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Brasil
Tornar
as empresas terceirizadas mais qualificadas com a nova legislação, sancionada
nessa sexta-feira (31) pelo presidente Michel Temer, é uma das apostas de
especialistas ao analisar o tema. Para os críticos da lei, no entanto, direitos
trabalhistas ficarão prejudicados.
Após a sanção do texto, empresários da área não esperam uma migração “em massa” das contratações diretas para a prestação de serviços a terceiros, e sim uma formalização nos setores que já contratam dessa forma. A falta de detalhamento da legislação, porém, pode dar margem a ações na Justiça, contrariando a tese de que traria mais segurança jurídica às empresas.
Em
2014, havia 12,5 milhões de vínculos ativos nas áreas tipicamente terceirizadas
e 35,6 milhões de trabalhadores contratados diretamente, número que tende a se
inverter, de acordo com os contrários ao texto. Já os representantes da
indústria e do comércio creditam à necessidade de contratação, à modernização
do Estado e à maior produtividade os benefícios da nova lei.
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Relator do projeto, o deputado
Laércio Oliveira (SD-SE) acredita que os trabalhadores ficarão mais protegidos
porque as empresas contratantes serão responsáveis “subsidiárias” pelas obrigações
trabalhistas. “Nenhuma empresa pública
nem privada vai terceirizar todas as suas atividades. Isso não vai ocorrer em
hipótese alguma. O mercado vai se autorregular a tal ponto de não terceirizar
tudo”, afirma.
O parlamentar explica que a
terceirização não envolve diretamente as pessoas, e sim a prestação de serviços
que podem ser oferecidos por empresas especializadas. “De repente, o hospital quer terceirizar o serviço de enfermagem, porque
existem empresas no Brasil que só trabalham com isso. A empresa prestadora
disponibiliza para aquele cliente a mão de obra especializada na área. Essa
diferenciação é importante para entender o projeto”.
As
mudanças permitem a contratação de trabalhadores para exercer cargos em todas
as áreas da empresa, inclusive na atividade-fim. Além disso, a contratação
poderá ocorrer de forma irrestrita em empresas privadas e na administração
pública. Atualmente, não existe uma legislação específica sobre a
terceirização, mas decisões judiciais têm permitido a terceirização apenas para
as chamadas atividades-meio, ou seja, funções secundárias que não estão
diretamente ligadas ao objetivo principal da empresa, como serviços de limpeza,
vigilância e manutenção.
Concursos públicos
De
acordo com o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do
Trabalho (Anamatra), Germano Siqueira, as carreiras de Estado não correm o
risco de ser terceirizadas. Ele avalia, no entanto, que pode haver menos cargos
destinados a concursos públicos. “Carreiras
de apoio já são, hoje em dia, terceirizadas. Então, a possibilidade de ampliar
a terceirização nessas funções é muito efetiva. Com isso, há não só o risco de
precarização, mas a possibilidade de haver clientelismo político, nepotismo.”
Ele
cita como exemplo, além dos enfermeiros, o próprio corpo médico de um hospital.
“Eu não tenho a menor dúvida de que vai
diminuir a quantidade de cargos destinados a concursos públicos. Nas escolas,
isso pode acontecer com os professores. Uma companhia aérea pode terceirizar
todo o seu corpo de pilotagem, na medida em que não há um limite. Mas, acho que
tudo isso são matérias que os magistrados vão interpretar e examinar, para ver
o real limite da lei”, prevê.
No ensino, a preocupação de especialistas é quanto ao
aumento das chamadas Organizações Sociais, que são contratadas em alguns
estados para cuidar da administração de escolas.
Direitos
Para
o subprocurador-geral do Ministério Público do Trabalho (MPT), Ricardo José
Macedo de Britto Pereira, a maior rotatividade dos trabalhadores pode
comprometer a concessão de benefícios básicos, como décimo terceiro salário e
férias. “O problema é que toda vez que
você coloca um intermediário na relação de trabalho, haverá a tentativa de
explorar para ter ganho maior. A empresa que faz intermediação [terceirizada]
também quer ganhar. Além disso, não há nenhuma garantia de que o empregador não
dispense o seu empregado direto e o contrate em seguida em uma empresa
prestadora de serviços. A lei não previu isso. Agora tem esse risco, o que é
muito ruim”, observa Pereira.
Segundo
ele, outro ponto negativo é a permissão de empresas com capital social muito
baixo. De acordo com a nova lei, empresas com até dez empregados deverão ter
capital mínimo de R$ 10 mil. “São
pequenas empresas que não terão o cuidado necessário com o ambiente do
trabalho, e isso só vai confirmar dados de que a terceirização causa o adoecimento
no trabalho, alto grau de acidentes, violação de vários direitos”, enumera.
Para
o representante do MPT, órgão que anteriormente havia divulgado uma nota
técnica solicitando o veto, a lei “não
traz direitos”, apenas uma “liberação
geral no campo das relações de trabalho”. Ele acredita que as “diversas interpretações” da legislação
darão espaço a questionamentos no Poder Judiciário, tanto na Justiça do
Trabalho quanto no Supremo Tribunal Federal (STF). Além do caso analisado esta
semana no STF, que tirou a responsabilidade da administração pública em passivos trabalhistas, outros recursos relativos à terceirização
tramitam na corte.
Divulgado
em março, estudo feito pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e
Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra que os trabalhadores terceirizados recebem salários entre 23% e 27% mais
baixos, têm uma jornada maior e ficam durante menos tempo na empresa.
Com
base em dados do Ministério do Trabalho e na Classificação Nacional de
Atividades Econômicas, o estudo comparou
informações registradas entre 2007 e 2014. Mostrou também que a rotatividade
dos terceirizados e o afastamento por acidente de trabalho são maiores que
entre os contratados diretamente.
Segurança jurídica
“Acredito que está havendo um pavor
desnecessário nessa questão, porque não é possível você ter uma modalidade de
contrato terceirizado hoje, que vem a ser os serviços especializados, no
sentido de trazer alguma insegurança. Pelo contrário, é para dar segurança de
proteção ao trabalhador que presta serviços para essas empresas terceirizadas”,
contrapõe o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira. Ele também avalia que a
nova legislação não vai acabar com os concursos públicos, pois atualmente já
existem categorias que atuam em determinados órgãos, como o próprio Judiciário.
Para Vander Morales, presidente da Federação Nacional dos Sindicatos de Empresas de Recursos Humanos (Fenaserhtt), que reúne 32 mil empresas e cerca de 2,5 milhões de trabalhadores na área, em todo o Brasil, muitas empresas exercerão no Brasil algum tipo de terceirização especializada. "Isso vai ser bom para o mercado, para o próprio trabalhador. Pode resultar em maiores salários. A rotatividade vai até diminuir, porque hoje há uma insegurança. Alguns contratos são interrompidos por falta de clareza na lei. Haverá um compromisso maior do trabalhador com a empresa e elas passarão por uma qualificação maior. Essa é a mudança imediata”, diz Morales.
“Geralmente, as empresas terceirizadas não
cumprem todos os seus deveres. Terminam o contrato e deixam de pagar verbas
rescisórias e trabalhistas”, afirma o presidente da Anamatra. Na opinião de
Germano Siqueira, a insegurança jurídica deve permanecer porque a lei tem
brechas.
Ele não concorda com a ideia de que o país está atrasado ao aprovar somente agora mudanças que podem ser um ponto de partida para revolucionar o mundo do trabalho. “Na verdade, atrasados estão aqueles que querem fazer uma terceirização que corta direitos", avalia Siqueira.
De
acordo com o presidente da Fenaserhtt, o número de empresas terceirizadas pode
aumentar, já que surgirão novas tendências. “Muitas profissões de hoje vão desaparecer. O Brasil tem que mirar no
futuro do trabalho. Como é que isso está acontecendo no mundo, com tantas
pessoas precisando trabalhar? Precisamos desenvolver formas. Não precisamos
ficar amarrados a um único modelo”, analisa.
Sancionada
com três vetos pelo presidente Michel Temer, a nova
lei, que trata também do trabalho temporário, foi publicada em edição extra do Diário
Oficial da União de ontem (31).
O presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra, sinalizou que o STF deve ser chamado a se pronunciar sobre a polêmica.
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