sexta-feira, 12 de agosto de 2011

PT diz que desconfiava de espionagem política

Espionagem revela necessidade de abrir os documentos secretos do regime militar, diz secretário de Comunicação do partido
A revelação de que a Polícia Civil de São Paulo fez espionagem política até 1999, quase 15 anos depois do fim da ditadura militar, reforça a necessidade de abrir os documentos secretos do regime militar. A opinião é do secretário de Comunicação do PT e deputado federal, André Vargas (PT-PR).
“Era uma suspeita nossa. Achávamos que isso era possível mas não tínhamos comprovação. É possível que tenha ocorrido também em outros Estados além de São Paulo mas só poderemos constatar se abrirmos os documentos da ditadura”, disse Vargas.
Criado em 1983, no governo Franco Montoro, o DCS infiltrou agentes e bisbilhotou todo o processo de redemocratização, movimentos sociais, sindicatos e partidos políticos. O PT foi espionado durante todo o primeiro mandado do tucano Mário Covas, até 1999.
Os documentos mostram também que as Forças Armadas mantiveram uma rede de espionagem pelo menos até 1991, no governo Fernando Collor de Mello, hoje um dos maiores defensores da manutenção do sigilo.
“A reportagem mostra que o PT seguiu sob um olhar de desconfiança dos poderes estabelecidos mesmo depois da democratização”, disse Vargas.
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O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, um dos nomes mais citados nas 50 mil páginas de arquivos secretos disponibilizados pelo Arquivo Público do Estado, disse que as reportagens mostram o despreparo dos arapongas brasileiros.
“Sabia desde o final da década de 90 que havia uma espécie de continuação do Dops na polícia de São Paulo. Isso é lamentável porque em 1999 já tínhamos a Constituição que proíbe este tipo de atividade. Espero que não se repita”, disse Dirceu. “O Brasil, na verdade, não tem um serviço de inteligência. Estes serviços precisam se qualificar melhor”, completou.
Segundo ele, a presença de arapongas nos comícios pelas Diretas Já era uma certeza entre os participantes. “Enfrentamos muita resistência. No Rio de Janeiro o governador mandou desligar a energia e cancelou os transportes na hora do comício”, recordou Dirceu, que participou como representante do PT de quase todas reuniões de organização.
O ex-ministro recordou um episódio pitoresco de arapongagem no comício pelas Diretas Já no Rio de Janeiro. “Um homem subiu no palanque dizendo que era representante do Raúl Alfonsin (ex-presidente da Argentina). Fomos checar e descobrimos que não era argentino coisa nenhuma. Era um agente do SNI (o extinto Serviço Nacional de Informação).”
Ricardo Galhardo
By: iG

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Câmara: Pedro Novais é convidado a dar esclarecimentos

Integrantes da Comissão de Defesa do Consumidor e da de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara aprovaram na manhã de hoje (10) convite para que o Ministro do Turismo, Pedro Novais, preste esclarecimentos sobre suspeitas de fraudes na pasta.
O convite aprovado na Comissão de Consumidor é de autoria do deputado Reguffe (PDT-DF). Na Comissão de Fiscalização, o autor foi o deputado Fernando Francischini (PSDB-PR).
Na tarde de hoje um terceiro convite deve ser apresentado na Comissão de Turismo. A idéia inicial é que a audiência seja feita, na próxima semana, em conjunto com os integrantes das três comissões.
O pedido de esclarecimentos aos deputados ocorre um dias depois de operação da Polícia Federal (PF) prender 35 pessoas ligadas ao Ministério do Turismo.
As investigações indicam que há indícios de desvios de recursos públicos em convênios realizados em 2009.
Na época, o ministério era comandado por Luiz Barreto (PT). Ele foi secretário executivo de Marta Suplicy, quando ela dirigiu a pasta, entre 2007 e 2008.
Barreto atualmente é presidente do Sebrae.
Entres os presos na operação da PF está o secretário executivo do ministério, Frederico da Costa Silva. Ele é indicação do líder Henrique Eduardo Alves.
Também foi preso o secretário de Programas de Desenvolvimento do Turismo, ex-deputado Colbert Martins.
E o ex-secretário executivo da pasta Mário Moysés, que até junho deste ano comandou a Embratur. Moysés também é ligado à Marta Suplicy.
O episódio pode servir de munição para setores do PT que são contrários à candidatura de Marta à prefeitura de São Paulo em 2012.

Por: Blog do Noblat

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Nomeação de Amorim desafia direita


Não foi à toa que a mídia tucana deu tão ampla repercussão às asneiras do maior idiota imodesto deste país, Nelson Jobim, na esperança de que sua incontinência verbal fizesse Dilma demiti-lo. A queda de mais um ministro em míseros sete meses e tanto e a possibilidade de o demitido sair atirando eram troféus que faziam a direita midiática salivar.
Além disso, sempre se poderia transformar a queda de Jobim em derrota de Lula, que teria “imposto” o ex-auxiliar à sucessora. E noticiar sucessivas derrotas do ex-presidente e colocá-lo em campo contrário ao de Dilma vem sendo a cereja do bolo para os conservadores.
Dilma seguiu à risca o script dos últimos meses. Negou que demitiria Jobim pelas declarações desrespeitosas e, depois, terminou por demiti-lo intempestivamente. Enquanto escrevo, no início da madrugada de sexta-feira, já está sendo armado o palco para extrair alguns disparos do agora ex-ministro da Defesa contra o governo a que serviu.
A saída de Jobim bem que poderia ter sido mais uma derrota como as que este governo vem colhendo desde que aceitou demitir Palocci sob pressão cinco meses após ter tomado posse. Todavia, com boa dose da coragem que tem faltado a este governo Dilma nomeou um verdadeiro pesadelo para a direita midiática.
A nomeação de Celso Amorim, o ex-ministro de Lula que produziu acidez estomacal nos conservadores durante os oito anos do governo anterior, afronta Globos, Folhas, Vejas Estadões e, sobretudo, os partidos de oposição e vários chefes militares que estão em pé-de-guerra desde 2003.
Apesar de Amorim ter sido considerado o melhor chanceler do mundo pela revista norte-americana Foreign Policy em 2009, poucas horas após o anúncio de sua nomeação os portais de internet da mídia tucana referiam-se a ele como “polêmico” e até “fracassado” em sua passagem pelo Ministério das Relações Exteriores.
A indicação de Amorim, aliás, equivale a devolver Waldir Pires à pasta da Defesa. Em 31 de março de 2006, Pires assume o Ministério da Defesa a pedido de Lula. Assumiu no dia em que a Caserna comemora o golpe de 1964. O ex-presidente colocou como chefe das Forças Armadas um homem que foi perseguido por elas décadas antes.
A vingança da direita midiática não tardaria. Pouco mais de um ano depois, em julho de 2007, a crise do “caos aéreo” culminaria com a demissão de Pires. Nelson Jobim, ex-ministro do STF, assumiu a pasta no lugar dele inclusive dando declarações desrespeitosas que insinuavam incompetência do antecessor.
Com a nomeação de Jobim, amigo dos tucanos, dos chefes militares golpistas e da mídia desde sempre a crise aérea sumiu do noticiário, deixando ver que os algozes de Pires ficaram satisfeitos com a nomeação de um representante da direita no sensibilíssimo Ministério da Defesa.
Amorim, um progressista em uma pasta que, nos últimos quatro anos, foi comandada por um reacionário de quatro costados como Jobim – tucano de alma, íntimo dos barões da mídia, quase um fetiche dos militares remanescentes do golpe de 1964. Resta saber como impedir que tenha o destino de Pires, porque a artilharia não tardará a começar.

Por: Blog da Cidadania

sábado, 6 de agosto de 2011

Nada de reforma política

NEY LOPES
nlopes@brasiliaemdia.com.br

Recomeçaram os trabalhos do Congresso Nacional em ano pré-eleitoral. Voltarão ao debate parlamentar a regulamentação da Emenda 29, que garante mais recursos para a Saúde (PLP 306/08); o piso salarial nacional para os policiais e bombeiros dos estados (PECs 300/08 e 446/09), além dos projetos sobre as regras do Supersimples (PLP 591/10); o Vale Cultura (PL 5798/09); o aperfeiçoamento do Conselho Administrativo de Defesa Econômica e o Plano Nacional de Educação (PL 8035/10) e a Emenda à Constituição prevendo a perda de terras por parte de produtores que usarem mão de obra similar à escravidão, proposição já votada duas vezes no Senado e em primeiro turno na Câmara, aguardando uma última votação para se transformar em norma constitucional.
A grande indagação é sobre o destino da inadiável reforma política. Poderá ser aprovada até 7 de outubro, a data limite estabelecida no princípio constitucional da anualidade? A resposta, infelizmente, é não.
Mais uma vez, nada de reforma política. Prevalece a omissão do Congresso Nacional. Certamente entrarão em pauta algumas propostas, tipo “curativo de emergência”, apelidadas de “reforma política”. Deus queira que essa previsão esteja errada.
O leitor deve querer saber quais mudanças eleitorais poderão, ainda, ocorrer este ano. Nas gavetas da Comissão de Reforma Política encontram-se algumas propostas indefinidas e típicas de “perfumaria”. Uma delas, se refere a “suplência de senador”, que reduz de dois para um o número de suplentes de senador e veda a eleição de suplente que seja cônjuge, parente consangüíneo ou afim, até o segundo grau ou por adoção do titular (PEC 37/2011). Por que não transformar a eleição de senador realmente em majoritária, com o suplente sendo o segundo mais votado diretamente? Daria mais legitimidade ao representante de um Estado federado. Talvez, não ocorra assim para preservar a “barganha” de quem pague a conta da eleição, mesmo sendo incapaz e às vezes indigno de um mandato eletivo.
Outras propostas que poderão ir a plenário até o dia sete de outubro são as seguintes: a que veda a transferência de domicílio eleitoral de prefeitos e vice-prefeitos, durante o exercício do mandato (LC 265/11). Previsão da perda de mandato por desfiliação partidária em casos nos quais não se configure incorporação ou fusão de legenda, desvio de programa partidário e grave discriminação pessoal. Emenda da Comissão de Justiça retirou a criação de partido como causa justa para mudança de legenda (PL 266/11).
Exigência de referendo popular para lei ou emenda constitucional, em matéria eleitoral, entrar em vigor (PEC 42/11). Coligações apenas nas eleições majoritárias (presidente da República, governador e prefeitos) (PEC 40/11). Novas datas para posse de presidente da República, governador e prefeito. Estabelece mandato de cinco anos para esses cargos. Emendas aprovadas na CCJ mantêm quatro anos de mandato e autorizam coincidência dos pleitos municipais, estaduais, distrital e federal (PEC 38/11).
A instituição do sistema eleitoral proporcional de listas preordenadas nas eleições para a Câmara. Substitutivo do relator, Romero Jucá, prevê sistema majoritário “distritão” (rejeitado na Comissão de Justiça, porém haverá recurso para o plenário) (PEC 43/11). Eliminação da exigência de filiação partidária para candidatos em eleições municipais. (PEC 41/11) Rejeitada na Comissão de Justiça e arquivada.
Inclusão entre os critérios em vigor para funcionamento partidário na Câmara, de pelo menos três deputados eleitos em diferentes estados. (PL 267/11). “Financiamento público de campanha”, que destina recursos ao Tribunal Superior Eleitoral em valor correspondente a R$ 7,00 por eleitor inscrito, a serem aplicados exclusivamente por partidos e respectivos candidatos nas campanhas eleitorais.
Nas eleições de 2012 continuarão sendo usados os mesmos métodos de corrupção desenfreada do passado recente. A Justiça Eleitoral tentará “tapar buracos”, com as limitações de não ter competência para legislar, mas somente aplicar e interpretar a lei.
Lamentável que o Senado e a Câmara tenham desperdiçado a oportunidade para a implantação de mudanças profundas nas regras eleitorais. Agora é entregar a Deus para ver como é que fica. Pobre democracia brasileira, onde predominam os poderes econômico, político e a propriedade privada dos partidos!

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Apontamentos sobre a Espanha rebelde

De dentro das praças e acampamentos, o filósofo e militante italiano Toni Negri discute formas de organização, reivindicações e perspectivas do movimento na Espanha. Por Antonio Negri
Negri: "A linguagem do movimento é simples e popular,
mas não populista”. Foto de Michael Allen 000

Na última semana, estive na Espanha a trabalho. Estive naturalmente envolvido com os “indignados”: atravessei algumas praças e acampamentos, questionei e discuti com muitos companheiros. Quem são os “indignados”? Não pretendo responder – há dezenas de narrativas facilmente encontráveis sobre isso. Relato aqui somente alguns apontamentos.
Democracia Real Já nasceu dois meses antes do 15 de Maio. É uma associação de militantes digitais, menos radicais, porém mais eficazes que o grupo Anonymous. Já havia movimentos desde Janeiro de 2011 contra a Lei Sinde, que pune a pirataria na Internet; e articularam um discurso e uma luta contra a assinatura daquele acordo entre PP e PSOE (direita e esquerda), que viabilizara essa lei, promovida inclusive pelo vice-presidente americano. Em consequência, a associação incita à recusa do voto: “no les votes!”, e desenvolve um discurso sobre o sistema representativo espanhol, contra o bipartidarismo, com a exigência de uma nova lei eleitoral proporcional, dirigida a favorecer o pluralismo e a equidade.
Um segundo grupo interessante é o V de Vivienda. É um movimento de luta pela moradia, começado em 2005 (“por uma moradia digna”) e desenvolvido em rede, como reacção ao estouro da bolha imobiliária. Em rede, convocam manifestações, produzem verdadeiros “enxames”, com grandes mobilizações iniciais que, contudo, encontraram dificuldade em obter um impacto político mais duradouro.
Um terceiro movimento é o dos “hipotecados”. Surge em Barcelona e constitui uma plataforma de ajuda recíproca das famílias e indivíduos que, por causa de hipoteca ou débito bancário ou insolvência privada, terminaram despejados. Valoriza muito a aparição mediática – inclusive nos meios tradicionais. Esta competência foi muito importante para as lutas e a construção do 15-M.
Um quarto grupo formou-se nas várias assembleias e colectivos urbanos. Esses não possuem militantes orgânicos. Trata-se essencialmente de uma esquerda intelectual, que protesta e coopera em rede, assumindo posições radicalíssimas contra a precariedade e a incerteza do trabalho, além de contestar os baixos salários. São grupos do trabalho imaterial crescidos na crise, “dentro e contra”.
Além desses, em certo momento, principalmente em Abril deste ano, apresentou-se na cena também uma rede da “esquerda autónoma” sindical, – geralmente ligada à Izquierda Unida: Juventud Sin Futuro. O nome diz tudo. Esta organização começa uma ampla agitação, com a importante capacidade de repercutir nos grandes jornais, e tenta convocar uma manifestação em 7 de Abril. É um prólogo importante, haja vista que, entre 7 de Abril e 15 de Maio, o anúncio da “grande manifestação” dissemina-se de modo viral pelas redes.
Quem é a gente que se reuniu no 15 de Maio nas praças da Espanha? Existem dois componentes de peso. O primeiro é essencialmente a classe média empobrecida, desempregados, pequenos empresários em crise, profissionais que não conseguiram sucesso, ou foram rejeitados pelas empresas, trabalhadores autónomos recentemente golpeados pela crise, ou assediados pelo fisco, — a quem se juntam os cidadãos sem casa própria e sem condições de adquiri-la, os que vivem como inquilinos. Um segundo componente, fortemente maioritário nos acampamentos, é o “cognitariado” metropolitano: trabalhadores digitais e cognitivos, precários do sector dos serviços e de todos os géneros de actividade imaterial, estudantes e jovens sem futuro. Alguns poucos imigrantes também apareceram nas manifestações e assembleias para se expressar. No movimento, muitas mulheres se destacaram nas discussões e lideraram a organização dos acampamentos. Esses sujeitos constituem um movimento que não é identitário, que não é simplesmente movimento de solidariedade. Todos falam em primeira pessoa. É um movimento contra a crise e a pobreza, de toda a classe média (num sentido amplo).
Indignados. Foram os meios de comunicação que impuseram este nome, importado do célebre opúsculo de Stéphane Hessel. Nisso, o movimento reconheceu rapidamente uma tentativa de reduzi-lo a mero protesto moral, de relegá-lo a um terreno não-político (com a ameaça implícita que, se começasse a actuar politicamente, haveria repressão). O movimento reagiu imediatamente: pacífico, praticando a “recusa à violência”, teorizada e proclamada como “recusa do medo”. Este é um dado constante e importantíssimo na formação e na firmeza do movimento. Exprime a consciência que, quando há medo, se é levado naturalmente a responder violentamente à violência; que o governo tenta amedrontar (um gesto hobbesiano) para incitar uma resposta do movimento, tão violenta quanto vazia e, como resultado, legitimar a repressão. A resistência não-violenta do movimento permitiu uma aceleração extraordinária, uma enorme expansão (metrópoles, cidades, vilas), a sua aparição como “evento” irrefreável.
A linguagem do movimento é simples e popular, mas não populista. Foi sugerido na Democracia Real Já: “não somos uma mercadoria nas mãos dos banqueiros e políticos”. A linguagem foi trabalhada nas redes e pela incrível quantidade de comunicações, agenciamentos, sites e fóruns no Facebook, twitter etc. Que, numa democracia real o poder seja acção que exercitamos sobre a acção do outro — e assim fica implícita a dissolução de toda autonomia do político — constitui a chave da linguagem do movimento. A isso se junta a crítica da constituição democrática, aos três poderes tradicionais (legislativo, executivo, judiciário), porque não correspondem mais às funções originais. A dimensão pública do Estado, quando não é atravessada pela participação dos cidadãos, não pode mais ser considerada legítima. Nas formas actuais, o público não passa de uma superestrutura do privado. Exige-se, portanto, um novo poder constituinte, visando à construção do comum. Pode-se dizer, mais claramente, que o movimento dos indignados é um movimento radicalmente constituinte?
Nele, propõe-se um novo modelo de representação. De um lado, as redes; de outro, as assembleias. Partindo das assembleias nas praças centrais das cidades, chega-se “em rede” às assembleias locais, nos bairros das metrópoles e, finalmente, às pequenas cidades e vilas. O retorno, por sua vez, é directo e veloz. A organização da base — pela base — pelas assembleias constitui assim o percurso e a estrutura da “democracia real”, além da representação. A rede oferece uma temporalidade imediata. Já na organização/difusão espacial (quando os tempos são mais longos), as assembleias institucionalizam o movimento.
O 15-M parece nascer do nada. Não é verdade: além do papel dos grupos, além da casualidade (latente e perversa) da crise, notam-se no movimento acumulações, sedimentações, recomposições ao longo do tempo.
Para começar, há analogia com o que ocorreu em Março de 2004, quando o “movimento contra a guerra”, insurgido contra Aznar nos dias anteriores às eleições, protestou ante a atribuição dos atentados terroristas na estação central de Madrid aos bascos e à ETA. Também nesse caso se tratou da produção de um enorme enxame, à época convocado através dos telemóveis, que transformou radicalmente o clima eleitoral e pavimentou o acesso de Zapatero e dos socialistas ao governo: a dita “comuna de Madrid”.
Diferentemente, hoje, não existe aquela enorme tensão, aquele grande medo, aquela violência que então se disseminava pelos movimentos. Hoje há uma percepção maior da própria força, logo maior maturidade. Naquele momento, uma vez eleito, Zapatero tenta responder às dinâmicas do movimento, mas propõe ainda outra vez uma opção de representação política — que rapidamente se revelou uma mistificação, e insultante na medida em que foi encarada como traição. Agora não existe mais nenhuma hipótese reformista, existe no lugar disso a consciência da impossibilidade de modificar o sistema. Existe a percepção (sobretudo depois do resultado eleitoral desastroso para os socialistas, que tem a ver com o grande impacto da abstenção — cerca de 50%) que o movimento pode realmente fazer e desfazer os governos, mas hoje a isso se acrescenta um imaginário modificado, visto que nenhuma hegemonia partidária poderá mais corresponder ao movimento. “Ninguém nos representa”. O sistema constitucional está em crise.
A continuidade pode ser também registada a respeito das formas de organização. Na configuração material dos acampamentos, resgataram-se particularmente as formas de luta dos operários da Sintel [NT. cujos trabalhadores fizeram greve por 11 meses seguidos, em 2001-02], que por meses e meses acamparam no centro de Madrid, depois do encerramento da empresa. A tradição do “acampar” foi recepcionada pela luta operária. Isto mostra como a intersecção dos movimentos representa hoje uma passagem essencial na produção das lutas multitudinárias. Mesmo quando os organismos oficiais do movimento operário (sindical e partidário) se excluem da manifestação, a tradição das lutas operárias inclui-se no processo e o desenvolve.
A partir dessa nota, vale a pena recordar outro elemento fundamental no 15-M — é o “Republicanismo” implícito, a recordação melancólica, mas radical, de 1936. Toda a história da Espanha na modernidade é aqui colocada em jogo, contra uma governamentalidade capitalista e clerical, reaccionária e repressiva, liberal e reformista, que não encontra par noutros países da Europa.
Tudo isso ajuda a compreender a dinâmica de organização deste movimento. Irrompe de um amadurecimento capilar, numa dimensão microssocial, completamente voluntarista. Há um máximo de cooperação, que não se produz simplesmente por indivíduos ou colectivos, mas se organiza “todos juntos”, na sinergia. Igualmente a elaboração teórica é colectiva. Nas assembleias todos têm direito à palavra. O nível da discussão é por vezes descontínuo, mas sempre rico de intervenções competentes, no mérito e na eficácia da proposta. Parece incrível, mas, de verdade, ocorreram formidáveis e inovadoras experiências, seja sobre o terreno da cooperação organizacional, seja sobre a elaboração teórica — experiências nunca repetitivas, burocráticas ou inúteis. Há uma maturidade geral que desenvolveu novas habilidades — porém, especialmente, que evitou contraposições dogmáticas e/ou sectárias. Aqueles que já estavam organizados em grupos não foram excluídos, mas implicados no “todos juntos”. Não houve necessidade de um “savoir faire” político particular, mas somente de competência e capacidade de participar de um projecto comum.
Os dois processos fundamentais de organização que se integraram foram a comunicação em rede (que permite a articulação de centralizações e descentralizações territoriais) e a intersecção de componentes sociais (que permite a recomposição programática do proletariado social).
Considerando a característica da recomposição (dos movimentos e dos programas), compreende-se também um espírito constituinte, que evita amálgamas politicamente contraditórios (por exemplo, entre grupos e organizações que disputam usualmente a hegemonia um contra o outro) e, por isso, não gera enfatuações sectárias ou abstractas, puramente dogmáticas. Os indignados falam entre si, nas assembleias ou na rede, de programas, de coisas por fazer, de metas conjuntas, de problemas concretos… O espírito constituinte predomina. “Todos juntos” — aqui se constrói o comum.
Uma organização de subsistência totalmente horizontal foi criada, com a cozinha e o serviço de policiamento da praça acampada, com uma centralização informática e informativa, com horários definidos em assembleia, com decisões, comissões jurídicas e médicas etc.
Quais são os mecanismos de decisão do movimento? Democracia directa, logo decisões tomadas de modo assembleiar, atreladas à curta duração nas funções de representação (porta-vozes). Sabe-se que tomar uma decisão nessas condições exige longo tempo, que o processo decisório muitas vezes deve elevar-se acima dos efeitos tumultuados de uma discussão caótica. Contudo, isto não impede de chegar, através da nomeação de porta-vozes (a cada dia substituídos), à tomada de decisão, e a sua comunicação pública — com legitimidade consensual. Seja a decisão, seja a discussão que se produziu, tudo é arquivado no site do movimento. Corre em paralelo ao processo uma verificação em rede das decisões tomadas. Põe-se assim em movimento uma estrutura policêntrica de decisão e, enquanto nas assembleias a decisão exige longo tempo, nas redes a verificação da decisão dá-se muito velozmente.
Este processo decisório constrói uma novidade radical em relação às melhores experiências de movimentos recentes (Seattle, Génova etc), quando as decisões colectivas dificilmente conseguiam associar expressão exacta dos comportamentos à urgência do evento, juntar a continuidade com a extensão da iniciativa… Para não falar de sua institucionalidade.
Como já dissemos, o movimento surgiu na soma de iniciativas de vários grupos, num período de experimentação de mobilizações ágeis, da repetição de acções em flash: e ao final deu-se, em concomitância com as manifestações gigantes, a decisão de acampar. O acampamento e a consolidação da modalidade assembleiar que o seguiu representam assim uma relativa ruptura/descontinuidade com o modelo de decisão em rede. Tanto mais que, nos acampamentos, a composição social se complica. Ao lado dos sujeitos citados acima, encontramos também fracções marginais do proletariado (cognitivo ou não): desocupados, migrantes, “loucos” e/ou “hippies”, e alguns pequeno-burgueses arruinados e desesperados… Tudo isso pode criar problemas que, por um lado não podem ser agilmente resolvidos, por outro também não vamos exagerá-los, de modo a não romper o processo global de organização e decisão. Outra prova do “bom senso” deste movimento.
Os temas programáticos discutidos nas assembleias e retomados na circulação em rede, sempre firmados em documentos, são fundamentalmente os seguintes:
Trabalho precário. Requerem-se trabalho e/ou rendimento para todos. A discussão não implica ideologias “laborais” (os sindicatos foram excluídos, a UGT e a CO, bem como outras forças políticas): dizer “trabalho para todos” significa dizer “rendimento para todos”. O tema do rendimento universal é bastante disseminado. E torna-se hegemónico quando os trabalhadores autónomos de 2ª Geração representam a maioria da assembleia. E adicionalmente: redução da jornada laboral, reforma aos 65 anos, segurança no trabalho, proibição de demissões, ajuda aos desempregados etc.
Direito à moradia. Expropriação do stock de moradias não vendidas e a sua transferência ao mercado de alugueis controlados. Plano para o cancelamento das hipotecas etc.
Tributação. A crítica é muito forte à desigualdade de tratamento dos trabalhadores, sejam independentes ou dependentes, da parte do fisco. Aumento da tributação sobre as grandes fortunas e os bancos. Relançamento do imposto patrimonial. Controle real e efectivo das fraudes fiscais e da fuga de capitais através dos ditos paraísos fiscais. Mas o tom da discussão é acima de tudo contra os bancos, contra a estrutura financeira etc. Proibição de injecção de capital nos bancos responsáveis pela crise. Controle social dos bancos. Sanções para o movimento especulativo e as más práticas bancárias. O conceito fundamental exprimido nas assembleias é que existe uma grande riqueza social, mas ela é expropriada pelo fisco e pelos bancos. As operações bancárias tais quais hoje estão repletas de usura em relação aos pobres, e de prepotência diante da sociedade. Requer-se a generalização da Lei Tobin inclusive nas transferências internas e internacionais entre os bancos.
Sistema eleitoral. A solicitação da mudança da lei eleitoral e das regras de representação é pesadíssima e assunto da mais alta urgência. Entende-se que o sistema bipolar espanhol seja intolerável, que as duas grandes forças parlamentares são igualmente corruptas e responsáveis pela crise. Solicita-se assim que o sistema eleitoral seja modificado no sentido do voto proporcional, e uma proposta de referendo sobre o tema (500 mil assinaturas) já foi lançada. Além disso, mais democracia participativa: não ao controle da Internet e revogação da Lei Sinde, generalização do método referendário etc.
Sistema judiciário. Considera-se completamente nas mãos dos políticos e banqueiros, incapaz de perseguir a corrupção e, sobretudo, inapto para corrigir o défice de representação ou promover um senso igualitário ao sistema normativo como um todo. Quando se fala em justiça, contrapõe-se à corrupção política um discurso de dignidade — e não aqui um moralismo pequeno-burguês, mas um sentimento forte de autonomia ética e política.
Serviços comuns. Reorganização dos serviços de saúde. Contratação de sindicatos de professores, para garantir uma taxa mais correcta de alunos por sala de aula e grupos de reforço escolar. Gratuitidade da educação universitária. Financiamento público da pesquisa, para assegurar a sua independência. Transportes públicos de qualidade e ecologicamente sustentáveis. Constituição de redes de controle local e serviços municipais etc.
Alguns temas foram evitados nas assembleias. O tema “nacional” em primeiro lugar — vale dizer que não colidiram nacionalismos diversos (coisa muito costumeira no debate político espanhol), se falou em todas as línguas, castelhano, basco, catalão etc. Esse é um elemento extremamente importante na experiência dos acampamentos. Outros temas por enquanto excluídos da discussão: a Europa e, parcialmente, a guerra (às vezes contestada a despesa militar do governo). A essência do debate sobre esses temas é bastante bizarra, e corresponde, todavia, à informação insuficiente e à forte ambiguidade que geralmente se sente em relação ao tema europeu e ao da Aliança Atlântica.
O que pode tornar-se esse movimento numa perspectiva temporal mais longa? Ele pode constituir um contra-poder permanente e/ou organizar-se como poder constituinte. É difícil prever qual será o caminho. Se organizando uma espécie de dualismo do poder (acontecimental e periódico); ou se desenvolvendo um poder constituinte que tenta uma penetração e uma transformação das estruturas do estado. Certo é que, de dentro da prática da Praça contra o Governo, aparece positivamente o projecto de uma regeneração republicana: a República contra o Estado; como na tradição espanhola (antes e através da guerra civil) esse projecto fora vivenciado. Na Espanha, trinta anos depois do fim do franquismo, falta ainda uma crítica do fascismo, carece ainda uma denúncia da continuidade da direita negocista e financeira em relação ao regime franquista. Isto significa que o movimento — também e sobretudo no seu êxodo actual — se situa radicalmente à esquerda, mas certo fora daquela esquerda representada por Zapatero — cuja acção política sempre consistiu numa gestão servil do capital. O 15-M não se opõe à política em geral, mas ao sistema dos partidos.
Como dito, fala-se pouco da Europa nos acampamentos. Quando nela se fala, recorda-se a sua opacidade. E, entretanto, é particularmente evidente a necessidade de um relé [relais] europeu, da assunção de uma dimensão continental à discussão política.
O que ocorrerá daqui para a frente, depois do tempo breve das manifestações? Três possibilidades devem ser consideradas. A primeira: o fim da frustração. A segunda: uma radicalização que se aglutina. Mas a terceira é aquela de uma reterritorialização estável, nos bairros, na sociedade, com uma capacidade de mobilização contínua. Parece que os manifestantes querem agrupar-se e articular-se num movimento sócio-político, com particularidades em todas as regiões, com uma auto-gestão em escala territorial. A cada dia 15 do mês, os grupos nos territórios deveriam colocar-se de acordo sobre uma plataforma de reivindicações e um calendário de mobilizações. Assim se dará, seguramente, a continuidade do movimento, — pelo menos até as eleições gerais do próximo ano. Resta compreender se a adesão da população permanecerá tão maciça no próximo período. Isto dependerá em parte do comportamento das autoridades: se reprimem o movimento, a solidariedade que o caracteriza deverá reforçá-lo. Em qualquer caso, os problemas fundamentais que sobram em aberto são, em primeiro lugar, aqueles ligados à reterritorialização do movimento e, além disso, a construção de uma rede europeia.
Tradução: Bruno Cava

15 M – Um Acontecimento

Desta experiência pode surgir um novo ciclo de mobilizações,
prolongadas no tempo e cada vez mais coordenadas.
Foto de olmo gonzález
As manifestações e os acampamentos em mais de 50 cidades constituem um Acontecimento fundador de um novo tipo de movimento social com perspectivas de duração. Sete perguntas a Jaime Pastor.



1. Já podemos falar de um «movimento 15M»? Como se dá o salto de uma manifestação para um acampamento?



Talvez seja prematuro chamar-lhe assim, mas julgo que sim, que efectivamente as manifestações em mais de 50 cidades e os acampamentos nas praças principais de muitas cidades nos dias seguintes constituem um Acontecimento fundador de um novo tipo de movimento social com perspectivas de duração, uma vez que se expressa uma indignação colectiva perante as consequências negativas de uma crise pela qual uma maioria social não se sente responsável.
Em saltos como o que foi dado agora, de uma manifestação para um acampamento, pode haver motivos concretos. No caso de Madrid, por exemplo, as detenções no fim da manifestação de domingo levaram um grupo de pessoas a acampar na Puerta del Sol para exigir a sua libertação; mais tarde, o seu desmantelamento por parte da polícia provocou uma nova ocupação e acampamento no dia seguinte e assim continua.
Mas, sem dúvida, têm também a sua influência factores gerais como o «efeito emulação ou contágio», tanto pelas referências que pudemos ver ao simbolismo da Praça Tahrir no Cairo (mesmo reconhecendo que, nesse caso, se tratava de fazer cair uma ditadura), como pelo facto de a própria iniciativa de Madrid ter significado um estímulo para que as pessoas mobilizadas noutras cidades expressassem a sua solidariedade. Pretende-se assim ocupar o espaço público em lugares particularmente simbólicos.
2. Quais as causas possíveis da indignação destas pessoas?
É difícil generalizar, mas julgo que a causa mais comum foi a percepção da injustiça presente na resposta que os grandes partidos, constituídos por uma «classe política» considerada corrupta e ao serviço dos grandes poderes económicos, estão a dar à crise sistémica – financeira, económica, social. As pessoas vêem que as medidas contra a crise estão a recair sobre aqueles que não a provocaram – jovens, mulheres, velhos, imigrantes – através de grandes cortes em direitos sociais fundamentais num Estado Social minguante como o espanhol. É muito significativo o slogan da comissão que tomou a iniciativa destas mobilizações, «Democracia Real, Já»: «Não somos mercadoria de políticos e banqueiros».
Se, além disso, tivermos em conta o protagonismo que a juventude está a ter, o slogan da Juventude Sem Futuro, outra das comissões da convocatória, é também representativo dessa indignação quando denunciam a sua situação «sem casa, sem trabalho, sem pensão», embora a seguir afirmem «Sem Medo», para expressar a sua vontade de abandonar a resignação ou a procura de saídas individuais para a crise.
3. Como se pode interpretar isto no contexto de uma campanha eleitoral?
Julgo que, justamente por ter acontecido a meio dessa campanha, também implica uma expressão de protesto face a discursos partidários cheios de promessas que depois não pensam cumprir se chegarem a governar. Reflecte o que as sondagens já dizem: a convicção de que a «classe política» é um dos principais problemas, daí o distanciamento da cidadania: não em relação à democracia em abstracto, mas em relação à democracia realmente existente. Pensam que essa democracia se foi esvaziando e que as grandes decisões são tomadas fora dos parlamentos e das instituições representativas. Uma frase de um dos manifestantes pode resumi-lo: «A nossa democracia foi sequestrada. Queremos libertá-la».
4. Em que medida se relaciona com os acontecimentos que estão a ter lugar a nível mundial?
Desde a explosão da crise sistémica e financeira em finais de 2008, estamos a assistir ao desenvolvimento, desigual mas crescente, de movimentos de protesto em diversos países do «Norte» face à saída mais neoliberal que se está a dar à crise. Na própria União Europeia temos os casos da Grécia, da França, da Grã-Bretanha ou de Portugal. Temos também o caso, até agora excepcional, da Islândia, onde houve dois referendos que decidiram recusar o pagamento da dívida gerada por uma banca privada que entrou em falência devido ao seu próprio aventureirismo especulativo. Por isso também vimos slogans como «Espanha em pé, uma Islândia é» ou «Queremos ser islandeses». E, por fim, temos o exemplo das revoltas no mundo árabe e o papel que teve a juventude, através do recurso intensivo e extensivo das novas tecnologias da comunicação. Tudo isto, sem dúvida, teve influência nas redes sociais que aqui foram preparando as mobilizações do passado 15-M.
5. As mobilizações em torno do 15 de Maio efectuaram-se principalmente através das redes sociais. Em que medida a Internet altera o panorama das mobilizações políticas?
Obviamente, implicam uma revolução na contra-informação e na comunicação que ajuda a contrabalançar as informações e a opinião publicada nos meios de comunicação tradicionais e a difundir as suas próprias, com uma rapidez e uma economia de tempo impensáveis no passado. Permitem uma coordenação entre os activistas muito superior à que existia até agora, a que se junta a possibilidade de um funcionamento democrático e horizontal também maior. Ajudam, finalmente, a uma passagem fácil do espaço virtual para o espaço real mediante a difusão acelerada das iniciativas de rua e das réplicas imediatas às respostas que possam ser dadas pelas autoridades.
6. Qual a sua opinião sobre a cobertura que as mobilizações estão a ter nos meios de comunicação tradicionais?
Até 15 de Maio houve um silenciamento quase total sobre o que se estava a preparar a partir dessas redes sociais, mas é evidente que no dia seguinte houve uma mudança de atitude ao verem a legitimação social que o movimento conseguiu, com a resposta massiva que encontrou na rua. Mas há também tentativas claras de revelar as presumíveis fraquezas deste movimento: a sua heterogeneidade (real mas lógica e nem por isso negativa), a sua possível manipulação por um ou outro partido (o que remete para as teorias conspiratórias em ascensão, que pretendem negar os motivos reais do protesto), a existência de sectores «anti-sistema» (utilizando este termo depreciativamente, quando vimos slogans como «O sistema é que é antipessoal») ou «violentos» (quando se está a ver que a opção claramente maioritária é a desobediência civil não violenta). No entanto, também há meios (especialmente nas rádios) que estão a dar a palavra a porta-vozes das redes que estiveram na origem da convocação, ou analistas que ajudam a compreender que o que está a acontecer é algo que pode ajudar a procurar respostas diferentes àquelas que os grandes partidos oferecem, tanto em relação à democracia realmente existente, como relativamente à crise.
7. Por último, queríamos perguntar-lhe que efeitos possíveis poderão ter estas mobilizações, quer a curto, quer a longo prazo.
Um efeito importante é já a construção de uma nova subjectividade comum, plural e criativa presente nas pessoas que participam nestas mobilizações. Isto é positivo para todas estas pessoas porque implica saírem da paralisia e deixarem de acreditar que não se pode fazer nada face à crise, além de ir votar por um ou outro partido a 22 de Maio.
A efervescência colectiva que se está a viver nestes dias, o sentir-se parte de um movimento tão espalhado e sincronizado em tantas cidades e com referências à escala internacional, com um reportório de mensagens e de acções muito amplo e cada vez mais criativo, terá impacto, sem dúvida, em todas estas pessoas. Desta experiência pode surgir um novo ciclo de mobilizações, prolongadas no tempo e cada vez mais coordenadas, embora também seja provável que se possam ir expressando publicamente diferentes redes, discursos e propostas e surjam as primeiras tensões no interior do movimento. Mas isto também dependerá da atitude mantida pelos poderes públicos e das suas tácticas de cooptação e/ou repressão face às exigências e aos diversos sectores do movimento.
Jaime Pastor é professor titular de Ciências Políticas. Faz parte da redacção de VIENTO SUR
Fonte: UNED
Tradução de Helena Pitta para o Esquerda.net

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