Por
Rui
Rodrigues no Bar do Chopp Grátis
Em casa nos ensinavam a sermos umas crianças boazinhas. A única maldade que aprendíamos em casa era a bater. Naquela época nos batiam para que fossemos crianças boazinhas. Não pensavam, não raciocinavam, e produziam revoltados. Eu vi mais tarde, aqueles que mesmo apanhando diziam que eram culpados, bem mais tarde, ainda bendizer as surras que apanharam de cinto, de chinelo, de palmatória. Mas isso era na escola.
Apanhei bastante apesar de ser sempre o
primeiro ou o segundo da turma, até o dia em que comecei de espontânea vontade
a oferecer a minha mão para a palmatória da minha querida professora dona
Ermelinda. Digo querida, porque sem ela, meu pai não me teria posto na escola
para estudar e muito menos para me formar. Já ouvi falar do complexo de Édipo,
do complexo de Electra, e agora temos que inventar o complexo de “inveja
paternal”. Podia pagar com folga. Porque não queria que eu estudasse? Não valia
a pena o sacrifício, que nem era sacrifício nenhum? Mas quando me formei ficou
orgulhoso e me apresentou aos amigos como “meu filho engenheiro”. Ah... Os
professores... Então... Todos... Todos eles me ensinaram os bons modos, a ser
um sujeito decente, competente, com a recomendação de que seria mais um cidadão
do futuro a desenvolver a minha pátria. Como tenho duas pátrias, tenho que
desenvolver duas, por isso que não recomendo a ninguém a dupla nacionalidade.
Dá muito trabalho e por vezes sentimos que não vale a pena. Roubam-nos tudo em
impostos e desperdícios. Melhor emigrar, ficar uns cinco anos e depois emigrar
outra vez, depositando a grana economizada num paraíso fiscal que cobre menos
imposto. Assim nos roubam menos em nossa própria terra.
Nunca nenhum professor me alertou para os perigos da vida como eles realmente são. Os professores aprenderam muitas matérias, sofreram muito para estudar, conhecem a vida, mas as diretorias das escolas não deixam que nos alertem para os perigos, contando-nos como o mundo realmente é. Diziam-nos que deveríamos defender a pátria sem nos avisar porque raios de motivos nossos governos declaravam guerras ou se metiam em guerras, e nunca nos disseram que os presidentes tinham o poder de nos chamar em manifestações para baixar o cacete em populações nacionais indefesas, nós, os soldados, armados a acobertados até os dentes como se estivéssemos numa guerra de matar ou morrer. Diziam que era tudo maravilhoso, que a nação era uma esperança só. As duas que me catalogam como binacional. Toda a nação deveria ter verde em suas bandeiras, vermelha cor de sangue, negro a cor da imbecilidade, e branco que representasse o individuo sozinho, tentando sobreviver a esse caos onde todos mandam nele, lhe batem, lhe jogam gás de pimenta, lhe furam o couro com balas de borracha e o trancafiam numa prisão como se fosse um terrorista.
Viemos ao mundo errado, construímos um mundo errado, ou somos umas lesmas vagarosas e sem cérebro que não percebemos bem onde estamos, se numa folha verde de esperança, ou numa salada em um prato, prontos para sermos devorados pelos reis do castelo.
Professores não ensinam isto. Não ensinam porque a
diretoria e os donos dos colégios não deixam. Querem manter a juventude com
esperanças, sem causar problemas em casa. Professor não é livre para ensinar
nem para completar a educação de casa. Por isso em muitas escolas a violência
dos alunos se torna insuportável. Eles sabem que os professores estão
escondendo o jogo, e que “lá fora” a vida é muito diferente e há que
sobreviver. E nem sempre os melhores alunos são os mais efetivos neste tipo de
sobrevivência. E quando chegam nas empresas, todos verdes, cheios de esperança,
começam a aprender coisas nas quais custam a acreditar, coisas que dão lucros
incríveis para as empresas, das quais não escapam nem as santas igrejas que têm
contas em Banco.
E quando temos nossos vinte anos, e enfrentamos o mundo, olhamos para trás, para o que nos ensinaram em casa e nas escolas e universidades, e comparamos com o que vemos na vida e nas empresas em que trabalhamos e ficamos pasmados, embasbacados, atônitos. Como é possível que sejam dois mundos tão diferentes? Enganaram-nos no ensino. O tempo todo nos enganaram. Talvez para mostrarem como estávamos domados, como éramos boas crianças, educadas, orgulho dos pais, por sua vez excelentes cidadãos... E lá vamos nós pela vida, o balconista enganando o freguês por ordem e instrução do patrão, mas com vontade de avisar que na outra loja o artigo é melhor e mais barato... Engenheiros e médicos, e todos nós, cooperando para as empresas ficarem cada vez mais ricas, arriscados a levar um tombo na vida, indo para hospitais de tratamento alienados, tendo visões com uma bata que mostra a bunda, soro na mão, pelos corredores dizendo: os alemães estão atacando... Cuidado com os índios, eles vão nos pegar... Ou entrar no carro e dizer em voz baixa que façam silêncio porque podem ter plantado escuta no veículo. E tudo para dar lucros às empresas que até pagam bem, muitas vezes não por competência, nem por quem indica, mas por eficiência no trato com as finanças.
E quando temos nossos vinte anos, e enfrentamos o mundo, olhamos para trás, para o que nos ensinaram em casa e nas escolas e universidades, e comparamos com o que vemos na vida e nas empresas em que trabalhamos e ficamos pasmados, embasbacados, atônitos. Como é possível que sejam dois mundos tão diferentes? Enganaram-nos no ensino. O tempo todo nos enganaram. Talvez para mostrarem como estávamos domados, como éramos boas crianças, educadas, orgulho dos pais, por sua vez excelentes cidadãos... E lá vamos nós pela vida, o balconista enganando o freguês por ordem e instrução do patrão, mas com vontade de avisar que na outra loja o artigo é melhor e mais barato... Engenheiros e médicos, e todos nós, cooperando para as empresas ficarem cada vez mais ricas, arriscados a levar um tombo na vida, indo para hospitais de tratamento alienados, tendo visões com uma bata que mostra a bunda, soro na mão, pelos corredores dizendo: os alemães estão atacando... Cuidado com os índios, eles vão nos pegar... Ou entrar no carro e dizer em voz baixa que façam silêncio porque podem ter plantado escuta no veículo. E tudo para dar lucros às empresas que até pagam bem, muitas vezes não por competência, nem por quem indica, mas por eficiência no trato com as finanças.
Então, fartos de sermos explorados e de mandarem em nós desde a infância, sendo obrigados a esquecer os bons princípios que nos ensinaram durante toda a vida escolar e sob o teto dos pais, vamos para a rua reclamar contra a escravidão mensal, anual, secular, milenar... Sem nunca termos mudado decentemente este mundo, nem nós mesmos, os neo-escravos do século XXI e do Papa Francisco, no que pesem tantas escolas, tantas universidades – algumas católicas, tantos professores. Ninguém quer mudar nada aparentemente, a não ser quem vai para as ruas.
E vêm nossos irmãos, e nos baixam o sarrafo na avenida, só porque queremos decência no modo de governar, bons serviços públicos, bons transportes, boa infra-estrutura com água potável energia elétrica e esgotos tratados, boa educação.
Porque será que somos tão burros e idiotas que não mexemos uma palha para mudar de vida? Será doença? Se for, temos urgentemente que pedir uma bolsa-doença para sobreviver neste mundo, com alguns calmantes de sobra para vencer o mal estar.
Nossos professores também foram enganados. Será desculpável? O que mudou no ensino?
Há gente que está e esteve no governo, com e sem diploma, e que nem passaram pelas prédicas dos professores. Estavam entretidos com guerrilhas, com dar lucros a empresas, e não têm problemas de consciência. Outros até passaram bons tempos na escola, mas aprenderam rapidamente a “nobre” arte de embrutecer a consciência.
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Dag Vulpi