Uma conversa que o escritor
americano Jonathan Safran Foer teve, aos 9 anos de idade, com a babá mudaria
seus hábitos alimentares. No livro Comer Animais ele conta que estava
com “a boca cheia de galinha” quando a babá se recusou a comer e disse que não
queria machucar animais. “Você sabe que galinha é galinha, não sabe?”,
perguntou ela. Saber ele sabia, mas só mais tarde começou a pensar nisso e
parou de comer carne.
Com a obra, Foer conseguiu adeptos para o
vegetarianismo no mundo. Além disso, chamou a atenção para algo que não está em
nenhuma embalagem de produto de origem animal: o sofrimento ali embutido. O
modo de criação dos animais até o abate estaria relacionado com a qualidade do
alimento que vai para a mesa. O interesse pelo assunto cresce no Brasil e o
bem-estar animal passa a ser uma das exigências dos consumidores.
De acordo com o Conselho Federal de Medicina
Veterinária, o mercado que dá prioridade ao bem-estar animal ainda é pequeno e
desconhecido. Faltam produtores que sigam regras de bem-estar animal, faltam
normas que regulamentem o setor e falta conhecimento dos consumidores. Mas uma pesquisa
da veterinária Carla Molento, membro da Comissão de Ética, Bioética e Bem-Estar
Animal do Conselho Federal de Medicina Veterinária, mostra que quando conhecem
o sistema de produção intensivo os consumidores se tornam mais exigentes.
Carla Molento consultou 481 pessoas que
faziam compras em supermercados em Curitiba, perguntando o que levavam em conta
ao comprar frango. Em um primeiro momento, apenas 3,7% disseram se preocupar
com o bem-estar animal. No entanto, quando viram fotos do sistema produtivo, o
percentual subiu para 24,1%. A pesquisa mostrou que 70,9% dos consumidores
pagariam mais por produtos com certificação de bem-estar animal, carne firme e
rosada.
“Intensifica-se a criação com o intuito de
aumentar a produção, colocando mais animais em uma área muito pequena. Isso
cria animais com múltiplos problemas de saúde. O objetivo é ter muita carne com
o menor custo possível. Boa parte desse custo está sendo paga pelo animal”, diz
a pesquisadora.
Segundo ela, a produção intensiva, mais
praticada no Brasil para aves e suínos, tem mais de 40 anos e acaba se
tornando mais competitiva no mercado. Um produto que valoriza o bem-estar
animal custa cerca de 30% a 70% mais caro e, em alguns casos, o preço pode
dobrar, comparado a produtos similares.
As normas que regem o setor também são
falhas. A Instrução Normativa nº 3/2000 aprovou o Regulamento Técnico de
Métodos de Insensibilização para Abate Humanitário de Animais de Açougue. Pelo
regulamento, todos os estabelecimentos industriais fornecedores de carne para
açougue devem sedar os animais antes do abate.
Além dessa norma, as demais tratam de
aspectos sanitários, de vacinação, de regras para o ambiente de criação. Não há
na legislação brasileira normas específicas que visem ao bem-estar, o que torna
subjetiva a fiscalização e até mesmo a certificação dos produtos que chegam ao
consumidor.
No Brasil, existe apenas uma certificadora, a
filial da francesa Ecocert, que segue as normas da Humane Farm Animal
Care (Hfac), certificadora norte americana. A empresa tem apenas cinco clientes
na área animal contra 5 mil produtores de orgânicos certificados. Segundo o
diretor-geral da empresa, Luiz Mazzon, o número de clientes não vem crescendo.
“Muita gente pergunta, mas não temos um aumento no pedido de certificações”. O
movimento é mais forte na Europa e nos Estados Unidos, países compradores de
carne brasileira.
Segundo o Ministério de Agricultura, Pecuária
e Abastecimento, o Brasil lidera o ranking de maior exportador de
carne bovina do mundo desde 2008, e as estatísticas mostram crescimento de
2,15% ao ano para os próximos anos. O país também lidera a exportação de
frango, com crescimento previsto de 4,22% ao ano. Em carne suína, o país é o
quarto maior exportador.
Para atender aos mercados mais exigentes, o
país adotou o abate humanitário, mas tanto Mazzon quanto Carla Molento
acreditam que o bem-estar deve ter maior destaque para que o país mantenha as
exportações nos próximos anos.
Agência Brasil
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