terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Governo diverge sobre socorro a distribuidoras

Por Nicola Pamplona
Com o preço da eletricidade chegando a R$ 822,83, as empresas do setor pedem injeção de recursos para enfrentar o impacto em seus balanços

Com o preço da energia no mercado de curto prazo atingindo valores históricos, as distribuidoras brasileiras reforçam ofensiva junto ao governo para conseguir um alívio de caixa até a próxima data de reajuste tarifário. Um novo pacote de socorro, porém, esbarra no esforço Ministério da Fazenda para conter os gastos públicos. Para analistas, o primeiro trimestre de 2014 será difícil para o segmento de distribuição, que tem sido pressionado pela necessidade de comprar energia no mercado spot - que, na última sexta-feira atingiu o preço recorde de R$ 822,83 por megawatt-hora (MWh) - sem repasse imediato ao consumidor.

"O governo está em uma encruzilhada: deixa subir a energia ou prejudica o resultado fiscal", resume Lenon Borges, analista da Ativa Corretora. Na última quinta-feira, representantes do segmento estiveram no Ministério de Minas e Energia (MME) para pedir socorro. Segundo fontes, os argumentos foram bem recebidos pelo ministério, mas há muitas dúvidas sobre a possibilidade de convencer a área financeira a autorizar um pacote de ajuda. No ano passado, as empresas já tomaram um empréstimo do Tesouro, via Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) para suavizar o repasse do custo das térmicas.

A Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) evita comentar o assunto, para não atrapalhar as negociações. Em dezembro do ano passado, já vislumbrando o cenário, o presidente da entidade, Nelson Leite, disse que o nível de "adimplência do setor pode ser comprometido" caso não haja solução. As companhias estão comprando, em média, 3,5 mil MWh no mercado de curto prazo, cujo preço vem sendo pressionado pela falta de chuvas no país - em apenas uma semana, o valor de liquidação dos contratos de energia, chamado Preço de Liquidação de Diferenças (PLD), disparou 70%. O valor é calculado com base em uma fórmula que considera o nível de águas nos reservatórios das hidrelétricas.

As distribuidoras alegam que a situação tem prejudicado a capacidade de investimento e de financiamento das empresas. Um exemplo citado por especialistas é o da Eletropaulo, que teve em junho do ano passado o rating de crédito rebaixado pela agência Fitch diante do alto grau de endividamento. "O rebaixamento dos ratings reflete o enfraquecimento do perfil de crédito da Eletropaulo, que se deve à significativa redução de seu fluxo de caixa das operações", informou a agência, na ocasião, citando a elevação dos custos com compra de energia como uma das causas do problema.

No início do ano, o limite da dívida da empresa, pela relação dívida líquida sobre Ebitda, foi ultrapassado, forçando a companhia a iniciar uma negociação com os credores. A situação da companhia melhorou no terceiro trimestre, graças ao pacote de socorro do governo e um programa de redução de custos. Mas a perspectiva para o primeiro trimestre é negativa novamente. "Como a previsão para fevereiro é de pouca chuva, é provável que tenhamos o PLD elevado por um período", comenta Borges.

Na outra ponta, as empresas geradoras que não aderiram ao programa da renovação automática de concessões têm lucrado com a estiagem. Como não assinaram os contratos de venda de cotas de energia para a distribuidoras, têm vendido eletricidade no mercado de curto prazo a preços altos. Na quinta-feira, já sob os rumores de que o PLD atingiria valores históricos, as ações da Cesp dispararam 4,77% na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Na sexta, o papel manteve o ritmo. Em janeiro, acumula alta de 2,9%, enquanto o Ibovespa caiu 7,51%. 

No último balanço divulgado, referente ao terceiro trimestre, a empresa mostrou um quadro curioso: o volume de energia gerada pela empresa nos nove primeiros meses de 2013 caiu 20,6%, mas a receita com a venda da eletricidade subiu 13,6% no período. Considerando apenas a energia vendida no mercado de curto prazo, houve uma queda de 32,6% no volume gerado, contra alta de 121,2%. No terceiro trimestre, o preço médio da energia vendida pela empresa neste mercado foi de R$ 182,71 por MWh.

O nível de exposição das distribuidoras beneficia ainda Cemig e Copel, que também se recusaram a aderir à proposta do governo para renovação automática das concessões. As companhias, porém, terão de começar a devolver, a partir de 2015, as usinas que operam. "Nada impede que participem dos novos leilões de concessão. Enquanto isso, estão fazendo caixa com a alta dos preços", diz um executivo ligado ao setor. Segundo cálculos do mercado, a transferência de recursos das distribuidoras para as geradoras com a compra de energia a R$ 822,83 no mercado de curto prazo pode chegar a R$ 400 milhões por semana, considerando a exposição do segmento de distribuição no nível atual, de 3,5 mil MWh.

Um novo aporte de recursos ou a revisão extraordinária das tarifas são as duas alternativas apontadas por especialistas para resolver o problema. No início do ano passado, quando a questão do aumento de custos começou a ganhar força, impulsionada pelo aumento do PLD e pelo maior uso de térmicas, a opção do governo foi pelo controle da inflação, injetando recursos públicos nas empresas. Agora, segundo fontes, ainda não há sinalização sobre qual solução será adotada.

Do Brasil Econômico

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