terça-feira, 17 de maio de 2011

MACHADO DE ASSIS DEFENDE CAPITU

Capitu Surfistinha

Talvez a maior e mais persistente polêmica brasileira seja se Capitu traiu ou não Bentinho com Escobar. Até o presente momento, eu não quis entrar nessa celeuma. Imaginei que, se esclarecesse o enigma, eu iria esvaziar muitas teses de mestrado, muitas festas literárias e suas mesas redondas. Alguns livros sobre o tema seriam simplesmente ignorados.

Sentia-me mais ou menos como um cientista que descobre a cura para uma doença importante, mas que ao mesmo tempo compromete os lucros da indústria farmacêutica. entendi que era hora de vir a público, por meio do meu blog, resolver o enigma.

A verdade é que todo esse mistério foi obra de um processo não desejado. Na primeira versão do romance, eu havia deixado tudo muito claro – e o fui, até nos mínimos detalhes, para que não restasse dúvida alguma.

Havia um capítulo em que Bentinho flagrava Capitu e Escobar na cama, mais um camelo e três anões besuntados. Dois escravos negros assistiam a tudo – um gemia, o outro procurava olhar para o lado. Capitu coordenava a todos, menos o camelo, que se encarregava apenas de beber a água espalhada nos seus seios. Os anões, por sua vez, ocupavam o que havia de disponível em Capitu e Escobar – que parecia ser o mais contente da festinha. Para deixar mais claro que aquela era uma cena de adultério, Capitu gritava: “Isso aqui não é só aaaaaaahh sexo! Isso, isso, isso é amooooor! Eu amoooooo fazer isso! Vamos, Escobar! Não pára, não pára, safadinho!”. Os escravos estavam na cena para alimentar a imaginação dos sociólogos e historiadores. Fui mostrar essas páginas para um amigo que considerava arrojado. Ele me disse que eu estava muito louco, que precisava me acalmar e recomendou-me que tomasse um chá. Então, fundei a Academia de Letras. Outro escritor próximo objetou que não havia camelos no Brasil. Então, mudei para uma anta, o que retirou um pouco do erotismo e criou um significado indesejado. Por tudo isso, acabei por retirar tal capítulo do romance, o que provocou todo esse mistério.

Mas devo dizer que Capitu foi uma personagem que cresceu, tomou vida própria, fugiu-me ao controle. Tanto que, quando vi, ela havia ofertado o seu sexo para o livro inteiro e para toda a sua cadeia produtiva. Capitu não se contentou só com os personagens disponíveis nas páginas. Seguiu sua sanha com o editor, o diagramador, o revisor e até com o pessoal da gráfica, que de tão felizes não param de me mandar calendários promocionais. Ô olharzinho oblíquo e dissimulado poderoso, esse.

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Dag Vulpi

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