terça-feira, 11 de setembro de 2012

Relator condena nove por lavagem de dinheiro; só Ayanna, absolvida da acusação de gestão fraudulenta, escapou

Por Gabriel Castro e Laryssa Borges, na VEJA.com

O ministro relator do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, votou nesta segunda-feira pela condenação de nove réus do processo pelo crime de lavagem de dinheiro. Ao analisar o item 5 da denúncia (o terceiro na ordem estabelecida pelo relator), Barbosa considerou culpados todos os acusados deste trecho do processo.
Nesta etapa, o STF analisa a acusação de lavagem de dinheiro contra réus ligados aos núcleos publicitário e financeiro do esquema: Marcos Valério, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Simone Vasconcellos, Geiza Dias, Rogério Tolentino, Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório.
A única ressalva feita por Joaquim diz respeito a Ayanna Tenório, ex-vice-presidente do Banco Rural. O relator afirmou que ela também participou dos crimes de lavagem de dinheiro. Mas, como a ré foi absolvida pelo STF da acusação de gestão fraudulenta, não ficou provado o chamado crime antecedente para caracterizar a prática da lavagem de dinheiro. Joaquim pediu a absolvição de Ayanna por essa razão, mas afirmou manter a convicção de que ela é culpada – tanto de um crime quanto de outro.
Banco RuralOs quatro réus ligados ao Banco Rural são acusados de lavagem de dinheiro porque, segundo o Ministério Público, atuaram na a concessão de empréstimos fraudulentos ao PT e a empresas de Marcos Valério, além de terem dissimulado pagamentos a representantes de partidos políticos. Para realizar as operações, os acusados desrespeitaram normas do Banco Central e adulteraram o modelo de gerenciamento de riscos da instituição bancária. Em troca, a cúpula do Banco Rural esperava favores políticos – em especial, o acesso à liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco.
Uma menção em especial chamou a atenção no voto do relator: o ministro citou duas reuniões entre Kátia Rabello e o então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, como uma prova do conluio entre Marcos Valério e a executiva do Banco Rural. ”Parece bastante revelador o fato de Kátia Rabello ter participado de duas reuniões com o ex ministro da Casa Civil, uma no próprio Palácio do Planalto e outra num jantar no hotel Ouro Minas, em Belo Horizonte. Era Marcos Valério quem agendava essas reuniões, agindo como intermediário entre José Dirceu e o Banco Rural”, disse o ministro. 
“É imprescindível atentar para o contexto em que tais reuniões se deram. Não se trata de um fato isolado, de meras reuniões entre dirigentes de um banco e o então ministro-chefe da Casa Civil, mas de encontros ocorridos no mesmo contexto em que se verificaram as operações de lavagem de dinheiro levadas a efeito pelo grupo crimininoso apontado na denúncia”, afirmou, ainda, Barbosa. Dirceu não é réu neste capítulo da denúncia. Mas a citação é um pequeno sinal de que o relator vê irregularidades na atuação do petista.
A cúpula do banco também é acusada de ocultar os registros financeiros da entidade para acobertar movimentações financeiras irregulares. “O Banco Rural, a época dos exames periciais, ao não entregar as informações requeridas pelo STF, tentava dissimular a real situação de sua contabilidade, pois não possuía os livros diários de 2004 devidamente registrados – sendo que só foram providenciados em 2006, já no bojo das investigações”, disse o ministro relator.
Já na fase de distribuição de recursos aos beneficiários do mensalão, o Banco Rural cometeu, segundo Joaquim, outra sequência de crimes. Por ao menos 46 vezes, a instituição bancária entregou recursos em espécie a políticos e seus representantes. Nos registros constantes do banco, entretanto, a empresa SMP&B aparecia como destinatária do dinheiro – tudo para acobertar os repasses ilegais.
O ministro afirmou que são fartas as provas de que houve sucessivas fraudes nas transações envolvendo empresas de Marcos Valério e o Banco Rural. Para o ministro, o esquema do mensalão se valeu de diversas etapas de lavagem de recursos ilícitos, seja utilizando empréstimos falsos tomados junto ao Banco Rural e ao BMG, seja na manipulação de notas fiscais e registros contábeis das empresas do publicitário Marcos Valério.
“Todas essas fraudes contábeis constituíram uma importante etapa para que os membros do núcleo publicitário conseguissem repassar, através do Banco Rural, valores milionários com a dissimulação da natureza, origem, localização e destinação dessas quantias, bem como ocultação dos verdadeiros beneficiários”, disse ele, ao analisar o repasse de 32 milhões de reais feito pela instituição bancária ao esquema.
Notas falsasDe acordo com o relator, as duas empresas de Marcos Valério adulteraram balanços e emitiram 80.000 notas fiscais falsas. Somente a SMP&B utilizou ao menos 2.497 desses documentos forjados, segundo o relator. As notas falsas serviam para esconder repasses irregulares. Boa parte deles alimentou o esquema do mensalão.
Ao relatar o caso da agência de publicidade SMP&B, por exemplo, Barbosa se remeteu também a laudos para afirmar que “a contabilidade da SMP&B entre 2001 e 2004 foi alterada de maneira substancial”, com notas fiscais fraudulentas e “erros voluntários caracterizados como fraude contábil”.
TolentinoJoaquim Barbosa também afirmou ser irregular o empréstimo de 10 milhões de reais concedido pelo banco BMG ao advogado Rogério Tolentino. Parte dos recursos foi utilizada no esquema do mensalão após o advogado repassar, a pedido de Valério, cheques em branco à funcionária Simone Vasconcelos, subordinada do publicitário mineiro. O relator afirmou que não há dúvidas de que o repasse fraudulento tinha como objetivo esconder a transferência de recursos para o valerioduto. 
Após o voto do relator, quem usará a palavra na próxima sessão do STF é o ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo. O julgamento prosseguirá na quarta-feira, às 14h.

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