Postagem Dag Vulpi 03/06/2011
Por Polêmico
Sábado, 21 de maio, Centro de São Paulo. A Marcha da Maconha, proibida pela Justiça, vai às ruas e é reprimida pela polícia.
“Não adianta querer tratar um debate de ideias com porrada. A gente não vai aceitar, a gente vai continuar”, argumenta o jornalista Júlio Delmanto.
As vozes pela descriminalização, ou até pela liberação da maconha, estão ganhando apoio de peso. O líder do PT na Câmara dos Deputados, Paulo Teixeira, já defendeu publicamente até a formação de cooperativas para o plantio de maconha.
E agora o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, prestes a completar 80 anos, conduz um documentário que defende a descriminalização do uso de drogas e a regulação do uso da maconha.
Por que o presidente resolveu meter a mão nesse vespeiro? “Porque é um vespeiro. As pessoas não tem coragem de quebrar o tabu e dizer: vamos discutir a questão”, diz Fernando Henrique Cardoso.
No filme “Quebrando o tabu”, que estreia nesta semana, Fernando Henrique Cardoso e ex-presidentes do México, Ernesto Zedillo; da Colômbia, César Gaviria; e dos Estados Unidos, Jimmy Carter e Bill Clinton reconhecem: falharam em suas políticas de combate às drogas.
Perguntado sobre o motivo pelo qual não foi implementado em seu governo, Fernando Henrique Cardos responde: “Primeiro porque eu não tinha a consciência que tenho hoje. Segundo que eu também achava que a repressão era o caminho”.
Todos concluem que a guerra mundial contra as drogas, iniciada há 40 anos, é uma guerra fracassada. Bilhões de dólares são gastos no mundo inteiro, mas o consumo cresce, e cresce o poder do tráfico, espalhando a violência. As armas constantemente recolhidas dos traficantes no Rio de Janeiro são a prova de que a polícia trabalha enxugando gelo. É preciso ir além das apreensões de drogas e do combate aos traficantes.
“Um ponto central é questionar a lógica de guerra, não é defender o uso da droga. É apenas dizer: ‘vamos ver, vamos pensar se não existem jeitos mais inteligentes e mais eficientes de lidar com esse assunto’”, diz o diretor do filme Fernando Gronstein Andrade.
No Brasil, a maconha é a droga mais difundida. Consumida por 80% dos usuários de drogas; 5% da população adulta. Mas é inofensiva a ponto de ser legalizada?
“Não há droga inofensiva. Qualquer coisa depende da dose, da sensibilidade do indivíduo. Agora, entre as drogas usadas sem finalidade médica para fins de divertimento, para fins de recreação, a maconha é bastante segura”, afirma Elisaldo Carlini,médico da Unifesp especializado em drogas.
Palavra de quem há mais de 40 anos estuda a questão e trata dependentes. O professor Elisaldo Carlini representa o Brasil nas comissões de drogas da Organização Mundial da Saúde (OMS) e das Nações Unidas.
“Defendo totalmente a descriminalização”, diz Carlini.
“Eu sou contra porque quanto mais fácil você tornar a droga disponível na sociedade, maior será o consumo”, defende o psiquiatra da Unifesp Ronaldo Laranjeira.
O professor Ronaldo Laranjeira trata de dependentes químicos há 35 anos. “Ela é uma droga perigosa. Um dos principais exemplos é que 10% de todos os adolescentes menores de 15 anos que experimentam com a maconha vão ter um quadro psicótico”, afirma.
Na lista das drogas mais perigosas publicada na revista médica “Lancet”, respeitada no mundo inteiro, a maconha aparece em 11º lugar, bem atrás do álcool e até mesmo do cigarro, que são vendidos legalmente.
“Álcool é mais letal do que maconha. Não se diz isso, mas é. Pelo menos os dados mostram isso. Então, temos que discutir e diferenciar, regular o que pode e o que não pode”, defende o ex-presidente Fernando Henrique.
Regular não é o mesmo que legalizar. E foi isso que Fernando Henrique Cardoso descobriu indo para a Holanda. Lá a maconha é vendida em cafés. Mas o governo não legalizou o uso indiscriminado. Funciona assim: a regulamentação determina que você não pode consumir nas ruas, nem vender fora dos cafés; nos locais determinados, fuma-se maconha sem repressão policial.
“Na Holanda é muito interessante. Os meninos de colégio – eu conversei com eles – não têm curiosidade pela maconha, porque é livre”, garante Fernando Henrique Cardoso.
O consumo de maconha é tolerado e, mesmo assim, vem caindo. Desde 2006, a lei brasileira já trocou a prisão por penas alternativas para quem é pego com drogas e considerado usuário, não traficante. Mas que quantidade de drogas, que situação caracteriza o tráfico? Isso a lei deixa a critério do juiz.
É uma linha difícil de estabelecer. Como o doutor Drauzio Varella explica no documentário: “Como a droga é criminalizada, é um crime você possuir a droga, não vão dez pessoas comprar se uma pode comprar e dividir entre as dez. E o menino que usa droga percebe que, dessa maneira, também se ele vender um pouquinho mais caro, a dele sai de graça”, argumenta o médico no filme.
Nesse caso, o usuário vira traficante e acaba na prisão, onde, como se sabe, a droga circula facilmente.
Em Portugal, o consumo de entorpecentes não dá mais cadeia desde 2001. Mas há uma penalidade: o usuário tem que fazer tratamento médico e prestar serviço social.
“A maior parte dos que usam drogas quer sair dessa situação. E a existência de um caminho que não os leve à cadeia, mas que leve ao tratamento, é positiva”, ressalta Fernando Henrique.
O ministro da Saúde de Portugal explica que dez anos depois o tratamento é gratuito para dependência em todo tipo de droga – da maconha ao crack.
“Dez anos depois, o que nós vemos? Os nossos jovens consomem menos drogas ilícitas”, revela o ministro.
“Eu não vejo nenhum sentido em criminalizar o uso e a posse dessas drogas todas. É um caso de saúde, não é um caso de polícia”, avalia Elisaldo Carlini.
Mas qual é a estrutura que o Brasil tem hoje para tratar seus dependentes?
“Essas pessoas ficam perambulando pelo sistema de saúde ou perambulando, literalmente, pelas ruas, no caso dos usuários de crack. E você fica desassistindo ativamente essa população”, comenta Ronaldo Laranjeira.
O Ministério da Saúde já fez as contas do que falta para tratar dependentes químicos: 3,5 mil leitos hospitalares, 900 casas de acolhimento e 150 consultórios de rua, para chegar às cracolândias, por exemplo. Mas a previsão é atingir essa meta só em 2014.
“Como ministro da Saúde, tenho opinião como ministro. Exatamente isso: nós do Sistema Único de Saúde (SUS) precisamos reorganizar essa rede e ampliá-la rede para acolher usuários de drogas, sejam lícitas ou ilícitas”, afirma Alexandre Padilha.
Na Suíça e na Holanda, existem os projetos chamados de redução de danos: dependentes de drogas pesadas, como heroína, recebem do governo a droga e agulhas limpas.
“É terrível ver isso. Mas você vê também que ali está um doente, não um criminoso”, constata Fernando Henrique Cardoso.
Triste, mas é essa redução de danos que evita a transmissão de doenças infecciosas, mortes por overdose e a ligação dos usuários com o crime.
“Eu não estou pregando isso para o Brasil, porque a situação é diferente, o nível de cultura, riqueza e violência é diferente. Cada país tem que buscar seu caminho. É isso que eu acho fundamental. Quebrar o tabu, começar a discutir e ver o que nos fazemos com a droga”, diz Fernando Henrique Cardoso.
Ouvindo um ex-usuário famoso, o documentário dá uma pista: campanhas de prevenção abertas e honestas podem funcionar.
“O grande perigo da droga é que ela mata a coisa mais importante que você vai precisar na vida: o seu poder de decidir. A única coisa que você tem na sua vida é o seu poder de decisão. Você quer isso ou quer aquilo? Seja aberto, seja honesto. Realmente, a droga é fantástica, você vai gostar. Mas cuidado, porque você não vai poder decidir mais nada. Basta isso”, alerta o escritor Paulo Coelho.
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Um senhor de quase 80 anos aparece tranquilamente no Fantástico ao lado da turma que enrola e queima baseados em um dos pontos legalizados de venda de maconha em Amsterdã, capital da Holanda. Dias antes, é filmado com as mãos grudadas em líderes tucanos que se engalfinhavam pelo comando do partido. As duas cenas não deixam dúvidas: o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) voltou a fazer fumaça na política nacional.
O ápice do retorno de FHC ao centro dos espaços de poder será visto a partir de hoje, quando estreia o documentário Quebrando o Tabu. Nele, o tucano vira protagonista da ala dos que defendem a descriminalização do uso de seu quase xará TCH, princípio ativo da maconha. Grupo que inclui os ex-presidentes Jimmy Carter e Bill Clinton (EUA), César Gaviria (Colômbia) e Ernesto Zedillo (México), além do médico Drauzio Varela e do escritor Paulo Coelho.
Na noite de segunda-feira, após a exibição do documentário à imprensa em São Paulo, o cineasta brasileiro Fernando Grostein Andrade garantiu que a escolha de FHC como personagem condutor do longa-metragem não teve intenção de dar visibilidade política ao ex-presidente. Apesar de Andrade, irmão do apresentador Luciano Huck, ser declaradamente eleitor do PSDB.
Contudo, ao segurar a vidraça de um tema polêmico, FHC montou uma vitrine e tanto. No domingo passado, foi o personagem principal de uma matéria de quase nove minutos no Fantástico, da Rede Globo. No dia seguinte, a maconha era um dos assuntos mais debatidos no Twitter. De um lado, os que, como ele, defendem que droga é caso de saúde pública. Do outro, os que preferem a repressão policial.
Holofotes
Ao encabeçar o debate, o ex-presidente passou a semana com alta cotação na mídia. Grandes veículos da imprensa nacional e internacional deram destaque às reflexões do líder tucano, puxados pelo burburinho em torno do documentário. Anteontem, reviveu seus dias de celebridade mundial em Nova York, na apresentação do relatório da Comissão Global de Política sobre Drogas, da qual é presidente.
A entidade que reúne 19 luminares - entre os quais o escritor Mario Vargas Llosa, o ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, e o bilionário americano Richard Bronson - defendeu a descriminalização do uso de drogas, especialmente a maconha, para enfraquecer o crime organizado.
Simpatia De quebra, FHC ganhou elogios de políticos da base aliada do governo Dilma Rousseff. A exemplo do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que defende plantações caseiras para usuários. Ontem, a Comissão de Assuntos Sociais do Senado aprovou convite, feito pela senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS), para que ele debata o assunto na Casa.
Para o pesquisador e professor titular da Ufba Wilson Gomes, especialista nos estudos em comunicação e política, FHC abocanhou espaço em meio à crise que permeia os líderes dos partidos apeados do poder após o início da era PT. “A oposição vive um momento em que lhe falta repertório, e tem dificuldades de chancelar protagonistas. Isso talvez seja a melhor explicação para sua volta à cena”, analisa.
A bandeira pró-descriminalização da maconha, porém, é apenas uma das frentes que turbinaram a recente visibilidade de FHC. Nos últimos meses, o ex-presidente voltou com força à atividade partidária. Em abril, publicou um artigo no qual dispara críticas ao papel da oposição, sobretudo, por ter perdido a conexão com o eleitorado.
Com isso, reassumiu o papel de guru da aliança antipetista, ao definir os alvos para evitar uma derrota em 2014: foco na nova classe média, a volta do corpo a corpo com a população e uso das redes sociais - em especial Facebook, Twitter e Orkut - como lacuna a ser aproveitada. As críticas repercutiram bastante na imprensa e entre os líderes oposicionistas. A maioria deles entendeu que era o conselho certo a seguir.
“FHC resolveu assumir com vigor a tarefa de dar um rumo e sanar as fissuras da oposição, sobretudo do seu partido. O que lhe deu poder para ganhar espaço”, avalia o pesquisador Gilberto Wildberger, professor e pesquisador das relações entre mídia e poder da Faculdade de Comunicação da Ufba.
Um exemplo do aumento da musculatura do ex-presidente ocorreu semana passada, quando evitou que a guerra entre o senador mineiro Aécio Neves e o ex-governador paulista José Serra rachasse o PSDB. Sábado passado, uniu as asas tucanas na convenção nacional do partido. E, com isso, evitou outro tipo de fumaça.
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