Brasília - O juiz
espanhol Baltasar Garzón, conhecido por ter expedido mandado de prisão contra o
ex-presidente chileno Augusto Pinochet, disse hoje (10) que a corrupção e a
impunidade são questões diretamente relacionadas, que se retroalimentam e
viabilizam a execução de crimes contra a humanidade. Garzón ainda defendeu que
a corrupção seja tratada como crime internacional pelo Tribunal Penal
Internacional (TPI) e que a cooperação judicial entre os países seja mais
efetiva, sem a possibilidade de negação de execução judicial por questões
políticas - o que, segundo ele, contribui para que atividades corruptas fiquem
impunes.
O juiz espanhol participou de debate sobre o papel da sociedade no
combate à corrupção na 15ª Conferência Internacional Anticorrupção. A
participação do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Carlos
Ayres Britto, estava prevista, mas foi cancelada. No final do dia, o ministro
chefe da Controladoria-Geral da União (CGU), Jorge Hage, deverá encerrar a
conferência, que aprovará uma declaração sobre o tema.
De acordo com o juiz Garzón, durante muitos anos, impunidade e
corrupção foram temas tratados de forma dissociada. Investigações conduzidas
mundialmente, no entanto, mostram que o aproveitamento econômico e a obtenção
de fundos viabilizados pela corrupção financiam crimes contra a humanidade,
crimes de guerra e genocídio - os três crimes tipificados pelo Estatuto de
Roma, que criou o Tribunal Penal Internacional, em 2002, a única corte
internacional que tem competência para julgar e condenar pessoas por essas
violações. Por outro lado, a comunicação entre as instâncias
internacionais e os tribunais nacionais não é eficiente, o que dificulta as
investigações e a aplicação de penas.
Isso, segundo o juiz, deve ser investigado no sentido de se
avaliar se as autoridades judiciais e políticas são perseguidas por corruptores
ou têm colaboração com os atos de corrupção.
Para essa avaliação, Garzón defendeu a ampla participação da
sociedade civil organizada e da imprensa internacional, que, segundo ele, deve
ser ampla e sistematicamente protegida. O juiz disse que atentados contra a
imprensa devem ser catalogados como crime contra a humanidade - pois seriam
óbices à obtenção de informações e, consequentemente, empecilhos ao combate à
corrupção e à impunidade.
Segundo Garzón, o TPI deve abrir espaço para que seja feita uma
relação entre as causas e as consequências econômicas dos diferentes delitos. O
juiz deu os exemplos dos crimes cometidos na Líbia e no Quênia, recentemente
tratados pela corte, nos quais ele avalia haver fundamental origem econômica.
Ele elogiou as políticas brasileiras de combate à fome e à pobreza como forma
de atenuar esse tipo de motivação.
Baltasar Garzón também defendeu a jurisdição universal para o
tratamento dos crimes previstos pelo TPI. Jurisdição universal é um princípio
do direito internacional em que os Estados teriam o poder de julgar
e condenar pessoas independentemente do local onde o crime foi cometido ou
da nacionalidade do infrator. Em geral, para uma corte exercer jurisdição sobre
um indivíduo, deve haver relação entre a pessoa em questão ou o local onde o
crime foi cometido e a Justiça responsável pelo julgamento.
Em fevereiro deste ano, Garzón foi condenado pela Justiça
espanhola a 11 anos de afastamento da profissão por abuso de autoridade. O juiz
ainda é processado em outros casos relacionados aos períodos militares na
Espanha e em países da América Latina. Desde que foi impedido de exercer a
profissão, Garzón tem atuado como defensor dos direitos humanos e de outras
questões sociais.
Carolina Sarres - Agência Brasil
- Edição: Carolina Pimentel
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