segunda-feira, 22 de maio de 2017

Intimidade ou intimidação? Ou tudo foi normal e é institucional?


Min. Gilmar, mais uma vez, com todo respeito, não precisava mexer os pauzinhos nos bastidores para aprovar projeto de abuso de poder!

Por José Herval Sampaio Júnior no Jusbrasil

Agora se fosse um Juiz de 1º grau, como Vossa Excelência agiria?

Quem nos acompanha sabe que não costumo ficar calado com agressões a minha pessoa e muito menos a carreira que abraçamos com tanto amor, contudo, sempre tive a cautela de falar o que penso sem atingir ninguém e de cumprir o Estatuto da Magistratura e em especial o seu Código de Ética, mesmo sendo professor e tendo a ressalva legal em sala de aula, sou e sempre serei comedido.

Entretanto, como disse outrora, paciência tem limite e mais uma vez vou falar com Vossa Excelência, através de um texto, mas não para respondê-lo como no anterior e sim indagá-lo, a partir da confirmação de que as conversas ocorreram e que sinceramente ousarei dizer que não eram institucionais! E muito menos republicanas! 

Será que Vossa Excelência iria aceitar, com a naturalidade que quer que aceitemos, uma conversa desse nível de intimidade, por exemplo, com um vereador influente na cidade que atuamos?

O Senador Aécio Neves conversa com Vossa Excelência com uma intimidade que asseguro lhe dizer, a maioria esmagadora dos mais de 15 mil juízes não têm com qualquer político e os que têm, corretamente, estão alegando suspeição em possíveis processos, coisa que inclusive Vossa Excelência tem restringido muito, mas não nos cabe falar de casos que não temos mais elementos e o referido Código nos impede como Vossa Excelência sabe, ou pelo menos, deveria saber.

E os que não estão fazendo e com todo respeito, continuam a ter toda essa intimidade, devem no nosso entender, serem investigados e não serem considerados de plano como culpados, isso defendo, desde já, ser a saída para seu caso, usando com fundamento as diversas manifestações que Vossa Excelência fez e faz quando acontece caso semelhante que envolve juízes. Mas defendo para o senhor e todos os investigados e acusados, o devido processo legal!

O problema é que Vossa Excelência age com dois pesos e duas medidas!

E ouso dizer que eu e meus colegas de primeiro grau seríamos, talvez, sumariamente punidos em eventual voto de Vossa Excelência, pelo menos, pelas declarações que o senhor vive dando na imprensa, mas não defenderei isso ao seu caso, pois quero, como já disse, que se cumpra a Constituição e as leis reputadas constitucionais pelos meus colegas, como o senhor muito bem nos ensina em seus livros de Direito Constitucional, inclusive muito bons, pois é assim que deve ser. 

Nós juízes, temos a obrigação de sempre fazer valer a Constituição e as leis, tanto para os “amigos” quanto inimigos, mas parece que Vossa Excelência lê outra Constituição quando se trata das pessoas que fala com tanta intimidade e nós não, pelo menos a
maioria, seguimos com uma só, justamente a que o senhor tão bem comenta em seus livros e a aplica quando não tem qualquer relação de intimidade.
Outra pergunta: será que os juízes de primeiro grau teriam a mesma complacência acaso comentassem na imprensa, com tanta liberalidade, como o senhor faz, em casos de colegas do Supremo?

Penso que não, pois nós do primeiro grau somos olhados de cima pra baixo como se diz e tratados como fôssemos culpados em simples inspeções feitas, sem que se leve em consideração a estrutura que dispomos.

Falando em estrutura, o CNJ corretamente normatizou que nós do primeiro grau devemos ser priorizados e Vossa Excelência no TSE expediu uma portaria que pode vir a extinguir quase metade das Zonas Eleitorais de todo o Brasil, sem que se mexesse em nada nos Tribunais, em especial o Superior da qual Vossa Excelência o preside. 

A indicação dos textos supra é justamente para não fugirmos do assunto em tela, mas ainda nos cabe afirmar que se a extinção combatida, na qual tenho certeza que o STF não deixará se operar, tendo a Anamages (Associação Nacional dos Magistrados Estaduais) já intentando ação nesse sentido, viesse a ocorrer, beneficiaria, justamente, muitos políticos que Vossa Excelência conversa com tanta intimidade. 

E olhe que não sou daqueles juízes radicais que não conversam com políticos, pelo contrário, converso quase que diariamente com muitos e tenho até o dever como Diretor do Fórum da Comarca de Mossoró/RN, representando institucionalmente um dos Poderes, mas lhe asseguro que não tenho intimidade alguma para ligar para nenhum vereador e influenciá-lo a votar em dado projeto, pois se assim procedesse, não tenho nenhuma dúvida, que o Vereador com certeza iria ficar tendente a votar nesse sentido, pois quem não quer agradar um Juiz que um dia pode vir a julgá-lo?

Vou parafrasear nosso colega Lênio Streck. Bingo. Vossa Excelência tem um processo na qual o Senador Aécio Neves é acusado, tendo havido recentemente adiamento de sua oitiva, por decisão monocrática de Vossa Excelência.

E aí mais uma pergunta: será que se nós, juízes de primeiro grau, estivéssemos julgando processos envolvendo vereadores ou prefeitos e conversássemos com os mesmos, no mesmo grau de intimidade, que Vossa Excelência conversou com o Senador Aécio e Flexa, poderíamos normalmente continuar no processo, sem nenhuma suspeição?

Penso sinceramente e espero que Vossa Excelência não leve para o lado pessoal, que o senhor daria uma daquelas suas declarações que nos motivou ao primeiro texto citado em que o respondi, pois seríamos trucidados, sem direito a qualquer tipo de defesa e no CNJ, no mínimo, seríamos suspensos, quiçá aposentados, além do processo criminal que iríamos responder.

Entretanto, não estou defendendo isso para Vossa Excelência, pelo contrário, não quero prejulgá-lo e uma coisa é certa, e até advogo em seu favor, o senhor sempre defendeu que a maioria dos juízes abusam da autoridade, logo o pedido que o senhor fez ao senador Flexa, a pedido do senador Aécio, era coerente mesmo com suas posições, só não era e não é com seus colegas, que não mereciam ser tratados por Vossa Excelência como criminosos, eis que o senhor sabe que os possíveis excessos já podem ser punidos com a legislação atual, mas insiste em querer que se aprove um projeto, talvez por outros interesses e aí não serei leviano de acusá-lo, mas sim de nos defender, pois nós, os juízes de primeiro grau, base da magistratura brasileira, não têm esse nível de conversa, regra geral, com os políticos.

E não tem por uma coisa muito simples. Cada qual no seu quadrado.

Não faz sentido algum que um integrante da mais alta Corte do Poder Judiciário fique ligando para senadores da República para influir no mérito de sua votação e nesse caso, segundo o senador Aécio, bastava o senhor ligar e sequer precisava explicar muito porque o senador Flexa não iria entender, mas que acompanhasse o Senador Aécio e depois se fazia uns destaques, tudo de “H” como se diz e o senhor concordou com tudo.

Seria normal a mesma coisa acaso fosse aqui, por exemplo, na cidade de Mossoró com um vereador?

Não, Sr. Ministro, na qual continuarei o respeitando pessoalmente, mas confesso que perdi o glamour com Vossa Excelência, pois mesmo querendo sim, chegar, quem sabe, ao STF um dia ou qualquer outro Tribunal Superior, sendo Ministro, não quero chegar para agir como Vossa Excelência, que mesmo tendo intimidade e talvez isso, por si só, não seja o grande pecado, interfere diretamente na vontade de outro Poder, descumprindo a nossa Constituição, que é mais do que clara no sentido de que as leis não são feitas por Ministros do Supremo Tribunal Federal.
E será que um senador não vai querer votar do jeito que um Ministro do Supremo está pedindo individualmente a ele?

Então, Sr. Ministro, o fato de o senhor ter claramente publicizado que era a favor do projeto de abuso de autoridade, não lhe dava o direito de sair ligando para os Senadores, fazendo valer a força de seu cargo, para que votassem na sua linha, ou melhor na linha do Senador Aécio, porque pelo áudio que o senhor confirmou, só houve concordância total com o pedido do Senador.

Para finalizar eu digo ao senhor e ao Brasil, que tanto pessoalmente quanto institucionalmente, na mesma linha que o senhor confirmou e se defendeu em nota, falo muito, tanto em textos quanto em vídeos, bem como palestras e cursos, mas não me dou ao direito de sair ligando e influenciando os políticos porque sou Juiz e quando fazemos na linha associativa, diferente do senhor que luta contra a sua classe, o faço com o devido respeito que os políticos merecem, pois cada qual tem a sua devida atribuição constitucional.

Sei do risco pessoal que porventura possa ter com este escrito e na realidade o faço consciente, mas aguardo em Vossa Excelência que o veja da forma mais republicana possível, coisa que nesse momento falta à boa parte dos políticos e algumas autoridades, mas que tenho a esperança de que assim haja, pois tão somente penso refletir o pensamento da grande maioria dos juízes de primeiro grau desse país, qual seja, ficaram constrangidos com tal diálogo, pois não reflete nem perto, o nosso dia a dia, nas Comarcas e seções judiciárias de todo o país! 

Que Vossa Excelência possa reconhecer o erro e quem sabe mudar com o tratamento, a nós juízes de primeiro grau, em especial ao povo brasileiro e reflita sobre seus últimos atos, pois sinceramente, uma coisa não tenho a menor dúvida, não tem engrandecido em nada o Poder da qual Vossa Excelência faz parte, pelo contrário, tem nos deixado, perante o povo, em situação bem difícil!

José Herval Sampaio Júnior - um cidadão indignado com a corrupção

Mestre e Doutorando em Direito Constitucional, Especialista em Processo Civil e Penal, Professor da UERN, ESMARN, Coordenador Acadêmico do Curso de Especialização de Direitos Humanos da UERN. Autor de várias obras jurídicas, Juiz de Direito e ex-Juiz Eleitoral.

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