Tramita
perante o Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional 37 de 2011
(PEC 37), na qual se propõe emendar o texto constitucional para acrescentar o
parágrafo 10º, ao seu artigo 144, com a disposição de que a apuração das
infrações penais seja incumbência, privativa, das Polícias Federal e Civis dos
estados e do Distrito Federal.
Com a PEC 37,
como é notório, se está a tentar evitar que o Ministério Público possa
investigar diretamente as infrações penais, visando, assim, corrigir abusos, a
ponto de contar com o apoio do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB).
Inúmeros
juristas, particularmente, invulgares criminalistas de grande renome estão a
cerrar fileira em defesa da PEC 37, fundados no ponto comum de coibir esses
abusos.
Entretanto, o Parquet,
além de suas corregedorias, ainda está subordinado constitucionalmente ao
controle externo do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que atua em
prol do cidadão para coibir qualquer tipo de abuso do MP e de seus membros.
Formado por 14
conselheiros, que representam diversos setores da sociedade, o CNMP é composto
por quatro integrantes do MPU, três membros do MPE, dois juízes, indicados um
pelo Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior Tribunal de Justiça, dois
advogados, indicados pelo Conselho Federal da OAB, e dois cidadãos de notável
saber jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados e
outro pelo Senado Federal.
Aliás, antes
da posse no CNMP, os nomes de seus conselheiros são apreciados pela Comissão de
Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), do Senado Federal, vão ao plenário
do Senado e seguem para a sanção do presidente da República.
Em
decorrência, o sistema constitucional já prevê o canal competente de coibição
dos abusos do MP, logo, está a soar que o alcance e o objetivo da PEC 37 vai
além deste propósito, que, com todo respeito, julgo panfletário.
É sabido que a
atual Constituição Federal é o espelho da democratização nacional,
representando uma ruptura com o sistema constitucional anterior, tanto que é
considerada pelos estudiosos do Direito como fruto do poder constituinte
originário.
A
democratização brasileira conquistou-se pela quebra e equalização do gigantismo
do Poder Executivo, que, no sistema anterior, tolhia severamente os Poderes
Legislativo e Judiciário. Basta lembrar dos Atos Institucionais.
Foi, então,
pela consolidação dos Poderes Legislativo e Judiciário que o Brasil de hoje
passou a ser democrático e, no caso do Poder Judiciário, esta ocorreu por meio
do fortalecimento das instituições judiciárias constituídas — a advocacia, a
magistratura e o Ministério Público — daí que são expressamente reconhecidas e
consagradas na Constituição Federal.
Via de
consequência, pelo atual sistema constitucional da separação de Poderes, os
Poderes Executivo e Legislativo não controlam o Poder Judiciário, porque suas
instituições constituídas são autônomas e independentes, de modo que a
advocacia, a magistratura e o Ministério Público não se vergam aos demais
poderes da República, muito menos aos seus governantes.
Nesta
perspectiva, qualquer tentativa de esvaziar as instituições judiciárias
constituídas é uma ação tendente de apequenar o Poder Judiciário e afronta o
equilíbrio do sistema da separação constitucional de Poderes.
No caso da PEC
37 é o que está a acontecer, tendo em vista que, ao pretender mutilar as
atribuições de investigação criminal direta por parte do MP, se está a atentar
contra o próprio Poder Judiciário, uma vez que se mitiga o nível do respectivo
acesso das Ações Penais e o pronunciamento pela Justiça das devidas
responsabilidades criminais.
Até porque, de
outro lado, a estrutura legal e institucional das Polícias Federal e Civis as
colocam sob o controle do Poder Executivo e seus governantes, independentemente
da boa vontade dos respeitáveis policiais, de maneira que o governo irá
controlar as investigações criminais e, consequentemente, a elucidação dos
elementos aptos a autorizar o ajuizamento das ações penais, prejudicando o
acesso ao Poder Judiciário e controlando sua capacidade de julgamento dos
crimes.
Portanto, no
caso de aprovação da PEC 37, haverá por parte do Poder Executivo o inaceitável
controle de acesso das ações penais ao Poder Judiciário; que, tragicamente,
propicia um ambiente fértil à corrupção, peculato e todas as demais condutas de
delinquência por parte dos agentes do próprio governo, o qual controla a
Polícia.
A aprovação
desta PEC direciona o Brasil, a passos largos, para o retrocesso democrático e,
até mesmo, a uma odiosa ditadura. Nossos vizinhos — a Argentina, Venezuela e
Bolívia — a propósito, já estão neste triste caminho e não podemos permitir que
o nosso país siga essa lamentável rota.
No entanto, a
solução está alojada na própria Constituição Federal do Brasil, posto que, nos
termos de seu artigo 60, inciso III, não será objeto de deliberação a proposta
de emenda tendente a abolir a separação dos Poderes, remetendo-se à inexorável
conclusão de que a PEC 37 é inconstitucional.
Ricardo
Sayeg é advogado, professor livre-docente da PUC-SP e vice-presidente
da Fadesp — Federação das Associações de Advogados do Estado de São Paulo.
Revista Consultor
Jurídico
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