Como
um brasileiro enxerga a Holanda. "Pescado" no Facebook
Algumas
pessoas idealizam a Holanda como um lugar paradisíaco. Nada mais longe da
verdade; as ‘terras baixas’ não são nenhum paraíso e têm diversos problemas. E
nada, também, comparável ao que acontece com o Brasil e em relação ao resto do
mundo, de uma maneira geral. Por isso, é tão didática (e deliciosa) essa
narrativa de Daniel Duclos, o Daniduc, um ‘brazuca’ que vive por aquelas
bandas.
Limpe você mesmo o seu
banheiro
A
sociedade holandesa tem dois pilares muito claros: liberdade de expressão e
igualdade.
Claro,
quando a teoria entra em prática, vários problemas acontecem. Há censura e
desigualdade, em alguma medida, mas esses ideais servem como Norte na bússola
social holandesa.
Um
porteiro na Holanda não se acha inferior a um gerente. Um instalador de cortinas
tem tanto valor quanto um professor “doutor”. Todos trabalham, levam suas vidas
normalmente e cada profissão é tão digna quanto à outra.
Fora
do expediente nada impede de sentarem-se todos no mesmo bar e tomarem suas Heineken
juntos. Ninguém olha pra baixo e ninguém olha por cima.
A
profissão não define o valor da pessoa, trabalho honesto e duro é trabalho
honesto e duro, seja cavando fossas na rua, seja digitando numa planilha em um
escritório com ar condicionado. Um precisa do outro e todos dependem de todos.
Claro
que profissões mais especializadas pagam mais. A questão não é essa. A questão
é “você ganhar mais porque tem uma profissão especializada não te torna melhor
que ninguém”.
Profissões
especializadas pagam mais, mas não muito mais. Igualdade social significa menor
distância social: todos se encontram no meio. Não há muito baixo, mas também
não há muito alto.
Um
lixeiro não ganha muito menos do que um analista de sistemas. O salário mínimo
é de 1.300 euros por mês. Um bom salário de profissão especializada fica de uns
3.500 a 4.000 euros mensais.
E
ganhar mais do que alguém não torna esse alguém teu subalterno: o porteiro não
toma ordens de você só porque você é gerente de RH. Aliás, ordens são muito mal
vistas. Chegar dando ordens abreviará seu comando.
Todos
ali estão em uma equipe, da qual você faz parte tanto quanto os outros, mesmo
que a sua função dentro do time seja o de tomar decisões.
Esses
conceitos são basicamente inversos aos conceitos da sociedade brasileira,
fundada na profunda desigualdade.
Entre
os brasileiros que aqui vêm para trabalhar e morar é comum, há exceções, estranharem
serem olhados no nível dos olhos por todos. O chefe não te olha de cima e o
garçom não te olha de baixo.
Brasileiros
quando dão ordens ou ignoram socialmente quem tem profissão menos especializada
do que a sua, ficam confusos ao encontrar de volta hostilidade em vez de
subserviência. Ficam ainda mais confusos quando o chefe não dá ordens – o que
fazer, agora?
Descendo do
pedestal
Os
salários pagos para profissões especializadas no Brasil conseguem
tranquilamente contratar ao menos uma faxineira diarista, quando não uma
empregada full time.
Os
salários pagos à mesma profissão na Holanda não são suficientes pra esse luxo e
é preciso limpar o banheiro sem ajuda – e mesmo que pague bem mais do que
pagaria a um ajudante no Brasil, ele não ficará o dia todo a te seguir limpando
cada poeirinha sua, servindo cafezinho.
É
assim: eles vêm, dão uma ajeitada e se mandam para cuidar de suas vidas fora do
trabalho, tanto quanto você.
De
repente, a ficha do que realmente significa igualdade cai: todos se encontram
no meio e, pra quem estava no Brasil na parte de cima, encontrar-se no meio
quer dizer descer de um pedestal que julgavam direito inquestionável, seja por
mérito de ter “estudado mais” ou “meu pai trabalhou duro e saiu do nada” ou
qualquer outra justificativa pra desigualdade.
Porém,
a igualdade social holandesa tem outro efeito que é muito atraente pra quem vem
de uma sociedade profundamente desigual como a do Brasil: a relativa segurança.
Igualdade social
É
inquestionável que a sociedade holandesa é menos violenta do que a brasileira.
Claro que aqui há violência, pessoas são assassinadas, há roubos. Nessa
comparação, “menos violenta” não quer dizer “não violenta”.
O
curioso é que aqueles brasileiros que se queixam amargamente de limpar o
próprio banheiro elogiam incansavelmente a possibilidade de andar à noite sem
medo pelas ruas, sem enxergar a relação entre as duas coisas.
Violência
social não é fruto de pobreza; violência social é colheita da desigualdade
social.
A
sociedade holandesa é relativamente pacífica não porque é rica, não porque é
“primeiro mundo”, não porque os holandeses tenham alguma superioridade moral,
cultural ou genética sobre os brasileiros, mas porque a sociedade deles tem
pouca desigualdade.
Há
uma relação direta entre a classe média holandesa limpar seu próprio banheiro e
poder abrir um MacBook de 1.400 euros no ônibus sem medo.
Vá limpar seu banheiro!
Eu,
pessoalmente, acho excelentes os dois efeitos. Primeiro porque acredito
firmemente que a profissão de alguém não tem qualquer relação com o valor
pessoal. O fato de ter “estudado mais”, ter doutorado ou gerenciar uma equipe
não te torna pessoalmente melhor que ninguém, sinto muito.
Não
enxergo superioridade moral num trabalho honesto sobre outro, não importa qual.
Por trabalho honesto não quero dizer “dentro da lei”, pois não considero
honesto matar, roubar, espalhar veneno, explorar ingenuidade alheia, espalhar
ódio e mentira, não me importa se seja legalizado ou não.
O
quanto você estudou pode te dar direito a um salário maior mas não te torna
superior a quem não tenha estudado – por opção, ou por falta dela. Quem seu pai
é ou foi não quer dizer nada sobre quem você é. E nada, meu amigo, nada te dá o
direito de ser o dono da cocada preta.
Um
doutor que é arrogante e desonesto tem menos valor do que qualquer garçom que
trata direito as pessoas e não trapaceia ninguém. Profissão não tem qualquer
relação com valor pessoal.
Não
gosto mais do que qualquer um de limpar banheiro. Ninguém gosta – nem as
faxineiras no Brasil, obviamente. Também não gosto de ir ao médico fazer
exames. Mas é parte da vida, e um preço que pago pela saúde.
Limpar
o banheiro é um preço a ser pago pela saúde social. E um preço bastante barato,
na verdade.
nunca foi:
ResponderExcluiro que mais tem no Brasil e Gente assim,que se acha ...
nas redes sociais esta cheio delas