quarta-feira, 19 de junho de 2013

Militares punidos na ditadura militar criticam anistia

Em sessão conjunta, a Comissão Nacional da Verdade e a Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro ouviram hoje (18) cinco militares da reserva que foram perseguidos, presos e torturados por resistir ao golpe de 1964.
O comandante da Marinha, Ferro Costa - que participou do gabinete do almirante Paulo Mário, o último Ministro da Marinha do governo de João Goulart - foi preso e cassado após o golpe. Ele contou que a resistência à ditadura militar já ocorria antes do Ato Institucional 5 (AI-5), de 1968.
“Ficou cristalizada a ideia de que esse golpe foi uma salvação da democracia. Nunca se salva uma democracia com um golpe, é uma contradição. Além disso, [diziam] que nós éramos inimigos do Brasil, que os inimigos eram os comunistas, os legalistas, quando o verdadeiro inimigo do Brasil, que eles [governo militar] não combateram e que nós queríamos combater, era a miséria, o atraso e a desigualdade que grande parte do povo brasileiro estava mergulhada”.

Para ele, a anistia, concedida em 1979, beneficiou apenas os militares “criminosos, torturadores e assassinos” do próprio regime e foi uma farsa. “Os marinheiros foram massacrados porque não tinham família aqui. É preciso mostrar à exaustão os fatos. A anistia foi outra fraude, nós não merecíamos anistia, porque nós não éramos criminosos. Os verdadeiros anistiados foram os criminosos que mataram e esconderam corpos. Nós temos que ser reparados. Os militares legalistas [os que resistiram à ditadura] ficaram esquecidos”.
Outro militar que falou às comissões foi o coronel do Exército Bolívar Meirelles, que servia em Goiânia quando foi preso. De família tradicional do movimento de esquerda, foi um dos primeiros militares a ser cassado e depois atuou pela anistia na Associação dos Militares Cassados (Amic) e Associação Democrática e Nacionalista dos Militares do Rio de Janeiro (Adnam). É autor da dissertação Conflitos Políticos e Ideológicos das Forças Armadas entre 1945 – 1964.
“Eu acho importante para o Brasil, vir à tona esses torturadores, esses golpistas, serem nominados para que isso não aconteça mais no Brasil. Que a juventude tenha uma paz de sossego para poder amar, trabalhar, estudar, e jamais uma moça ser estuprada em um quartel, ser torturada, nem um homem também”.
Também prestaram depoimento hoje o coronel do Exército Ivan Proença, que era capitão e abortou uma missão com  o objetivo de massacrar estudantes; o marinheiro Antônio Duarte, que participou da resistência armada; e o marinheiro Oswaldo Araújo, que fez parte das mobilizações antes de 1964 e atuou na resistência ao golpe.
Membro da Comissão Estadual da Verdade, Eny Moreira, explica que o trabalho tem sido importante para ouvir a versão de quem estava nas Forças Armadas na ocasião do Golpe de 1964.
“É importante que a história registre que havia, mesmo naquela época, no ceio das Forças Armadas, militares dignos e honrados que se colocaram contra o golpe, que se colocaram em uma posição de não aceite à tirania”, disse.
Consultor do grupo de trabalho Perseguição a Militares da comissão nacional, o professor Paulo Cunha afirma que, proporcionalmente, os militares foram o grupo mais atingido pela perseguição da ditadura militar. “Então, são milhares de praças, centenas de oficiais, e um dado ainda não devidamente contabilizado, temos também dezenas, talvez centenas de policiais militares pelos estados. Uma parte deles já faleceu, outros estão literalmente desaparecidos, sem contato há muito tempo. Então, nós temos feito vários depoimentos, para nos aproximarmos de uma amostragem segura para a primeira parte desse trabalho”.
O trabalho do grupo começou com uma audiência pública, no dia 4 de maio, quando a Comissão Nacional da Verdade ouviu outros militares vítimas da ditadura. Durante a semana, mais militares que passaram pela mesma situação serão ouvidos em sessões reservadas.

Militares perseguidos pela ditadura dizem que até hoje não foram completamente anistiados

Militares perseguidos pela ditadura militar deram hoje (4) depoimentos à Comissão Nacional da Verdade (CNV), em audiência pública na cidade do Rio de Janeiro. Entre os depoimentos de seis pessoas ouvidas hoje, o tom era de insatisfação com a aplicação da anistia aos militares punidos pelo regime de exceção que prevaleceu no país entre 1964 e 1985.
Os depoimentos ressaltaram que os militares punidos pela ditadura não tiveram a mesma anistia que aqueles que integraram o regime. As dificuldades vão da garantia de pensão para esposas e filhas até a possibilidade de ascender às patentes que companheiros de farda contemporâneos fiéis à ditadura conseguiram.
Além disso, eles reclamam que as Forças Armadas continuam tratando-os de forma diferenciada, como se fossem militares de segunda classe. “Continuamos discriminados e punidos. Não querem nos deixar voltar à condição de militar. Até hoje somos rotulados e mal recebidos nos quartéis. Você é olhado com desconfiança. Eles estão nos humilhando”, disse o capitão de mar e guerra Luiz Carlos de Souza Moreira.
Expulso da Marinha, quando era capitão-tenente em 1964, por trabalhar com almirantes leais ao então presidente da República João Goulart, Moreira disse esperar uma anistia completa, assim como os militares que permaneceram nas Forças Armadas. “Eu quero uma anistia ampla, geral e irrestrita como tiveram os torturadores”, ressaltou.
Para Paulo Cunha, consultor da Comissão Nacional da Verdade, a anistia deveria apagar o passado desses militares, mas não é o que ocorre. “Eles ainda são vistos como párias, como pessoas não muito bem-vistas. Muitos deles não têm nem herdeiros para deixar [pensões]. Eles só querem o reconhecimento de um direito”, declarou. A posição do Ministério da Defesa é não comentar sobre o assunto.
A audiência pública de hoje também serviu para que alguns militares fornecessem informações sobre episódios antes e durante a ditadura militar de 1964, como a chamada Operação Mosquito. A ação visava a impedir a posse de João Goulart como presidente da República depois da renúncia de Jânio Quadros, em 1961.
Segundo relato do coronel-aviador Roberto Baere, o plano era impedir que o avião que trazia Jango de Porto Alegre para Brasília, chegasse à capital federal. O então tenente do 1º Grupamento de Aviação de Caça da Base Aérea de Santa Cruz disse ter recebido ordens do comandante da base, tenente-coronel Paulo Costa (já morto), para preparar os caças a fim de abater o avião do vice-presidente.
Baere disse que ele e três colegas se recusaram a cumprir a missão e pediram para não ser incluídos nos planos de derrubada da aeronave. “Pedimos que ele não nos escalasse porque entramos nas Forças Armadas para defender a Constituição e não para agredi-la”, declarou.
A decisão de um jovem oficial de pouco menos de 30 anos de idade, segundo ele, foi o motivo para a expulsão da Força Aérea três anos depois, já durante a ditadura militar. “Fui sumariamente expulso, após 50 dias de prisão incomunicável, policiado na porta por um oficial portando metralhadora, como se fosse um marginal de alta periculosidade”, disse o coronel.
O suboficial Paulo Novais Coutinho foi expulso por se recusar a cumprir uma ordem superior, que, se levada a cabo, provavelmente ocasionaria um massacre. O então fuzileiro naval disse que, em 25 de março de 1964, foi enviado ao Sindicato dos Metalúrgicos, no centro da cidade, para dispersar uma reunião da Associação de Marinheiros e Fuzileiros Navais, considerada ilegal pelo comando da Marinha.
“O Conselho do Almirantado determinou que os fuzileiros navais fossem reprimir a manifestação. Eu era da companhia de polícia, então fomos, um pelotão de 39 homens, para reprimi-la. Lá, a assembleia estava em sessão em apoio ao presidente constitucional do país, João Goulart. Ao recebermos uma ordem [dos superiores] para evacuar a reunião a qualquer preço. Isso resultaria em um massacre. Então, botamos a metralhadora no chão, entramos no sindicato e apoiamos o movimento”, relatou o suboficial.
Segundo ele, sua atitude lhe rendeu a expulsão do Corpo de Fuzileiros Navais e oito meses de prisão. Ele disse que ficou incomunicável por sete meses e chegou a ficar detido por 30 dias no porão de um navio adernado.
Agencia Brasil

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