segunda-feira, 4 de julho de 2011

Preocupações com a reforma política?



A interrogação no título do texto é por minha conta, na publicação original, o ex-ministro José Dirceu, tenta mostrar preocupações com a reforma política.

Vamos ler e tentar entender a preocupação do Zé Dirceu, isso, caso realmente ocorra algum tipo de reforma na política.

 Diz ele:
“Os debates sobre a reforma política têm gerado preocupações, com sérios riscos de se transformar em retrocesso. Isso se deve aos inúmeros interesses em jogo e aos muitos cálculos político-eleitorais de curto prazo. Mas há também uma perda em relação ao conceito de reforma que buscamos.

Queremos valorizar a figura do candidato ou os programas dos partidos? Como aproximar o eleitor do partido e do processo eleitoral? Como delimitar a influência do poder econômico nas eleições? São questões para organizar o debate.

Infelizmente, as últimas ações foram de dispersão. A Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou texto que proíbe a coligação proporcional e que convoca consulta popular sobre voto em lista ou no candidato. O trabalho no Senado tem sido sobre o voto proporcional e não sobre o voto majoritário ou outras questões relativas à Casa. 

Além disso, há meses, aventa-se criar o “distritão” — 
uma deturpação do modelo de voto distrital. Se, no voto distrital, criam-se zonas eleitorais que restringem o número possível de candidatos ao Legislativo por grupo de cidades, o “distritão” faria cada Estado virar um grande distrito. Essa “saída” fere os princípios da proporcionalidade e da soberania do voto. 

Na Câmara, a reforma parece ter saído da agenda. Enquanto isso, ganha corpo a campanha contra o voto em lista, com o PTB à frente, inclusive usando seu horário televisivo. Isso sem ao menos esclarecer o que representa esse avanço, quais os países que adotam esse modelo, os prós e os contras. 

Não se esclarece, por exemplo, que fixar o voto no partido estimula que cada legenda apresente com mais clareza e detalhes suas propostas, valorizando a escolha pelas ideias. O voto em lista é uma forma de combater o poder dos grandes grupos econômicos que financiam campanhas e abafam o verdadeiro debate político. 
Não há mobilização. Vivenciamos uma superficialidade no debate e um elevado nível de desinteresse em levar a reforma adiante.  

A gravidade da situação nos obriga a resgatar as reflexões que estamos deixando de lado. Precisamos debelar a ideia de “distritão”, bem como a do fim do voto obrigatório. Mas precisamos, primeiro, recuperar o sentido maior da reforma política. 

O momento, portanto, é de reorganização das forças que querem melhorar o atual sistema político-eleitoral e partidário. Fidelidade partidária, financiamento público de campanha e voto proporcional e obrigatório, independentemente se será em lista ou distrital misto, são temas a se enfrentar. Ao PT, cabe a grande responsabilidade de reconduzir esse debate aos trilhos que interessam à sociedade”.

José Dirceu, 65, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT
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Digo eu:
Já que o Zé perguntou, darei a minha opinião!

- Quem está preocupado com a reforma política? Os políticos? Desculpem-me, mas, não é esta a impressão que eles estão passando. Na verdade eles estão mais uma vez empurrando com a barriga, e tudo leva a crer que, mais uma vez ela não sai. 

- Essa de valorizar a figura do candidato ou do partido é fácil, particularmente não estou nenhum pouco preocupado com a figura dos candidatos. Aliás, os próprios candidatos nunca se preocuparam com suas próprias figuras, porque nós haveríamos de nos preocupar?

- A idéia de votar nos programas do partido, é outra balela. Quantos partidos teriam programas de governo, de forma a contemplar o anseio do povo?

Outra coisa Zé, os programas dos partidos, caso eles realmente existam seriam para os mandatos do executivo. No caso específico do sistema de votos em lista fechada os candidatos serão do legislativo, em todos os âmbitos, sejam eles municipais, estaduais ou federal. Ou seja, não existe programa de governo para deputados e vereadores, os seus projetos deverão ser pessoais. Cada município e estado possuem as suas peculiaridades e suas carências, ninguém melhor que o político que convive nestes redutos para saber das suas deficiências e prioridades.

Quem nos garantiria que os programas apresentados pelo partido seriam tocados pelos candidatos por estes indicados, afinal para o candidato o eleito foi ele, ele quem “correu” atrás dos votos, ainda que tente vincular o mandato á legenda, isso nunca irá ocorrer de fato, os candidatos continuarão a serem os donos dos mandatos, ou alguém duvida disso.

Outra questão legal, digamos que um candidato se eleja nos moldes da proposta de reforma política defendida principalmente, mas, não somente pelo PT, onde seria adotado o sistema de voto em lista fechada. Neste caso os partidos indicariam os nomes, e os eleitores elegerão as propostas do partido. Subentende-se que o mandato é do partido, e é realmente isso que os partidos defendem. O candidato não será eleito, porém assumirá o mandato por ter sido indicado. Em sendo o mandato do partido, e no caso de haver improbidade administrativa, quem será levado a juízo, o partido ou o cidadão que está cumprindo o mandato?

Tentar delimitar a influência do poder econômico nas eleições desculpe-me Zé, mas, é utopia, não haverá reforma política que conseguirá tirar o poder de o candidato se beneficiar do poder econômico. As compras de votos na maioria das vezes são feitos ao longo dos mandatos, e não somente durante o período das eleições. Existem candidatos que tomam conta de redutos (currais) eleitorais, bancando os times de futebol, distribuindo cestas básicas, colaborando nas festinhas da comunidade, bancando aquele churrasquinho prá rapaziada, conseguindo uma vaguinha para um aqui e outro ali e eticetera e tal. E isso não acabará nunca, porque infelizmente já faz parte da cultura de um povo que já se acostumou a trocar seu voto a troco de benesses. 

Reforma política democrática para garantir a governabilidade



A presidente Dilma Rousseff mandou e o controvertível ministro dos Transportes Alfredo Nascimento, um dos caciques do não menos controvertível PR, obedeceu incontinenti: afastou autoridades de segundo escalão do seu ministério, acusadas de atos ilícitos. A presidente também deu mostras de insatisfação com os injustificáveis aumentos e aditamentos nos valores de algumas obras do PAC, aos cuidados do referido ministério.
Semanas antes, a presidente, com a mesma autoridade, mostrou ao seu então principal ministro, Antonio Palocci , que a porta da rua é serventia da casa, aplacando assim uma grave crise política que tinha acometido seu governo na metade do primeiro ano do mandato. Não podia a credibilidade do governo manter-se de pé numa situação em que o principal articulador político e administrativo das ações governamentais não conseguira responder a contento acusações de enriquecimento ilícito obtido por meio de tráfico de influência.
Nos dois episódios, a presidente mostrou que não é tão neófita em política como pretendem seus críticos na oposição e na mídia. Fez valer a autoridade presidencial e engrandeceu-se perante a sociedade brasileira como governante que não transige com o ilícito e o errado.
Os impasses da situação política brasileira e da governabilidade nada têm a ver com o perfil pessoal nem com déficit de autoridade da mandatária, mas com o desconchavo e as perversões do próprio sistema político e da base de sustentação do governo. As traficâncias de Palocci e o propinoduto do Ministério dos Transportes da dupla Alfredo Nascimento/Waldemar Costa Neto ocorreram dentro da base governista.
A semana passada foi marcada por episódios nada edificantes relacionados com os chamados restos a pagar das emendas dos parlamentares ao orçamento União. Depois de idas e vindas, a presidente ordenou que seus auxiliares estabelecessem um cronograma para a liquidação destes restos, que são recursos federais oriundos de emendas parlamentares ainda não pagas a estados

Votar a reforma política é homenagear Itamar, diz Marco Maia


Foto Reprodução
Segundo Maia, Itamar defendeu, ao longo dos últimos anos, a necessidade de renovar as instituições políticas e partidárias do País
Foto: Fernando Borges/Terra

O presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), afirmou neste domingo, durante o velório do ex-presidente da República e ex-senador Itamar Franco, que a votação da reforma política pelo Congresso Nacional, ainda neste ano, será uma forma de homenagear o ex-governador mineiro. Itamar defendeu, ao longo dos últimos anos, a necessidade de renovar as instituições políticas e partidárias do País.
"Itamar estava engajado nesse tema no Senado, participando ativamente da comissão criada para tratar do assunto, e abordava isso em todas suas entrevistas. Ele achava que a reforma política era uma questão fundamental e importante, que precisa ser tratada como prioridade pelo País. Votar a reforma política é também uma forma de homenagear e agradecer por todo o legado que ele deixou", disse Maia. Ele também afirmou que pretende votar a matéria ainda este ano, para que possa valer para as eleições de 2014.
O deputado destacou ainda que os valores éticos e morais defendidos por Itamar ao longo de sua vida devem servir de exemplo a toda a classe política brasileira. "Ele foi duro com a corrupção e os desmandos que acontecem na vida política e na sociedade. O Itamar teve essa característica de ser muito duro com isso, muito presente na hora de tomar decisões para evitar esquemas de corrupção ou falta de ética. Esse é o legado que ele deixa, também, para a sociedade brasileira."

sábado, 2 de julho de 2011

Reforma Política em doses homeopáticas

Fonte: Google
Muito embora em doses homeopáticas, o Congresso Nacional vem dando sinais, de que, a Reforma Política começa a encontrar o caminho ideal e exigido pela sociedade, cansada que está, de conviver com um modelo arcaico e vulnerável à prática de abusos, durante a realização dos pleitos eleitorais. Um ponto polêmico, porém importante , para dar maior legitimidade ao voto, foi aprovado na Câmara dos Deputados e deverá valer para as Eleições Municipais de 2012, caso seja aprovado no Senado, antes do mês de outubro próximo. Trata-se do fim das coligações nas eleições proporcionais. Significa dizer, que, as vagas no legislativo, serão ocupadas pelos candidatos que conquistarem o maior número de votos. A medida vem dar um basta na velha regra, em que candidatos bem votados, não conseguem se eleger, enquanto outros menos votados, mas, beneficiados pela coligação, acabam atingindo o quociente eleitoral. Exemplificando, o eleitor deposita o seu voto em “João” e se sente frustrado quando o resultado da apuração aponta “José”, como eleito. Essa discrepância pode ser uma das causas que vem tornando o eleitor desinteressado em comparecer para votar.
O fim das coligações é um passo importante, pois, se de um lado, servirá para fortalecer os partidos maiores, por outro lado, inviabilizará os partidos “nanicos”, também chamados de partidos de aluguel. O projeto da reforma política, aprovado no Senado, no ano 2.000, agrupa os partidos pequenos, na formação de uma federação, sem direito aos recursos do Fundo Partidário. É bem provável, que, o Congresso encontre outra solução para os “nanicos”, inclusive, optando pela extinção. Para isso, basta instituir a Cláusula de Barreira, que extingue o partido que não conseguir eleger, no mínimo, dez deputados federais.
As comissões especiais instaladas no Senado e na Câmara, para tratar da Reforma Política, aprofundam estudos, visando a criação do voto distrital e voto listado. Entende-se, no entanto, que é chegado o momento de acabar com o voto obrigatório. Até porque, não faz sentido, um modelo democrático que prega a liberdade ampla e irrestrita, mas obriga o cidadão a votar.

Por: Ruy Guarany Neves – Reforma política - http://www.correaneto.com.br/site/?p=10296
2/Julho/2011


sexta-feira, 1 de julho de 2011

A inflação e a dívida pública

ECONOMIA
É evidente que toda a sociedade apoia o controle da inflação, porém, os instrumentos utilizados pelo Banco Central não estão de fato combatendo a alta de preços, mas se prestam a promover uma brutal transferência de recursos públicos p/ o setor financeiro privado, a elevadíssimo custo, tanto financeiro como social
por Maria Lucia Fattorelli

Em razão da marca negativa deixada pela inflação galopante dos anos 1980 até início dos anos 1990, não foi difícil convencer a população, parlamentares e poderes constituídos de que o país necessitava de um “Regime de Metas de Inflação”.
Na realidade, tal regime foi imposto pelo FMI, em ambiente econômico afetado por crises financeiras que abalaram diversas economias no final da década de 1990.
A opção do governo brasileiro por recorrer ao Fundo em 1998 abriu caminho para a interferência da instituição em diversos assuntos internos do país, entre eles a exigência de que a definição de metas inflacionárias deveria ser uma das principais diretrizes da política monetária. Colocando em prática o compromisso assumido com o FMI, foi editado o Decreto 3.088, em junho de 1999, estabelecendo a sistemática de “metas de inflação” como diretriz para fixação do regime de política monetária.
Na mesma época, o Banco Central editou a Circular 2.868/99, por meio da qual criou a taxa Selic e, desde então, tem utilizado a referida taxa de juros como instrumento de controle da inflação, forçando sua elevação toda vez que a expectativa de alta de preços ameaça superar as metas estabelecidas.
Outro instrumento colocado em prática pelo Banco Central para regular a inflação tem sido o controle do volume de moeda em circulação, realizando as chamadas “operações de mercado aberto”, por meio das quais entrega títulos da dívida pública às instituições financeiras em troca de eventual excesso informado pelos bancos, de moeda nacional ou estrangeira.
Dados oficiais demonstram o equívoco desses dois instrumentos utilizados pelo Banco Central:
1. A elevação da Selic não ajuda a controlar o tipo de inflação de preços existente no país. Tal medida tem servido para elevar continuamente as já altíssimas taxas de juros, impactando no crescimento acelerado da dívida pública, além de prejudicar a distribuição de recursos para todas as áreas do orçamento e impedir investimentos na economia real.
2. As operações de mercado aberto estão servindo para trocar dólares especulativos que ingressam no país, sem controle, por títulos da dívida pública que pagam os juros mais elevados do mundo. Tal mecanismo tem provocado megaprejuízos operacionais ao Banco Central R$ 147 bilhões em 2009 e R$ 50 bilhões em 2010 , o que representa significativo dano ao patrimônio público.
É evidente que toda a sociedade apoia o controle da inflação, porém, os instrumentos que vêm sendo utilizados pelo Banco Central não estão de fato combatendo a alta de preços, mas se prestam a promover uma brutal transferência de recursos públicos para o setor financeiro privado – nacional e internacional – a elevadíssimo custo interno, tanto financeiro como social, e por isso precisam ser revistos.

Selic não controla a inflação
A teoria ortodoxa que defende a elevação da taxa de juros como remédio para controlar a inflação se aplicaria somente quando a alta de preços decorresse de excesso de demanda. Em tese, a elevação dos juros tentaria dificultar o consumo e frear a demanda, buscando conter a subida de preços provocada pelo excesso de procura dos produtos e serviços.
Essa teoria não é unânime, pois, mesmo diante de processo inflacionário causado por excesso de demanda, a solução recomendável não seria a elevação dos juros, pois essa alta provoca aumento dos custos financeiros das empresas, que são repassados aos preços dos produtos. Além disso, juros altos provocam a queda dos investimentos de longo prazo em novas plantas produtivas. Isso reduz a oferta futura de produtos e serviços, dando margem a leituras equivocadas de que a demanda estaria mais alta que a oferta, o que justificaria novas elevações de juros em um círculo vicioso e danoso para a economia.
No Brasil, ao contrário do que alegam governo e rentistas, a inflação atual não é causada por suposto excesso de demanda, mas tem sido provocada por contínuos e elevados reajustes dos preços de alimentos e preços administrados, tais como combustíveis, energia elétrica, telefonia, transporte público, serviços bancários.1 Esses itens afetam todos os preços de bens e serviços vendidos no país, pois fazem parte da composição de seus custos. Adicionalmente, o preço dos alimentos e demais preços administrados não são reduzidos quando o governo promove uma elevação da taxa Selic.
Para combater esse tipo de inflação – denominada inflação de preços –, o remédio adequado é o efetivo controle de tais preços, o que poderia ser feito pelo governo sem grandes dificuldades, já que estamos falando justamente de preços administrados, que em tese devem ser geridos pelo poder público.
O problema é que a maioria desses setores passou pelo processo de privatização – cuja justificativa, na década de 1990, era o pagamento da dívida externa. Em mãos privadas, a reivindicação de lucros cada vez maiores leva ao fornecimento de serviços cada vez mais caros. É o caso, por exemplo, da telefonia no Brasil, que após a privatização passou a ser a mais cara do mundo, ao mesmo tempo que é campeã de reclamações dos consumidores. As empresas de telefonia auferem lucros espantosos anualmente e não realizam os investimentos necessários. O mesmo ocorre com empresas de energia elétrica e transportes públicos, serviços altamente lucrativos, em decorrência do alto preço das tarifas cobradas. A elevação contínua desses preços tem pesado no cômputo da inflação e não sofre redução quando os juros sobem.
Os combustíveis, então, nem se fala: exercem influência direta na composição de todos os preços e serviços no país. O preço da gasolina é um dos maiores do mundo, apesar de nossa autossuficiência, das recentes descobertas de imensas jazidas e dos significativos lucros da Petrobras. A parcela dos lucros correspondentes às ações da Petrobras vendidas ao setor privado é distribuída na forma de dividendos, mas a fração do lucro correspondente ao capital estatal é destinada ao pagamento da dívida pública. Isso porque a Lei 9.530 trata do privilégio na destinação de recursos para o pagamento da dívida, determinando que todos os lucros das estatais destinados ao governo, superávits financeiros e demais disponibilidades de estatais, fundos e autarquias têm essa finalidade.
Da forma como está regulamentado o “Regime de Metas de Inflação”, toda vez que a inflação ameaça ultrapassar a meta estabelecida (atualmente em 4,5% ao ano), seu controle é feito por meio da elevação da taxa Selic, desconsiderando-se as verdadeiras causas do aumento de preços no Brasil.
O resultado tem sido o crescimento explosivo da dívida pública, cujo montante supera R$ 2,5 trilhões, enquanto o pagamento de juros e amortizações consumiu 45% dos recursos do orçamento federal em 2010, conforme mostra o gráfico.
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Dívida Pública, concluída em 2010 na Câmara dos Deputados, comprovou que as altas taxas de juros foram o principal fator responsável pelo contínuo crescimento da dívida pública, apesar dos vultosos pagamentos anuais de juros e amortizações. A CPI comprovou que a dívida pública brasileira não tem contrapartida real em bens ou serviços, mas se multiplica em função de mecanismos e artifícios meramente financeiros, bem como da incidência de “juros sobre juros”, o que configura “anatocismo”, prática considerada ilegal pelo Supremo Tribunal Federal.
Em resumo, as mesmas autoridades monetárias que defendem a elevação das taxas de juros com a justificativa de controle inflacionário permitem contínua elevação nos preços administrados, o que é um total contrassenso. Adicionalmente, os órgãos de defesa da livre concorrência não têm conseguido combater adequadamente os cartéis privados que também afetam a formação dos preços.
Como são definidas as taxas de juros
A CPI da Dívida realizou importante e inédita investigação sobre aspectos do endividamento interno e externo brasileiro, tendo se dedicado também a investigar como são determinadas as taxas Selic, já que os juros são o principal responsável pelo crescimento acelerado da dívida brasileira.
O Banco Central informou à CPI que para estabelecer o patamar das taxas de juros não utiliza fórmulas científicas, mas realiza consultas a “analistas independentes”, em reuniões periódicas. O resultado dessas reuniões constitui o fundamento para a definição da Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom), pois nelas são apresentadas estimativas sobre a evolução futura de variáveis como inflação, evolução de preços e taxa de juros.
A CPI requereu ao Banco Central os nomes dos participantes dessas reuniões. A resposta permitiu confirmar o que já se esperava: a imensa maioria deles (95%) faz parte do setor financeiro, ou seja, são representantes de bancos, fundos de investimento ou consultores de mercado. São justamente os maiores interessados nas elevadas taxas de juros, que lhes proporcionam elevados lucros, configurando evidente conflito de interesses.
O mais grave é que muitos desses participantes das reuniões do Banco Central são também os mesmos analistas consultados por grandes meios de comunicação, que passam a alardear temores relacionados ao temerário crescimento da inflação e a necessidade de combater tal previsão, recomendando sempre a elevação das taxas de juros como se fosse o único remédio eficaz para frear o retorno inflacionário.
Em poucos dias de governo, ao mesmo tempo que a presidente Dilma Rousseff procedeu ao contingenciamento recorde de R$ 50 bilhões para fazer “ajuste fiscal”, a taxa Selic subiu três vezes com a justificativa de que tal medida era necessária para reduzir o ritmo da atividade econômica, diminuir a demanda e controlar a inflação.

As operações de mercado aberto
Desde a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o Banco Central ficou proibido de emitir títulos da dívida brasileira, o que é feito exclusivamente pelo Tesouro Nacional. Na prática, essa proibição não tem valor, pois o Tesouro emite títulos e os entrega ao Banco Central, sem qualquer contrapartida ou limite, para que aquela autarquia exerça a política monetária.
A justificativa para essa prática, que dribla a LRF, é, mais uma vez, a necessidade de o Banco Central “enxugar” o excesso de moeda em circulação, tendo em vista que isso pode provocar inflação.
O volume dessas operações de mercado aberto já ultrapassa a cifra dos R$ 500 bilhões, e estatísticas oficiais costumam não incluir esse valor no saldo da dívida, com a justificativa de que seriam títulos da dívida em poder do Banco Central. Isso não corresponde à realidade, pois tais títulos são entregues aos bancos em troca do “excesso de moeda” nacional ou estrangeira e fazem parte dos compromissos assumidos pela República.
Desde que o dólar começou a se desvalorizar em todo o mundo, o volume dessas operações de mercado aberto passou a aumentar aceleradamente, pois os especuladores viram o gatilho acionado pelo “Regime de Metas de Inflação” como uma tremenda oportunidade para trazer seus dólares para o Brasil e trocá-los por títulos da dívida pública brasileira, que pagam os maiores juros do mundo, isentos de qualquer tributo, podendo fugir do país quando bem entenderem, engordados pela variação cambial.2
Como esse gatilho é acionado? O Banco Central acompanha o volume das reservas bancárias – principalmente depósitos e saldos de caixa – dos bancos e das instituições financeiras instaladas no país. Se esse volume supera determinado patamar, entende-se que há excesso de moeda em circulação que precisa ser enxugado a fim de evitar o risco inflacionário. Para diminuir esse excesso, o Banco Central realiza as chamadas operações de mercado aberto, entregando títulos da dívida aos bancos e ficando com a moeda excedente, que ultimamente pode ser representada por montanhas diárias de dólares que vêm para o país em busca do negócio mais generoso do mundo: troca de dólares por títulos da dívida brasileira.
Por sua vez, o Banco Central fica com os dólares e os destina às Reservas Internacionais, que já superam US$ 300 bilhões e não rendem quase nada ao país, pois estão aplicadas em grande parte em títulos da dívida norte-americana, que pagam juros próximos de zero. Além disso, ainda temos de arcar com os custos de senhoriagem.
Conforme citado anteriormente, esse mecanismo tem sido um dos principais responsáveis pelo enorme prejuízo operacional do Banco Central – R$ 147 bilhões em 2009 e R$ 50 bilhões em 2010 –, que é repassado para o Tesouro Nacional e pago com recursos do orçamento que deixam de ser destinados ao atendimento de necessidades urgentes do povo brasileiro, ou pago mediante a emissão de mais títulos da dívida pública.
Em resumo, para combater o risco inflacionário, estamos “enxugando” o excesso de moeda que evidentemente não decorre de superaquecimento da atividade econômica no país, mas de movimento especulativo que tem beneficiado escandalosamente o setor financeiro nacional e internacional, cujos lucros batem recordes anuais e superam dezenas de bilhões de dólares.
Com essas reflexões, verificamos a necessidade urgente de rever a política monetária vigente no país. Com o rótulo de combater a inflação, estamos garantindo os maiores lucros do mundo ao setor financeiro privado, por meio da escandalosa transferência de recursos públicos que fazem muita falta no combate à infame miséria que acomete mais de 100 milhões de brasileiros. Estes nem sequer têm acesso a saneamento básico, apesar de arcarem com pesada carga tributária embutida em todos os produtos de primeira necessidade que conseguem comprar com esmolas, Bolsa Família ou pífios salários.
Alternativas para o efetivo combate à inflação existem e são muito mais eficientes: redução da taxa de juros; controle e redução dos preços administrados; reforma agrária para garantir a produção de alimentos não sujeitos à variação internacional dos preços de commodities; controle de capitais para evitar o ingresso de capitais abutres, meramente especulativos, e fugas nocivas à economia real; adoção de medidas tributárias apropriadas ao controle de preços. Para que essas medidas sejam adotadas, é necessário enfrentar o endividamento público, cancro que adoece nosso rico país e impede o curso da Justiça.
Maria Lucia Fattorelli é graduada em Administração e Ciências Contábeis. Auditora Fiscal da Receita Federal desde 1982, é coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida e membro do CAIC (Comisión para la Auditoría Integral de Crédito Público) criada pelo Presidente Rafael Correa em 2007.

1  Dados do IBGE sobre a inflação de janeiro a abril de 2011 comprovam que 73% da inflação verificada no período e medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi causada por problemas de oferta de alimentos ou por preços administrados pelo próprio governo. Na expressiva parcela de 73% está considerada a variação dos preços de alimentação, taxa de água e esgoto, transporte público, combustíveis de veículos, educação, plano de saúde, energia elétrica, telefonia, serviço bancário. Interessante observar que até mesmo o setor bancário – que mais se beneficia com a elevação da Selic, pois é aquele que detém a maior parte dos títulos da dívida – promoveu a elevação de suas tarifas em 5,46% no período, número muito acima da média geral da inflação estabelecida, de 3,23%. Tal fato denota a contradição entre o discurso e a prática do referido setor.
2   A variação cambial tem favorecido os investidores e especuladores que trazem dólares para o Brasil e convertem tais dólares em reais, aplicando-os na Bolsa ou em títulos da dívida. Considerando que o dólar tem se desvalorizado continuamente em relação ao real, decorrido algum tempo, quando resgatam suas aplicações e as reconvertem a uma taxa de dólar mais baixo, obtêm um volume de dólares bem maior.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Vergonha à brasileira

Nesta quinta-feira, pela manhã, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Deputados promoveu audiência pública em face de recente decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), cuja jurisdição o Brasil está constitucionalmente vinculado.
Para surpresa geral e vergonha internacional deixou de comparecer à audiência pública, nada mais nada menos, do que a presidente da comissão, deputada Manuela D’ávila. A referida deputada é da base de apoio ao governo da presidenta Dilma Rouseff. Na verdade, uma postura adrede preparado e voltada a passar, irresponsavelmente, a imagem, para a opinião pública, da irrelevância da decisão da Corte Interamericana.
Não estiveram presentes, na condição de convidados, o presidente da Supremo Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República, os ministros da Justiça, Relações Exteriores, da Defesa e da Secretaria Especial de Direitos Humanos. Os ministros mandaram representantes e o da Justiça, José Eduardo Cardozo, aquele que já atuou como lobista do banqueiro Daniel Dantas na Itália, designou representante apenas ontem à noite. 
Tal quadro serve para indicar a posição oficial das autoridades públicas quanto à intenção de resistir ao máximo ao cumprimento da sentença da CIDH no caso “Guerrilha do Araguaia”.
A respeito do ocorrido, o professor e jurista emérito Fábio Konder Comparato falou com este articulista por telefone, de Brasília. As suas declarações seguem abaixo:
“O que está em discussão, nesta audiência pública, não é o conflito entre a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Gomes Lund e outros v. Brasil (“Guerrilha do Araguaia”) e o acórdão do Supremo Tribunal Federal, que julgou a argüição de descumprimento de preceito fundamental n° 153.
É irrelevante, nesta altura dos acontecimentos, saber qual das duas decisões judiciais é a melhor, à luz do direito interno e do direito internacional.
O que se deve discutir, aqui e agora, é a responsabilidade do Estado Brasileiro no cumprimento da referida sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, estejamos ou não de acordo com ela.
Comecemos por lembrar que o princípio fundamental do Estado de Direito impõe a todas as potências soberanas o respeito absoluto à jurisdição dos tribunais internacionais, quando essa jurisdição foi por elas oficialmente reconhecida. A soberania de um Estado, no plano do direito das gentes, não implica, de modo algum, a relatividade do princípio cardeal pacta sunt servanda.
O Brasil aderiu à Convenção Americana sobre Direitos Humanos e reconheceu como obrigatória, nos termos do disposto em seu art. 62, a jurisdição da citada Corte. O art. 68 da Convenção dispõe que os Estados signatários “comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”.
O Brasil foi citado como Réu no caso supra-referido, compareceu perante a Corte e não opôs nenhuma preliminar de incompetência desta, para conhecer da referida demanda e julgar o mérito da causa. Em conseqüência, não cabe a menor dúvida de que o Estado Brasileiro aceitou a jurisdição internacional nesse caso.
Seria rematado dislate, escusa lembrá-lo, que o Brasil tivesse aceito tal jurisdição tão-só para a hipótese de uma decisão que lhe fosse favorável no mérito.
Ora, como a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobreveio em 24 de novembro de 2010, posteriormente, portanto, ao acórdão do Supremo Tribunal Federal na argüição de descumprimento de preceito fundamental nº 153, o demandante neste último processo, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que tenho a honra de representar nesta audiência pública, pediu ao Tribunal, em instância de embargos declaratórios, que se pronunciasse expressamente sobre a executoriedade daquela sentença.
Chamada a manifestar-se a esse respeito naquele processo, a Advocacia-Geral da União afirmou, citando os votos vencedores no acórdão, que “o Brasil não estaria [note-se o tempo condicional do verbo] obrigado a adotar convenções internacionais por ele não ratificadas, ou convenção que tenha vindo a ratificar em data posterior à anistia concedida pela Lei n° 6.683/1979”.
O argumento, com a devida vênia, é inteiramente despropositado.
Em primeiro lugar, porque o Brasil aderiu à Convenção Americana sobre Direitos Humanos por ato de 25 de setembro de 1992, tendo ela sido promulgada pelo Decreto nº 678, de 6 de novembro do mesmo ano.
Em segundo lugar, porque a tese de que os tratados de direitos humanos não se aplicam a fatos anteriores à sua ratificação é unanimemente rejeitada, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, constituindo a todas as luzes uma norma imperativa de direito internacional geral (jus cogens), conforme o disposto no art. 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Com efeito, em se tratando de crimes de Estado ou crimes contra a humanidade, como é o caso que ora se discute, seria rematado despautério admitir que o próprio Estado, cujos agentes praticaram tais atos criminosos, tivesse o arbítrio de fixar a data a partir da qual o tratado que os qualifica e regula sua punição seria aplicável.
Na verdade, o pronunciamento do Exmo. Sr. Advogado-Geral da União perante o Supremo Tribunal Federal produziu um efeito político dos mais graves, que não pode deixar de ser aqui ressaltado.
Segundo o disposto no art. 3°, § 1° da Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União, o Advogado-Geral da União é “submetido à direta, pessoal e imediata supervisão do Presidente da República”. Há, por conseguinte, uma presunção legal de que todo pronunciamento do Advogado-Geral da União, em processos judiciais, conta com a aprovação do Chefe de Estado.
De onde se conclui, lamentavelmente, que a Presidência da República, enquanto único órgão competente para representar o Estado Brasileiro na esfera internacional (Constituição Federal, art. 84, incisos VII e VIII), acaba de rejeitar, por interposta pessoa, a decisão proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso supra-referido; no qual – repita-se – o Brasil consentiu em figurar como Réu e fez-se presente em todas as instâncias do processo.
A recusa em cumprir sentença de tribunal internacional, cuja jurisdição foi oficialmente aceita de modo geral e tacitamente confirmada no processo pertinente, configura flagrante desrespeito ao princípio do Estado de Direito e coloca o nosso País em estado de aberta ruptura com a ordem jurídica internacional.”
PANO RÁPIDO. Este é o Brasil que nos envergonha pelo desrespeito aos direitos da pessoa humana. Esperamos que e a presidente Dilma, que foi torturada e presa quando da ditadura militar, reflita sobre a decisão da CIDH e mude a orientação dos seus ministros, que são agentes da sua autoridade.

Wálter Maierovitch





Por: *Walter Maierovitch é jurista e professor, foi desembargador no TJ-SP

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