quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Paulo Moreira Leite: EXPLICAÇÃO DE RODRIGO DE GRANDIS É "BISONHA"


Por Paulo Moreira Leite via 247
"Ergueu-se, ao longo de vários anos, um muro de aço contra a apuração de um dos mais prolongados escândalos de corrupção da história política brasileira, formado por 45 inquéritos arquivados sem o devido esclarecimento (sim, 45!)", diz o colunista Paulo Moreira Leite, da revista Istoé, sobre o pedido de investigação contra tucanos feito pela Suíça, mas arquivado numa "pasta errada" pelo procurador; segundo o jornalista, houve o crime de prevaricação

Em sua coluna na revista Istoé, o jornalista Paulo Moreira Leite bateu duro no procurador Rodrigo de Grandis, que, por uma suposta "falha administrativa", permitiu o arquivamento de várias sobre o caso Alstom e o pagamento de propinas a tucanos do PSDB na Suíça. Para ele, houve prevaricação.



Se você acha que fez papel de bobo porque acreditou no slogan “PEC 37= impunidade”, não precisa ficar muito deprimido. Só um pouco.

A descoberta de que o inquérito sobre a Alston foi parcialmente interrompido, na Suíça, porque o procurador Rodrigo de Grandis não atendeu a uma solicitação das autoridades daquele país é um fato que merece um minuto de reflexão.

A explicação de Grandis é bisonha. Ele  não teria dado sequencia ao pedido das autoridades suíças, feito em fevereiro de 2011, porque a solicitação ficou guardada na gaveta errada – e nunca mais pensou no assunto.

Há, é claro, uma suspeita de prevaricação no caso.

Código Penal – Prevaricação (art. 319): Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.

Lei 8429/92 – Art. 11: Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

(…) II – retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;

Há três meses, em 25 de junho, o Congresso rejeitou, sob uma pressão que seria mais conveniente definir como chantagem, a PEC 37, que pretendia  garantir aos delegados de polícia a exclusividade sobre a condução de um inquérito policial. A votação foi um massacre: 430 a 9.

O monopólio dos delegados sobre uma investigação tampouco  era uma boa ideia, quando se recorda o histórico de nossas corporações policiais. Mas a PEC 37 ajudava a fazer um debate necessário e poderia permitir correções úteis.

Nos bastidores de Brasília, policiais, procuradores e representantes do ministério da Justiça tentavam chegar a um acordo, a partir da PEC, para assegurar os direitos da polícia sobre a investigação sem deixar de atender os principais pleitos do Ministério Público. Pensava-se em criar uma nova divisão do trabalho de apuração, mais inteligente e produtiva.

Mas, com o apoio dos meios de comunicação, que passaram a tratar a rejeição à PEC 37 como se fosse como se fosse uma reivindicação tão popular como a redução da passagem de ônibus, o Ministério Público  garantiu a votação em bloco, sem qualquer concessão à outra parte. Confusos, e mesmo acovardados, vários parlamentares preferiam omitir-se e votar errado para não ser criticados pelos jornais nos dias seguintes.

Naquele momento, o procurador geral da República, Roberto Gurgel, travava uma luta de morte para fazer o sucessor. Seu prestígio atingia o ponto máximo em função do julgamento da ação penal 470.

A denúncia ainda não havia sofrido a primeira (e até agora única) derrota, representada pela aceitação dos embargos infringentes para 12 condenados.

Acreditava-se em junho que qualquer arranhão na imagem do Ministério Público poderia chamar a atenção para incongruências e falhas do julgamento. Foi essa a motivação que impediu uma discussão civilizada, com argumentos ponderados. 

Três meses depois, comprova-se uma verdade fácil de reconhecer, mas que não era conveniente admitir.

Enquanto os manifestantes acreditavam estar berrando contra a impunidade em Brasília, o pedido das autoridades suíças era esquecido na gaveta de De Grandis em São Paulo.

Ergueu-se, ao longo de vários anos, um muro de aço contra a apuração de um dos mais prolongados escândalos de corrupção da história política brasileira, formado por 45 inquéritos arquivados sem o devido esclarecimento (sim, 45!). 

Ninguém ficaria sabendo o que estava acontecendo se não fosse o trabalho competente corajoso de meus colegas da IstoÉ Alan Rodrigues, Pedro Marcondes e Sérgio Pardellas sobre o propinoduto, capazes de produzir reportagens à altura dos fatos descobertos.

Não há instituição a salvo de pressões políticas nem de iniciativas estranhas a sua missão legal. Erros ocorrem. Desvios, também. E coisas piores, você sabe.

Se você acha que fez papel de bobo porque acreditou no slogan “PEC 37= impunidade”, não precisa ficar muito deprimido. Só um pouco.

Muita gente está se sentindo da mesma maneira.


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