Por
Ana Cristina Campos da Agência Brasil
Se
antes era prática comum prometer cestas básicas, emprego ou tratamento médico
em troca de votos para conquistar um mandato, com o aumento da escolaridade do
eleitor brasileiro essas propostas começam a perder espaço para um voto de mais
qualidade. Para especialistas, há um novo eleitor em construção e a melhora no
nível educacional pode se transformar em mais consciência política no médio
prazo.
Apesar
de a maior parte dos eleitores ainda ter baixa escolaridade, houve aumento no
número de pessoas com superior completo e incompleto e ensino médio completo e
incompleto. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que dos 142,8
milhões de eleitores aptos a votar no pleito de outubro, 5,6% (8 milhões)
terminaram a graduação - 2,8 milhões de pessoas a mais que nas eleições de
2010.
O
número de pessoas com superior incompleto também subiu em relação a 2010 –
aumentou em 1,5 milhão, passando de 2,7% para 3,6%. O número de cidadãos com
ensino médio completo aumentou em 5,9 milhões de pessoas, de 13,1% para 16,6%.
Já o número de eleitores com ensino médio incompleto teve um incremento de 1,8
milhão, de 18,9% para 19,2%.
Em
contrapartida, o número de analfabetos e dos que apenas leem e escrevem
(analfabetos funcionais) diminuiu. São cerca de 700 mil analfabetos a menos que
na eleição de 2010, passando de 5,8% dos eleitores para 5,1%. No caso dos
analfabetos funcionais, são 2,5 milhões a menos no pleito de 2014, de 14,5% do
eleitorado para 12%.
Para
o cientista político Leonardo Barreto, especialista em comportamento eleitoral,
o índice de desenvolvimento educacional do eleitor é reflexo da evolução dos
indicadores de educação da população brasileira. “As pessoas melhoraram a
capacidade de buscar e processar informações porque é isso que, basicamente, o
nível de educação mais elevada proporciona.”
O
Censo Demográfico 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) indicou que o nível de escolarização, de um modo geral, tem melhorado no
país. No grupo acima de 25 anos, idade considerada suficiente para conclusão da
graduação, o número de pessoas sem instrução ou com ensino fundamental
incompleto caiu de 64% em 2000 para 49,3% em 2010. Com ensino médio completo
passou de 12,7% para 14,7% e a proporção de pessoas com ensino superior
completo passou de 6,8% para 10,8%.
Para
Barreto, ainda não é possível dizer que o país já tem um eleitor mais crítico e
consciente. “É um eleitor híbrido, que combina a necessidade de propostas novas
para ele, de políticas públicas mais universais, com práticas antigas. Era uma
pessoa que até ontem estava dentro de um contingente populacional que era muito
suscetível a trocas e a propostas clientelistas. É uma pessoa que está migrando
de um lugar para outro, mas que ainda está no meio do caminho porque essa é uma
mudança de uma geração.”
De
acordo com o especialista, com o aumento da escolarização e da renda, fazer
campanha em uma região pobre não significará encontrar um eleitor desprovido de
capacidade crítica e de informação. “Na periferia, você vai encontrar pessoas
cujos filhos estão fazendo ou fizeram faculdade. Uma geração abastece a outra.
O filho que fez faculdade é o orgulho da família, vai influenciar quem não fez.
Tem um efeito de dispersão desse conhecimento. Isso torna o processo político
mais complexo. Abre uma janela de oportunidades para uma nova geração de
políticos. Quem interpretar e conduzir bem esse processo vai sair na frente”,
disse.
O
professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB)
Paulo Roberto Kramer também avalia que o eleitorado brasileiro está em fase de
transição. Para ele, os dados do TSE comprovam o gradual avanço nas condições
de vida e de educação da população. “Um eleitor mais instruído costuma ser mais
exigente. Esse eleitor tende a transcender o nível mais básico de expectativas
e necessidades, como o alimento e o teto, e passa a querer políticas públicas
mais amplas, de educação, saúde e mobilidade urbana de qualidade.”
Na
opinião do especialista, os políticos vão se deparar com uma parcela cada vez
maior da população que vai cobrar seus direitos. “Esse novo eleitor certamente
vai lançar um desafio para os políticos, que é repaginar suas propostas, suas
maneiras de abordagem, pois está mais crítico ao confrontar as promessas que
são feitas com a possibilidade de concretização.”
Para
a coordenadora-geral da organização não governamental (ONG) Ação Educativa,
Vera Masagão, à medida que o país mude o perfil educacional da população, a
tendência é que o perfil do eleitorado também seja alterado no sentido de um
voto mais consciente.
“Pessoas
com mais escolaridade se sentem mais empoderadas, sentem menos o político como
alguém de quem precisam para ter um favor. Tendem a romper essa visão do
clientelismo, daquele pobrezinho que precisa ir lá pedir favor para o político.
Aumentam a consciência cidadã de que eu estou exercendo meu direito votando e
que o meu dever também não acaba na hora do voto. Tenho que continuar cobrando
e é dever desse gestor público cumprir as promessas que fez. Esse caráter da
cidadania é reforçado”, disse.
Segundo
Vera, ao lado da educação formal, é preciso ampliar a educação cidadã. “Essa é
uma educação que se dá principalmente no engajamento político. Então são
pessoas participando de partidos, de ONGs, engajadas, acompanhando causas de
interesse público e políticas públicas. É dessa forma que a gente vai, de fato,
mudar a política, com mais gente participando e exercendo o controle social.”
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