Bobbio identificava na visão tecnocrática de um lado e na postura
indiferente, do outro, duas situações adversas à democracia. A primeira teimava
em reduzi-la apenas a um ritual mecânico de sucessivas eleições, enquanto que a
outra, ao dizer que podia ser eleito qualquer um, tanto faz (o qualunquismo), a
desqualificava. Num resumo geral, pode-se dizer que para ele a democracia tinha
como fundamentos:
· estar sempre em transformação. O seu estado natural é a
dinâmica, enquanto que no despotismo predomina a estática, sempre igual a sim
mesmo;
· o direito e o poder são duas faces da mesma moeda. Somente o
poder cria o direito, e só ao direito cabe limitar o poder;
· o centro da atenção da democracia repousa numa concepção
individualista da sociedade. Ela somente se desenvolve onde os direitos de
liberdade têm sido reconhecidos por uma constituição;
· trata-se de um conjunto de regras que estabelece quem está
autorizado a tomar decisões coletivas e quais são os seus procedimentos;
· baseia-se na regra de que a democracia é o regime da maioria e
que o Estado Liberal é o suposto histórico-jurídico do Estado Democrático;
· é um regime que define o bom governo como aquele age em função
do bem comum e não do seu exclusivo interesse, e se move através de leis
estabelecidas, claras para todas, e não por determinações arbitrárias;
· considera um governo excessivamente paternal (imperium
paternale) como negativo insistindo que a democracia é um governo de leis por
excelência
Na luta pelos direitos
A emergência da doutrina dos direitos (do Homem , do Cidadão, etc...) é
produto da história moderna. Surgiu com as revoluções liberais do século XVIII,
graças ao engajamento dos pensadores iluministas como Locke, Montesquieu,
Voltaire, e J.J. Rousseau. Procurou a sua universalização com a aprovação, na
assembléia geral da ONU em 1948, dos Direitos Universais do Homem e do Cidadão.
Se numa primeira fase os direitos foram concebidos pelos teóricos
jusnaturalistas modernos (o homem tem direitos por natureza e ninguém, muito
menos o Estado, pode subtraí-los ou aliená-los), a transição da teoria à
pratica deu-se graças as revoluções liberais de 1776 e 1789. Com a declaração
de 1948 a política dos direitos humanos passou a ser estendida ao mundo
inteiro.
Neste longo périplo, os direitos humanos deixaram de ser aplicados
somente em determinadas pólis, nos estados-nacionais que os aprovaram (Estados
Unidos, França, Itália, etc..), e passaram a ser difundidos pela cosmopólis,
isto é aos integrantes do planeta como um todo.
As modificações dos direitos
Se em determinado momento os jusnaturalistas procuram fixar uma
universalidade abstrata dos direitos (direito à vida, à liberdade, à
propriedade), gradativamente, no transcorrer dos dois últimos séculos,
verificou-se a incorporação de novos direitos (ao trabalho, à educação, à
organização sindical e partidária). Subdividindo-se contemporaneamente nos
direitos da mulher, da criança e do idoso. Neste espaço de tempo os defensores
dos direitos, para se afirmarem, tiveram que enfrentar os poderes religiosos (a
resistência das igrejas), os poderes políticos (resultantes do estado de
conquista) e , por fim, o poder econômico (o peso do capital).
Uma distinção chama a atenção: na luta pela conquista da primeira
geração dos direitos – sob a égide da ideologia liberal - o indivíduo
posicionava-se contra o estado (absolutista). Na segunda geração, a dos
chamados direitos sociais – sob influência do socialismo -, o estado
(preferivelmente democrático) é visto como aquele que irá garantir as
conquistas alcançadas, evitando que o poder econômico as revogue.
Os direitos, por serem históricos, jamais serão os
mesmos e nunca serão estáticos. Cada época formula um conjunto deles para ser
atingido, novos grupos sociais, sexuais ou étnicos, a cada instante solicitam
que suas demandas sejam atendidas e incorporadas no corpo geral dos direitos.
Esses, agindo como se fossem ondas, atingem as praias das nações mais distantes
e afastadas. Vivemos, pois, no que Bobbio chamou de a Era dos Direitos, uma
longa caminhado da humanidade em direção a maior liberdade e maior igualdade
possível.
Mais Bobbio Justiça e Liberdade.
História - Cultura e Pensamento
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua visita foi muito importante. Faça um comentário que terei prazaer em responde-lo!
Abração
Dag Vulpi