Veja quais elementos são típicos da filmografia do dinamarquês, que volta aos cinemas nesta sexta-feira
Não causa surpresa que Lars von Trier seja o diretor de "Ninfomaníaca", filme que estreia nesta sexta-feira (10) e é apenas a primeira parte da história de uma autodiagnosticada viciada em sexo. Estão no longa as principais marcas do cineasta: protagonista feminina, nenhum pudor nas cenas eróticas, divisão de capítulos e um jeitão de "filme para chocar" que é típico da obra do dinamarquês.
Estamos, afinal, falando de alguém que se proclamou o melhor diretor do mundo no Festival de Cannes de 2009, o mesmo do qual foi banido, dois anos depois, por fazer comentários pró-Hitler. Agora decidido a não conceder entrevistas ou fazer pronunciamentos públicos, Von Trier diz esperar que seus filmes falem por ele.
E os filmes, de fato, dão muitas pistas sobre o universo e a personalidade do diretor, que despontou nos anos 1980 com "Elemento de um Crime" e virou figurinha carimbada de Cannes, levando o Grande Prêmio do Júri por "Ondas do Destino" e finalmente a Palma de Ouro por "Dançando no Escuro".
Um dos idealizadores do movimento Dogma 95, que defendia um cinema despido de efeitos especiais e truques tecnológicos, Von Trier se consagrou utilizando forma e conteúdo para provocar o espectador, se recusando a oferecer histórias fáceis.
Os roteiros são permeados por situações e diálogos que refletem as angústias do próprio diretor, que diz sofrer de depressão desde a adolescência, que soube o nome do pai verdadeiro quando a mãe estava no leito de morte (procurado por Von Trier, o homem rejeitou qualquer contato), e cujas fobias (aviões, barcos, lugares fechados, entre outros) impõem uma série de limitações ao seu trabalho.
As esquisitices de Von Trier e o constante desejo de polemizar dentro e fora da tela por vezes ofuscaram o talento de um diretor que, em seus melhores momentos, fez filmes inteligentes, originais e desafiadores.
Veja as principais características do cinema de Lars von Trier.
Dramas provocadores
Os longas de Von Trier são, em geral, difíceis de assistir - histórias pesadas, trágicas, que dão pouco respiro ou explicações ao espectador. "Um filme deve ser como uma pedra no sapato", definiu certa vez o cineasta.
Seus protagonistas costumam ser indivíduos marginalizados, tidos como diferentes, que muitas vezes estão em depressão ou enfrentando situação traumática. É o caso, por exemplo, do acidente de trabalho que paralisa Yan em "Ondas do Destino", da cegueira de Selma em "Dançando no Escuro", das humilhações e abusos sofridos por Grace em "Dogville" e da morte do filho do casal de "Anticristo".
Nudez, sexo e violência
Dentro da proposta de provocar e chocar o espectador, os filmes de Von Trier costumam ter muitas cenas de nudez frontal e sexo. Esse elemento é elevado à máxima potência em "Ninfomaníaca", cuja versão sem censura inclui cenas explícitas, gravadas por atores pornôs.
É comum que o sexo seja associado à violência e à dor nos filmes de Von Trier. Em "Ondas do Destino", por exemplo, transar com homens que não sejam seu marido é visto por Bess como sacrifício. "Dogville" tem cenas de estupro, enquanto "Anticristo" mostra, em close, uma automutilação genital.
Câmera na mão
Esteticamente, o cinema de Von Trier também pode causar estranhamento, principalmente as obras do início da carreira. Além de gostar de cortes bruscos, o diretor costuma incorporar eventuais imperfeições da filmagem, quase sempre digital e com câmera na mão.
Filmes como "Os Idiotas", "Ondas do Destino" e "Dançando no Escuro" mostram bem os efeitos da filmagem com câmera na mão, uma das diretrizes do movimento Dogma 95, que Von Trier ajudou a criar ao lado do também cineasta dinamarquês Thomas Vinterberg.
Von Trier ainda costuma operar a câmera, algo que, segundo ele, "o deixa em pé de igualdade com os atores". Mas avanços nos aparelhos corrigiram grande parte das falhas, fazendo com que os filmes recentes do diretor pareçam bem mais refinados esteticamente.
Capítulos e trilogias
O dinamarquês têm vários filmes longos no currículo: "Ondas do Destino" se desenrola por 154 minutos; "Dogville", por 171; e "Ninfomaníaca", na versão completa e sem censura, ultrapassa as cinco horas de duração.
Nestes e em outros longas, mesmo nos mais curtos, Von Trier costuma optar por dividir a história em capítulos. Em alguns casos o epílogo ou prólogo é altamente estilizado, como em "Anticristo" e "Melancolia". No primeiro, uma cena em preto e branco mostra o casal protagonista fazendo sexo enquanto seu filho cai da janela, tudo ao som da música "Lascia ch'io pianga", de Handel. No segundo, imagens apocalípticas são mostradas tendo o prelúdio de "Tristão e Isolda", de Richard Wagner, como trilha sonora.
O diretor também têm o hábito de dividir seus filmes em trilogias. "O Elemento do Crime", "Epidemia" e "Europa" formam a "trilogia da Europa"; "Ondas do Destino", "Os Idiotas" e "Dançando no Escuro" integram a "trilogia do coração de ouro"; "Dogville", "Manderlay" e o ainda não filmado "Wasington" são a trilogia "EUA: Terra de Oportunidades"; por fim, "Anticristo", "Melancolia" e "Ninfomaníaca" formam a "trilogia da depressão".
Protagonistas femininas
A partir dos anos 1990, as mulheres se tornaram o principal foco de Von Trier, com muitas personagens femininas que encontram uma espécie de transcendência após duras adversidades. "Meus filmes são sobre ideais que se chocam com o mundo. Toda vez que um homem é protagonista, eles se esquecem de seus ideais. E toda vez que uma mulher é protagonista, elas levam seus ideais até o fim", disse o diretor.
Há uma série de discussões sobre se os traumas, sacrifícios e abusos pelas quais passam as personagens refletem sexismo por parte do diretor. Especialistas na obra de Von Trier, porém, encaram as mulheres criadas por ele como expressão de sua própria personalidade.
O diretor disse sentir que existe algo de feminino dentro de si no documentário "Os 100 Olhos de Lars von Trier". "Me sinto próximo das mulheres, embora prefira a companhia dos homens. Sempre tenho mais dificuldades quando dirijo mulheres. As atrizes às vezes me olham como se fossem minha mãe."
O diretor, aliás, é famoso por problemas nos sets. Björk chegou a abandonar as filmagens de "Dançando no Escuro" e Nicole Kidman, estrela de "Dogville", se recusou a participar dos outros longas da trilogia. Apesar disso, três atrizes foram premiadas em Cannes por atuações em filmes de Von Trier: Björk, Charlotte Gainsbourg, por "Anticristo", e Kirsten Dunst, por "Melancolia". Emily Watson foi indicada ao Oscar por "Ondas do Destino".
Atores repetidos
Se alguns atores consideraram traumática a experiência de trabalhar com Von Trier, outros estão sempre sendo escalados para novos papéis. A grande musa é a franco-britânica Charlotte Gainsbourg, que atuou em "Anticristo", "Melancolia" e "Ninfomaníaca".
O sueco Stellan Skarsgard participou de "Ondas do Destino", "Dançando no Escuro", "Dogville", "Melancolia" e "Ninfomaníaca". O alemão Jean-Marc Barr fez todos estes e mais "Manderlay".
Outro alemão, Udo Kier, é um dos parceiros mais antigos de Von Trier, fazendo trabalhos com o diretor na televisão e participando de todos os seus filmes desde "Epidemia" - com exceção para "Os Idiotas", "O Grande Chefe" e "Anticristo".
Do IG - Ultimo Segundo
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