Grampos
mostram o secretário da Justiça Romeu Tuma Júnior tentando comprar videogame em reduto de pirataria e revelam sua amizade com chinês acusado de contrabando.
"ASSESSOR ESPECIAL"
Paulo Li (de costas), com Lula e o ministro Tarso Genro: o convite para ir à solenidade partiu do amigo Tuma Júnior, de quem o chinês era "assessor especial", segundo anuncia seu cartão de visita.
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O que acontece
quando um secretário nacional de Justiça é pego em flagrante intimidade com
alguém acusado de viver da pouco honrosa atividade de importar celulares
baratos, etiquetá-los com marcas famosas e revendê-los como se legítimos
fossem? E o que acontece se esse secretário, que é também presidente do
Conselho Nacional de Combate à Pirataria, é gravado cotando o preço de uma
muamba com a ajuda do mesmo amigo suspeito? A resposta é: não acontece nada. Ao
menos até o presente momento, o delegado Romeu Tuma Júnior segue sua função
como presidente do conselho cuja principal atribuição é definir os caminhos
pelos quais o estado brasileiro vai combater o crime da pirataria. Não há
dúvida de que ele entende do assunto.
Em 2008, a
Polícia Federal começou a investigar uma quadrilha de contrabandistas chefiada
pelo chinês Lee Kwok Kwen, conhecido como Paulo Li. A quadrilha movimentaria
pelo menos 12 milhões de reais por ano. Ao longo dos trabalhos, os policiais
depararam diversas vezes com telefonemas e e-mails para Li vindos de Tuma
Júnior. Algumas dessas conversas, publicadas pelo jornal O Estado de S.
Paulo, mostram o apreço que o secretário tinha pelo chinês, preso em
setembro de 2009. Em um dos diálogos interceptados pela polícia, ele chega a
convidar o amigo para dividir o mesmo quarto de hotel, numa viagem ao interior
de São Paulo. "Assim, você não gasta em hospedagem", diz. Em outra
gravação, Tuma Júnior aparece perguntando a Li se o videogame Wii está à venda
"lá na Vinte e... lá na Paulista". O secretário se refere à Rua Vinte
e Cinco de Março, em São Paulo, reduto de produtos piratas e contrabandeados, o
mesmo tipo de comércio praticado numa conhecida galeria da Avenida Paulista.
Tuma Júnior prossegue: "Dá pra saber quanto é que é? Eu preciso comprar
pra Renata (sua filha), mas na Europa tava caro". Li diz que vai
passar na loja para olhar, ao que Tuma responde: "Tá bom (...) Daí me
fala, aí eu já levo o dinheiro pra você". Outras conversas sugerem também
que o secretário prestava favores a Li, facilitando ou agilizando a liberação
de vistos para imigrantes chineses. Em e-mails endereçados a Tuma Júnior, Li
relaciona números de processos e lhe pede providências. Em julho passado, na
cerimônia de sanção da lei de anistia a imigrantes ilegais, Tuma Júnior levou o
amigo a Brasília. Li posou para foto ao lado do presidente Lula e do então
ministro da Justiça, Tarso Genro.
Li não é
íntimo apenas de Tuma Júnior, mas também de seu pai, o senador Romeu Tuma. Na
década de 80, quando Tuma era superintendente da PF em São Paulo, ele dava
aulas de kung fu aos policiais federais. Foi quando conheceu Tuma Júnior. Mais
tarde, participou da eleição do amigo para deputado estadual e tornou-se seu
assessor parlamentar. No dia em que Li foi preso, os policiais encontraram no
escritório dele um cartão de visita que o apresentava como "assessor
especial" da Secretaria Nacional de Justiça. O escândalo veio à tona na
quarta-feira. No mesmo dia, o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, chamou o
diretor-geral da PF, Luiz Fernando Corrêa, para lhe pedir um relatório sobre a
participação do secretário no episódio. Parte da conversa foi presenciada pelo
próprio Tuma Júnior. No dia seguinte, o ministro declarou que não iria
"sair rifando as pessoas, condenando e executando a condenação em
público".
O fato de o
secretário continuar até agora no cargo pode ter outra explicação além da
notória candura com que o governo do PT trata aliados flagrados em situações
pouco republicanas. Tuma Júnior foi nomeado para a Pasta da Justiça mediante
uma barganha que envolveu a ida de seu pai para o PTB, da base governista.
Ocorre que, nestas eleições presidenciais, o partido ainda não definiu se vai
ficar ao lado da candidata petista, Dilma Rousseff, ou se bandear para a arena
do tucano José Serra – no nível estadual, o apoio ao PSDB já está praticamente
acertado. Assim, quando o governo se empenha em blindar Tuma Júnior – "um
homem que tem uma folha de serviços prestados a este país", nas palavras
do presidente Lula –, está de olho no peso que Romeu Tuma tem dentro do PTB e
na possibilidade de que o cacique o utilize em favor de Dilma Rousseff.
Enquanto as negociações não se definem, a Secretaria Nacional de Justiça e o
Conselho Nacional de Combate à Pirataria continuarão sob o comando de alguém
que não vê nenhum problema em dividir um quarto com um sujeito enrolado com a
Justiça e comprometido com a pirataria. Parece deboche? Pois é mesmo.
BLINDAGEM
O governo sai em defesa de Tuma Júnior para tentar atrair Tuma pai (à esq.) e seu PTB para o palanque petista. Para o ministro Barreto (à esq), não se pode "sair rifando as pessoas"
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