Às
vésperas do início de mais um capítulo no julgamento do caso conhecido como ‘mensalão’,
duas denúncias vêm à tona e comprometem tanto a credibilidade da Ação Penal
(AP) 470 quanto da revista semanal de ultradireita Veja, uma das
principais expressões da mídia conservadora no país. Na principal delas,
veiculada na página Megacidadania na internet, editada por Alexandre César
Costa Teixeira, que integra os quadros do Ministério Público do Estado do Rio
de Janeiro, os pilares da acusação de que teria havido a compra de votos de
parlamentares com dinheiro público são abalados com a divulgação de “uma carta mentirosa”.
Costa
Teixeira alinhava documentos que envolvem o ex-vice-presidente de Varejo do
Banco do Brasil, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, titular da
diretoria que controla os cartões de crédito Ourocard, a BB-Cartões. Antonio
Luiz Rios da Silva, “antes de sua saída
do BB”, nomeou como diretor de Verejo Fernando Barbosa de Oliveira, que foi
um dos três funcionários do Banco que a Comissão Parlamentar Mista de
Investigação (CPMI) dos Correios recomendou que fossem indiciados pela
Procuradoria Geral da República.
“Mas Antonio Fernando Barros e Silva de Souza
(então procurador-geral) resolveu ‘poupá-los’, exatamente os nomeados na era
FHC, indiciando somente o petista”, afirma.
Nesta
carta assinada por Rios da Silva, na qual presta informações tanto à Polícia
Federal quanto aos parlamentares, o teor difere dos contratos que deveriam
abalizar a denúncia:
“E esta carta mentirosa do ‘tucano’ ditou,
influenciou e/ou moldou todos os pareceres, perícias e fundamentalmente a
própria ‘denúncia’ da PGR/MPF, bem como a argumentação do relator Joaquim
Barbosa que por sua vez ‘convenceu’ o plenário do STF. Ninguém, repetimos,
absolutamente ninguém, nem o PGR/MPF e nem o relator, se deram ao trabalho de
observar a regra básica de uma relação de mercado, o respeito ao contrato”.
Segundo
a denúncia de Costa Teixeira, “existia um
contrato que normatizava a relação da Visanet com seus sócios, os diversos
bancos, sendo o maior acionista da Visanet o Bradesco”. Antônio Fernando
Barros não foi imediatamente encontrado pela reportagem do Correio do
Brasil, para se pronunciar sobre a recente denúncia em que está envolvido.
Para
o jornalista Miguel Baia Bargas, editor do Blog Limpinho & Cheiroso –
que concentra uma das maiores audiências do país – a denúncia cita outro
episódio na história do país:
Bargas
lembra que, neste domingo, “faz 59 anos
que Carlos Lacerda, baseado numa carta forjada, acusava João Goulart de querer
instalar no Brasil uma república sindicalista. A carta que teria sido escrita
pelo deputado argentino, Antonio Brandi, falava de supostos entendimentos
feitos com o presidente, Juan Perón, envolvendo a implantação de uma república
sindicalista e contrabando de armas da argentina para o Brasil. Com a repercussão
da noticia na grande mídia, deputados da oposição pediram a abertura de uma CPI
para apurar o caso. Só muitos meses depois ficou comprovado que o documento era
falso”.
“Mas ai o estrago já estava feito. Este tipo
de pratica política de produzir denúncias com provas falsas ou declaratórias
voltou a ser utilizada a cada nova eleição. Isso tem provocando o descrédito na
política e na democracia brasileira, abrindo espaço para políticos aventureiros
totalmente descolados dos partidos e de compromissos políticos. Como afirma
Pierre Norra, os empresários da comunicação no Brasil sabem que multiplicar o
novo, fabricar o acontecimento, degradar a informação, são seguramente os meios
de defender seus interesses”, acrescentou.
Relações complicadas
Dilma
estaria arrependida de marcar o encontro com o dono da Veja
A
outra denúncia que circulou neste domingo é ainda mais cáustica para o tecido
político nacional e enterra os últimos traços de credibilidade do principal
título de propriedade da Editora Abril S/A. A capa da última edição de Veja,
que circulou nas bancas, neste fim de semana, traz o título: Os segredos
de Valério. A reportagem contém uma declaração atribuída ao empresário Marcos
Valério, imediatamente desmentida pelo advogado do réu na AP 470, sobre o
envolvimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no episódio do ‘mensalão’:
“Desde 2005 Marcos Valério não dá entrevista
e não deu nenhuma entrevista para a revista Veja. Ele nega o teor das
declarações atribuídas a ele”, afirmou o advogado Marcos Leonardo. Sem uma
só entrevista gravada ou a citação de qualquer nome, a não ser o da personagem
que desmente todas as informações da revista, Veja se baseia em “revelações de parentes, amigos e associados”
para colocar sob a responsabilidade do empresário a afirmação de que “Lula era o chefe”. A frase, diz o texto
assinado pelo jornalista Rodrigo Rangel, teria sido repetida por Valério “com mais frequência e amargura agora que já
foi condenado pelo (Supremo Tribunal Federal) STF”.
Capa da última edição de Veja, sobre
o 'mensalão'
A
reportagem, conforme anuncia a revista, “tem
cinco capítulos”. O primeiro deles, publicado nesta semana, já foi
suficiente para que o Planalto mudasse o tom com a revista, frequentada pela
presidenta Dilma Rousseff, que concedeu uma entrevista exclusiva para a
publicação que integra o “Grupo dos 10″ veículos de
comunicação que mais recebem recursos públicos do Palácio do Planalto.
“O constrangimento foi geral, a ponto de o
presidente do Grupo Abril, Roberto Civita, no melhor estilo dos jogadores
de futebol que reprovam o técnico ao serem preteridos, sair do salão de eventos
do hotel Unique, em São Paulo, na sexta-feira 15, meneando a cabeça. Pela
manhã, por volta das 10h00, sob a elegante justificativa de não ter um membro
de sua família para acompanhá-la, a presidente Dilma Rousseff cancelou
compromisso pré-agendado com Civita para o almoço. Pouco mais tarde, durante o
evento Maiores e Melhores, da revista Exame do mesmo Civita, o
ministro da Fazenda, Guido Mantega, levatou-se sem prévio aviso da mesa de
debates da qual participava, ao lado do prêmio Nobel de Economia Paul Krugman
e, outra vez, do próprio Civita, para se retirar em definitivo do recinto,
diante de dezenas de empresários”, pontuou a página de notícias na internet 247,
neste domingo.
“Os dois gestos foram imediatamente
compreendidos como um protesto do governo pela matéria de capa da revista Veja Os
Segredos de Valério, que iria circular no dia seguinte”, afirma o site. “A informação do conteúdo em tudo agressivo
contra o ex-presidente Lula e o PT circulou para o governo, que, com a batida
em retirada, deu o tom de como serão, doravante, as relações institucionais com
o Grupo Abril de Civita”, presumiu.
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