domingo, 28 de agosto de 2011

Reforma política pode ser combate ao ´toma lá, dá cá´


Políticos, especialistas, cientistas políticos analisam a atual crise de ética que envolve agentes do Governo



Como fazer o governo deixar de ser refém dos partidos que dão sustentação no Congresso? Como evitar as barganhas, o chamado "toma lá dá cá" ou como está sendo definido agora, o "governo de transação"? A resposta, para a maioria dos parlamentares, cientistas políticos, historiadores e integrantes do judiciário é a reforma política.

"Somente uma reforma política séria pode acabar com as irregularidades, a corrupção. Vai permitir que governantes deixem de ser reféns de integrantes da base aliada. Com a reforma política, que torne os partidos fortes, pode-se saber quem é quem e isto ajuda o governo e garantir a governabilidade", diz o deputado Raimundo Gomes de Matos (PSDB-CE).

"A reforma política é fundamental. A economia se moderniza, a cultura se moderniza e a política também vai se modernizar", avalia o cientista político e professor da Faculdade Processus, de Brasília (DF) Gustavo Javier Castro Silva.

Indagado se esta crise de governabilidade, com a instituição dos governos ´reféns´ de políticos é uma constante só no Brasil ou acontece em outros países democráticos o professor afirmou que "essa é uma crise profunda da estrutura política do Brasil, que está passando por um processo de modernização e substituição das heranças políticas. Os antigos centros de poder estão de alguma maneira perdendo alguma força".
 
Apesar de ser apontada como a única esperança de se quebrar o ciclo vicioso de favores e "conchavos" a reforma política em votação no Congresso não deve representar uma mudança profunda em curto prazo, na opinião do presidente do TSE, ministro Ricardo Lewandowski.

Ele disse não acreditar que ocorram mudanças profundas na legislação eleitoral para as Eleições 2012, devido à proximidade do pleito.

"A reforma política é uma reforma de muito fôlego", disse Lewandowski, acrescentando que a reforma exige uma alteração da Constituição e da legislação ordinária. "Penso que não haverá tempo para uma reforma muito ampla", avaliou.

Crise ética
Ainda segundo Gustavo Castro a crise ética vivida dentro do governo Dilma Rousseff com certeza é um reflexo do sistema político brasileiro, e especificamente do presidencialismo brasileiro após a volta à democracia. "O presidente não tem todos os poderes de um chefe de estado puro. Existe no sistema de governo brasileiro uma clara necessidade do Executivo fazer alianças para a governabilidade. A questão mais importante são as características dessas alianças. Porque elas e as negociações são parte da essência da política, o problema está na ligação que os grupos políticos dominantes no Brasil tem com o sistema clientelista, coronelista e com elites de um passado não tão remoto do Brasil", afirma.

Ele avalia que diferença frente a outras democracias mais antigas é que, no Brasil, "essa cultura coronelista e  clientelista tem uma força que realmente chega a ser inimaginável que entra em todos os níveis do estado brasileiro".

Isso contamina desde uma secretaria em uma pequena repartição publica até ministros de estado. "São lealdades espúrias construídas durante décadas", critica Castro.

O sistema híbrido de presidencialismo no Brasil, onde o presidente precisa do apoio do Congresso para respaldar suas decisões também foi apontado pelo doutor em Sociologia e professor da Processus, Alejandro Olivieri. "O problema não é desse governo, pois o sistema presidencialista brasileiro tem uma característica específica que fica muito dependente da construção da base parlamentar".

De acordo com Alejandro Olivieri, "sem a reforma política, o presidencialismo brasileiro, que é um pouco capenga, fica muito dependente da negociação política no varejo".

Para ele, esse fato tira do governo federal a capacidade de gerar política de longo prazo, pois toda a sua base está construída a partir de negociações específicas.

Olivieri defende que para acabar com as pressões sobre o presidente da República, seja ele quem for, é fundamental a "reforma política, mas uma reforma que ataque os vícios desse sistema político".

Um conjunto de medidas que a própria classe política diz ter desejo de fazer, mas que nos bastidores ninguém faz porque isso faria com que muitos perdessem poder. Para os cidadãos que acompanham o debate, a sensação é que só haverá reforma política no País quando essa liderança política não for afetada pela própria reforma.

FIM DA FAXINA

Aliados negam que gestão esteja refém dos partidos.
Para a oposição, o abandono da causa da moralidade pública pode comprometer a governabilidade.

Enquanto chovem críticas da oposição, de partidos menores da base, como o PSB e da própria sociedade, em relação à crise ética no governo Dilma Rousseff e ao fim da chamada "faxina ética", os integrantes dos mais fortes partidos da base aliada, isto é, PMDB e PT negam que o governo esteja refém de seus aliados.

Indagado sobre o alto preço que o governo está pagando pelo apoio dos partidos da base e se a presidente Dilma está refém destes aliados, o deputado Danilo Forte (PMDB-CE) não concorda com esta visão. "Acho que não existe isso de refém. E a que preço você está se referindo? Compreendo que não há preço. A presidente colocou em pauta a austeridade na gestão do país e uma limpeza ética e com isto ela está inibindo as iniciativas indecorosas de gastos irregulares com recursos públicos," avalia.

Para Danilo Forte, "o ajuste fiscal e a redução dos investimentos reduziram a perspectiva de troca de favores menores". O contingenciamento de recursos foi analisado por um prisma totalmente diferente pelo deputado peemedebista Mauro Benevides, que diz entender a razão dos movimentos de revolta dentro da base aliada: "Alguns parlamentares se ressentem porque se sentem desprestigiados (sobre o contingenciamento de obras)".

Tanto Danilo Forte, como Mauro Benevides defendem que dentro do PMDB não há pressão sobre a presidente e que o partido é o principal aliado do governo. "Acredito que o PMDB sempre esteve consciente que ao longo do tempo sobretudo quando se promoveu a redemocratização do país, o partido sempre foi um sustentáculo da governabilidade. Se naquele ou noutro momento surge divergências entre o partido e setores do planalto isso é normal no sistema democrático".

Mas o indício mais evidente que tudo isso já foi ultrapassado é que na ultima terça, na residência do vice-presidente Michel Temer houve uma confraternização da bancada aliada com a presidente Dilma Rousseff, isso sinaliza para o entendimento e sobretudo para um apoio às políticas públicas que estão sendo colocadas em prática pelo governo petista.

Agendas da base
O vice-líder do governo na Câmara, o petista José Guimarães (CE), refuta veementemente que os partidos da base, incluindo o PT, estejam fazendo o governo Dilma refém de suas agendas pessoais, como a liberação de recursos e a concessão de cargos do segundo e do terceiro escalão.

"O governo tem sua agenda e precisa de apoio do Congresso para aprovar parte dela que depende de leis e emendas constitucionais. Mas o governo não está e nem deve ficar refém de ninguém, muito menos da base do governo. É uma interdição. Nós temos um sistema presidencialista dependente de uma relação congressual que não é uma relação programática. Essa é uma deformação do sistema político e eleitoral brasileiro. Você só corrigira essa deformação com uma radical reforma política", assevera.

Miséria
Ao afirmar nesta semana que "a verdadeira faxina, é a da miséria", a presidente da República, Dilma Rousseff colocou uma pedra em cima dos sonhos da oposição e de parte da sociedade de ver continuar, dentro do seu governo, a limpeza ética que vinha sendo promovida nos últimos dois meses com o afastamento de quatro ministros, três deles envolvidos em denúncias de irregularidades. Na avaliação da oposição, o abandono da causa da moralidade pública pode comprometer a governabilidade e manter uma gestão baseada no "toma lá, dá cá".

AVALIAÇÃO
Oposição critica troca de favores
Dilma Rousseff, quando reafirmou que a "faxina (ética) não é meta de governo" volta a acender o pavio da munição dos oposicionistas no Congresso, que retornam com força o discurso de que seu governo é refém dos partidos da base aliada. A oposição critica o método pouco democrático de trocar a liberação de recursos e a concessão de cargos pelo apoio e com isto garantir a governabilidade.

Nesta semana, até um aliado, governador do Ceará Cid Gomes (PSB) declarou publicamente que Dilma está nas mãos não só do PMDB, mas também do PT. A presidente, que desde o início do governo vinha tentando impor sua marca de austeridade fiscal e seriedade política, sem conchavos, agora sucumbe à força da necessidade de manter seu governo estável.

"Acho que combate-se o malfeito. Não se faz disso meta de governo. Faxina no meu governo é faxina contra a pobreza. É isso que é a faxina. O resto são ossos do ofício da Presidência. Se houver algum malfeito, eu tomarei providências", afirmou a presidente. As denúncias que ainda pesam contra o ministro do  Turismo, Pedro Novais, e das Cidades, Mário Negromonte, podem abalar a decisão da presidente de acabar com a "faxina" e acalmar os aliados.

Para o doutor em História Social e professor da Universidade de São Carlos, Marco Antônio Villa, nos últimos meses a sociedade construiu mitos em torno da atuação da presidente Dilma Rousseff, sempre em busca de um papel para a presidente, como sua marca pessoal e sem os ecos do seu antecessor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diretamente responsável pela eleição de Dilma.

Villa classifica-a como "parceira e artífice" não de um governo de transição, mas sim de um governo de "transação".

"A presidente Dilma Rousseff foi transformada, da noite para o dia, em uma genial gestora pública. Falava-se que ela não aparecia em público porque priorizava o trabalho administrativo. Era uma devoradora de relatórios. Exigia o máximo dos seus ministros. Conhecia detalhadamente os principais projetos do país. Era tão diferente de Lula", destaca,

Segundo Villa, a fase "faxineira" durou menos do que o esperado. O doutor em História Social acredita que os partidos da base continuam mais preocupados com seus interesses paroquiais do que com a governabilidade. "Em meio à crise, os partidos continuaram exigindo cargos e favores. Sabiam que a apuração era para inglês ver. Trocavam-se os nomes mas não as práticas," avaliou.

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