O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar hoje o mérito de
liminares concedidas a unidades da Federação permitindo o pagamento da
dívida com a União por juros não capitalizados. Na avaliação de
especialistas consultados pela Agência Brasil, caso
haja decisão definitiva pelos juros simples, os consumidores terão um
estímulo para entrar na Justiça e contestar o modelo vigente de
cobrança.
O economista Miguel de Oliveira, diretor da Associação
Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), explica que a diferença
entre os juros simples e os compostos, ou capitalizados, é que os
primeiros são sempre aplicados sobre o valor original da dívida. Os
juros capitalizados, por sua vez, são aplicados sobre o montante
corrigido. "Em uma dívida de R$ 1 mil com juro de 1% ao mês, o juro,
que corresponde a R$ 10, vai ser sempre calculado sobre R$ 1 mil. Já o
juro composto vai ser calculado sobre a dívida devidamente corrigida -
por exemplo, sobre R$ 1.010, passado o primeiro mês. Por isso, se diz
que é juro sobre juro".
Oliveira lembra que os juros capitalizados estão amplamente
difundidos na economia doméstica e na de outros países. "Vale para
geladeira, casa própria, financiamento de veículo. Tudo é com juros
compostos. No mundo inteiro é assim que se pratica mas, lá fora, as
taxas são mais baixas", comenta. Na visão dele, justamente por abrir um
precedente, o Supremo não permitirá o cálculo da dívida dos estados
baseado nos juros não capitalizados.
"Se [a decisão] for juros
simples, todo mundo poderia ir à Justiça. É um contrassenso, porque os
próprios estados cobram do contribuinte juros compostos", afirma. Para o
economista, o problema não está na cobrança de juros capitalizados. "O
problema não é se é abusivo [cobrar juros capitalizados]. O problema é
que, como no Brasil as taxas de juros são muito altas, dá uma alteração
grande".
A advogada Maria Inês Dolci, coordenadora institucional
da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), defende que
o cálculo dos juros deve ser transparente e sua aplicação, justa. "A
gente sabe que, hoje, sobre qualquer financiamento para bens, insumos,
serviços, limite de cheque especial, incidem juros compostos. Nós,
consumidores, não temos o conhecimento técnico da sua aplicação. Sabemos
que muitas vezes se tornam abusivos e até ilegais e são as instituições
financeiras que acabam lucrando. Existe também uma súmula do próprio
STF dizendo que é vedada a capitalização de juros", afirma.
A
coordenadora da Proteste refere-se à Súmula 121 do Supremo. No entanto,
alguns juízes entendem que a Súmula 596, publicada posteriormente,
invalida a anterior. O STF também já julgou constitucional a cobrança de
juros compostos em operações de crédito com prazo inferior a um ano, em
decisão de 2015. A decisão da Corte sobre o mérito das liminares
concedidas às unidades da Federação promete trazer mais clareza sobre o
tema.
Segundo estimativa do Ministério da Fazenda, uma decisão do
STF favorável aos juros simples traria um rombo de R$ 402,3 bilhões aos
cofres públicos, levando em conta o estoque da dívida dos estados até
dezembro de 2015. Os estados de Santa Catariana, do Rio Grande do Sul,
de Minas Gerais, Alagoas, Goiás, São Paulo e do Rio de Janeiro estão
entre os que obtiveram liminares que dão o direito a pagar a dívida
calculada por juros não capitalizados sem sofrer sanções da União.
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