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sábado, 3 de fevereiro de 2024

As Maiores Economias mundias, para imprimirem dinheiro novo, emitem títulos do tesouro nacional

 


Dag Vulpi - 30 de maio de 2023
Não só a estadunidense, mas, todas as Economias globais mais expressivas utilizam títulos do tesouro nacional como instrumento-chave de emissão monetária.
Enquanto as economias mundiais competem pela supremacia financeira, um padrão comum emerge entre as maiores potências: a emissão de moeda por meio de títulos do tesouro nacional. Esses países, cuja influência econômica molda o cenário global, encontraram nos títulos do tesouro uma ferramenta vital para impulsionar suas economias, ao mesmo tempo em que geram confiança nos investidores internacionais. Esta prática se tornou uma estratégia indispensável para financiar projetos, estimular o crescimento e garantir a estabilidade financeira.
Estados Unidos:
Como a maior economia do mundo, os Estados Unidos utilizam títulos do tesouro, como o Tesouro dos Estados Unidos, para financiar gastos governamentais e suprir déficits orçamentários. Os títulos do tesouro norte-americano são amplamente considerados como um investimento seguro e têm um papel fundamental na economia global.
China:
Como a segunda maior economia do mundo, a China também emite títulos do tesouro para sustentar seu crescimento econômico e financiar projetos de infraestrutura. Embora a compra desses títulos pelo governo chinês seja expressiva, eles também são adquiridos por investidores estrangeiros, contribuindo para a estabilidade e liquidez do mercado financeiro global.
Japão:
A terceira maior economia mundial, o Japão, emite títulos do tesouro para enfrentar desafios econômicos, como a deflação persistente e a dívida pública crescente. Esses títulos são uma fonte essencial de financiamento para o governo japonês e também são adquiridos por investidores domésticos e estrangeiros, fornecendo uma base sólida para a economia japonesa.
Alemanha:
Como uma das maiores economias da Europa, a Alemanha emite títulos do tesouro como parte de sua política fiscal. Os Bunds alemães são considerados um porto seguro para os investidores, beneficiando-se da confiança na estabilidade econômica alemã e no euro.
Enquanto as maiores economias mundiais competem e cooperam em uma paisagem financeira complexa, a emissão de moeda por meio de títulos do tesouro nacional surge como uma prática comum. Países como Estados Unidos, China, Japão e Alemanha reconhecem a importância desses instrumentos para financiar suas economias, impulsionar o crescimento e manter a estabilidade financeira. A emissão de títulos do tesouro nacional não apenas fornece recursos essenciais, mas também gera confiança nos mercados internacionais, desempenhando um papel crucial na economia global.
Nos países que emitentem nova moeda através de títulos do tesouro há as agências de análise de risco que as validam através de notas de risco. Porém essas análises podem falhar.
Agências de análise de risco enfrentam desafios à medida que análises de títulos do tesouro podem falhar
No cenário econômico global, países que emitem nova moeda por meio de títulos do tesouro geralmente dependem das agências de análise de risco para avaliar a qualidade e a confiabilidade desses títulos. Essas agências, que têm influência significativa nos mercados financeiros, desempenham um papel crucial na determinação do rating de crédito dos governos. No entanto, à medida que os desafios econômicos e as incertezas aumentam, essas análises podem falhar, colocando em xeque a confiabilidade dessas agências e gerando consequências significativas para os investidores e a estabilidade financeira global.
O papel das agências de análise de risco:
As agências de rating são responsáveis por avaliar o crédito e a capacidade de pagamento dos emissores de títulos do tesouro. Elas atribuem notas de crédito com base em análises e critérios específicos, fornecendo aos investidores informações cruciais para tomar decisões de investimento.
Possíveis falhas nas análises:
As análises de risco realizadas pelas agências podem apresentar falhas em situações complexas ou em momentos de crise econômica. A capacidade limitada de prever eventos econômicos imprevistos, como recessões ou crises financeiras, pode levar a avaliações equivocadas dos títulos do tesouro, subestimando os riscos associados.
Impacto nas economias e nos investidores:
Falhas nas análises de títulos do tesouro podem ter consequências significativas. Investidores que confiam nas notas de crédito podem ser expostos a riscos mais altos do que o indicado, levando a perdas financeiras substanciais. Além disso, países que dependem dessas avaliações para atrair investidores podem enfrentar dificuldades em obter financiamento adequado ou podem enfrentar aumento nos custos de empréstimos.
Desafios em um ambiente econômico volátil:
Em tempos de instabilidade econômica, como crises globais ou mudanças abruptas nas políticas econômicas, as análises de risco tornam-se ainda mais desafiadoras. A complexidade dos fatores envolvidos e a interconexão global dos mercados financeiros dificultam a previsão precisa do desempenho dos títulos do tesouro.
Embora as agências de análise de risco desempenhem um papel importante na avaliação dos títulos do tesouro emitidos por países que emitem nova moeda, é importante reconhecer que essas análises podem falhar em determinadas circunstâncias. À medida que a volatilidade econômica e os desafios aumentam, é necessário que os investidores adotem uma abordagem cautelosa, diversifiquem suas carteiras e considerem outras fontes de informação além das avaliações das agências. Além disso, os governos devem buscar a transparência e adotar políticas econômicas sólidas para diminuir os riscos associados aos títulos do tesouro e fortalecer a confiança.
As principais agências de análise de risco dos tesouros nacionais são:
Standard & Poor's (S&P): A S&P é uma das principais agências de rating do mundo. Ela fornece avaliações de crédito e análises de risco para governos e empresas em todo o mundo. Sua escala de classificação de crédito inclui notas como AAA, AA, A, BBB, entre outras.
Moody's Investors Service: A Moody's é outra agência líder em análise de risco. Ela atribui ratings de crédito a títulos de dívida emitidos por governos e empresas. As notas de crédito da Moody's variam de Aaa, Aa, A, Baa, entre outras.
Fitch Ratings: A Fitch Ratings é uma agência global de rating que avalia a qualidade creditícia de governos e entidades corporativas. Ela atribui notas de crédito baseadas em critérios financeiros e análises de risco. As notas da Fitch incluem AAA, AA, A, BBB, entre outras.
Essas três agências são consideradas as principais referências no mercado de análise de risco dos tesouros nacionais. Seus ratings de crédito têm um impacto significativo nos mercados financeiros globais, influenciando a percepção de risco e a confiança dos investidores em relação aos títulos do tesouro emitidos pelos governos. É importante ressaltar que existem outras agências de análise de risco, mas essas são amplamente reconhecidas e têm uma influência considerável no cenário financeiro internacional.
Na grande retratação econômica graças aos títulos podres hipotecarios no ano de 2008, qual era a nota de vavaliação de risco dos títulos hipotecarios segundo as agências Standart & Poor's (S&O), a moody's e a outra líder Fitch Ratings?
Durante a crise financeira de 2008, as agências de rating, incluindo a Standard & Poor's (S&P), Moody's e Fitch Ratings, foram criticadas por suas avaliações de risco inadequadas dos títulos hipotecários conhecidos como "subprime" ou "títulos podres". Esses títulos eram compostos por empréstimos imobiliários de alta complexidade e alto risco.
Na época, muitos desses títulos hipotecários foram classificados com notas de crédito altas, o que implicava um baixo risco de inadimplência. No entanto, posteriormente, esses títulos enfrentaram sérios problemas de inadimplência, levando à crise financeira global.
As notas de avaliação de risco desses títulos variaram entre as agências, mas, em geral, muitos receberam classificações elevadas. Por exemplo:
Standard & Poor's (S&P): A S&P atribuiu muitas notas elevadas para os títulos hipotecários subprime, classificando-os com classificações AAA, consideradas as mais altas em termos de qualidade de crédito.
Moody's Investors Service: A Moody's também forneceu notas de crédito altas para esses títulos hipotecários subprime, incluindo classificações AAA ou similares, sugerindo um baixo risco de inadimplência.
Fitch Ratings: A Fitch Ratings também atribuiu notas elevadas para muitos desses títulos, classificando-os como AAA ou próximos disso.
No entanto, a crise financeira de 2008 demonstrou que essas avaliações de risco foram inadequadas, pois os títulos hipotecários subprime sofreram perdas substanciais e contribuíram para a instabilidade do sistema financeiro global. Isso gerou críticas sobre a confiabilidade e precisão das avaliações realizadas pelas agências de rating naquela época, levando a um debate e a mudanças nas regulamentações do setor.
Quais foram as consequências para a economia Mundial graças à queda na bolsa hipotecaria avaliadas equivocadamente pelas agências de risco com notas muito superiores aos riscos reais que esses títulos representavam para a economia mundial?
A queda na bolsa hipotecária e a crise financeira de 2008 tiveram consequências significativas para a economia mundial. Aqui estão algumas das principais consequências:
Colapso do setor financeiro:
A crise teve um efeito cascata no setor financeiro, com grandes instituições financeiras enfrentando problemas de solvência e liquidez. Bancos e outras instituições financeiras tiveram perdas substanciais devido aos títulos hipotecários subprime, resultando em falências, resgates governamentais e a necessidade de reestruturação em todo o setor.
Recessão econômica global: A crise financeira de 2008 desencadeou uma recessão global. A confiança dos consumidores e das empresas foi abalada, resultando em uma queda nos gastos e no investimento. O desemprego aumentou significativamente em muitos países, e a atividade econômica diminuiu consideravelmente.
Crise imobiliária:
A crise financeira teve origem no mercado imobiliário, e seu impacto foi particularmente sentido nesse setor. Houve uma queda acentuada nos preços dos imóveis, muitas hipotecas subprime entraram em default e ocorreu um aumento nos casos de execução hipotecária. Isso afetou negativamente o setor de construção e contribuiu para a desvalorização de ativos e perdas financeiras.
Aumento da dívida pública:
Os resgates financeiros e as medidas tomadas pelos governos para estabilizar a economia resultaram em um aumento significativo na dívida pública. Os países gastaram grandes quantias de dinheiro para resgatar bancos e instituições financeiras, além de implementar políticas de estímulo para impulsionar a economia, levando a déficits orçamentários e acúmulo de dívidas.
Impacto global nos mercados financeiros: A crise financeira se espalhou rapidamente pelos mercados globais, afetando as bolsas de valores, os mercados de câmbio e os mercados de commodities. Houve uma diminuição na confiança dos investidores, uma fuga de capitais e uma volatilidade significativa nos preços dos ativos.
Reformas regulatórias e mudanças no ambiente financeiro:
A crise financeira desencadeou um debate sobre a necessidade de reformas regulatórias para evitar eventos semelhantes no futuro. Houve um aumento na supervisão e na regulamentação dos mercados financeiros, com o objetivo de fortalecer a estabilidade e reduzir os riscos sistêmicos.
No geral, a queda na bolsa hipotecária e a crise financeira de 2008 tiveram um impacto profundo na economia mundial, causando recessão, instabilidade financeira e mudanças significativas no ambiente regulatório. As consequências dessa crise ainda são sentidas em muitos aspectos da economia global até os dias de hoje.
Qual foi a saída alternativa que o governo americano encontrou para amenizar os efeitos deletérios da falha de avaliação das agências de risco americano no caso das hipotecas imobiliárias?
Para amenizar os efeitos negativos da falha de avaliação das agências de risco e combater a crise financeira de 2008, o governo dos Estados Unidos implementou várias medidas e políticas. A principal resposta foi a adoção de um pacote abrangente de resgate financeiro conhecido como Troubled Asset Relief Program (TARP), que tinha o objetivo de estabilizar o sistema financeiro e fornecer suporte para instituições em dificuldades.
O TARP foi aprovado pelo Congresso dos EUA em outubro de 2008 e tinha uma alocação inicial de até US$ 700 bilhões. O programa permitiu ao governo adquirir ativos problemáticos e títulos lastreados em hipotecas de instituições financeiras, como bancos e seguradoras, para aliviar sua situação financeira e evitar colapsos sistêmicos.
Além disso, outras medidas foram adotadas para estimular a economia e restaurar a confiança no sistema financeiro, incluindo:
Injeção de liquidez: O Federal Reserve (Fed), banco central dos EUA, adotou políticas de flexibilização quantitativa, como a compra de títulos do Tesouro e ativos lastreados em hipotecas, a fim de injetar liquidez no sistema financeiro e estimular o crédito.
Estímulo fiscal: O governo implementou programas de estímulo econômico por meio de cortes de impostos e aumento dos gastos públicos. Isso tinha o objetivo de impulsionar a demanda agregada e incentivar o investimento e o consumo.
Recapitalização de instituições financeiras: O governo forçou instituições financeiras em dificuldades a buscar capital adicional para fortalecer sua posição financeira. Além disso, alguns bancos foram submetidos a processos de stress test para avaliar sua solidez e garantir que estivessem em condições de enfrentar adversidades futuras.
Reformas regulatórias: O governo dos EUA implementou uma série de reformas regulatórias para fortalecer a supervisão do setor financeiro e prevenir a repetição de eventos semelhantes. Isso incluiu a Lei de Reforma e Proteção ao Consumidor de Dodd-Frank, que estabeleceu novos requisitos de capital, aumentou a transparência e introduziu regulamentações mais rigorosas para as instituições financeiras.
Essas medidas e políticas visavam estabilizar o sistema financeiro, restaurar a confiança dos investidores e impulsionar a economia dos EUA. Embora tenham havido controvérsias em torno das ações tomadas e de seu impacto, essas intervenções governamentais foram fundamentais para reduzir os efeitos maléficos da falha de avaliação das agências de risco e evitar uma crise financeira ainda mais profunda.
Resumidamente, sim, durante a crise financeira de 2008, a intervenção estatal, mais uma vez foi necessária e fundamental para salvar a economia capitalista e reduzir os impactos da falência financeira hipotecária. As agências reguladoras de rating, que inicialmente garantiam a segurança desses títulos do tesouro, falharam em avaliar corretamente o risco envolvido. Como resultado, o governo teve que intervir por meio de medidas como o pacote de resgate financeiro (TARP), injeção de liquidez, estímulo fiscal e reformas regulatórias. Essa intervenção estatal foi necessária para estabilizar o sistema financeiro e evitar uma crise ainda mais grave, demonstrando a importância do papel do Estado em momentos de crise para salvar o sistema capitalista.
Conclusão: Em momentos de crise ou falhas no sistema capitalista, a intervenção estatal é a opção mais viável e eficiente para salvar a economia. A intervenção estatal pode envolver medidas como resgates financeiros, injeção de liquidez, estímulo fiscal e reformas regulatórias. Essas ações são tomadas com o objetivo de estabilizar o sistema financeiro, restaurar a confiança dos investidores e impulsionar a economia. Embora haja debates sobre a extensão e a eficácia da intervenção estatal, em muitos casos, a intervenção governamental é considerada necessária para evitar uma crise mais profunda e proteger a economia e os interesses dos cidadãos.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

A Conferência de Bretton Woods, e a substituição do lastro do ouro por uma cesta das cinco moedas mais estáveis da economia mundial


Dag Vulpi - 27/01/2023

O que foi a Conferência de Bretton Woods?
Quando a Segunda Guerra Mundial se aproximava de seu fim, em 1944, as maiores potências capitalistas, lideradas pelos Estados Unidos, sob o regime de Franklin D. Roosevelt, estavam em busca de revitalizar a economia mundial e a harmonia entre as nações.
Com o intuito de debater a reorganização do cenário econômico no período pós-guerra e acabar com as políticas de protecionismo econômico, organizou-se a Conferência de Bretton Woods, um dos acordos econômicos mais relevantes do cenário mundial, cujos impactos são sentidos até hoje.
Nesse contexto, mais de quarenta nações participaram da Conferência de Bretton Woods, que aconteceu em New Hampshire (EUA), na cidade de mesmo nome. O encontro diplomático durou três semanas e contou com debates de ilustres economistas, entre eles John Maynard Keynes, representante britânico no evento, e Harry Dexter White, funcionário de alto escalão do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos. Keynes não conseguiu impor sua proposta de que se criasse uma união monetária dos países industrializados da época. Em vez disso, o resultado foi a fundação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, como sugerido pelo subsecretário de Finanças dos Estados Unidos, Harry Dexter White.
Vales destacar que naquele momento o cenário global olhava com entusiasmo para a nação norte-americana e como a Segunda Revolução Industrial tinha beneficiado os assuntos econômicos do país, especialmente no que dizia respeito à manufatura de bens de consumo e o sistema de produção fordista.
O que a reunião de Bretton Woods criou?
O acordo de Bretton Woods definiu que cada país deveria manter a taxa de câmbio de sua moeda “congelada” ao dólar, com limite de variação de cerca de 1%. A moeda estadunidense, por sua vez, estaria ligada ao valor do ouro em uma base fixa, com cada dólar equivalendo a 35 gramas de ouro.
Os desdobramentos de Bretton Woods deram espaço para que a política do Monetarismo de Milton Friedman se instalasse no cenário macroeconômico mundial, acompanhada do liberalismo, e para a consolidação de instituições financeiras mundiais.
Ademais, o fenômeno conhecido como Globalização ganhava traços mais firmes a partir do que foi definido na Conferência de Bretton Woods, bem como o estabelecimento do capitalismo como sistema econômico predominante e os Estados Unidos como a maior potência econômica mundial.
Por isso, neste conteúdo, nós te explicamos qual era o contexto histórico quando as Conferências de Bretton Woods foram realizadas, quais foram os impactos à época e como as decisões tomadas naquele momento impactam, ainda, a economia.
Bretton Woods: resumo do contexto histórico
O encontro de Bretton Woods possuía como objetivo central estabelecer a paz entre as nações depois de meio século de crises e disputas, sendo as Guerras Mundiais e a Grande Depressão de 1929 os eventos mais marcantes.
Na visão dos responsáveis pelo debate, o imperialismo era o grande causador dos conflitos internacionais e apenas o livre mercado e comércio era capaz de resolver as desavenças entre os países para finalmente estabelecer a animosidade entre todos os continentes.
Diante disso, as discussões que aconteceram nesse evento colocavam as políticas intervencionistas, do ponto de vista estatal, elaboradas por Keynes em uma situação muito sensível. Os economistas que lá estavam definiam tal sistema como falho e destacavam a importância de reformular a economia a nível global para evitar outro conflito.
O sistema econômico de Bretton Woods
Basicamente, as reuniões de Bretton Woods focaram em estabelecer os critérios para negociações comerciais e financeiras a nível internacional, especialmente para regular as relações entre as maiores economias naquela época, como os Estados Unidos, Canadá, Europa Ocidental, Austrália e Japão.
Os acordos focaram em estabelecer um equilíbrio entre as políticas monetárias dos países, de modo a manter a paridade com as moedas nacionais de um para um em relação ao ouro (o chamado padrão dólar-ouro). Nesse sistema, o valioso material mantinha a paridade com o dólar americano, já que os Estados Unidos possuíam três-quartos das reservas mundiais do minério.
Além dessa importante decisão, os países-membros do Acordo de Bretton Woods concordaram em evitar novos conflitos internacionais, além de erguerem algumas instituições financeiras mundiais para regular assuntos relacionados a investimentos internacionais e órgãos de fiscalização das economias para deixá-las estáveis.
Quais instituições se formaram com a Conferência de Bretton Woods?
Apesar de ter perdido a validade nos anos 70, a Conferência de Bretton Woods foi o marco do abandono do keynesianismo, ainda muito praticado entre as economias mundiais, em detrimento de uma política monetarista, bastante baseada nos ideais liberais. Além da influência ideológica, o encontro de Bretton Woods foi o responsável pela criação de algumas importantes instituições financeiras globais.
Porque Bretton Woods acabou?
O sistema de Bretton Woods acabou em 1971, quando os EUA abandonaram o lastro de ouro e o valor das moedas passou a flutuar ao sabor das taxas de câmbio. Mas as instituições ficaram e se tornaram pilares da globalização pós-Guerra Fria, a partir de 1990.
Nesse encontro, por exemplo, a Organização Mundial do Comércio (OMC) foi estruturada. Ela existe até os dias atuais e é a responsável por regular as trocas comerciais entre os países, justamente para evitar disputas entre as nações, sejam elas armadas ou ideológicas, por meio de sanções, multas e bloqueios econômicos em casos pontuais.
Outra medida que foi estabelecida em Bretton Woods foi a inauguração do Fundo Monetário Internacional (FMI). O objetivo da instituição era a reestruturação da nova ordem econômica e ajudar as nações que tiveram seus países arrasados pela guerra e que estavam em posição vulnerável desde a Crise de 1929 a se reerguerem, especialmente em questões de infraestrutura, através do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD).
Como as nações podiam contar diretamente com instituições monetárias internacionais, como o FMI e o BIRD, para resolver questões de crises econômicas e de problemas infraestruturas, a tensão entre os países diminuía, afastando a ideia de novos conflitos mundiais.
Vale mencionar que o FMI e o BIRD, que tinham a nação norte-americana como maior credora desde as suas fundações, ambas em 1944, exigiam medidas de austeridade bastante voltadas ao campo liberal para quitar dívidas contraídas pelas nações – como as privatizações e os cortes em gastos públicos. Dessa forma, tais iniciativas tenderam a beneficiar os EUA e o sistema capitalista naquele momento. Além disso, com os Acordos, o capitalismo se fortaleceu como o modelo econômico mais viável, em escala global, isolando os países socialistas e inviabilizando a participação de economias subdesenvolvidas no cenário mundial.
Apesar do capitalismo ter conhecido o seu apogeu durante os anos de vigência dos Acordos de Bretton Woods (1944 – 1971), o sistema foi quebrado pelo governo norte-americano, quando as reservas de ouro começaram a se esvair rapidamente do país e pelo conflito ideológico contra o sistema econômico da URSS. No próximo tópico, vamos entender a sequência de ações que resultaram na quebra dos Acordos.
O fim do Sistema de Bretton Woods
Na década de 1960, a harmonia entre as nações começava a ser ameaçada, colocando os tratados de Bretton Woods sob prova de fogo, especialmente com o agravamento do conflito entre a União Soviética e os Estados Unidos e as constantes críticas ao sistema capitalista, à produção em massa, ao lastreamento de moedas ao ouro e ao consumo inconsciente.
A derrota militar dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã (1965-1975) ameaçou a estabilidade do dólar e ajudou a colocar o sistema de Bretton Woods em vulnerabilidade ainda maior, à medida que as reservas de ouro dos norte-americanos caiaram drasticamente.
Vale lembrar que o dólar tinha paridade com o o ouro, em uma imposição importante de Bretton Woods. Ou seja, o governo dos Estados Unidos prometeu uma conversão fixa de ouro em dólar (aproximadamente 31 gramas do material tinha o valor de 35 dólares). Assim, todas as moedas atreladas ao dólar também fixavam o mesmo valor em ouro.
Em 1971, no entanto, esse pilar de sustentação dos acordos da Conferência foi alterado pelo então presidente Nixon depois que as reservas norte-americanas do minério terem diminuído significativamente, após três décadas de crescimento.
A decisão do presidente, conhecida como Nixon Shock, abalou o que havia sido estabelecido nos Acordos de Bretton Woods, de modo a dar ainda mais destaque ao dólar na economia mundial.
Dessa maneira, as moedas mundiais migraram, lentamente, entre a segunda metade da década de 70 até a entrada no novo milênio, ao câmbio flutuante, trazendo o dólar como referência em detrimento do ouro.
Conferência de Bretton Woods: qual é o legado?
Para firmar de vez a hegemonia dos Estados Unidos no pós-guerra, a Conferência de Bretton Woods adotou o lastro do dólar para moedas internacionais. Isso quer dizer que o ouro, mineral finito e escasso e que era usado para tal função desde a Primeira Guerra Mundial, seria atrelado ao dólar como o lastro – ou conversão – entre transferências internacionais. Isso conferiu à moeda norte-americana um papel de destaque a nível global.
Na década de 70, com a vertiginosa queda nas suas reservas de ouro, o governo dos EUA reconheceu que a proposta de keynes era a mais coerente e determinou s desvinculação da sua moeda do ouro, por problemas de baixa reserva do minério, em um movimento político-econômico que colocaria um fim aos acordos de Bretton Woods. Assim, o dólar permaneceria como câmbio para as moedas internacionais, enquanto as nações optavam pelo câmbio flutuante, que permanece até hoje.
Os Acordos estabelecidos em Bretton Woods tiveram sucesso entre 1945 a 1975, quando o cenário global experienciou crescimento econômico generalizado entre os países desenvolvidos e algumas nações emergentes.
Além disso, as iniciativas políticas e econômicas de Bretton Woods firmaram os Estados Unidos como potência hegemônica no cenário capitalista. Historicamente, esses 30 anos ficaram conhecidos como os anos gloriosos do sistema capitalista.
Diante disso, o legado de Bretton Woods praticamente ditou como seria a economia atual e as instituições criadas no evento permanecem defendidas por economistas de todo o mundo até os tempos atuais, garantindo uma pseudo estabilidade das economias das nações e a paz mundial, pelo menos no plano teórico. Mas as regras mudaram. Ao invés da paridade dólar/ouro que sustentou o capitalismo e mascarou a realidade, a partir ds década de 70, o FMI adotou a fórmula proposta por keynes em 44 e sua paridade passou a ser baseado em uma cesta das principais moedas internacionais, revista pelo FMI a cada cinco anos. Com base na revisão realizada em 30 de novembro de 2015, a cesta dos DES era composta pelas seguintes cinco moedas: dólar estadunidense ($) 41,73%, euro (€) 30.93%, libra esterlina (£) 8,09%, iene japonês (¥) 8,33% e, mais recentemente, o yuan chinês (¥) 10,92%. Os pesos atribuídos a cada uma das moedas na cesta de DES são ajustados de acordo com a sua importância atual em termos de comércio internacional e reservas nacionais de divisas.
REFERÊNCIAS
- John Maynard Keynes -
- História – Bretton Woods
De Bretton Woods à Globalização Financeira: Evolução, Crise e Perspectivas do Sistema Monetário Internacional
Instituições de Bretton Woods

quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

AS FASES DO CAPITALISMO DURANTE OS ÚLTIMOS SETE SÉCULOS (XV AO XXI) E A MANUTENÇÃO DE SUA PRINCIPAL CARACTERÍSTICA

 



Dag Vulpi - 08 de abril de 2023

O Capitalismo é um sistema econômico que tem sua origem no final do século XV, mas se desenvolveu e evoluiu ao longo dos séculos.
O capitalismo é dividido em três fases principais:
1° . O capitalismo 'Comercial ou Mercantil' (pré-capitalismo) – teve seu início no século XV e se estendeu até o século XVIII;
2° . O capitalismo 'Industrial ou Industrialismo' – ocorreu entre os séculos XVIII e XIX; e
3° . O capitalismo 'Financeiro ou Monopolista' – teve seu início a partir do século XX.
Na primeira fase, o Capitalismo Mercantilista, surgiu em um contexto em que a Europa vivia uma série de transformações políticas e sociais. O feudalismo, sistema que predominou durante a Idade Média, estava em declínio, e novas formas de organização social e econômica começavam a emergir.
Nesse contexto, o Mercantilismo consolidou-se como uma doutrina econômica que buscava a acumulação de riquezas e poder por meio do comércio. Os países europeus, em especial Portugal, Espanha e Inglaterra, foram os principais protagonistas deste período, e buscavam expandir seus mercados e obter vantagens comerciais em relação a outros países.
Durante o Mercantilismo, as nações europeias buscavam garantir sua posição no mercado mundial através do monopólio de determinados produtos, como especiarias, ouro e prata. Os Estados também passaram a incentivar a produção de bens manufaturados para reduzir a dependência do comércio internacional.
Além disso, a doutrina do Mercantilismo defendia a intervenção estatal na economia, com o objetivo de garantir o sucesso do comércio e a prosperidade do país. Os governos passaram a regulamentar o comércio e impor tarifas sobre importações e exportações.
No entanto, o Mercantilismo também gerou desigualdades sociais e econômicas. A acumulação de riquezas por parte dos países europeus se deu em detrimento da exploração dos povos colonizados e de uma parcela da população europeia.
Além disso, a busca incessante pelo lucro e pela expansão do comércio gerou guerras e conflitos, que por sua vez levaram a um esgotamento do modelo mercantilista.
O Mercantilismo é considerado uma fase importante na história do capitalismo, pois consolidou as bases do comércio internacional e influenciou a formação de novas doutrinas econômicas, como o liberalismo e o marxismo. Com o passar do tempo, o capitalismo evoluiu para uma fase industrial, em que a produção em massa e o uso de máquinas para produzir bens em grande quantidade tornaram-se as principais características da economia capitalista.
Na segunda fase, o Capitalismo Industrial, também conhecido como Industrialismo, teve início no final do século XVIII, com a Revolução Industrial na Inglaterra, e se estendeu até o final do século XIX.
Essa fase foi caracterizada pela produção em massa, o surgimento das máquinas e o aumento da produtividade. As fábricas passaram a ser o centro da produção e do trabalho, e as cidades se transformaram em grandes centros industriais.
O desenvolvimento do capitalismo industrial foi impulsionado pelo avanço da tecnologia, pela disponibilidade de matérias-primas e pelo aumento da demanda por produtos. As inovações tecnológicas, como a máquina a vapor e o telégrafo, permitiram a criação de novas indústrias e a melhoria dos processos produtivos.
Com o aumento da produção, a concorrência entre as empresas também cresceu, o que levou à busca por novos mercados e à formação de monopólios. Essa fase foi marcada pela formação de grandes conglomerados industriais e pela concentração do poder econômico em poucas mãos.
O capitalismo industrial também teve impactos significativos na sociedade. A urbanização acelerada gerou novas formas de organização social e cultural. A classe trabalhadora cresceu em número e organizou-se para lutar por melhores condições de trabalho e remuneração.
Além disso, o capitalismo industrial gerou desigualdades sociais e econômicas. Os trabalhadores eram frequentemente explorados e submetidos a condições precárias de trabalho e vida, enquanto os donos das fábricas acumulavam grandes fortunas.
No entanto, o capitalismo industrial também permitiu a melhoria das condições de vida em algumas partes do mundo, principalmente nos países que se industrializaram. Aumento da renda, melhoria da saúde e da educação foram alguns dos benefícios que essa fase trouxe para a sociedade.
O capitalismo industrial teve um papel fundamental na história do capitalismo e na evolução do sistema econômico mundial. Sua influência ainda pode ser vista em diversas áreas, como na organização do trabalho, na produção em larga escala e na formação de grandes conglomerados empresariais.
A terceira e atual fase é o Capitalismo Financeiro, também conhecido como Monopolista. Teve início no século XX, com a ascensão do setor financeiro e a globalização da economia.
Nessa fase, a atividade financeira se tornou o principal motor da economia, com o surgimento de novos instrumentos financeiros e a criação de mercados financeiros globais. Os bancos e outras instituições financeiras passaram a ter um papel central na alocação de recursos e na tomada de decisões econômicas.
O capitalismo financeiro também foi marcado pela formação de grandes empresas e conglomerados internacionais, que dominaram o mercado e exerceram um enorme poder econômico e político. A globalização da economia permitiu a expansão das empresas em escala mundial e a abertura de novos mercados.
Além disso, a financeirização da economia gerou novas formas de acumulação de capital, como a especulação financeira, que envolve a compra e venda de ativos financeiros com o objetivo de obter lucro a curto prazo.
No entanto, o capitalismo financeiro também gerou instabilidade e crises econômicas. A especulação financeira pode levar a bolhas financeiras e a desequilíbrios econômicos, o que pode resultar em crises financeiras e recessões.
O capitalismo financeiro também tem sido criticado por sua tendência à desigualdade econômica e social. A concentração de riqueza e poder nas mãos de poucas empresas e indivíduos tem sido apontada como uma ameaça à democracia e ao bem-estar social.
Apesar das críticas, o capitalismo financeiro continua sendo o principal sistema econômico do mundo atualmente. A influência do setor financeiro na economia global é cada vez maior, e a busca por lucro e acumulação de capital continua sendo o principal motor da atividade econômica.
Apesar das diferentes fases, o capitalismo mantém inalterada sua principal característica: 'o lucro às custas da desigualdade e da exploração'.
Marcado pela busca incessante pelo lucro, pela concorrência entre empresas e pela desigualdade social. Críticos argumentam que o capitalismo não é um sistema econômico sustentável, pois explora recursos naturais e humanos em excesso, gerando desigualdades sociais e ambientais.

De qualquer forma, o capitalismo é um sistema que continua a ser objeto de estudo e debate, e é importante entender suas fases e características para compreender a dinâmica econômica mundial.

segunda-feira, 4 de setembro de 2017

O poder da atlas network: conexões ultraliberais nas américas


Por Kátia Gerab Baggio
Capitalistas financiam uma rede de think tanks ultraliberais pelas Américas, cujos frutos são organizações como ILISP e MBL. O que pretendem com isso?

Introdução: sobre a Atlas Network e o ultraliberalismo

Inicialmente, esclareço que meu interesse nas vinculações da Atlas Network com organizações latino-americanas — e, em particular, brasileiras — deve-se, evidentemente, à conjuntura política brasileira dos últimos anos.

Meu objetivo é apresentar as conexões entre o avanço de uma direita ultraliberal — no Brasil e em outros países latino-americanos — e o think tank norte-americano Atlas Network, que tem parcerias com várias organizações ultraliberais em todo o mundo.

Explicito, a princípio, que fiz a opção pela expressão ultraliberal, em lugar de neoliberal, por considerá-la mais precisa. O termo neoliberal já foi utilizado, inclusive, para denominar as ideias e políticas econômicas de matriz keynesiana do período entreguerras, vinculadas à implementação de modelos de Estado de bem-estar social ou de economia social de mercado, ainda que, posteriormente, essa concepção tenha caído em desuso. A partir dos anos 1980, o termo neoliberal passou a ser utilizado, como se sabe, em sentido praticamente inverso, ou seja, para denominar as propostas econômico-sociais de Estado mínimo, defesa do livre mercado e da desregulamentação em um período de rápida e intensa globalização. Considero o termo ultraliberal, como já afirmei, mais preciso, pois sintetiza as propostas de um liberalismo acentuado, na era da globalização financeira.

A Atlas Network — think tank legalmente denominado Atlas Economic Research Foundation, sediado em Washington, D.C. — atua, desde 1981, na defesa e propagação de concepções da direita ultraliberal, com organizações parceiras em todos os continentes. Em 2013, o nome da organização foi alterado para Atlas Network, ainda que o nome legal tenha permanecido o mesmo: Atlas Economic Research Foundation. Seu principal idealizador — e fundador — foi Antony Fisher(1915-1988), um empresário britânico defensor das concepções do economista austríaco Friedrich Hayek — assim como, posteriormente, do norte americano Milton Friedman —, que se mudou, na década de 1970, para os Estados Unidos, depois de um período de dois anos no Canadá, em que foi diretor do Fraser Institute, outro think tank ultraliberal. Em 1955, Fisher havia fundado, em Londres, o Institute of Economic Affairs (IEA). É conhecido o fato de que, desde o início dos anos 1960, Margaret Thatcher (Partido Conservador), que viria a ser a primeira-ministra britânica entre 1979 e 1990 — período em que houve um progressivo desmonte do Estado de bem-estar na Grã-Bretanha —, frequentava reuniões no IEA.

Vale lembrar que, no mesmo ano da fundação da Atlas Network, 1981, teve início, nos Estados Unidos, o governo de Ronald Reagan (Partido Republicano), caracterizado pela defesa do livre mercado, desregulamentação da economia, cortes de impostos e redução do orçamento de programas sociais. Em síntese, um programa de enxugamento do Estado, com exceção do orçamento militar, que cresceu significativamente na década de 1980. O governo Reagan (1981-1989), afinado com as concepções ultraliberais, contribuiu significativamente para o fortalecimento da direita norte-americana, não só por sua política econômica, que ficou conhecida como Reaganomics, como pela retomada da corrida armamentista e do discurso anticomunista. Para quem não se lembra, Reagan chamou a ex-União Soviética de “o império do mal”.

Acerca do financiamento da Atlas Network, segundo consta no site, a organização não recebe recursos governamentais, apenas privados: de corporações, fundações ou doações individuais. É registrada como uma organização sem fins lucrativos. Portanto, todas as doações feitas nos Estados Unidos são dedutíveis de impostos. Entre os patrocinadores da Atlas Network, estão os irmãos Koch, bilionários norte-americanos cujas empresas atuam, entre outros setores, com petróleo e gás.

A Atlas Network possui, de acordo com informações contidas em sua página na internet, 465 partners em 95 países. A maior parte dessas organizações está sediada nos Estados Unidos, 168. Em segundo lugar, estão a Europa e a Ásia Central, com 134. E, a seguir, com 79, situam-se a América Latina e o Caribe.

Há organizações com sedes em cidades do México, países centro-americanos e caribenhos como Bahamas, CostaRica, El Salvador,  Guatemala,  Honduras, Jamaica, Panamá e República Dominicana —, além de todos os países da América do Sul continental, com as seguintes exceções: Guiana, Guiana Francesa e Suriname.

Entre os países latino-americanos, aqueles com o maior número de organizações são a Argentina, com doze; Brasil, onze; e Chile, com dez. Em seguida, aparecem na lista o Peru, com oito; Costa Rica e México, cinco em cada um; Bolívia, Uruguai e Venezuela, com quatro em cada país. A Guatemala aparece na lista com três. Equador, El Salvador e República Dominicana, com duas cada um; além das Bahamas, Colômbia, Honduras, Jamaica, Panamá e Paraguai, com uma organização cada. Além das organizações nacionais, aparece como partner da Atlas Network uma organização supranacional, Estudiantes por la Libertad (EsLibertad), que é o ramal latino-americano da estadunidense Students For Liberty (SFL). Com sede em Washington, capital dos Estados Unidos, o SFL realizou seu primeiro congresso em 2008, na Columbia University, em Nova York, e se identifica como “a maior organização estudantil libertária do mundo”. Há, no Brasil, uma organização específica, Estudantes Pela Liberdade, com sede em Belo Horizonte.

Vale registrar que as duas organizações parceiras da Atlas Network sediadas em Porto Rico — com nomes em espanhol: Centro para Renovación Económica, Crecimiento y Excelencia e Fundación Libertad — estão listadas entre as instituições dos Estados Unidos.

Todos os anos, a Atlas Network promove a realização do evento Liberty Forum and Freedom Dinner, que assim é apresentado no site:

A Atlas Network fortalece o movimento mundial pela liberdade, identificando, treinando e apoiando indivíduos com potencial para fundar e desenvolver organizações independentes eficazes que promovam nossa visão em todos os países. […] O Liberty Forum reúne anualmente os campeões da liberdade em uma rede para a troca de ideias e o compartilhamento de estratégias. O jantar de gala [Freedom Dinner] serve como um grand finale apropriado para o evento, celebrando os heróis do movimento pela liberdade e os princípios que os amigos da Atlas Network estão divulgando por todo o mundo.

Sobre os apoios da Atlas Network às organizações parceiras, afirma-se que:

Com recursos modestos disponíveis para subvenções [grants], só podemos financiar uma fração das propostas que recebemos. […] Os subsídios patrocinados pela Atlas Network podem apoiar projetos específicos ou oferecer suporte operacional a organizações parceiras. Este suporte é normalmente concedido em quantidades modestas de 5.000 a 10.000 dólares, e apenas em raras ocasiões irá exceder a 20.000 dólares.

Como poderá ser constatado adiante, no caso brasileiro, as doações, nos anos de 2015 e 2016, excederam em muito os 20.000 dólares.

Nas organizações parceiras da Atlas Network, os “princípios”, “valores” ou “missão” incluem, praticamente sem variações, a defesa da livre iniciativa, do livre mercado, do empreendedorismo, da responsabilidade individual, da propriedade privada, das liberdades individuais, da meritocracia e da limitação de ação dos governos. Algumas dessas organizações visam à capacitação de indivíduos para serem multiplicadores dos seus princípios e, em alguns casos, a formação de lideranças empresariais. Nem sempre perspectivas ultraliberais são explicitadas, ainda que com muita frequência, na maioria das organizações.

Nos sites dessas organizações são citados, frequentemente, os dois maiores expoentes da chamada “Escola Austríaca de Economia”, Ludwig von Mises (1881- 1973) — principalmente seu livro Ação humana: um tratado sobre economia, de 1940 (edição em inglês de 1949) — e Friedrich Hayek (1899-1992), cuja obra mais citada é O caminho da servidão, de 1944. Muito citados também são Ayn Rand e Murray N. Rothbard. Nascida na Rússia czarista em 1905, a romancista e filosofa Ayn Rand é autora, entre outras obras, do romance filosófico Atlas Shrugged, de 1957, publicado no Brasil com o título A revolta de Atlas, em que a autora faz uma defesa enfática do individualismo e da livre concorrência, e um rechaço veemente do modelo de Estado de bem-estar social.

Murray N. Rothbard, por sua vez, ficou conhecido, a partir da década de 1940, por sua defesa do que veio a ser conhecido como “anarcocapitalismo”, isto é, um sistema econômico em que todos os serviços, produtos e espaços seriam privados — tanto por iniciativa individual quanto coletiva — e disputados na livre concorrência, inclusive a segurança pública, a defesa e a justiça. Os defensores dessas ideias individualistas de negação do Estado se autointitulam “libertários anarcocapitalistas”, representantes da “nova direita libertária” e do “libertarianismo”. Rothbard é autor, entre outras obras, de For a New Liberty: The Libertarian Manifesto, cuja primeira edição é de 1973. Obviamente, o sentido da palavra “libertário” não se vincula ao que lhe foi dado, historicamente, pelos movimentos anarquistas, vinculados à luta dos trabalhadores por direitos e melhores condições de vida, mas ao sentido que lhe dá os movimentos ultraliberais, a partir das concepções econômicas da “Escola Austríaca” e da “Escola Econômica de Chicago”, cujo expoente maior é Milton Friedman, ou dos “anarcocapitalistas”.

No site da Atlas Network, há a seguinte explicação sobre a coincidência de nomes entre a organização e o conhecido livro de Ayn Rand, Atlas Shrugged:

O nome não foi derivado do livro. Na verdade, a palavra “Atlas” em nosso nome tem relação com a natureza global do nosso trabalho. E, embora compartilhemos muitos dos valores de livre mercado encontrados no Atlas Shrugged e mantidos pela Atlas Society e Ayn Rand Institute, somos organizações separadas.

Considero, entretanto, ser indiscutível que a popularidade do livro de Ayn Rand e os valores compartilhados fazem com que essa associação seja praticamente inevitável.

O presidente da Atlas Network, desde 1991, é Alejandro Antonio Chafuen, argentino radicado nos Estados Unidos. Conhecido como Alex Chafuen, é, também, fundador e presidente do Conselho do Hispanic American Center For Economic Research (HACER), fundação criada em 1996, com sede em Washington, D.C., que se dedica a promover as ideias ultraliberais na América Hispânica e entre hispano-americanos que vivem nos Estados Unidos.

Chafuen ingressou na Atlas Network em 1985 e trabalhou junto com o fundador, Antony Fisher. Segundo uma consistente matéria da jornalista Marina Amaral, publicada na agência Pública, em 23 de junho de 2015, Chafuen seria ligado à Opus Dei, além de simpatizante do Tea Party, tendência ultraliberal-conservadora dentro do Partido Republicano — ultraliberal na economia e conservadora no que se refere a questões sociais, religiosas e de costumes. Como já mencionado, Chafuen é argentino. Em Buenos Aires, uma das organizações parceiras da Atlas norte-americana é a Fundación Atlas para una Sociedad Libre, fundada em 1998 e também conhecida como Atlas 1853, em referência ao ano de aprovação da Constituição liberal argentina. Em seu site, afirma-se que Atlas 1853 retoma o legado de Juan Bautista Alberdi como inspirador da Constituição de 1853, que permitiu que — em pouco mais de meio século —  o deserto que era a Argentina naquele momento se transformasse no 10º. país com a maior renda per capita do planeta.

Os ultraliberais argentinos de finais do século XX e inícios do XXI retomam, à sua maneira, Alberdi e Sarmiento, em uma releitura do pensamento liberal argentino do século XIX.

As organizações parceiras da Atlas Network no Brasil

No Brasil, as onze organizações que aparecem no site da Atlas Network como parceiras, são as seguintes: três no Rio de Janeiro: Centro Interdisciplinar de Ética e Economia Personalista (CIEEP), Instituto Liberal (IL) e Instituto Millenium (Imil); três em São Paulo: Instituto de Formação de Líderes – São Paulo (IFL-SP), Instituto Liberal de São Paulo (ILISP) e Instituto Ludwig von Mises Brasil (Mises Brasil); duas em Belo Horizonte: Estudantes Pela Liberdade (EPL) e Instituto de Formação de Líderes (IFL); duas em Porto Alegre: Instituto de Estudos Empresariais (IEE) e Instituto Liberdade (IL-RS); e uma em Vitória (ES): Instituto Líderes do Amanhã.

Chama atenção a presença das mesmas pessoas em várias dessas organizações, incluindo empresários — que, com frequência, são patrocinadores desses institutos, ou seja, doadores de recursos, como pessoas físicas ou jurídicas — e os chamados “especialistas”: economistas, jornalistas, cientistas políticos, juristas, “consultores” etc. São pessoas que atuam, ao mesmo tempo, em órgãos de imprensa da mídia corporativa, em geral como colunistas, e nas organizações liberais ou ultraliberais, além de participarem ativamente dos eventos dessas organizações, ministrando palestras, cursos etc. Basta dar uma olhada nas páginas na internet de várias dessas organizações, incluindo o Instituto Millenium — o think tank mais diretamente vinculado às empresas brasileiras de mídia —, para constatar essa recorrência de nomes.

Grande parte dessas organizações ultraliberais latino-americanas são filiadas à Red Liberal de América Latina – RELIAL. A RELIAL foi criada em 2004 e reúne não só think tanks como partidos políticos liberais da América Latina. No caso do Brasil, as organizações filiadas à RELIAL são o Instituto Liberal (IL), criado no Rio de Janeiro em 1983, o Instituto de Estudos Empresariais (IEE) e o Instituto Liberdade (IL-RS). 

O vice-presidente da RELIAL é, segundo consta no site da organização, Ricardo Gomes, que também é membro do Conselho Deliberativo do IEE. No Brasil, também há uma organização que reúne think tanks e demais organizações ultraliberais que atuam no país. É a Rede Liberdade, que assim se apresenta:

Somos a rede nacional de organizações liberais e libertárias, que influencia políticas públicas, por meio de projetos próprios ou de seus membros. A Rede Liberdade coordena os membros, de forma descentralizada, e tem por objetivo potencializar a divulgação e o impacto efetivo, entre os formadores de opinião, de ideias e iniciativas que visem uma menor intervenção estatal na economia e na sociedade.

A Rede Liberdade reúne 28 institutos, além de 20 grupos de estudos ou núcleos, situados em estados de todas as regiões do Brasil. Alguns desses institutos são bastante conhecidos e com atuação em suas cidades há vários anos, como os já citados Instituto de Estudos Empresariais, Instituto Liberal, Instituto Millenium e Estudantes Pela Liberdade. A Rede Liberdade, além das organizações mais estabelecidas e conhecidas, agrega organizações como o Movimento Endireita Brasil (MEB – São Paulo), que participou ativamente, nas redes e nas ruas, da mobilização a favor do impeachment de Dilma Rousseff. A maioria dessas organizações surgiu nos últimos cinco ou dez anos, ainda que algumas delas (IEE ou IL, por exemplo) tenham sido criadas na década de 1980. Ou seja, nos anos dos governos Lula e Dilma houve uma proliferação, no Brasil, de organizações defensoras do Estado mínimo ou do enxugamento do Estado, com maior ou menor estrutura de atuação.

Vale registrar que, em visita ao site da Atlas Network em maio de 2016, verifiquei que havia 76 organizações parceiras na América Latina e Caribe, exatamente uma a mais do que as que constavam no site no dia da minha apresentação no XII Encontro Internacional da ANPHLAC, ocorrida dois meses depois, em 28 de julho. Entre as 76, estava o Movimento Brasil Livre (MBL), que, em julho, não aparecia mais na lista de parceiras. Nada, obviamente, é por acaso. Houve, provavelmente, uma deliberada decisão por ocultar o MBL da lista de partners no período de votação do impeachment da presidente Dilma no Senado.

Existem ligações estreitas, comprovadas, entre brasileiros ultraliberais que lideraram a mobilização pró-impeachment de Dilma — jovens e não tão jovens — com a Atlas Network e outras organizações norte-americanas.

O MBL — que, como se sabe, teve destacada atuação na organização dos atos a favor do impeachment de Dilma — tem origem no Students For Liberty (SFL), fundado em 2008 na Columbia University, que tem como “missão” “empoderar jovens estudantes liberais” ou líderes estudantis “libertários”, e, no ramal do SFL no Brasil, a organização Estudantes Pela Liberdade (EPL), com sede em Belo Horizonte. Em novembro de 2015, foi realizado o Primeiro Congresso Nacional do MBL, ocasião em que foram aprovadas propostas nas áreas da educação, saúde, sustentabilidade, reforma política, economia, Justiça, transporte e urbanismo. Sem espaço para detalhar as propostas, ressalto apenas uma delas: “Fim da função social da propriedade. A propriedade privada não pode ser relativizada.”

O Students For Liberty tem vínculos estreitos com a Atlas Network, que promove programas de treinamento, cursos e apoio financeiro para formar jovens lideranças do “movimento pela liberdade” em todos os continentes.

Farei, a partir dessa parte do texto, algumas breves considerações sobre algumas dessas organizações parceiras da Atlas Network no Brasil.

O Instituto de Estudos Empresariais, sediado em Porto Alegre, foi fundado em 1984 e realiza, anualmente, o Fórum da Liberdade, desde 1988. Entre os patrocinadores, estão o Grupo Gerdau, que também patrocina o Instituto Millenium, o grupo de mídia RBS etc. E há uma parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), em cujo Centro de Eventos é realizado o Fórum da Liberdade. Na 29a edição do Fórum, ocorrida em abril de 2016 no Centro de Eventos PUCRS (CEPUC), o tema escolhido foi “Quem move o mundo?”, inspirado no romance A revolta de Atlas, de Ayn Rand. Um dos principais nomes do evento foi Yaron Brook, presidente do The Ayn Rand Institute (ARI), sediado em Irvine, na Califórnia.

A parceria do Instituto Millenium com a Atlas Network revela os vínculos do think tank norte-americano com a mídia corporativa brasileira. Entre os patrocinadores do Instituto Millenium (Imil), estão os grupos Abril e RBS (filiado à Rede Globo em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul). O Grupo Estado, que publica o jornal O Estado de S. Paulo, aparecia entre os “mantenedores e parceiros” do Imil até 2016.

E, entre os integrantes da “Câmara de Mantenedores”, estão João Roberto Marinho(Grupo Globo) e Nelson Sirotsky (Grupo RBS); empresários do setor financeiro — como Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central de 1999 a 2002, no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso — além de outros empresários de diferentes setores da economia.

Segundo informa o site do Imil, o instituto foi fundado em 2005, com o nome inicial de Instituto da Realidade Nacional, pela economista Patrícia Carlos de Andrade, e oficializado em 2006, durante o Fórum da Liberdade, em Porto Alegre, organizado pelo IEE.

No site do Imil, foi divulgada a realização da 29a edição do Fórum da Liberdade. Na ocasião, o Instituto Millenium informou que, além de ter apoiado a realização do evento, “organizou a edição em português do livro A revolta de Atlas, lançado em 2010 pela editora Arqueiro.” Entre os “especialistas” do Instituto Millenium, além de economistas, cientistas políticos e intelectuais reconhecidos no meio acadêmico, há jornalistas e colunistas que defenderam abertamente o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Um deles é Leandro Narloch, que foi colunista da revista Veja (Grupo Abril) de dezembro de 2014 a novembro de 2016, coincidindo com o período da campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff (sua coluna era intitulada “Caçador de Mitos”) e, desde dezembro de 2016, assina uma coluna na Folha de S. Paulo. Também aparece na lista de “especialistas”, o veterano jornalista José Nêumanne Pinto, colunista de O Estado de S. Paulo (OESP) e, assim como o jornal para o qual trabalha — o que ficou claramente evidenciado pelos editoriais —, foi favorável ao impeachment de Dilma. No dia 10 de março de 2016, foi publicado no site do Imil um artigo de Nêumanne Pinto publicado em OESP no dia anterior — apenas quatro dias antes das grandes manifestações de domingo, 13 de março, a favor do impeachment —, intitulado “O governo contra a lei”, de oposição duríssima à presidente. A certa altura do artigo, Nêumanne faz uma menção elogiosa ao “acordo internacional que incorporou o Brasil ao Primeiro Mundo no combate à corrupção”.

Alguns nomes que apareciam como “especialistas” do Imil em 2016, não aparecem mais na lista em fevereiro de 2017. Entre esses, estão os nomes de Carlos Alberto Sardenberg, Demétrio Magnoli, Denis Rosenfield e Marco Antonio Villa, todos com amplo espaço na mídia. Outros nomes, como Arnaldo Jabor e Reinaldo Azevedo, colaboraram com o Instituto, com artigos e/ou participação em eventos. Pode-se supor que o Imil tenha preferido, para tentar manter sua imagem de uma organização técnica e apartidária, excluir da lista alguns nomes que ficaram muito marcados pela defesa do impeachment de Dilma. Entretanto, permaneceram na lista de “especialistas” nomes como o do economista Rodrigo Constantino e o de Hélio Beltrão, fundador-presidente do Mises Brasil. Enfim, são muitos os colaboradores do Instituto Millenium que tiveram participação ativa no processo de desestabilização do governo de Dilma: economistas liberais com colunas em jornais, empresários favoráveis ao impeachment, jornalistas com espaço na mídia corporativa etc.

No site da Atlas Network, foi publicado um artigo de Rodrigo Constantino, no dia 24 de março de 2016, intitulado: “A corrupção governamental no Brasil apresenta ambos, riscos e oportunidades”. O texto é ilustrado com uma foto da massa vestida de verde e amarelo que participou, em 13 de março, da manifestação a favor do impeachment de Dilma em Brasília. Constantino é apresentado como “presidente do Instituto Liberal e membro-fundador do Instituto Millenium, ambos parceiros da Atlas Network no Brasil”.

Além de contar com o patrocínio de empresas, o Instituto Millenium recebeu, em 2009, a certificação de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), outorgada pelo Ministério da Justiça, o que permite ao Imil receber doações dedutíveis do Imposto de Renda de pessoas jurídicas de até 2%.

É desnecessário expor aqui o papel absolutamente central das grandes empresas de mídia brasileiras na desestabilização do governo de Dilma Rousseff, a partir de junho de 2013 e, particularmente, durante a campanha pelo impeachment da presidente, a partir do início de seu segundo mandato, em 2015.

Vale registrar que, em 2013, integrantes dessas organizações ultraliberais iniciaram sua participação nas manifestações de rua, como demonstra a matéria, já citada, de Marina Amaral. A jornalista entrevistou membros do Movimento Brasil Livre e Vem Pra Rua, que confirmaram o início da participação nos atos de rua em junho de 2013, mas que o problema, naquela ocasião, era a diversidade de pautas. Os entrevistados afirmaram que, somente a partir de março de 2015, puderam colocar suas pautas ultraliberais nas ruas, por exemplo, em cartazes em que se podia ler “Menos Marx, Mais Mises”.

Chama atenção, também, o oportunismo do Movimento Brasil Livre (MBL), que, evidentemente, inspirou-se no nome do Movimento Passe Livre (MPL), que teve grande importância no desencadeamento das manifestações de junho de 2013, em defesa da melhoria e da gratuidade do transporte público, ou seja, uma pauta de esquerda, totalmente contrária à do MBL, que é privatista e defensora do Estado mínimo. Se os integrantes do MBL atuassem como Estudantes Pela Liberdade, a filiação com o Students For Liberty ficaria explícita. Daí, a criação do Movimento Brasil Livre em novembro de 2014, logo depois da reeleição da presidente Dilma.

No site da Atlas Network, há um texto sobre Kim Kataguiri e o Movimento Brasil Livre, publicado no dia 01 de abril de 2015, ou seja, um ano antes da votação pela admissibilidade do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados, ocorrida em 17 de abril de 2016. O artigo tem o seguinte título: “Students For Liberty jogam um importante papel no Movimento Brasil Livre”. Assim o texto apresenta Kataguiri:

À frente do movimento [MBL] está Kim Kataguiri, uma estrela libertária emergente que trabalha com os Estudantes Pela Liberdade (Students For Liberty), partner da Atlas Network. […] Muitos membros do Movimento Brasil Livre passaram pelo principal programa de treinamento da Atlas Network, a Atlas Leadership Academy, e agora estão aplicando o que aprenderam no local onde vivem e trabalham. “A Atlas Leadership Academy oferece diversos treinamentos com foco no desenvolvimento de missões, saber como alcançar seu público e a importância de alcançar impacto”, afirma Cindy Cerquitella, diretora da Atlas Leadership Academy. “Foi emocionante trabalhar com defensores da liberdade no Brasil e em 90 países do mundo, e ainda mais emocionante foi vê-los colocar essas lições em prática”.

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