Por Alexandro
Kichileski*
Terminado o processo eleitoral das eleições municipais de 2016 foi possível constatar um porcentual
considerável de votos invalidados, por vezes maiores que dos candidatos
eleitos. E esses votos inválidos apresentam um problema que necessita ser
pensado com seriedade. Afinal, o que há de errado? Quais
fatores desencadearam esse fenômeno? Penso que é preciso
observar a questão a partir de duas prerrogativas: a primeira no contexto da Modernidade e
a segunda diante as especificidades próprias do Brasil.
Na
Modernidade é observado a descrença nas instituições públicas e no nosso
sistema representativo. Porém, diferente de outros contextos históricos, essa
descrença não vem com uma organização social querendo uma ruptura, apresentando
novos projetos societários. Pelo contrário, é sinalizado pela brutal indiferença. É
óbvio que existe, no tecido social, grupos mobilizados, mas esses geralmente
são marginalizados pela Opinião Pública, sobretudo pelos setores conservadores.
Nós
estamos reféns de uma cosmovisão endossada pelo direcionamento dos desejos ao
consumo, e amparado a isso, a constante mutilação de tudo que remete ao
público/coletivo. Nossa opinião é formada pelos aparelhos midiáticos, que por
sua vez dependem da publicidade. Como observado por Dominique Quessada, a publicidade
comunica, mas na ideologia consumista ela é uma ferramenta que [re]orienta os
cidadãos (ou seriam consumidores?) a negar os elementos simbólicos da
coletividade, ressaltando o ideal de vida apenas no individualismo
exacerbado. Podemos compreender, inclusive, esse fenômeno como manifestação que
rivaliza com o discurso político. Assim, existe uma ideologia que se
diz contra ideologias e associa a política a tudo que é pejorativo. Nessa
lógica maniqueísta o discurso apolítico é visto como ideal a ser seguido nesse
mundo desencantado.
Dito
isso, parto para a segunda prerrogativa. Acredito que o primeiro problema é a
ausência de rupturas políticas na História do Brasil. Nosso processo político
sempre se deu de forma mais conciliadora. A transição do modelo colonial para o
império foi regido pelo filho do rei. Pagamos, aliás, indenização à
Portugal. Posteriormente, como observado pelos historiadores, a República veio
por setores sociais que já se beneficiavam das políticas do Império e apesar da
etimologia da palavra, a grande maioria da população brasileira não participou
desse evento histórico. Quando houve uma tentativa de reformas profundas, com o
Jango, grupos opositores aproveitaram da histeria anticomunista e com os
militares o tiraram do poder. A redemocratização, depois de décadas de
obscurantismo, veio aos poucos, consentida pelos militares e diversos figurões estão
no exercício político até hoje.
Quase
sempre a política brasileira foi dirigida por poucos e focado para poucos.
Havendo momentos mais populares, mas sob os olhos dos setores dominantes. A
participação democrática da população é extremamente recente.
Dentro do habitus da
grande maioria, o envolvimento político não faz parte de sua realidade, e esse
distanciamento excludente é internalizado e naturalizado no processo de
socialização. Some-se isso ao contexto da modernidade e da ideologia dominante,
que procura destruir toda a credibilidade do que representa o bem comum, sejam
os partidos, sindicatos e movimentos sociais, teremos uma carga explosiva de
aversão, indiferença e desprezo pela política e por aqueles que estão nesse
meio. E esse reflexo está nas urnas, não só nas abstenções/nulos, mas nos
discurso de vários prefeitos eleitos.
*Alexandro
Kichileski é Professor de Sociologia
Artigo
publicado no jornal impresso Folha de Londrina
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