Blog Dag Vulpi – A Justiça ouviu hoje (11) as últimas testemunhas de acusação na ação penal proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) que acusa o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, o delegado aposentado de polícia Alcides Singillo e o ex-investigador de polícia Carlos Alberto Augusto, hoje delegado, pelo sequestro qualificado de Edgar de Aquino Duarte, ocorrido em 1973, durante a ditadura militar (1964-1985). Duarte continua desaparecido.
Os ex-presos políticos Maria Amélia de Almeida Teles e o advogado Virgílio Egydio Lopes Enei depuseram na presença de dois dos três acusados. Ustra, mais uma vez, não compareceu, e é considerado réu revel. A Justiça decidiu que o processo vai seguir à revelia. Ele comandou o Destacamento de Operações de Informações–Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) de São Paulo no período de 1970 a 1974.
Maria Amélia Teles confirmou que Ustra e o delegado Singillo tinham conhecimento da captura e prisão ilegal de Edgar no DOI-Codi e posteriormente no Departamento de Ordem Política e Social (Dops). “Eu que estava presa sabia [da presença dele]. Não tinha ninguém lá que não soubesse”, disse. “Ustra entrava nas celas [do DOI-Codi] e pedia para os torturadores fazer tais e tais perguntas. O Singillo era o delegado do Dops e cuidava de tudo lá”, destacou. Amélia disse ainda acreditar que Duarte tenha sido morto pelos agentes da ditadura, já que viu um oficial dizer a Edgar que ele "sabia um segredo de Etado e, por isso, iria morrer”.
Segundo o MPF, Duarte ficou preso ilegalmente nas dependências do DOI-Codi e, depois, no Dops até meados de 1973. Ele era amigo de José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, que tinha acabado de retornar de Cuba e com quem passou a dividir um apartamento no centro de São Paulo. A tese do Ministério Público é que Duarte foi sequestrado pelos agentes da ditadura porque conhecia a verdadeira identidade de Cabo Anselmo, que passara a atuar como informante dos órgãos de repressão.
O MPF defende no processo penal que Duarte foi sequestrado e permanece desaparecido, caracterizando que o crime não prescreveu e não está protegido pela Lei de Anistia. Para o Ministério Público Federal, enquanto não se souber o paradeiro da vítima e o corpo não for encontrado, o crime de sequestro perdura pelo tempo. A Lei de Anistia não se aplica ao caso porque o crime continua a ser cometido após a aprovação da lei, em 1979.
“Eles falam que existe um crime permanente. Hoje ficou provado que a pessoa está morta, segundo a última testemunha. Se a pessoa está morta, não é crime permanente. Mesmo se fosse crime permanente, tecnicamente, como eu poderia manter por 40 anos uma pessoa em cativeiro?”, disse o acusado Carlos Alberto Augusto.
“A posição do MPF é de que, enquanto não se encontrar o corpo, ele [Edgar Duarte] está desaparecido. É óbvio que todo mundo tem essa suspeita de que ele foi morto, os parentes têm essa suspeita porque uma pessoa que nunca mais é vista, a suspeita é de que está morta. O que a Amélia disse foi a opinião dela, mas isso não comprova que houve a morte do Edgar. Não há corpo, não há restos mortais, não há elementos concretos”, rebateu o procurador da República, e um dos autores da ação, Andrey Borges de Mendonça.
Segundo o procurador, já há, inclusive, jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) para casos similares. “O STF já decidiu nesse sentido em diversas extradições, dizendo que enquanto não houver o corpo, provas concretas, há ainda pendente um crime de sequestro”.
Ele ressaltou ainda que as testemunhas comprovaram que Duarte estava sob a responsabilidade dos órgãos de repressão, e de que esteve no DOI-Codi e no Dops sob a responsabilidade dos acusados. O ex-delegado Singillo e o advogado de Ustra não quiseram falar com a imprensa.
Foram agendadas para 27 de março, 1º e 2 de abril os depoimentos das testemunhas de defesa. Os advogados dos acusados arrolaram, entre outros, Paulo Maluf e o vice-presidente Michel Temer.
Esta é a primeira ação penal aceita pela Justiça em que agentes do Estado estão sendo acusados de crimes. Eles poderão ser responsabilizados criminalmente, e não apenas civilmente, como já ocorreu em junho do ano passado com Ustra, condenado em primeira instância a pagar indenização de R$ 100 mil pelas torturas que mataram o jornalista Luiz Eduardo Merlino em 1971, durante a ditadura militar.
Agência Brasil
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