Sem mudanças, a voz
das ruas voltará a ecoar
Por Mauricio Dias, no site da
Carta Capital
Não houve na
imprensa brasileira foco mais acertado sobre a reação da presidenta em atenção
à voz das ruas. Ele se expressou no diário carioca O Dia, na terça-feira
25. No caminho inverso da motivação que levou à formação de passeatas, o
jornal, de viés popular, ilustrou sua primeira página com a manchete: “Dilma
vai às ruas”.
Os dias
seguintes confirmaram esse caminho inicial, mas no meio do caminho havia
pedras. Muitas pedras. Assim, a presidenta Dilma Rousseff se movimentou nos
limites do cargo e limitada à tese liberal de que é preciso haver ruptura para
a criação de uma Constituinte.
De qualquer
forma, essa mudança no comportamento popular criou uma situação inédita no
País. O povo não foi mobilizado por líderes ou partidos políticos. Rompeu
amarras e decidiu influir. Nesse ponto atingiu a maioridade.
Os
governantes, de alto a baixo, temeram. A polícia, fiel à origem de surrar o
povo inquieto, baixou o pau. Foi forçada, porém, a recuar e aposentar até mesmo
as balas de borracha. Oficialmente, no saldo do conflito, foram presas, em todo
o País, quase mil pessoas. Seriam todos arruaceiros?
No calor dos
acontecimentos, Dilma, tocada pelas cenas transmitidas para o Brasil e para o
mundo, “juntou-se” ao movimento. Anunciou decisões e propôs a formação de uma Constituinte
restrita, no entanto, à tarefa de fazer a reforma política.
A presidenta
foi freada. Recuou e não avançou. Tinha condições políticas adequadas de propor
ao Congresso a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva e
escolhida paralelamente à eleição presidencial de 2014. Já então distanciada do
calor dos acontecimentos.
“Sem a
plenitude da participação do povo, o governo não será nunca um governo
constitucional, mas governo de fato, dissimulado em aparências constitucionais
ou sem essas aparências”, diz o jurista e historiador Raymundo Faoro, em Assembleia
Constituinte – A legitimidade recuperada.
Faoro desfez o
mito resgatado agora e, de novo, no tabuleiro das decisões. O mito sustenta que
as constituintes devem seguir-se necessariamente a rupturas. É uma mentira
histórica para “quem conhece alguma coisa da história contemporânea”. Assim
Faoro espicaça os analistas contemporâneos.
“A
Constituinte dissolvida em 1823 foi convocada em 3 de junho de 1822, portanto,
antes da Independência, exatamente para organizar o berço em que esta deveria
nascer (...) A Constituinte eleita em 2 de dezembro de 1945 foi convocada por
Getúlio Vargas em 28 de fevereiro do mesmo ano, ainda vigente o Estado Novo...”
No movimento
das ruas não se projeta uma revolução. Há uma aspiração por mudanças profundas
descoladas do processo político fraudulento e viciado.
Esse
sentimento guia o barulho das multidões nas ruas e o silêncio dos que ainda não
se manifestam. Por ora, talvez possam sufocar os anseios. Sem mudanças
profundas, no entanto, haverá uma próxima vez. Eles voltarão.
Injustiça
Se houvesse no País um prêmio por demérito, o ministro José Eduardo Cardozo, da Justiça, levaria o troféu. Ele resiste a homologar a anistia de 190 funcionários do Arsenal de Marinha, no Rio de Janeiro. Punidos na ditadura, a Comissão de Anistia reconheceu o direito deles a uma indenização.
Se houvesse no País um prêmio por demérito, o ministro José Eduardo Cardozo, da Justiça, levaria o troféu. Ele resiste a homologar a anistia de 190 funcionários do Arsenal de Marinha, no Rio de Janeiro. Punidos na ditadura, a Comissão de Anistia reconheceu o direito deles a uma indenização.
Parece que o
ministro não se preocupa com os habitantes do Brasil de baixo.
Aonde vais,
Joaquim?
O canal fechado GloboNews abriu espaço para a entrevista de 40 minutos do ministro Joaquim Barbosa, após encontro dele com a presidenta Dilma Rousseff.
Barbosa tem
sido testado em pesquisas como candidato a presidente e declarou na ocasião que
os partidos políticos brasileiros estão falidos.
Na
oportunidade, pregou a criação de candidatos avulsos a todos os cargos.
Coincidência ou descuido planejado, ministro?
O inimigo mora ao lado
Manifestantes
acampados perto da casa do governador Sérgio Cabral, no Leblon, zona sul do
Rio, não sabem que, ao lado, habita Jérôme Valcke, secretário-geral da Fifa, um
dos alvos do movimento.
Ocupa um
apartamento de mil metros quadrados, que pertencia ao empresário John
Casablancas, da Elite Model.
Hoje, o imóvel
é de Ronaldo Fenômeno. Ele entrega por uma bagatela em torno de 40 milhões de
reais.
Nau de Cabral I
Sérgio Cabral
(PMDB), governador do Rio, quer a cabeça do senador Lindberg Farias (PT) a
qualquer preço. Lindberg, eleito senador em 2010, pretende disputar o
governo estadual em 2014, rompendo uma aliança de oito anos com Cabral.
Pesquisa Vox
Populi mostra que o petista, com 23,5% das intenções de voto, tem grande
vantagem sobre o candidato de Cabral, o vice-governador Luiz Fernando Pezão,
com 9,1%.
Mas quem puxa
a corrida é o ex-governador Anthony Garotinho, com 26,3%. Ele faz o papel de
“coelho”, que sai na largada e abandona a corrida.
Nau de Cabral II
A tabela de
rejeição mostra que, até agora, são poucas as chances de Pezão, o candidato do
governador. Pezão, pouco conhecido na capital e na Baixada Fluminense, onde se concentram
70% dos votos do estado, tem 5,5% de rejeição.
Garotinho, ex-governador,
lidera a lista dos rejeitados com 21%. Cabral ameaça, da boca para fora, deixar
Dilma sem palanque no Rio de Janeiro.
O petista
Lindberg é hoje o favorito. Além do bom porcentual de intenção de voto, tem
baixo índice de rejeição (3,8%).
Provocar
não ofende
O cientista
político Wanderley Guilherme dos Santos mete o dedo na ferida:
“Em momentos
de crise e de tensão, propostas de reforma política sempre foram
diversionistas. Se os políticos brasileiros estão desmoralizados, de que país
seriam importados candidatos íntegros à assembleia reformista?”
Demagogia hedionda
Transformar
corrupção em crime hediondo é forçar uma homenagem da virtude à
hipocrisia. Pode ser que a lei pegue bagrinhos. Nunca pegará tubarões.
Essa reação é similar àquela que vê a pena de morte e a redução da idade penal
como ações eficazes contra a violência.
A demagogia,
para iludir o clamor das ruas, devia ser crime hediondo.
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Dag Vulpi