Por Emir
Sader, no sítio Carta
Maior:
A crise atual
do capitalismo, além de confirmar, de maneira inequívoca, o caráter antissocial
desse tipo de sociedade, coloca desafios que a esquerda não se tem mostrado à
altura de enfrentar. Quando, na Europa – o berço da esquerda, como a conhecemos
até agora –, a crise não tem levado ao fortalecimento da esquerda –
revolucionária, radical ou até mesmo reformista –, mas o da extrema-direita,
temos a dimensão da incapacidade da esquerda de se erigir como alternativa de
massas ao capitalismo em crise.
Em alguns países, a esquerda predominante – socialdemocrata, que já havia
aderido a modalidades do neoliberalismo – aplica políticas de austeridade e é
derrotada – como são os casos da Espanha e de Portugal –, correntes radicais da
esquerda não avançam, enfim, todas são derrotadas. Mesmo quando chegam a
avançar – como agora na Espanha ou na Grécia –, não têm força suficiente para
se erigir como alternativa, ou porque sozinhas não têm maioria ou porque não
conseguem organizar um bloco de forças que possa se tornar hegemônico – também
pela ojeriza a alianças políticas.
Mesmo na América Latina, a esquerda ter sido de novo derrotada no México, um
país despedaçado entre décadas de governos neoliberais, violência do
narcotráfico, corrupção, é uma derrota de proporções. Mas nem por isso se vê um
balanço autocrítico da esquerda. Quando o país começa a enfrentar, tristemente,
outros seis anos de governos de direita, em que o retorno do PRI sucede ao
fracasso de dois mandatos do PAN, ao invés de alternativas de esquerda, o tom
das manifestações é ainda o da denúncia dos governos da direita, sem a
correspondente análise de por que a esquerda não conseguiu, nesses anos todos,
se erigir como força hegemônica – mais além das reiteradas e justas denúncias
das fraudes eleitorais.
Da mesma forma, o alerta dos resultados eleitorais apertados na Venezuela tem
que ser respondido com a denúncia dos planos da direita – não se pode esperar
outra coisa de uma direita que já tentou um golpe e é apoiada abertamente por
Washington. Mas também tem de ser acompanhada do balanço da perda de apoio do
governo, dos erros que levaram a isso e das formas de retificar e avançar.
Às vezes a esquerda – especialmente seus setores mais radicais, partidários e
intelectuais – não tomam as derrotas da esquerda como suas derrotas. A culpa é
do “reformismo”, da “traição” de outras forças, das manobras da direita etc.,
etc. Mas por que as radicais não crescem, não aparecem como alternativas?
Em parte, porque se limitam às criticas, às denúncias, em parte porque muitas
vezes recaem no receituário liberal, de concentrar suas denúncias nos temas da
corrupção – atitude típica no México e no Brasil –, ao invés de centrar as
denúncias e a construção de alternativas na luta contra o neoliberalismo e pela
sua superação.
Quem analisa o cenário mundial, com a prolongada e profunda crise do
capitalismo – especialmente no seu centro, mas em tantos outros países, de que
o México é um exemplo latino-americano –, poderia esperar um fortalecimento da
esquerda – radical ou moderada. É uma grave derrota da esquerda perder uma
oportunidade como essa crise mundial do capitalismo para aparecer como
alternativa – antineoliberal ou anticapitalista.
Nesse cenário se deve valorizar ainda mais os passos dados por governos
latino-americanos para superar os neoliberais, com modalidades mais moderadas
ou mais radicais, mas suficientes para que esses países não tenham entrado em
recessão e tenham continuado a avançar no combate à desigualdade, à miséria e à
pobreza, mesmo em meio à crise internacional e seus reflexos em cada país.
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