Terminou em
tumulto a reunião da comissão especial da Câmara que analisa o pedido de impeachment
da presidenta Dilma Rousseff. Houve bate-boca e um princípio de agressão física
entre deputados. O presidente do colegiado, deputado Rogério Rosso (PSD-DF) foi
acusado de manobrar a reunião a pedido do presidente da Câmara dos Deputados,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para favorecer os parlamentares favoráveis ao impeachment.
A confusão
começou após Rosso encerrar a reunião pouco depois da exposição dos advogados e
autores do pedido de impeachment, Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal, sob a
justificativa de que a pauta de votações no Plenário havia começado e que o
regimento da Casa determinava o encerramento dos trabalhos das comissões.
A atitude
provocou a indignação de deputados que queriam fazer perguntas aos convidados.
Alguns reagiram e acusaram Rosso de quebrar um acordo feito hoje de manhã com
líderes partidários de que a reunião prosseguiria mesmo após a abertura das
votações no Plenário, por se tratar de uma audiência pública. “Líderes e demais
integrantes da comissão terão três minutos para indagações”, disse Rosso após a
reunião que definiu as regras para os depoimentos.
O líder do
PSOL, Ivan Valente (SP), lembrou do acordo e disse que a ordem do dia no
Plenário já havia começado desde as 15h. “Ele [Rosso] prometeu que todos os
líderes e todos os membros da comissão falariam. De repente, ele recebe uma
ordem do Eduardo Cunha e suspende a sessão, cancela a fala dos líderes e de
todos os deputados. Isso é antidemocrático e ele perdeu a palavra. Ele não tem
mais autoridade na presidência dessa comissão”, disse Valente. “É manobra, é
golpe”, criticou.
Em resposta,
Rosso disse que obedeceu as regras da Câmara. “Temos que cumprir o regimento.
Não pode ter funcionamento de comissão enquanto há ordem do dia.”
Durante o
bate-boca, houve um princípio de agressão envolvendo Ivan Valente e o tucano
Caio Nárcio (PSDB-MG), que começaram a se empurrar e tiveram que ser separados.
“Eu me virei para as câmeras para explicar que a reunião podia continuar,
porque a ordem do dia só impede que as comissões deliberem, votem, e o deputado
Caio Nárcio começou a me provocar e gritar atrás de mim”, disse Valente, que
admitiu ter dado “um chega pra lá” em Nárcio.
Para o
deputado Paulo Pimenta (PT-RS), o tumulto poderia ter sido evitado se Rosso
tivesse mantido a reunião. “Na medida em que o presidente faz esse acordo e ele
não cumpre, vários líderes estão inscritos e não falam, ele provoca essa
situação, o que caracteriza o cerceamento da defesa, ele rompe o acordo que
assumiu com os líderes de todas as bancadas e provoca essa instabilidade que
cria essa situação lamentável para o Parlamento, para o Brasil e que não é boa
para ninguém”, disse.
Segundo o
deputado Paulo Teixeira (PT-SP), a manobra serviu para evitar que integrantes
da base aliada pudessem elaborar questões de ordem sobre os trabalhos da
comissão. Desde a abertura da reunião, deputados governistas tentaram
apresentar questões de ordem, mas foram interrompidos por Rosso com a promessa
de que poderiam fazê-lo após as falas dos líderes. “Ele encerrou, rompendo o
acordo que fizemos de que ele [Rosso] receberia a reclamação por não ter
respondido a questão de ordem em relação a ilegalidade do prazo de defesa”,
disse.
A questão
formulada por deputados da base aliada pede que a contagem do prazo para a
defesa de Dilma seja reaberta. Eles argumentam que Dilma deveria ser notificada
novamente a respeito do processo, uma vez que foi retirada da denúncia a parte
relativa à delação premiada do senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS).
Segundo
Teixeira, Rosso evitou receber a reclamação para não ter que responder à questão
de ordem. “Como foi aditado um documento ilegal, ele deveria ter sido
desentranhado e nova notificação deveria ser feita, além da recontagem de
prazo. Formulamos essa questão na primeira reunião da comissão e,
lamentavelmente, esta é mais uma sessão em que ele não responde a essa questão
de ordem”, criticou Teixeira.
O deputado
também disse que a atitude de Rosso prejudicou o equilíbrio e paridade de
forças no embate entre oposicionistas e o governo. “Cinco líderes da oposição
falaram e apenas dois líderes do governo.”
Questionado no
Plenário Cunha reconheceu que geralmente muitas comissões continuam os
trabalhos mesmo após o início das votações principais da Casa, mas disse que o
regimento determina que “em nenhum caso” as comissões podem funcionar
simultaneamente ao Plenário.
Para Teixeira,
apesar da determinação do regimento, o acordo entre os líderes partidários
sustentava a continuidade da reunião. “Isso tudo vai configurando um rito que
atropela a lei. É um rito fora da lei, açodado, e não podemos admitir que um
rito açodado se concretize”, disse.
Acusação
Na exposição de hoje, os autores do pedido de impeachment, Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal, argumentaram que as chamadas pedaladas fiscais são elementos suficientes para que a presidenta Dilma Rousseff seja processada por crime de responsabilidade. Segundo Reale, Dilma feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal ao retardar o repasse de recursos para bancos públicos.
Na exposição de hoje, os autores do pedido de impeachment, Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal, argumentaram que as chamadas pedaladas fiscais são elementos suficientes para que a presidenta Dilma Rousseff seja processada por crime de responsabilidade. Segundo Reale, Dilma feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal ao retardar o repasse de recursos para bancos públicos.
“Foi um
expediente malicioso [as pedaladas] por via do qual foi escondido o déficit
fiscal e foi, por via das pedaladas, que se transformou despesa em superávit
primario. As pedaladas constituem crime e crime grave”, disse Reali Junior
referindo-se aos atrasos de repasses a bancos públicos referentes ao pagamento
de benefícios de programas sociais, como Bolsa Família, seguro-desemprego e
abono salarial.
Janaína disse
que a denúncia está bem caracterizada quanto ao crime de responsabilidade
cometido por Dilma e negou se tratar de uma tentativa de golpe.
“Tenho visto
cartazes com os dizeres de que impeachment sem crime é golpe. Essa frase é
verdadeira. Acontece que estamos diante de um quadro em que sobram crimes de
responsabilidade. Para mim, vítima de golpe somos nós”, disse.
Defesa
do governo
A defesa do
governo na comissão será feita pelo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, e
pelo professor de Direito Tributário da Universidade Estadual do Rio de
Janeiro (UERJ) Ricardo Ribeiro. O governo nega que tenha cometido
irregularidade no atraso do repasse aos bancos públicos, conforme apontou
auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) feita em 2015, com base em
relatórios de 2014.
Segundo o
parecer do TCU, houve – em determinados momentos – diferença no fluxo de caixa
do Tesouro em razão do adiamento de despesas. O objetivo seria melhorar os
resultados fiscais.
Em audiência
na Câmara dos Deputados, no ano passado, Barbosa – que era ministro do
Planejamento na época – disse que é uma questão de “diferença na interpretação
jurídica” de algumas ações financeiras implementadas não só pelo governo da
presidenta Dilma Rousseff como também pelo governo Fernando Henrique Cardoso.
Barbosa
explicou que a implementação de programas sociais depende de agentes financeiros,
que têm de ser remunerados pelos serviços prestados. Eventuais atrasos nos
repasses, lembrou o ministro, não são irregulares. “[Os programas sociais]
dependem, na maior parte, de bancos públicos. Para implementar esses programas,
o governo tem de repassar dinheiro aos agentes prestadores de serviços.
Eventuais atrasos nesses repasses estão previstos em contrato, [situação em que
ocorre o] desequilíbrio de caixa", disse o ministro em maio do ano
passado, durante audiência pública na Comissão de Finanças e Tributação da
Câmara dos Deputados.
Histórico
O pedido de
impeachment da presidenta foi acatado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), no dia 2 de dezembro do ano passado. No documento, os advogados
Helio Bicudo, Janaína Paschoal e Miguel Reale Júnior pedem o afastamento da
presidenta evocando as pedaladas fiscais do ano de 2014 apontadas pelo Tribunal
de Contas da União (TCU).
Os autores do
pedido dizem também que Dilma cometeu crime de responsabilidade ao editar seis
decretos autorizando despesas extras em um cenário de restrição fiscal e ao,
suspostamente, repetir as pedaladas fiscais em 2015, já no exercício deste novo
mandato.
Os decretos,
não numerados assinados pela presidenta em 27 de julho e 20 de agosto de 2015,
autorizaram o governo a gastar R$ 2,5 bilhões a mais do que havia previsto no
Orçamento. Para os advogados, Dilma não poderia criar despesa extra quando
sabia que a meta de superávit primário (dinheiro reservado para pagar os juros
da dívida) prevista no Orçamento não seria cumprida.
O governo
rebate os argumentos, afirmando que as contas do governo de 2015 sequer foram
apreciadas pelo TCU e pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional e
que, portanto, não se pode falar na possibilidade de crime de responsabilidade.
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