sábado, 5 de novembro de 2016

O falacioso discurso da austeridade


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• A austeridade é uma política deliberada de ajuste da economia por meio de redução de salários e gastos públicos supostamente com o objetivo de reduzir a dívida e aumentar lucros e a competitividade das empresas.

• A recomendação de que o Estado deve cortar gastos em momentos de crise parte de uma falácia de composição que desconsidera que se todos os agentes cortarem gastos ao mesmo tempo, inclusive o Estado, não há caminho possível para o crescimento. A solução mais razoável para tratar de um desajuste fiscal em meio a uma recessão é, portanto, estimular o crescimento, não cortar gasto.

• No círculo vicioso da austeridade, cortes do gasto público induzem a redução do crescimento que provoca novas quedas da arrecadação que, por sua vez, exige novos cortes de gasto. Esse círculo vicioso só pode ser interrompido por decisões deliberadas do governo, a menos que haja ampliação das exportações líquidas em nível suficiente para compensar a retração da demanda interna, pública e privada. Esta exceção é pouco provável diante de uma crise internacional como a que o mundo enfrenta nesta década, com lenta recuperação da demanda e maior competição pelos mercados.

• A obsessão alarmista contra qualquer elevação da dívida pública esconde uma agenda política permeada por interesses de grupos econômicos, mas travestida como uma questão meramente técnica, seja ao defender a retração de bancos públicos, seja ao demandar a redução dos gastos sociais.

• No fundo, a austeridade é principalmente um problema político de distribuição de renda e não um problema de contabilidade fiscal. Os efeitos da austeridade afetam de forma distinta os diferentes agentes econômicos e classes sociais de forma que os mais vulneráveis, que fazem mais uso dos serviços sociais, são mais afetados.

• Apesar das inúmeras evidências contrárias à sua eficácia, a austeridade persiste como ideologia e sempre retorna ao debate político por ser oportuna para os grupos dominantes de poder.

A insensatez do superávit primário

• O regime fiscal brasileiro é extremamente pró-cíclico, ou seja, acentua as fases de crescimento e de recessão. Assim, em contextos de baixo crescimento, a busca pelo cumprimento da meta fiscal por meio de uma política fiscal contracionista retira estímulos à demanda agregada e reduz ainda mais o crescimento econômico e a própria arrecadação.

• Um segundo fator a se sublinhar sobre o regime fiscal brasileiro é sua natureza “anti-investimento”, porque, diante de uma estrutura de gastos públicos rígida, os cortes de despesa recaem primordialmente sobre o investimento público, um dos poucos gastos passíveis de contingenciamento. O mesmo regime impõe uma lógica curto-prazista à gestão da política fiscal e subordina o planejamento governamental.

• Na ditadura do superávit primário, os fins são atropelados pelos meios, e tudo se submete à necessidade de cumprir a meta de curto prazo, inclusive o próprio crescimento, o emprego e o bem estar da população. Portanto, um novo modelo de gestão fiscal precisa ser constituído, de caráter anticíclico, que viabilize o planejamento e que priorize o investimento público.


• Há diversas variantes institucionais para um regime fiscal, dentre essas estão as que estipulam metas fiscais ajustadas ao ciclo econômico, como a meta de “resultado fiscal estrutural”. Ou alternativamente, pode-se adotar bandas fiscais de forma análoga ao que ocorre no regime de metas de inflação. Ainda há a opção, aplicada em alguns países, de retirar todo investimento público do cálculo do superávit primário (assim como o gasto com juros é excluído desse indicador) e assim incentivar o uso do investimento público como vetor de desenvolvimento e abrir espaço para atuação anticíclica do gasto público.

Via http://brasildebate.com.br/

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Dag Vulpi

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