Por Dag Vulpi 22/04/2017
Dias
desses um velho conhecido, que eu omitirei o nome por razões que se provarão necessárias
ao final deste texto, me ligou se dizendo um pouco mais animado, pois enfim seu
advogado informou-lhe que havia sido marcada a audiência que tratará da divisão
letigiosa dos bens que ele e sua ex-esposa haviam acumulado durante mais de 25
anos de matrimônio.
Eles
já estavam separados há quase um ano, porém, o fato de seu ex-sogro ser juiz,
sua ex-sogra ser uma bem sucedida advogada e um dos ex-cunhados ser deputado, acabou
por fazer com que o meu velho conhecido saísse de casa com uma mão na frente e
outra atrás, e assim permaneceria, ao menos até que o juiz determinasse como
ficaria a partilha dos bens do casal.
Ele
conseguiu através de muito trabalho e dedicação acumular um belo patrimônio
naqueles 25 anos de casamento. Tinha um belo apartamento de frente para o mar,
onde morou por mais de 15 anos com sua ex-esposa, tinha outros dois apartamentos
que ele presenteou as filhas quando aquelas se casaram. Tinha um belo sitio na
região das montanhas espírito-santense, dois carros importados, um para ele e
outra da esposa, uma moto e tinha também uma bela quantia de dinheiro aplicada.
Ele
sempre comentava com orgulho das suas conquistas obtidas graças a toda uma vida
de dedicação ao trabalho e à família. Certa ocasião ele mencionou que quando
mais jovem o único bem que possuía era um Fusquinha 66, Fusca esse que ele
ainda guarda como relíquia na garagem da casa da sua mãe e que de vez em quando
ele ainda dava umas voltas com a relíquia para matar a saudade. Agora ele está
andando com o Fusquinha pra cima e pra baixo, afinal, é o único meio de
transporte que lhes restou.
Mas
voltando ao que de fato interessa que é a bendita partilha dos bens, ele pediu
para que eu ficasse na torcida, pois sabia que não seria fácil conseguir uma
partilha justa, afinal, sua ex-esposa estava muitíssimo bem guarnecida, com um
juiz, dois advogados, sendo que um deles era sua ex-sogra, não bastando tinha
ainda seu ex-cunhado que é deputado, enquanto ele contava apenas com um jovem e
inexperiente advogado que conseguira na Defensoria Publica.
Diante
desse quadro completamente desfavorável para ele sugeri que nos encontrássemos para
conversar sobre o assunto pessoalmente e que talvez eu pudesse ajuda-lo.
Marcamos um almoço para tratarmos do assunto. Ele chegou na hora combinada tentando
demonstrar tranquilidade, mas percebi que ele estava tenso. Depois de colocar a
conversa em dia, finalmente entramos no assunto que era o motivo de estarmos
ali.
Depois
de analisar os fatos e considerar os trâmites fui ao ponto que ele aguardava
ansioso. Estando ciente dos detalhes
jurídicos e do real patrimônio do casal, busquei ser objetivo na formulação de
uma proposta que poderia atender as expectativas dele e talvez, também as dela.
Lembrei
que enquanto ele adorava o belo sitio do casal, sua ex-esposa simplesmente o detestava
e que, em contrapartida, enquanto ele não morria de amores pelo apartamento na
praia, ela o adorava. E que esse seria um facilitador, já que os valores dos
dois imóveis se equivaliam. Lembrei também que o fato de terem dois carros facilitaria
a divisão, e no caso da moto, sugeri que ele deixasse para ela ou para seu
neto, e ele ficaria com o Fusca, lembrando-o que pelo fato de o Fusca estar
registrado em seu nome, sua ex-esposa também teria direito. No caso do valor
aplicado bastaria dividir em duas partes iguais e cada um ficaria com uma.
Ele
coçou a cabeça e falou: “sabe que você tem razão, a partilha até que não será
tão complicada como eu estava imaginando, mas é muita sacanagem ter que dividir
em partes iguais, tudo o que consegui com uma vida de trabalho, eu quase não
tenho dormido tanto que penso nisso”. Aí eu voltei argumentar, sempre na tentativa
de deixa-lo mais tranquilo, que ele deveria considerar o fato de terem vivido
harmoniosamente durante mais de 20 anos e que se não fosse sua ex-esposa ele
não teria aquela bela família, suas filhas maravilhosas, que por sua vez já
lhes deram duas netas e um neto e que tudo isso deveria ser levado em
consideração.
Mais
uma vez ele concordou comigo, dizendo que não havia nem pensado nisso, mas que
de fato, sem ela não teria uma família, ao menos não aquela. E acabou
concordando comigo. Ao final tomamos um café e quando íamos nos despedir ele me
fez um pedido: “será que você não poderia me acompanhar até o Fórum no dia da
audiência? Você me passa muita tranquilidade, coisa que meu advogado não
consegue”. Eu respondi que por mim não havia problema, mas que talvez eu teria
que sair antes dele, mas que mais tarde poderíamos conversar sobre o resultado
da audiência.
Conforme
o combinado no dia e hora marcados lá estava eu. Ele havia chegado mais cedo,
foi com seu Velho fusquinha, que segundo ele, daria sorte, o Fusca era uma espécie
de talismã pra ele. O jovem advogado chegou exatamente na hora em que eles
foram chamados, uma pena, pois eu queria ter conversado com ele pra saber qual
seria a sua linha de defesa e se as propostas que eu fiz seriam as melhores ou
se ele teria tido alguma ideia melhor para o acordo na divisão dos bens.
Eles
entraram na sala, eu encontrei alguns amigos, mas que infelizmente não tivemos
tempo para trocar mais que três ou quatro palavras, afinal quem está ali está,
ou a trabalho ou em atendimento à justiça. Fiquei mais alguns minutos e me
retirei.
Mais
tarde liguei pra ele, mas a ligação sempre caia na caixa postal, por certo ele
deve estar sem bateria deduzi. Foi quando resolvi ir até a casa da mãe dele,
que era onde ele estava morando ha mais de oito meses. Chegando lá fui recebido
com um belo sorriso da sua mãe, fazia tempo que não nos víamos, ela sempre
gentil me convidou para entrar e me serviu um café. Enquanto esperávamos ansiosos
sua chegada. Ficamos recordando de como antes as coisas eram mais difíceis, mas
mesmo com todas as dificuldades as pessoas pareciam serem mais felizes. Foi
inevitável que o assunto acabasse no final do casamento do seu filho, mas ela
entendeu que foi melhor assim, afinal, fazia tempo que seu filho estava infeliz
e reclamava com ela dizendo não confiar mais na esposa. Segundo informações não
confirmadas, sua ex-esposa estaria tendo um caso com um jovem advogado que não
por acaso é apadrinhado por seu ex-sogro.
Passado
algum tempo e nada dele chegar resolvi ir embora. Despedi-me e falei para a mãe
dele que ligaria mais tarde para saber como tudo transcorreu. Sai, fazia um
calor danado, atravessei a rua e fui até um bar na esquina. Pedi um chope e
fiquei ali na esperança que ele chegasse e de preferencia com boas noticias. Eu
já havia me decidido que se tudo desse certo eu iria passar um final de semana
lá no sitio dele, juntos poderíamos nos divertir e tentar fazer com que ele
esquecesse de uma vez por todas aquela triste situação da separação.
Tomei
o chope e quando ia pedir o segundo me chamou a atenção um carro que passava em
frente do bar. Olhei e não acreditei, mas acreditem, era o meu amigo dirigindo
meio Fusca, isso mesmo, um Fusca cerrado ao meio foi o que lhes restou. Depois
fiquei sabendo dos pormenores do ocorrido na audiência. O coitado do meu velho
conhecido acabou ficando praticamente sem nada, o celular que liguei e ele não
atendia também ficou para a ex-esposa. O Juiz que julgou o caso, um tal de
Sergio Mauro, era amigão do ex-sogro dele, sua ex-esposa além de ter a mãe como
advogada, que nunca perdeu uma causa e todos sabem por que, lá pelas tantas recebeu
um telefonema durante a audiência pedindo para que passassem o celular para o juiz,
era o irmão dela, o deputado. Ligou de Brasília para falar alguma coisa para o Mauro,
e para não restar nenhuma dúvida do tamanho da sacanagem, o advogado que estava
“defendendo” meu velho conhecido, aquele que foi conseguido na Defensoria
Publica, era ninguém menos que o tal advogado apadrinhado do ex-sogro e que
vinha saindo com a sua ex-esposa. Tá bom ou você quer mais.
Resumo
da ópera: O juiz Mauro determinou que todos os bens ficassem para a ex-esposa,
o apartamento de frente para a praia, o sítio nas montanhas espírito-santense,
os dois carros importados, quase dois milhões de reais aplicados, o celular que
havia sido presente da esposa e para acabar de vez, o juiz percebeu que entre
os bens havia um Fusca 66 e para ser justo, como aquele bem foi adquirido antes de eles se casarem, o juiz determinou
que o Fusca fosse dividido em duas partes, cortado ao meio, cerrado em duas
bandas como se faz com um pão francês. Pois isso seria o justo afiançou o nobre
representante da lei, vossa meritíssima excelência Sergio Mauro. E assim foi
feito.
Confira abaixo o vídeo que gravei de dentro do bar quando percebi que era o meu amigo que estava chegando da audiência de separação de bens litigiosa dirigindo agora o seu, meio Fusca 66.
rsrsrs por isso que nao caso
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