No artigo que foi postado originalmente no site da fundação
Maurício Grabois, e posteriormente publicado no grupo Consciência Política
Razão Social no Facebook, ele descreve o desempenho do Produto Interno Bruto
(PIB) brasileiro em 2012, as justificativas apresentadas pelo governo e a repercussão
que os baixos índices causou na mídia, e as críticas feita pelos oposicionistas.
Por Osvaldo Bertolino - "A reação da mídia e dos
tucanos em geral ao desempenho medíocre do Produto Interno Bruto (PIB)
brasileiro em 2012, com um miserável crescimento de 0,9%, já raiou a
indecência. Imediatamente após a divulgação dos números, a manipulação tomou
conta do noticiário econômico. Há, evidentemente, problemas muito mais graves
do que os apontados pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, mas eles passaram
longe dos diagnósticos midiáticos."
Segundo
o ministro, a causa engloba o baixo desempenho da agropecuária — provocado pelo
período de seca e chuvas no país — e da indústria, que “teve um resultado
fraco”. Além disso, ele afirmou que o ano passado foi afetado pela crise geral
do economia global, a exemplo do que aconteceu em 2009, quando a economia teve
retração de 0,3%.
Os
números divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
mostram uma desaceleração, já que em 2011, ante 2010, a economia teve uma
expansão de 2,7%. No acumulado de 2012, a indústria teve uma retração de 0,8%
no PIB na comparação com o ano anterior. Agropecuária também apresentou
retração no período — queda de 2,3%. Na contramão, o setor de serviços encerrou
o ano passado com crescimento de 1,7%.
O
ministro comentou ainda que, ao passo que o segmento industrial teve um PIB
fraco, a atividade de serviços teve um desempenho positivo. Comparado com o
trimestre anterior, o PIB dos três últimos meses do ano passado registrou um
avanço de 0,6%, na série com ajustes sazonais. Anualizando esse resultado, a
economia está avançando 2,2%, afirmou Mantega, destacando que o crescimento de
serviços “teve uma expansão anualizada de 4,4%”.
Pelo
lado da demanda, o consumo das famílias cresceu 3,1% em 2012. Os gastos do governo
tiveram expansão de 3,2% e a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) — que
representa o investimento em máquinas e equipamentos e na construção civil —
caiu 4% em 2012 sobre 2011. Os dados do IBGE revelaram ainda que a taxa de
investimento atingiu 18,1% do PIB no ano passado. Em 2011, o investimento
representou 19,3% do PIB, e 19,5% no ano anterior. Essa taxa, portanto, vem
baixando desde 2010. No setor externo, as exportações cresceram 0,5%, segundo o
IBGE. Do outro lado, o das importações, houve avanço de 0,2% em 2012.
Taxa de investimento
A
taxa de investimento é o problema que mais chama a atenção. Chegou a hora de
nos livrarmos definitivamente da bola de chumbo que a “era FHC” atou ao
tornozelo da produção nacional — as altas taxas de juros — e voltarmos os olhos
com mais atenção para o crescimento econômico. Além de ser preciso acabar com
esse fundamentalismo monetário dos xiitas neoliberais, o Brasil precisa
persistir no caminho da geração de empregos e renda. Além do palanque, a força
dos governistas consiste em gerar números e fatos que confirmem as propostas
que fizeram os brasileiros optarem por três governos sucessivos de viés popular
e democrático. E assim, fechar os espaços para a especulação politiqueira da
mídia.
Não
é à toa que o tucanato midiático mandou as manipulações que envolvem desde a
segurança pública no país — a pauta do caos — para segundo plano no noticiário
político e se concentrou da mediocridade do PIB. A politicagem segue sempre
cursos mais fáceis para arrastar o debate eleitoral para os subníveis da
histeria. No terreno, contudo, a direita não tem o que apresentar além da
proverbial repetição de números e frases vazias a la Goebbels. Ela pretende,
obviamente, ressuscitar o projeto neoliberal. O desafio é neutralizar a dicotomia
entre inflação baixa, represada pelos juros altos, e crescimento econômico sem
mexer nos fundamentos do modelo que reinou na “era FHC”. A mídia diz que é
possível. O povo não acredita. Por isso, qualquer candidatura que surgir
empunhando essa bandeira tende a não decolar.
Como
não dá para servir a dois senhores, o campo conservador está claramente a
serviço do capital financeiro e terá de deixar isso claro no curso do debate
eleitoral. FHC prometeu conciliar esses conceitos opostos e não cumpriu. Nem tentou
— o que demonstra a demagogia eleitoreira da direita ao atacar o governo com os
números do IBGE. Por que o povo acreditaria que agora isso será possível? O
campo governista, por seu turno, leva vantagem por dizer claramente o que
pretende fazer. E por isso contraria alguns e agrada muitos. Seu programa não
deixa margem para dúvidas sobre qual rumo o país deve seguir.
Ritmo e rumo
Mas
a velocidade não pode ser essa. É preciso ajustar o ritmo ao rumo. Temos
problemas estruturais que exigem bisturi; não se resolvem com anestésicos e
muito menos com panos quentes. Aparentemente, o governo está e continuará
caminhando nessa direção — e isso é bom. Mas também é certo que está faltando
em Brasília, ao lado dessa vontade política, o sentimento de que tais medidas
demandam velocidade, de que é preciso adequar o próprio passo ao ritmo ditado
pela fome sagrada de um país em crescimento, e nunca o contrário. O Palácio do
Planalto precisa ter mais claro que os interesses de uma nação e os de sua
elite conservadora não coincidem e que aqueles devem sempre se sobrepor a
estes. Eis a questão.
Os
brasileiros elegeram esses três governos sucessivos basicamente porque o
crescimento econômico e a geração de empregos não apareceram no debate
eleitoral como algo estrambótico — como nas propostas do campo conservador.
Esses itens do programa de governo estavam solidamente amarrados pelas
propostas de boa administração macroeconômica e vigor na ação social. E esse
escopo abarcava as aspirações de camadas da população nas quais se encontram
desde o sujeito socialmente excluído até uma sólida fatia do empresariado
nacional produtivo.
Os
tucanos José Serra e Geraldo Alckmin, os candidatos conservadores que perderam
as eleições presidenciais para Luis Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, não
passaram verdade em suas falas. Eram claramente os candidatos do sistema que
sempre oprimiu o povo, gente do mundo do dinheiro e da mídia. Lula e Dilma, por
sua vez, passaram segurança ao dizerem que levariam país ao encontro da sua
vocação histórica de independência e progresso. E viraram o alvo preferencial
do poder econômico. Era previsível, portanto, que o debate eleitoral, deixaria
a esfera das propostas de gestão para o país e entraria no terreno do
espetáculo circense. E aí surgiram uma sucessão de denúncias vazias — sendo a
mais grave delas a farsa do “mensalão” — bem ao da mais completa desonestidade
política histórica do campo conservador.
Debate desde já
O
governo brasileiro e a sua base política de sustentação entre o povo têm o
grande desafio de fazer esse debate com firmeza desde já. Os efeitos da crise
geral do capitalismo, evidentemente, devem ser considerados. Mas há o outro
lado da moeda. Uma das características mais marcantes deste cenário é a
passagem para uma nova fase da economia em muitos lugares — sobretudo na
América Latina —, distinta daquela histeria inaugurada nos anos 1980 pelos
governos neoliberais de Margareth Thatcher (Inglaterra) e Ronald Reagan
(Estados Unidos). Ali começou a pregação fundamentalista de que as “forças de
mercado” substituiriam com sucesso a “vontade dos governos”. A justificativa
para isso era a suposição arbitrária de que os defeitos dos governos seriam
mais perversos à sociedade do que as falhas do mercado.
A
essa idéia somou-se uma outra: a de que os países menos desenvolvidos deveriam
afrouxar os controles para a circulação de capitais em suas fronteiras. Essa
tese, um tanto paranoica, serviu a ideologias que veem o mundo numa fase final
da história, na qual só resta o caminho da conformação do eterno conflito entre
ricos e pobres, entre centro e periferia. De acordo com esse raciocínio, a
causa da pobreza de muitos não seria mais os instrumentos que garantem a
riqueza de poucos.
O
prêmio Nobel de economia de 1995, Robert Lucas, chegou a proclamar: “Quando se
começa a pensar em crescimento, é difícil pensar em qualquer outra coisa.” Ou
seja: para ele, diante da importância do crescimento seria difícil dar ênfase a
outras políticas econômicas. O efeito extraordinário do crescimento econômico,
no entanto, não pode obscurecer questões importantes para medir o seu efetivo
benefício para o conjunto da sociedade.
Distribuir
renda e riqueza
A
constatação de que o impacto do crescimento econômico sobre o bem-estar da
população é decisivo leva imediatamente à pergunta (particularmente importante
para os países com muitas pessoas pobres, como é o caso do Brasil): como
distribuir esta riqueza de forma eficiente? Entre os fatores determinantes para
a melhor utilização dos recursos disponíveis estão o papel do Estado como um
ente preparado para a prestação de serviços sociais, os investimentos em
infra-estrutura e a elevação dos salários.
No
fundo, esse é o debate que realmente interessa. Economias do tamanho da
brasileira não costumam crescer a taxas acima de 5% ao ano. Mas o Brasil não só
precisa dessa taxa como precisa que ela seja contínua — conceito que alguns
chamam de “crescimento sustentável”. Para reduzir a pobreza, elevando a renda
per capita, estudos mostram que o PIB precisa crescer entre 5% e 6% ao ano apenas
para incorporar a mão-de-obra que está entrando anualmente no mercado de
trabalho — além de absorver parte dos desempregados.
Crescimento
não é igual a desenvolvimento. Entre o final dos anos 1960 e o início da década
de 80, o Brasil cresceu a taxas anuais superiores a 8%. Nem por isso as
desigualdades de renda diminuíram na mesma proporção. A Finlândia não cresceu
tanto, mas sua população de 5 milhões de habitantes tem uma renda per capita em
torno de 20 mil dólares, segundo o Banco Mundial. Sob diversos parâmetros —
expectativa de vida, taxa de mortalidade infantil, índices de escolaridade —,
os finlandeses têm características de país muito mais desenvolvido que o
Brasil.
Para
crescer e desenvolver-se, um país precisa, antes de tudo, aumentar a sua produtividade.
Isso é feito, basicamente, pela incorporação de máquinas mais modernas, pela
qualificação da mão-de-obra e pela adoção de formas mais eficientes de
produzir. E a riqueza produzida precisa ser melhor distribuída, por meio de
investimentos sociais e infra-estruturais e da elevação da renda para quem vive
de salários.
Diagnóstico da Cepal
Em
2008, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) divulgou um
cálculo ilustrativo. Se o crescimento da produtividade fosse igual a zero, as
economias da região precisariam crescer a uma taxa anual de 2,1% até o ano
2015, apenas para evitar um aumento do desemprego. Se a produtividade crescesse
no ritmo de 3,7% ao ano (média do período 1950/1973), então o PIB precisaria
variar 5,8% ao ano. Como a produtividade brasileira vem crescendo em média 7%
anuais, é claro que o crescimento do PIB precisa ser ainda maior, apenas para
não criar mais desempregados.
E
será que uma economia de aproximadamente R$ 3 trilhões pode se dar a esse luxo?
É claro que tamanho faz diferença, mas é preciso aqui fazer outra constatação.
Países desenvolvidos já possuem usinas de energia, estradas e outras
infra-estruturas para atender a suas necessidades. Nesses casos, o crescimento
tende a ser naturalmente mais lento. Mas no Brasil ainda há muito o que fazer.
O país precisa, desesperadamente, de melhorias infra-estruturais. Ou seja: o
Brasil não só pode como deve crescer acima de 5%.
A
Cepal identificou que, ao menos no médio prazo, o crescimento da América Latina
pode ser assegurado pelas altas dos preços internacionais das commodities. A
região é dona de grandes reservas minerais. Na avaliação da Cepal, os países
latino-americanos deveriam aproveitar o momento mais favorável para reforçar
sua presença internacional e rever alguns modelos mais frágeis que ainda servem
de sustentação econômica. Entre as prioridades estariam reduzir a dependência
das exportações de produtos básicos.
O
pensamento progressista latino-americano há tempos discute os obstáculos
impostos à industrialização do sub-continente. A Cepal foi a referência maior
nesse debate, inaugurado pela reflexão inspiradora de Raúl Prebisch sobre os
vínculos desiguais entre as economias centrais e as regiões periféricas, e a
necessidade de maior coordenação entre os países da América Latina para superar
óbices como a deterioração continuada dos termos de nosso intercâmbio com a
Europa e os Estados Unidos.
Estado mais cobrado
Sabemos
que no Brasil esse desafio não foi enfrentado. O país levou a cabo um extenso
programa de substituição de importações, modernizou seu parque industrial, mas
manteve largos segmentos inteiramente à margem do processo produtivo, sem
acesso às benesses do crescimento. Com poucos governos de visão social, o
Estado esteve por muito tempo ausente não apenas da tarefa de distribuir renda
mas também da de habilitar toda a sociedade a participar da dinâmica produtiva.
A
máquina pública expandiu-se, mas para contemplar interesses elitistas, sem
atenção aos reclamos da maioria da população. Na “era neoliberal”, o assédio
institucionalizado de setores privilegiados aos canais de decisão foi
explícito. Acentuou-se o vício histórico do patrimonialismo, em que o público
se vê refém do privado.
Essa
situação começou a mudar com o governo Lula. Com o avanço da cidadania, a
sociedade também avançou. Multiplicaram-se as instâncias de representação. Os
movimentos populares abriram espaços cada vez mais amplos para o debate público,
atuando como uma verdadeira ágora desses novos tempos.
Mas
o Estado ainda precisa ser mais bem cobrado no desempenho de suas tarefas. Os
nichos historicamente privilegiados devem estar sob o crivo de segmentos
sociais mais vigilantes para impor limites à privatização do Erário. O governo
federal tem feito esforços para democratizar o Estado, para que ele se torne
mais transparente e responsável.
Iniciou
a concertação do poder público com os movimentos sociais. A descentralização
administrativa e orçamentária também concorreu para aproximar a população do
gestor público. No entanto, o governo precisa acelerar a recuperação da
capacidade do Estado cumprir seu papel. Ou melhor: o Estado precisa se
credenciar para cumprir finalmente a meta de universalização dos serviços
públicos.
Pode-se
dizer que estamos passando de um Estado do mal-estar social para a
possibilidade de se ter um Estado virtuoso, que assegure a todos os brasileiros
condições satisfatórias de vida. Mas o ritmo ainda é lento. Ainda temos uma
política monetária indomada e uma condução tímida das diversas políticas
públicas — condições que implicam em temor sobre a longevidade e eficiência do
crescimento do PIB.
Via Fundação Mauricio Grabois
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Via Fundação Mauricio Grabois
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