A matéria é discutida pelos parlamentares há 15 anos, sem nunca gerar um consenso, motivado pelos interesses diversos em todas as bancadas.
A última vez
que o assunto chegou próximo de um resultado foi após o pronunciamento da
presidente Dilma Rousseff, em junho de 2013, no qual sugeria a criação de um
plebiscito para que a população participasse na decisão de aspectos da reforma
política. A inviabilidade da proposta, analisada e criticada por juristas,
levou o tema novamente para o escuro.
Em 2012, outra novela havia se desenhado com a reforma política. Era a
proposta do deputado Henrique Fontana (PT-RS). Chegando à porta do plenário, a
matéria não foi apreciada por falta de acordos políticos. No texto, Fontana
previa a coincidência das eleições para todos os cargos em 2022 (de vereadores
até presidente do país); adiamento dos mandatos de prefeitos eleitos em 2016;
fim das coligações em eleições proporcionais; criação de uma lista flexível de
candidatos para os eleitores votarem; maior participação popular no Legislativo
via internet e, o polêmico item, a exclusividade de financiamento público das
campanhas.
Proposta
simples
Para facilitar o consenso, uma comissão mista do Congresso Nacional criou, paralelamente, uma proposta com menos mudanças. O projeto do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) propunha eleições em caso de cassação de mandato de prefeito, redução de burocracia na Justiça Eleitoral e a possibilidade de pré-campanha, permitindo aos candidatos divulgarem ações ou propostas em redes sociais e sites.
Entretanto,
como se pôde ver, nem mesmo a declaração de Dilma fez o tema progredir e,
efetivamente, mudar o sistema eleitoral do Brasil. Essa foi a brecha para que
um dos mais polêmicos temas chegasse ao STF (Supremo Tribunal Federal) no
último mês do ano: o veto a doações de empresas para campanhas eleitorais.
O que não se
podia esperar é que o assunto – que diz respeito aos eleitores, que, por sua
vez, votam e escolhem aqueles que irão representá-los na Câmara – chegou às
mãos de uma esfera que não têm representantes da população, mas indicações da
Presidência da República e, por isso, tem papel de árbitros e zeladores da
Constituição Federal.
Para a
população, a deliberação do Supremo de tomar a frente dessa decisão pode não
parecer tão prejudicial. Ainda mais quando 78% dos entrevistados – de uma
pesquisa realizada pelo Ibope, encomendada pela OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil) – afirmam ser contrários à doação de dinheiro por empresas para
campanha eleitoral. A apuração entrevistou 1.500 pessoas entre 27 e 30 de julho
deste ano. Confira a pesquisa completa abaixo.
Entretanto, a complicação não está no resultado dessa tomada pelo STF, se vetará ou não as doações, mas no ato de trazer para a esfera do Judiciário algo que deveria ser decidido pelo Legislativo e, assim, indiretamente, pelo povo. Uma vez que se permita a transferência de poder em órgãos distintos, que não se hierarquizam, nem disputam domínio entre si, qual será o limite para o próximo julgamento?
Entretanto, a complicação não está no resultado dessa tomada pelo STF, se vetará ou não as doações, mas no ato de trazer para a esfera do Judiciário algo que deveria ser decidido pelo Legislativo e, assim, indiretamente, pelo povo. Uma vez que se permita a transferência de poder em órgãos distintos, que não se hierarquizam, nem disputam domínio entre si, qual será o limite para o próximo julgamento?
Choque de poderes
E o conflito
gerado entre ambas as esferas já mostra seus sinais. O presidente da Câmara,
Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), afirmou, na segunda-feira (16), que o Supremo
está extrapolando suas atribuições e tomando o lugar do Congresso ao votar a
legalidade do financiamento de campanhas.
Entretanto, o
STF discorda. De acordo com o ministro Luís Roberto Barroso, o papel do Supremo
é de estar à frente, ainda que reconheça a necessidade de diálogo com o
Congresso. “Às vezes é preciso uma vanguarda iluminista que empurre a história,
mas que não se embriague desta possibilidade, pois as vanguardas também são
perigosas quando se tornam pretensiosas.”
Como ocorre em
muitos casos, a nossa Constituição, entretanto, ao mesmo tempo que oferece ao
Congresso o poder sobre essas decisões, também permite que o Supremo julgue “a
ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou
estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo
federal” (Art. 102, inciso 1.a).
Portanto, cabe
às duas esferas a iniciativa de acordo e consenso. A mesma Constituição, no
artigo 2º, apresenta que “são Poderes da União, independentes e harmônicos
entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Os poderes objetivam se
completar – não substituir, muito menos se confrontar.
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