(em francês:
Révolution Française, 1789-1799) foi um período de intensa agitação política e
social na França, que teve um impacto duradouro na história do país e, mais
amplamente, em todo o continente europeu. A monarquia absolutista que tinha
governado a nação durante séculos entrou em colapso em apenas três anos. A
sociedade francesa passou por uma transformação épica, quando privilégios feudais,
aristocráticos e religiosos evaporaram-se sobre um ataque sustentado de grupos
políticos radicais de esquerda, das massas nas ruas e de camponeses na região
rural do país.
Queda da Bastilha em 14 de julho de 1789. |
Antigos ideais
da tradição e da hierarquia de monarcas, aristocratas e da Igreja Católica
foram abruptamente derrubados pelos novos princípios de Liberté, Égalité,
Fraternité (em português: liberdade, igualdade e fraternidade). As casas reais
da Europa ficaram aterrorizadas com a revolução e iniciaram um movimento
contrário que até 1814 tinha restaurado a antiga monarquia, mas muitas reformas
importantes tornaram-se permanentes. O mesmo aconteceu com os antagonismos
entre os partidários e inimigos da revolução, que lutaram politicamente ao longo
dos próximos dois séculos.
Em meio a uma
crise fiscal, o povo francês estava cada vez mais irritado com a incompetência
do rei Luís XVI e com a indiferença contínua e a decadência da aristocracia do
país. Esse ressentimento, aliado aos cada vez mais populares ideais iluministas,
alimentaram sentimentos radicais e a revolução começou em 1789, com a
convocação dos Estados Gerais em maio. O primeiro ano da revolução foi marcado
pela proclamação, por membros do Terceiro Estado, do Juramento do Jogo da Péla
em junho, pela Tomada da Bastilha em julho, pela aprovação da Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão em agosto e por uma épica marcha sobre Versalhes,
que obrigou a corte real a voltar para Paris em outubro. Os anos seguintes
foram dominados por lutas entre várias assembleias liberais e de direita feitas
por apoiantes da monarquia no sentido de travar grandes reformas no país.
A Primeira
República Francesa foi proclamada em setembro de 1792 e o rei Luís XVI foi
executado no ano seguinte. As ameaças externas moldaram o curso da revolução.
As guerras revolucionárias francesas começaram em 1792 e, finalmente,
apresentaram espetaculares vitórias que facilitaram a conquista da Península
Itálica, dos Países Baixos e da maioria dos territórios a oeste do Reno pela
França, feitos que os governos franceses anteriores nunca conseguiram realizar
ao longo de séculos. Internamente, os sentimentos populares radicalizaram a
revolução significativamente, culminando com a ascensão de Maximilien
Robespierre, dos jacobinos e de uma ditadura virtual imposta pelo Comitê de
Salvação Pública, que estabeleceu o chamado Reino de Terror entre 1793 e 1794,
período no qual entre 16 mil e 40 mil pessoas foram mortas. Após a queda dos
jacobinos e a execução de Robespierre, o Diretório assumiu o controle do Estado
francês em 1795 e manteve o poder até 1799, quando foi substituído pelo
Consulado em 1799, sob o comando de Napoleão Bonaparte.
A era moderna
tem se desdobrado na sombra dos ideais conquistados pela Revolução Francesa. O
crescimento das repúblicas e das democracias liberais ao redor do mundo, a
difusão do secularismo, o desenvolvimento das ideologias modernas e a invenção
da guerra total tiveram o seu nascimento durante a revolução. Eventos
subsequentes que podem ser rastreados com a revolução incluem as Guerras
Napoleônicas, duas restaurações separadas da monarquia (a primeira em 1814 e a
segunda, a Restauração Bourbon, em 1815), e duas revoluções adicionais (1830 e 1848)
ajudaram a moldar a França moderna.
Antecedentes
A França
tomada pelo Antigo Regime era um grande edifício construído por cinquenta
gerações, por mais de quinhentos anos. As suas fundações mais antigas e mais
profundas eram obras da Igreja, estabelecidas durante mil e trezentos anos.
A sociedade
francesa do século XVIII mantinha a divisão em três Ordens ou Estados típica do
Antigo Regime – Clero ou Primeiro Estado, Nobreza ou Segundo Estado, e Povo ou
Terceiro Estado – cada qual regendo-se por leis próprias (privilégios), com um
Rei absoluto (ou seja, um Rei que detinha um poder supremo independente) no
topo da hierarquia dos Estados. O Rei fora antes de tudo o obreiro da unidade
nacional através do seu poder independente das Ordens, significando que era ele
quem tinha a última palavra sobre a justiça, a economia, a diplomacia, a paz e
a guerra, e quem se lhe opusesse teria como destino a prisão da Bastilha. A
França sofrera uma evolução assinalável nos últimos anos: não havia censura, a
tortura fora proibida em 1788, e a representação do Terceiro Estado nos Estados
Gerais acabava de ser duplicada para contrariar a Nobreza e o Clero que não
queriam uma reforma dos impostos. Em 14 de julho de 1789, quando a Bastilha foi
tomada pelos revolucionários, albergava oito prisioneiros.
Com a exceção
da nobreza rural, a riqueza das restantes classes sociais na França tinha
crescido imensamente nas últimas décadas. O crescimento da indústria era
notável. No Norte e no Centro, havia uma metalurgia moderna (Le Cresot data de 1781);
em Lyon havia sedas; em Rouen e em Mulhouse havia algodão; na Lorraine havia o
ferro e o sal; havia lanifícios em Castres, Sedan, Abbeville e Elbeuf; em
Marselha havia sabão; em Paris havia mobiliário, tanoaria e as indústrias de
luxo, etc..
Existia uma
Bolsa de Valores, vários bancos, e uma Caixa de Desconto com um capital de cem
milhões que emitia notas. Segundo Jacques Necker, a França detinha, antes da
Revolução, metade do numerário existente na Europa. Nobres e burgueses
misturavam muitos capitais em investimentos. Antes da Revolução, o maior
problema da indústria francesa era a falta de mão de obra. Desde a morte do rei
Luís XIV, o comércio com o exterior tinha mais do que quadruplicado. Em 1788,
eram 1,061 milhões de livres, um valor que só se voltará a verificar depois de 1848.
Os grandes portos, como Marselha, Bordéus, Nantes, floresciam como grandes
centros cosmopolitas. O comércio interior seguia uma ascensão paralela.
Sabendo-se que
existia uma burguesia tão enriquecida, muitos historiadores colocaram a
hipótese de haver uma massa enorme de camponeses famintos. Na França, o imposto
rural por excelência era a "taille", um imposto recolhido com base
nos sinais exteriores de riqueza, por colectores escolhidos pelos próprios
camponeses. A servidão dos campos, que ainda se mantinha em quase todos os
países da Europa, persistia apenas em zonas recônditas da França, e sob forma
muito mitigada, no Jura e no Bourbonnais. Em 1779, o Rei tinha apagado os
últimos traços de servidão nos seus domínios, tendo sido imitado por muitos
senhores.
Ao longo da
História, a miséria tem provocado muitos motins, mas em regra não provoca
revoluções. A situação da França, antes da Revolução, era a de um Estado pobre
num país rico.
Causas
As causas da
revolução francesa são remotas e imediatas. Entre as do primeiro grupo, há de
considerar que a França passava por um período de crise financeira. A
participação francesa na Guerra da Independência dos Estados Unidos da América,
a participação (e derrota) na Guerra dos Sete Anos, os elevados custos da Corte
de Luís XVI, tinham deixado as finanças do país em mau estado.
Os votos eram
atribuídos por ordem (1- clero, 2- nobreza, 3- Terceiro Estado) e não por
cabeça. Havia grandes injustiças entre as antigas ordens e ficava sempre o
Terceiro Estado prejudicado com a aprovação das leis.
Os chamados
Privilegiados estavam isentos de impostos, e apenas uma ordem sustentava o
país, deixando obviamente a balança comercial negativa ante os elevados custos
das sucessivas guerras, altos encargos públicos e os supérfluos gastos da corte
do rei Luís XVI.
O rei Luís XVI
acaba por convidar o Conde Turgot para gerir os destinos do país como ministro
e implementar profundas reformas sociais e econômicas.
Sociais
A sociedade
francesa da segunda metade do século XVIII possuía dois grupos muito
privilegiados:
o Clero ou Primeiro
Estado, composto pelo Alto Clero, que representava 0,5% da população francesa,
era identificado com a nobreza e negava reformas, e pelo Baixo Clero,
identificado com o povo, e que as reclamava;
a Nobreza, ou Segundo
Estado, composta por uma camada palaciana ou cortesã, que sobrevivia à custa do
Estado, por uma camada provincial, que se mantinha com as rendas dos feudos, e
uma camada chamada Nobreza Togada, em que alguns juízes e altos funcionários
burgueses adquiriram os seus títulos e cargos, transmissíveis aos herdeiros.
Aproximava-se de 1,5% dos habitantes.
Esses dois
grupos (ou Estados) oprimiam e exploravam o Terceiro Estado, constituído por
burgueses, camponeses sem terra e os "sans-culottes", uma camada
heterogênea composta por artesãos, aprendizes e proletários, que tinham este
nome graças às calças simples que usavam, diferentes dos tecidos caros
utilizados pelos nobres. Os impostos e contribuições para o Estado, o clero e a
nobreza incidiam sobre o Terceiro Estado, uma vez que os dois últimos não só
tinham isenção tributária como ainda usufruíam do tesouro real por meio de
pensões e cargos públicos.
A França ainda
tinha grandes características feudais: 80% de sua economia era agrícola. Quando
uma grande escassez de alimentos ocorreu devido a uma onda de frio na região, a
população foi obrigada a mudar-se para as cidades e lá, nas fábricas, era
constantemente explorada e a cada ano tornava-se mais miserável. Vivia à base de
pão preto e em casas de péssimas condições, sem saneamento básico e vulneráveis
a muitas doenças.
A reavaliação
das bases jurídicas do Antigo Regime foi montada à luz do pensamento Iluminista,
representado por Voltaire, Diderot, Montesquieu, John Locke, Immanuel Kant etc.
Eles forneceram pensamentos para criticar as estruturas políticas e sociais
absolutistas e sugeriram a ideia de uma maneira de conduzir liberal burguesa. A
situação social era tão grave e o nível de insatisfação popular tão grande que
o povo foi às ruas com o objetivo de tomar o poder e arrancar do governo a
monarquia comandada pelo rei Luís XVI. O primeiro alvo dos revolucionários foi
a Bastilha. A Queda da Bastilha em 14 de Julho de 1789 marca o início do
processo revolucionário, pois a prisão política era o símbolo da monarquia
francesa.
Econômicas
A causa mais
forte de Revolução foi a econômica, já que as causas sociais, como de costume,
não conseguem ser ouvidas por si sós. Os historiadores sugerem o ano de 1789
como o início da Revolução Francesa. Mas esta, por uma das "ironias"
da história, começou dois anos antes, com uma reação dos notáveis franceses -
clérigos e nobres - contra o absolutismo, tendo sido inspirada em ideias
iluministas, e se pretendia reformar e para isso buscava limitar seus
privilégios. Luís XVI convocou a nobreza e o clero para contribuírem no
pagamento de impostos, na altamente aristocrática Assembleia dos Notáveis (1787).
Jacques Necker. |
No meio do
caos econômico e do descontentamento geral, Luís XVI da França não conseguiu
promover reformas tributárias, impedido pela nobreza e pelo clero, que não
"queriam dar os anéis para salvar os dedos". Não percebendo que seus
privilégios dependiam do Absolutismo, os notáveis pediram ajuda à burguesia
para lutar contra o poder real - era a Revolta da Aristocracia ou dos Notáveis
(1787-1789). Eles iniciaram a revolta ao exigir a convocação dos Estados Gerais
para votar o projeto de reformas.
Por sugestão
do Ministro dos assuntos econômicos à época, Jacques Necker, o rei Luís XVI
convocou a Assembleia dos Estados Gerais, instituição que não era reunida desde
1614. Os Estados Gerais reuniram-se em maio de 1789 no Palácio de Versalhes,
com o objetivo de acalmar uma revolução de que já falava a burguesia.
As causas
econômicas também eram estruturais. As riquezas eram mal distribuídas; a crise
produtiva manufatureira estava ligada ao sistema corporativo, que fixava
quantidade e condições de produtividade. Isso descontentou a burguesia.
Outro fator
econômico foi a crise agrícola, que ocorreu graças ao aumento populacional.
Entre 1715 e 1789, a população francesa cresceu consideravelmente, entre 8 e 9
milhões de habitantes. Como a quantidade de alimentos produzida era
insuficiente e as geadas abatiam a produção alimentícia, o fantasma da fome
pairou sobre os franceses.
Política
Em fevereiro
de 1787, o ministro das finanças, Loménie de Brienne, submeteu a uma Assembleia
de Notáveis, escolhidos de entre a nobreza, clero, burguesia e burocracia, um
projeto que incluía o lançamento de um novo imposto sobre a propriedade da
nobreza e do clero. Esta Assembleia não aprovou o novo imposto, pedindo que o
rei Luís XVI convocasse os Estados-Gerais.
Em 8 de agosto,
o rei concordou, convocando os Estados Gerais para maio de 1789. Fazendo parte
dos trabalhos preparatórios da reunião dos Estados Gerais, começaram a ser
escritos os tradicionais cahiers de doléances, onde se registraram as queixas
das três ordens.
O Parlamento
de Paris proclama então que os Estados Gerais se deveriam reunir de acordo com
as regras observadas na sua última reunião, em 1614. Aproveitando a lembrança,
o Clube dos Trinta começa imediatamente a lançar panfletos defendendo o voto
individual inorgânico - "um homem, um voto" - e a duplicação dos
representantes do Terceiro Estado. Várias reuniões de Assembleias provinciais,
como em Grenoble, já o haviam feito. Jacques Necker, de novo ministro das
finanças, manifesta a sua concordância com a duplicação dos representantes do
Terceiro Estado, deixando para as reuniões dos Estados a decisão quanto ao modo
de votação – orgânico (pelas ordens) ou inorgânico (por cabeça). Serão eleitos
291 deputados para a reunião do Primeiro Estado (Clero), 270 para a do Segundo
Estado (Nobreza), e 578 deputados para a reunião do Terceiro Estado (burguesia
e pequenos proprietários).
Entretanto,
multiplicam-se os panfletos, surgindo nobres como o conde d'Antraigues, e
clérigos como o bispo Sieyès, a defender que o Terceiro estado era todo o
Estado. Escrevia o bispo Sieyès, em janeiro de 1779: “O que é o terceiro
estado? Tudo. O que é que tem sido até agora na ordem política? Nada. O que é
que pede? Tornar-se alguma coisa”.
A reunião dos
Estados Gerais, como previsto, vai iniciar-se em Versalhes no dia 5 de maio de
1789.
A
Revolução
A Revolução
Francesa pode ser subdividida em quatro períodos: a Assembleia Constituinte, a Assembleia
Legislativa, a Convenção e o Diretório.
O período da Assembleia
Constituinte decorre de 9 de julho de 1789 a 30 de setembro de 1791. As
primeiras ações dos revolucionários deram-se quando, em 17 de junho, a reunião
do Terceiro Estado se proclamou "Assembleia Nacional" e, pouco
depois, "Assembleia Nacional Constituinte". Em 12 de julho, começam
os motins em Paris, culminando em 14 de julho com a tomada da prisão da
Bastilha, símbolo do poder real e depósito de armas. Sob proposta de dois
aristocratas, o visconde de Noailles e do duque de Aiguillon, a Assembleia
suprime todos os privilégios das comunidades e das pessoas, as imunidades
provinciais e municipais, as banalidades, e os direitos feudais. Pouco depois,
aprovava-se a solene "Declaração dos direitos do Homem e do Cidadão",
contudo a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, não foi aprovada pela
mesma Assembleia e a idealizadora, Olympe de Gouges, foi executada. O lema dos
revolucionários era "Liberdade, Igualdade e Fraternidade", mas logo
em 14 de junho de 1791, se aprovou a Lei de Le Chapelier que proibia os
sindicatos de trabalhadores e as greves, com penas que podiam ir até à pena de
morte. Em 19 de abril de 1791, o Estado nacionaliza e passa a administrar todos
os bens da Igreja Católica, sendo aprovada em julho a Constituição Civil do
Clero, por intermédio da qual os padres católicos passam a ser funcionários
públicos.
O período da
Assembleia Legislativa decorre de 8 de outubro de 1791, quando se dá a primeira
reunião da Assembleia Legislativa, até aos massacres de 2 a 7 de setembro do
ano seguinte. Sucedem-se os motins de Paris provocados pela fome; a França
declara guerra à Áustria; dá-se o ataque ao Palácio das Tulherias; a família
real é presa, e começam as revoltas monárquicas na Bretanha, Vendeia e
Delfinado.
Entra o
período da Convenção Nacional, de 20 de setembro de 1792 até 26 de outubro de 1795.
A Convenção vem a ficar dominada pelos jacobinos (partido da pequena e média
burguesia, liderado por Robespierre), criando-se o Comitê de Salvação Pública e
o Comitê de Segurança Geral iniciando-se o reino do Terror. A monarquia é
abolida e muitos nobres abandonam o país, vindo a família de Luís XVI a ser
guilhotinada em 1793.
Vai seguir-se
o período do Diretório até 1799, também conhecido como o período da
"Reação Termidoriana". Um golpe de Estado armado desencadeado pela
alta burguesia financeira marca o fim de qualquer participação popular no
movimento revolucionário. Foi um período autoritário assente no exército (então
restabelecido após vitórias realizadas em campanhas externas). Elaborou-se uma
nova Constituição, com o propósito de manter a alta burguesia (girondinos) livre
de duas grandes ameaças: o jacobinismo e o ancien régime.
O golpe do 18
de Brumário em 9 de novembro de 1799 põe fim ao Diretório, iniciando-se a Era
Napoleônica sob a forma do Consulado, a que se segue a Ditadura e o Império.
A Revolução
Francesa semeou uma nova ideologia na Europa, conduziu a guerras, acabando por
ser derrotada pela instalação do Império e, depois da derrota de Napoleão
Bonaparte, pelo retorno a uma Monarquia na qual o rei Luís XVIII vai outorgar
uma Carta Constitucional.
A
Assembleia Constituinte
Os deputados
dos três estados eram unânimes em um ponto: desejavam limitar o poder real, à
semelhança do que se passava na vizinha Inglaterra e que igualmente tinha sido
assegurado pelos norte-americanos nas suas constituições. No dia 5 de maio, o
rei mandou abrir a sessão inaugural dos Estados Gerais e, em seu discurso,
advertiu que não se deveria tratar de política, isto é, da limitação do poder
real, mas apenas da reorganização financeira do reino e do sistema tributário.
O clero e a
nobreza tentaram diversas manobras para conter o ímpeto reformista do Terceiro
Estado, cujos representantes comparecem à Assembleia presentando as reclamações
do povo (materializadas nos "Cahiers de Doléances"). Os deputados da
nobreza e do clero queriam que as eleições fossem por estado (clero, um voto;
nobreza, um voto; povo, um voto), pois assim, já que clero e a nobreza
comungavam os mesmos interesses, garantiriam seus privilégios.
O terceiro
estado queria que a votação fosse individual, por deputado, porque, contando
com votos do baixo clero e da nobreza liberal, conseguiria reformar o sistema
tributário do reino. Ante a impossibilidade de conciliar tais interesses, Luís
XVI tentou dissolver os Estados Gerais, impedindo a entrada dos deputados na
sala das sessões. Os representantes do Terceiro Estado rebelaram-se e invadiram
a sala do jogo da Pela (espécie de tênis em quadra coberta), em 15 de junho de 1789,
e transformaram-se na Assembleia Nacional, jurando só se separar após a votação
de uma constituição para a França (Juramento da Sala do Jogo da Pela). Em 9 de
julho de 1789, juntamente com muitos deputados do baixo clero, os Estados
Gerais autoproclamaram-se Assembleia Nacional Constituinte.
Essa decisão
levou o rei a tomar medidas mais drásticas, entre as quais a demissão do
ministro Jacques Necker, conhecido por suas posições reformistas. Em razão
disso, a população de Paris se mobilizou e tomou as ruas da cidade. Os ânimos
mais exaltados conclamavam todos a tomar as armas.
O rei decidiu
reagir fechando a Assembleia, mas foi impedido por uma sublevação popular em
Paris, reproduzida a seguir em outras cidades e no campo.
O Conde de
Artois (futuro Carlos X) e outros dirigentes reacionários, defrontados a tais
ameaças, fugiram do país, transformando-se no grupo dos émigrés. A burguesia
parisiense, temendo que a população da cidade aproveitasse a queda do antigo
sistema de governo para recorrer à ação direta, apressou-se a estabelecer um
governo provisório local, a Comuna. Este governo popular, em 13 de julho,
organizou a Guarda Nacional, uma milícia burguesa para resistir tanto a um
possível retorno do rei, quanto a uma eventual mais violenta da população
civil, cujo comando coube ao deputado da Assembleia e herói da independência
dos Estados Unidos, Marie Joseph Motier, o Marquês de La Fayette.
A bandeira dos
Bourbons foi substituída por uma de cor Vermelha preta e branca que passou a
ser a bandeira nacional. E, em toda a França, foram constituídas unidades da
milícia e governos provisórios.
Enquanto isso,
os acontecimentos precipitaram-se e a agitação tomou conta das ruas: em 13 de
julho constituíram-se as Milícias de Paris, organizações militares-populares.
No dia 14 de julho, populares armados invadiram o Arsenal dos Inválidos, à
procura de munições e, em seguida, invadiram a Bastilha, uma fortaleza que fora
transformada em prisão política, mas que já não era a terrível prisão de outros
tempos. Dentro da prisão, estavam apenas sete condenados: quatro por roubo,
dois nobres por comportamento imoral, e um por assassinato. A intenção inicial
dos rebeldes ao tomar a Bastilha era se apoderar da pólvora lá armazenada. Caiu
assim um dos símbolos do Absolutismo. A Queda da Bastilha causou profunda
emoção nas províncias e acelerou a queda dos intendentes. Organizaram-se novas
municipalidades e guardas nacionais.
A partir de
então, a revolução estendeu-se ao campo, com maior violência: os camponeses saquearam
as propriedades feudais, invadiram e queimaram os castelos e cartórios, para
destruir os títulos de propriedade das terras (fase do Grande Medo). Temendo o
radicalismo, na noite de 4 de agosto, a Assembleia Nacional Constituinte
aprovou a abolição dos direitos feudais, gradualmente e mediante amortização,
além de as terras da Igreja haverem sido confiscadas. Daí por diante, a
igualdade jurídica seria a regra.
A
Elaboração de uma Constituição
A Assembleia
Nacional Constituinte aprovou a legislação, pela qual era abolido o regime feudal
e senhorial e suprimido o dízimo. Outras leis proibiram a venda de cargos
públicos e a isenção tributária das camadas privilegiadas. E, para dar
continuidade ao trabalho, decidiu pela elaboração de uma Constituição. Na
introdução, que seria denominada Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão
(Déclaration des Droits de l'Homme et du Citoyen), os delegados formularam os
ideais da Revolução, sintetizados em três princípios: "Liberdade,
Igualdade, Fraternidade" (Liberté, Egalité, Fraternité). Inspirada na Declaração
de Independência dos Estados Unidos e divulgada em 26 de agosto, a primeira
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (a que não terá sido estranha a
ação do então embaixador dos EUA em Paris, Thomas Jefferson) foi síntese do
pensamento iluminista liberal e burguês. Nesse documento, em que se pode ver
claramente a influência da Revolução Americana, defendia-se o direito de todos
à liberdade, à propriedade, à igualdade - igualdade jurídica, e não social nem
econômica - e de resistência à opressão. A desigualdade social e de riqueza
continuavam existindo.
O nascimento,
a tradição e o sangue já não podiam continuar a ser os únicos critérios utilizados
para distinguir socialmente os homens. Na prática, tais critérios foram
substituídos pelo dinheiro e pela propriedade, que, a partir daí, passam a
garantir a seus detentores prestígio social.
Pressionado
pela opinião pública, Luís XVI deixou Versalhes, estabelecendo-se no Palácio
das Tulherias, em Paris (outubro de 1789). Ali, o monarca era mais acessível às
massas parisienses.
Fervilhavam os
clubes: a imprensa tinha papel cada vez maior nos acontecimentos políticos. Jean-Paul
Marat e Hébert escreviam artigos incendiários.
A nobreza
conservadora e o alto clero abandonaram a França, refugiando-se nos países
ainda absolutistas, de onde conspiravam contra a revolução. Numa reação contra
os privilégios do clero e buscando recursos para sanar o déficit público, o
governo desapropriou os bens da Igreja, colocou-os à venda e, com o produto,
emitiu bônus do tesouro, os assignats, que valeram como papel-moeda, logo
depreciado. As propriedades da Igreja passaram majoritariamente às mãos da
burguesia, restando aos camponeses as propriedades menores, que puderam ser
adquiridas mediante facilitações.
Em agosto de 1790,
foi votada a Constituição Civil do Clero, separando Igreja e Estado e
transformando os clérigos em assalariados do governo, a quem deviam obediência.
Determinava também que os bispos e padres de paróquia seriam eleitos por todos
os eleitores, independentemente de filiação religiosa. O papa opôs-se a isso.
Os clérigos deveriam jurar a nova Constituição. Os que o fizeram ficaram
conhecidos como juramentados; os que se recusaram passaram a ser chamados de
refratários e engrossaram o campo da contra-revolução.
Procurando
frear o movimento popular, a Assembleia Nacional Constituinte, pela Lei de Le
Chapelier, proibiu associações e coalizões profissionais (sindicatos), sob pena
de morte.
No palácio
real, conspirava-se abertamente. O rei, a rainha, seus conselheiros, os
embaixadores da Áustria e da Prússia eram os principais nomes de tal
conspiração. A Áustria e a Prússia, países absolutistas, invadiram a França,
que foi derrotada porque oficiais ligados à nobreza permitiram o malogro do
exército francês. Denunciou-se a traição na Assembleia. Em junho de 1791 a
família real tentou fugir para a Áustria. O rei foi descoberto na fronteira, em
Varennes, e obrigado a voltar. A Assembleia Nacional, contudo, acabou por
absolver Luís XVI, mantendo a monarquia. Para justificar essa decisão, alegou
que o rei, ao invés de fugir, fora sequestrado. A Guarda Nacional, comandada
por La Fayette, reprimiu violentamente a multidão que queria a deposição do
rei.
A
Constituição de 1791
Em setembro de
1791, foi promulgada a primeira Constituição da França que resumia as
realizações da Revolução.
Foi implantada
uma monarquia constitucional, isto é, o rei perdeu seus poderes absolutos e
criou-se uma efetiva separação entre os poderes Legislativo, Executivo e
Judiciário. Além disso, foram concedidos direitos civis completos aos cidadãos.
A população
foi dividida em cidadãos ativos e passivos. Somente os cidadãos ativos, que
pagavam impostos e possuíam dinheiro ou propriedades, participavam da vida
política. Era o voto censitário. Os passivos eram os não-votantes, como
mulheres, trabalhadores desempregados e outros.
Apesar de ter
limitado os poderes do rei, este tinha ainda o direito de designar seus ministros.
De mais, a
constituição aboliu o feudalismo, nacionalizava os bens eclesiásticos e reconhecia
a igualdade civil e jurídica entre os cidadãos.
Em síntese, a
Constituição de 1791 estabeleceu na França as linhas gerais para o surgimento
de uma sociedade burguesa e capitalista em lugar da anterior, feudal e
aristocrática.
Apesar disso,
este projeto não teve muita sustentação. Alguns setores urbanos queriam
continuar com o processo revolucionário, enquanto nobres fugiam e se refugiavam
no exterior, planejando à distância organizar violentamente uma vingança
armada. Os emigrados tinham apoio de Estados Absolutistas como Áustria e Prússia,
que viam o resultado do movimento revolucionário francês como perigoso para os
seus domínios.
Em agosto de
1791, após a tentativa frustrada de fuga da família real para a Áustria, os
países que até então apoiavam a França lançaram a Declaração de Pillnitz, que
afirmava (e apoiava) a restauração da monarquia francesa como um projeto de interesse
comum a todos os Estados europeus. A população francesa ficou enfurecida, pois
enxergava esta ação como uma intromissão direta aos assuntos do país.
A
Assembleia Legislativa (1791-1792)
Em 1791,
iniciou-se a fase denominada Monarquia Constitucional. Nas eleições de outubro
de 1791, as cadeiras da Assembleia Legislativa foram ocupadas predominantemente
por elementos da burguesia. A Assembleia Legislativa, que iniciou suas sessões
em 1º de outubro, era formada por 750 membros, sem experiência política.
Embora a
burguesia tivesse de enfrentar, dentro da Assembleia, a oposição da
aristocracia, cujos deputados ocupavam o lado direito de quem entrava no
recinto de reuniões, e também dos democratas, que ocupavam o lado esquerdo, as
maiores dificuldades estavam fora da Assembleia.
À extrema
direita, o rei e a aristocracia se recusavam a aceitar qualquer compromisso. À
extrema esquerda, a pequena e média burguesia sentiam-se lesadas e enganadas.
Os camponeses,
desesperados, porque tinham de pagar pela extinção dos direitos feudais,
retomaram a violência.
O confisco dos
bens da Igreja e a Constituição do Clero, que faziam com que os religiosos
rompessem com o papado, levaram a maior parte do clero para o campo da
Contra-Revolução.
Apesar de
todas as dificuldades, a alta burguesia se mantinha no poder.
A Queda da
Monarquia
Os emigrados
buscavam apoio externo para restaurar o Estado absoluto. As vizinhas potências
absolutistas apoiavam esses movimentos, pois temiam a irradiação das ideias
revolucionárias francesas para seus países. Os emigrados e as monarquias
absolutistas formaram uma aliança destinada a restaurar, na França, os poderes
absolutos de Luís XVI. Alegando a necessidade de se restaurar a dignidade real
da França, na Declaração de Pillnitz (1791) esses países ameaçaram a França de
uma intervenção.
Em 1792, a
Assembleia Legislativa aprovou uma declaração de guerra contra a Áustria. É
interessante salientar que a burguesia e a aristocracia queriam a guerra por
motivos diferentes. Enquanto para a burguesia a guerra seria breve e vitoriosa,
para o rei e a aristocracia seria a esperança de retorno ao velho regime.
Palavras de Luís XVI: "Em lugar de uma guerra civil, esta será uma guerra
política" e da rainha Maria Antonieta: "Os imbecis [referia-se a
burguesia]! Não veem que nos servem". Portanto, o rei e a aristocracia não
vacilaram em trair a França revolucionária.
Diante da
aproximação dos exércitos coligados estrangeiros, formaram-se por toda a França
batalhões de voluntários.
Luís XVI e Maria
Antonieta foram presos, acusados de traição ao país por colaborarem com os
invasores.
Verdun, última
defesa de Paris, foi sitiada pelos prussianos. O povo, chamado a defender a
revolução, saiu às ruas e massacrou muitos partidários do Antigo Regime. Sob o
comando de Danton, Robespierre e Marat, foram distribuídas armas ao povo e foi
organizada a Comuna Insurrecional de Paris. As palavras de Danton ressoaram de
forma marcante nos corações dos revolucionários. Disse ele: "Para vencer
os inimigos, necessitamos de audácia, cada vez mais audácia, e então a França
estará salva".
O povo, entre
o pânico e o rancor, responsabiliza os inimigos internos pela situação. Entre 2
e 6 de setembro de 1792, são massacrados os padres refratários, os suspeitos de
atividades contra-revolucionárias e os presos de delito comum das prisões de Paris.
A matança dura vários dias sem que as autoridades administrativas ousem
intervir. Os chamados “massacres de Setembro”, que chocam a opinião pública,
marcam uma página importante da Revolução.
Em 20 de
setembro aconteceu aquilo que parecia impossível: as tropas revolucionárias,
famintas, mal vestidas, mas alimentadas por seus ideais, derrotaram, ao som da Marselhesa
(o hino da revolução), a coligação anti-francesa na Batalha de Valmy.
A
Convenção (1792-1795)
Após o término
das deliberações da Assembleia Constituinte em 1791, a burguesia passou a uma
posição conservadora, por entender que as principais mudanças já haviam sido
implementadas na sociedade francesa. A situação do povo mais pobre, porém,
pouco tinha mudado. Os camponeses continuavam sem terra e nas cidades a
situação tornava-se cada vez mais desesperadora.
Em agosto de 1792,
uma intensa mobilização popular destronou o rei, e depois de elaborar a Carta
Magna francesa, a Assembleia Nacional Constituinte dissolveu-se. A Assembleia
Legislativa substituiu a Constituinte. Ameaça de intervenção externa, crise
econômica e inflação. Abril de 1792: Declaração de guerra à Áustria e à
Prússia; exércitos inimigos chegam a ameaçar a cidade de Paris; ala radical
proclama a “pátria em perigo” e distribui armas à população parisiense. Comuna
de Paris assume o poder e exige da Assembleia o afastamento do rei. 10 de
agosto de 1792: Parisienses atacam o palácio real, detêm o soberano e exigem
que o Legislativo suspenda-o de suas funções.Esvaziada de seu poder, a Assembleia
convoca a eleição de uma Convenção Nacional. A revolução entrou numa fase
radical. As primeiras medidas tomadas pela Convenção foram a Proclamação da
República e a promulgação de uma nova Constituição (21 de setembro de 1792).
Eleita sem a divisão dos eleitores em passivos e ativos, a alta burguesia
monarquista foi derrotada. A Convenção contava com o predomínio dos
representantes da burguesia.
Entre os
revolucionários de 1789, houve divisão. A grande burguesia não queria
aprofundar a revolução, temendo o radicalismo popular. Aliada aos setores da
nobreza liberal e do baixo clero, formou o Clube dos Girondinos. O nome
"girondino" (do francês girondin) deve-se ao fato de Brissot,
principal líder dessa fação, representar o departamento da Gironda e de seus
principais líderes serem provenientes de lá. Eles ocupavam os bancos inferiores
no salão das sessões. Os jacobinos (do francês jacobin) — assim chamados porque
se reuniam no convento de Saint Jacques — queriam aprofundar a revolução, aumentando
os direitos do povo; eram liderados pela pequena burguesia e apoiados pelos
sans-culottes, as massas populares de Paris. Ocupavam os assentos superiores no
salão das sessões, recebendo o nome de montanha. Seus principais líderes foram Danton,
Marat e Robespierre. Sua fação mais radical era representada pelos raivosos,
liderados por Jacques Hébert, que queriam o povo no poder. Havia ainda um grupo
de deputados sem opiniões muito firmes, que votavam na proposta que tinha mais
chances de vencer. Eram chamados de planície ou pântano. Havia ainda os cordeliers
(camadas mais baixas) e os feuillants (a burguesia financeira).
As modernas
designações políticas de direita, centro e esquerda surgem neste momento: com
relação à mesa da presidência identificavam-se à direita os girondinos, que
desejavam consolidar as conquistas burguesas, estancar a revolução e evitar a
radicalização; ao centro, a Planície ou Pântano, grupo de burgueses sem posição
política definida; e à esquerda, a Montanha, composta pela pequena burguesia
jacobina que liderava os sans-culottes, e que defendia o aprofundamento da
revolução.
Dirigida
inicialmente pelos girondinos, a convenção realizava uma política
contraditória: era revolucionária na política externa — ao combater os países
absolutistas — mas conservadora na interna — ao procurar se acomodar com a
nobreza, tentar salvar a vida do rei e combater os revolucionários mais
radicais. Nesse primeiro período, foram descobertos documentos secretos de Luís
XVI, no Palácio das Tulherias, que provaram o seu comprometimento com o rei da
Áustria. O fato acelerou as pressões para que o rei fosse julgado como traidor.
Na Convenção, a Gironda dividiu-se: alguns optaram por um indulto, outros pela
pena de morte. Os jacobinos, reforçados pelas manifestações populares, exigiam
a execução do rei, indicando o fim da supremacia girondina na Revolução.
República
Jacobina
Os jacobinos,
com apoio dos sans-culottes e da Comuna de Paris (designação que foi dada ao
novo governo local da cidade), assumiram o poder no momento crítico da
Revolução.
A Convenção
reconheceu a existência do Ser Supremo e da imortalidade da alma. A virtude
seria o elemento essencial da República.
Em 21 de
janeiro de 1793, Luís XVI foi executado na guilhotina na praça da Revolução.
Vários países europeus, como a Áustria, Prússia, Holanda, Espanha e Inglaterra,
indignados e temendo que o exemplo francês se refletisse em seus territórios,
formaram a Primeira Coligação contra a França. Encabeçando a Coligação, a
Inglaterra financiava os grandes exércitos continentais para conter a ascensão
burguesa da França, seu potencial concorrente nos negócios europeus.
No
departamento de Vendeia, no oeste da França, camponeses contra-revolucionários,
instigados pela Igreja, pela nobreza e pelos ingleses, tomaram o poder. Os
girondinos tentaram frear a proposta de mobilização geral do povo francês,
temendo a perda do poder e a radicalização da revolução, que ameaçaria suas
propriedades e bens. Em resposta, em 2 de Junho de 1793, a população de Paris,
agitada pelos partidários de Hébert, cercou o prédio da convenção, pedindo a
prisão dos deputados girondinos. Os membros da Gironda foram expulsos da
convenção deixando uma triste herança: inflação, carestia e avanço da
contra-revolução, tudo isso agravado pela guerra no plano externo. Marat,
Hébert, Danton, Saint-Just e Robespierre assumiram o poder, dando início ao
período da Convenção Montanhesa.
A contra-revolução
camponesa da Vendeia e a ameaça externa colocavam a revolução à beira do
abismo. Para combater essa situação, os jacobinos organizaram os comitês, cujos
objetivos eram controlar o governo, combater os contra-revolucionários e
mobilizar a França para uma guerra total em defesa da revolução.
Devido ao
predomínio da atuação popular, esse período caracterizou-se por ser o mais
radical de toda a Revolução. O governo jacobino dirigia o país por meio do Comitê
de Salvação Pública, responsável pela administração e defesa externa do país,
de início comandado por Danton, seu criador. Abaixo, vinha o Comité de
Segurança Geral, que cuidava da segurança interna, e a seguir o Tribunal
Revolucionário, que julgava os opositores da revolução em julgamentos sumários.
Decretada a
mobilização geral, criou-se uma economia de guerra, com o racionamento das
mercadorias e o combate aos especuladores, que, aproveitando-se da situação,
escondiam os produtos para aumentar os preços.
Os jornais
populares utilizavam-se de linguagem grosseira para caracterizar os
aristocratas e inimigos da revolução. Ao mesmo tempo em que pediam que fossem
punidos, pregavam as virtudes revolucionárias, o patriotismo e a defesa
intransigente da revolução. O mais importante desses jornais era O amigo do
povo (L'Ami du Peuple), dirigido pelo jacobino Marat.
Quando, em
julho, Marat foi assassinado pela jovem Charlotte Corday, os ânimos se
exaltaram. Considerado excessivamente moderado, Danton foi substituído por
Robespierre e expulso do partido. O Comitê de Salvação Pública, liderado por
Robespierre, assumiu plenos poderes. Tinha início o Grande Terror, Terror
Jacobino ou, simplesmente, Terror. Milhares de pessoas — a ex-rainha Maria
Antonieta, o químico Antoine Lavoisier (considerado o criador da Química
moderna), aristocratas, clérigos, girondinos, especuladores, inimigos reais ou
presumidos da revolução — foram detidas, julgadas sumariamente e guilhotinadas.
Os direitos individuais foram suspensos e, diariamente, realizavam-se, sob
aplausos populares, execuções públicas e em massa. O líder jacobino
Robespierre, sancionando as execuções sumárias, anunciara que a França não
necessitava de juízes, mas de mais guilhotinas. O resultado foi a condenação à
morte de 35 mil a 40 mil pessoas. A revolta camponesa da Vendeia foi esmagada.
O exército francês começou a ganhar terreno nos campos de batalha em 1794 e a
coalizão antifrancesa foi derrotada.
Cansada do
terror, execuções, congelamento de preços e dos excessos revolucionários, a
burguesia queria paz para seus negócios. Essa posição era defendida pelos
jacobinos liderados por Danton. Os sans-culottes — que eram a plebe urbana —
pretendiam radicalizar mais a revolução, posição defendida pelos raivosos. A
falta de habilidade política de Robespierre ficou evidente quando, declarando a
"pátria em perigo", tomou uma série de medidas impopulares para evitar
as radicalizações — os partidários e políticos mais radicais, como a ala
esquerda, dos partidários de Hébert, e da ala direita, que tinha como líder
Danton, foram executados. A facção de centro, liderada por Robespierre e
Saint-Just, triunfou, porém ficou isolada.
Reação
Termidoriana
Muitos
girondinos que sobreviveram ao Terror, aliados aos deputados da planície,
articularam um golpe. Em 27 de julho (Termidor, de acordo com o calendário
revolucionário francês) a Convenção, numa rápida manobra, derrubou Robespierre
e seus partidários. Robespierre apelou para que as massas populares saíssem em
sua defesa. Mas os que podiam mobilizá-las — como os raivosos — estavam mortos,
e os sans-culottes não atenderam ao chamado. Robespierre e os dirigentes
jacobinos foram guilhotinados sumariamente. A Comuna de Paris e o partido
jacobino deixaram de existir. Era o golpe de Termidor, que marcou a queda da
pequena burguesia jacobina e a volta da grande burguesia girondina ao poder. O
movimento popular entrou em franca decadência.
A Convenção
Termidoriana (1794-1795) foi curta, mas permitiu a reativação do projeto
político burguês com a anulação de várias decisões montanhesas, como a Lei do
Preço Máximo (congelamento da economia) e o encerramento da supremacia da Junta
de Salvação Pública. Foram extintas as prisões arbitrárias e os julgamentos
sumários. Todos os clubes políticos foram dissolvidos e os jacobinos passaram a
ser perseguidos.
Em 1795, a
Convenção elaborou uma nova constituição - a Constituição do Ano III -,
suprimindo o sufrágio universal e resgatando o voto censitário para as eleições
legislativas, marginalizando, assim, grande parcela da população. A carta
reservava o poder à burguesia. No final de 1795, de acordo com a nova
Constituição, a Convenção cedeu lugar ao Diretório, formado por cinco membros
eleitos pelos deputados. Iniciou-se, assim, a República do Diretório.
O
Diretório (1795-1799)
O Diretório (1794
a 1799) foi uma fase conservadora, marcada pelo retorno da Alta Burguesia ao
poder e pelo aumento do prestígio do Exército apoiado nas vitórias obtidas nas
Campanhas externas.
Uma nova
constituição entregou o Poder Executivo ao Diretório, uma comissão constituída
de cinco diretores eleitos por cinco anos. Esta carta previa o direito de voto
masculino aos alfabetizados. O poder legislativo era exercido por duas câmaras,
o Conselho dos Anciãos e o Conselho dos Quinhentos.
Era a
república dos proprietários que enfrentavam uma grave crise financeira.
Registra-se uma oposição interna ao governo devido à crise econômica e à anulação
das conquistas sociais jacobinas. Tentativas de golpe à direita (monarquistas
ou realistas) e à esquerda (jacobinos) ocorreram neste período.
As ações
contra o novo governo se sucediam. Em 1795, um golpe realista foi abortado em
Paris. Aproveitando o descontentamento dos sans-culottes, os remanescentes
jacobinos tentaram organizar em 1796 a chamada Conjuração ou Conspiração dos
Iguais, liderada por François Noël Babeuf (mais conhecido como Graco Babeuf).
Os seguidores desse movimento popular, com algumas pinceladas socialistas,
desejavam não apenas igualdades de direitos (igualdade perante a lei), mas
também igualdade nas condições de vida. Babeuf achava que a única maneira de
alcançar a igualdade era com a abolição da propriedade privada. A insurreição
foi denunciada antes mesmo de se iniciar e seus líderes, Graco Babeuf e Buonarroti,
foram condenados à guilhotina. As ideias de Babeuf, entretanto, serviram de
base para a luta da classe operária no século XIX.
Externamente,
entretanto, o exército acumulava vitórias contra as forças absolutistas de Espanha,
Holanda, Prússia e reinos da Itália, que, em 1799, formaram a Segunda Coligação
contra a França revolucionária.
Napoleão
Bonaparte no Poder
O governo não
era respeitado pelas outras camadas sociais. Os burgueses mais lúcidos e
influentes perceberam que com o Diretório não teriam condição de resistir aos
inimigos externos e internos e manter o poder. Eles acreditavam na necessidade
de uma ditadura militar, uma espada salvadora, para manter a ordem, a paz, o
poder e os lucros.
A figura que
sobressai no fim do período é a de Napoleão Bonaparte. Ele era o general
francês mais popular e famoso da época. Quando estourou a revolução, era apenas
um simples tenente e, como os oficiais oriundos da nobreza abandonaram o
exército revolucionário ou dele foram demitidos, fez uma carreira rápida. Aos
24 anos já era general de brigada. Após um breve período de entusiasmo pelos
jacobinos, chegando até mesmo a ser amigo dos familiares de Robespierre,
afastou-se deles quando estavam sendo depostos. Lutou na Revolução contra os
países absolutistas que invadiram a França e foi responsável pelo sufocamento
do golpe de 1795.
Enviado ao Egito
para tentar interferir nos negócios do império inglês, o exército de Napoleão
foi cercado pela marinha britânica nesse país, então sobre tutela inglesa.
Napoleão abandonou seus soldados e, com alguns generais fiéis, retornou à França,
onde, com apoio de dois diretores e de toda a grande burguesia, suprimiu o
Diretório e instaurou o Consulado, dando início ao período napoleônico em 18 de
brumário (9 de novembro de 1799).
O Consulado
era representado por três elementos: Napoleão, o abade Sieyès e Roger Ducos. Na
realidade o poder concentrou-se nas mãos de Napoleão, que ajudou a consolidar
as conquistas burguesas da Revolução.
Datas
e Fatos Essenciais
1787: Revolta dos Notáveis
1789: Revolta do Terceiro Estado;
14 de julho: Tomada da Bastilha; 26 de agosto: Declaração dos Direitos do Homem
e do Cidadão.
1790: Confisco dos bens do Clero.
1791: Constituição que
estabeleceu a Monarquia Constitucional.
1791: Tentativa de fuga e prisão
do rei Luís XVI.
1792: Invasão da França pela Áustria
e Prússia. Decisiva vitória francesa na batalha de Valmy .
1793: Oficialização da República
e morte do Rei Luís XVI; 2ª Constituição.
1793: Terror contra os inimigos
da revolução.
1794: Deposição de Robespierre.
1795: Regime do Diretório — 3ª
Constituição.
1799: Golpe do 18 de brumário (9
de novembro) de Napoleão.
Reações
e comentários no estrangeiro
Reino
Unido
Entre os britânicos
que acolheram (inicialmente) a Revolução Francesa como um acontecimento
positivo conta-se Dugald Stewart. Stewart seguiu os acontecimentos em Paris
nesse verão dramático de 1789. Ele acreditava nos princípios pelos quais a
revolução se batia. Sentiu-se repelido quando leu os comentários de Edmund
Burke no seu "Reflections on the Revolution in France". Burke previu
acertadamente que a Revolução Francesa acabaria na perdição, terror, morte e
ditadura. Um aluno de Stewart, James Mackintosh, escreveu em resposta uma
apaixonada defesa da causa francesa. Nos anos seguintes, Stewart defendeu ainda
a Revolução, apesar de o terror e o caos serem evidentes. Em novembro de 1791,
Dugald Stewart escreve a um amigo: "As pequenas desordens que podem
ocorrer num país onde as coisas em geral correm tão bem são de menor
importância".
Já no ano
seguinte ver-se-ia que Burke tinha razão. Edmund Burke faleceu em 1797,
convicto de que a Revolução Francesa acabaria por terminar na ditadura. Napoleão
veio dar-lhe razão. Burke ganhou na sociedade britânica uma reputação de um
homem clarividente e perspicaz.
Em forte
contraste, Dugald Stewart perdeu o respeito dos seus concidadãos e foi
ostracizado em Edimburgo, onde vivia. James Mackintosh pediu desculpas
publicamente por criticar Burke e tornou-se um forte crítico do regime francês
e das revoluções em geral.
Raymond
Aron
O sociólogo do
século XX Raymond Aron (1905 — 1983) escreve em O ópio dos intelectuais o
seguinte, a propósito da revolução francesa, comparando-a com a evolução da
Inglaterra:
A passagem do
Ancien Régime para a sociedade moderna é consumada na França com uma ruptura e
uma brutalidade únicas. Do outro lado do Canal da Mancha, na Inglaterra, o
regime constitucional foi instaurado progressivamente, as instituições
representativas advêm do parlamento, cujas origens remontam aos costumes
medievais. No século XVIII e XIX, a legitimidade democrática se substitui à
legitimidade monárquica sem a eliminar totalmente, a igualdade dos cidadãos
apagou pouco a pouco a distinção dos "Estados" (Nobreza, clero e
povo). As ideias que a revolução francesa lança em tempestade através da
Europa: soberania do povo, exercício da autoridade conforme a regras,
assembleias eleitas e soberanas, supressão de diferenças de estatutos pessoais,
foram realizadas em Inglaterra, por vezes mais cedo do que em França, sem que o
povo, em sobressalto de Prometeu, sacudisse as suas correntes. A
"democratização" foi ali (em Inglaterra) a obra de partidos rivais.
(...) O Ancien
Régime desmoronou-se (na França) a um só golpe, quase sem defesa. E a França
precisou de um século para encontrar outro regime que fosse aceito pela grande
maioria da nação.
Referências:
Donald Greer,
The Incidence of the Terror during the French Revolution: A Statistical
Interpretation (1935).
Bell, David
Avrom. The First Total War: Napoleon's Europe and the birth of warfare as we
know it. New York: Houghton Mifflin Harcourt, 2007. p. 51. ISBN
0-618-34965-0.
Spielvogel,
Jackson. Western Civilization: A Brief History, Volume II: Since 1500 (em inglês).
8ª. ed. Stamford, CT: Cengage Learning, 2013. p. 421. ISBN
1133607934.
Klose, Fabian.
Human Rights in the Shadow of Colonial Violence: The Wars of Independence in
Kenya and Algeria (em inglês). Filadélfia, PA: University of Pennsylvania
Press, 2013. p. 172. ISBN
0812244958.
Pierre Gaxotte
(da Academia Francesa), La Révolution Française, Paris, Librairie Arthème
Fayard, 1957, pp. 31-54.
Como Tudo
Funciona
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua visita foi muito importante. Faça um comentário que terei prazaer em responde-lo!
Abração
Dag Vulpi