Um dos
segredos para o crescimento das vendas, apoiado principalmente na alta taxa de
expansão de evangélicos no Brasil, é o lançamento de novidades
Bárbara Ladeia -
iG São Paulo
De bíblias à prova
d'água ou com capa com estampa de animal, passando por agências de viagens,
pelo mercado da moda e da música, as vendas de produtos cristãos estão longe da
acanhada taxa de crescimento da economia do Brasil. As estatísticas ainda
são escassas, mas empresários do setor contam que o segmento vive uma fase
favorável.
No último
levantamento publicado sobre o setor, em janeiro de 2013, o professor de
ciências do comportamento da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing),
Mário René, chegou a cifras relevantes. Segundo a pesquisa, o mercado da fé
movimenta R$ 12 bilhões por ano entre shows, eventos, produtos, entre outros.
"As
compras de produtos relacionados à religião são totalmente impulsivas e
emocionais" , diz o pesquisador. "Esse mercado é pouco estudado e
muito pouco monitorado, então diversas informações escapam pelos dedos. "
Entretenimento
Com
crescimento de 60% no número de evangélicos nos últimos dez anos, está cada vez
mais lucrativo trabalhar para esse público. É apostando no cenário de
crescimento do público evangélico que Leo Ganem, ex-presidente da Geo Eventos,
das Organizações Globo, comemora o segundo mês da Um Entretenimento. “Quando
abrimos a empresa, queríamos dar foco mas tínhamos receio de trabalhar exclusivamente
com esse público, mas estamos tão felizes com o resultado que alcançamos que
vejo poucas possibilidades de trabalho fora do mercado gospel”, afirma.
Ganem está à
frente da Expo-cristã, evento marcado para novembro deste ano. A ideia é
receber em São Paulo 120 mil pessoas, devolvendo a popularidade e o prestígio
ao evento, que corria o risco de ser engolido pela Feira Internacional Cristã
(FIC), produzido pela Geo Eventos, empresa que encerrou as atividades em 2013.
Entre os patrocinadores, nada menos que Bradesco e Mapfre Seguros. “Já sabendo
que a Geo seria fechada, saí de lá e negociei um acordo de compra da marca para
dar continuidade a esse trabalho.”
O executivo
não é evangélico e hoje trabalha principalmente com feiras e gestão de
talentos. Já conquistou a produção do Renascer Praise, além dos cantores Eli
Soares e Hadassah Perez, dois expoentes da música jovem gospel, um na linha pop
e a segunda na linha eletrônica.
Entre os
eventos, Ganem planeja um festival de música. “O evangélico usa a música como
principal meio de comunicação. Estamos buscando eventos para colocar nossos
artistas na vitrine”, comenta. Para completar, o crescimento de evangélicos nos
classes A e B, segundo o executivo, deve também elevar o tíquete médio de
investimento em produtos evangélicos. “Eles já consomem muito livros e músicas.
Dificilmente abraçam o produto pirata, o que ajuda muito.”
Viagens
de fé
Leva entre
dois e três meses para um cliente decidir pela compra de um pacote de viagens –
o investimento é alto e exige um chamado divino. Até a assinatura dos
contratos, a vendedora de pacotes de viagens Fernanda Ariana de Almeida Alves
procura manter contato. “Eu chamo os clientes pelo nome, mando e-mail com
mensagens bíblicas. Eles querem ser bem tratados”, diz. “Vou alimentando esse
sonho deles com a Terra Santa. Não tem trabalho mais abençoado que viabilizar
esse sonho.”
Bárbara Ladeia
Fernanda, na Terra Santa Viagens: "Você
imagina a
emoção de ir aos mesmos lugares que estão na
Bíblia? É indescritível"
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É com esse
nível de profissionalismo na sedução do cliente que opera a agência da Terra
Santa Viagens, localizada na Galeria Conde de Sarzedas, no Centro de São Paulo,
na rua de mesmo nome – apelidada de “Rua dos Crentes” e “Crentolândia” por
alguns dos frequentadores. A agência é uma das operações da Terra Santa
Operadora de Israel, empresa de turismo com foco religioso.
Os destinos
são diversos: de Israel até um roteiro pelas Igrejas do Apocalipse e na Grécia.
Fernanda vende pouco menos de 500 pacotes por mês. A cada viagem que fecham
para Israel, por exemplo, levam entre 30 e 40 pessoas. “Nós temos muita
concorrência, por isso não chegamos a tantas pessoas”, diz. Um dos principais
canais de venda está nas mãos dos líderes religiosos – que são atendidos com um
carinho especial pela loja.
Anualmente, 20
pastores ganham a oportunidade de fazer o roteiro em Israel pela metade do
preço. “Nós fazemos o preço de custo, conseguimos patrocínios para baratear o
preço das viagens”, conta Fernanda.
Os pacotes
variam de US$ 3,2 mil – nove dias em Israel – até US$ 5,4 mil, para o roteiro
das Igrejas do Apocalipse. Todas as viagens são acompanhadas de um guia local e
outro que sai do Brasil junto com o grupo, para evitar problemas com o idioma.
Os roteiros incluem passagens por pontos turísticos, mas principalmente por
lugares citados nos livros sagrados. “Você imagina a emoção de ir aos mesmos
lugares que estão na Bíblia? É indescritível”, diz Fernanda.
Fernanda é da
Assembleia de Deus. O dono da agência é judeu e também proprietário da Caminhos
Sagrados, voltada para o público católico. “A gente sempre faz as viagens
separados, eles têm muitas divergências”, diz Fernanda.
Sem
misturar
A região
central de São Paulo, ao menos para os negócios, é ecumênica. Quem desce a
Conde de Sarzedas da rua Conselheiro Furtado na direção da baixada do Glicério,
possivelmente não enxergará uma só loja com imagens de santos. São os cantores
evangélicos que garantem o sucesso da barraca de Jarisson dos Santos Silva, que
não é evangélico, mas vende CDs e DVDs piratas na “Rua dos Crentes”. “Não vendo
nada de padre aqui, não. Não pode misturar, eles não gostam”, diz.
O maior
sucesso são os discos de playback das músicas da cantora Aline Barros. “O
pessoal quer cantar nas igrejas, então os playbacks acabam saindo bastante”,
conta. O ambulante leva para casa pouco mais de R$ 60 por dia. “Dá para
sobreviver”, fala.
Vestindo
a camisa
Primeira dirigente
da Igreja da Renovação Espiritual em Francisco Morato, Bete Vieira Rodrigues
andava pela região à procura de um presente para uma aniversariante de sua
comunidade.
Recém-mãe, a
moça ganhará duas camisetas – uma simples, estampada, e uma outra branca
cravejada de apliques metálicos com uma mensagem Cristã. “Eu gosto de vir aqui
porque sempre tem muito mais opção de tudo”, diz. A filha, Aparecida Luciana da
Silva, de 38 anos, faz companhia e divide os afazeres com a mãe, na função de
secretária da igreja. “Aqui é tudo metade do preço”, comemora Luciana, que
aproveitou a passagem pela galeria para comprar presentes para o cunhado e o
seu pastor.
Bárbara Ladeia
Primeira dirigente da Igreja da Renovação
Espiritual em Francisco Morato, Bete Vieira
(esq.) e sua filha Aparecida
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Foi a baiana
Nara Keila Oliveira do Carmo, 35 anos, que atendeu a dupla. Ela trabalha há
nove meses na Teddy Camisetas, também na Galeria Conde de Sarzedas. “Recebo
muita gente aqui de fora de São Paulo que acaba comprando no atacado para
vender nos seus Estados de origem”, conta. Frequentadora da Assembleia de Deus,
Nara sempre esteve envolvida com o mercado gospel. Antes trabalhava no Recanto
dos Evangélicos, a RDE, uma das lojas mais antigas do local.
Entre as
camisetas, a maior loja da Conde de Sarzedas, é a Cia dos Séculos. Com modelos
mais atrativos para a juventude, aproveita os trocadilhos com os temas jovens
como o Facebook e até os rótulos do bourbon Jack Daniels, que há muito tempo já
estampam camisetas do mundo do rock. “As vendas de 2013 as vendas foram bem
melhores que as do ano anterior”, diz Karina Paz dos Santos, de 26 anos, que
trabalha na loja há seis. Todas as camisetas custam R$ 20 no varejo e R$ 17,90
no atacado. “Vem muita gente de fora de São Paulo buscar, mas o melhor do
movimento é sempre na sexta e no sábado”
Há 36 anos na
região, a RDE é uma referência. Ana Lúcia de Carvalho, de 52 anos, é gerente da
loja onde trabalha há 34 anos. “A gente não costuma contar quantas pessoas
passam por aqui por dia, não. Tem dias que a gente da conta, mas tem dias que é
muito mais corrido”, diz. Lá, os CDs de cantoras modernas como Bruna Karla
fazem o maior sucesso. “Antigamente tinha bem menos diversidade que hoje, mas
os clássicos ainda vendem muito”, conta a gerente da loja, que vende CDs de R$
3 a R$ 19. Entre os clássicos, o preferido de Ana – e da maior parte dos
clientes – é o cantor Ozéias de Paula. “Esse é o que mais vende entre os
antigos.”
Textos
sagrados
As bíblias e
seus acessórios também chamam a atenção do público. Camila Causo, de 22 anos, é
da Igreja Bíblica da Paz e há um ano e meio ajuda o pai na loja no Galeria
Conde de Sarzedas. Entre os produtos mais vendidos da loja estão as capas para
bíblias – em especial com as estampas “animal print”. “Essa de tigre faz o
maior sucesso com as mulheres”, diz Camila.
Bárbara Ladeia
“Essa de tigre faz o maior sucesso com as
mulheres”, diz Camila
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Os livros
administrativos também têm uma boa procura, especialmente para o público de
fora de São Paulo, que também frequenta a região e faz compras por atacado.
“Recebemos gente da Bahia, de Santa Catarina, do Rio de Janeiro, e de vários
outros lugares.”
Camila afirma
que agora, no segundo andar da galeria, já consegue faturar até R$ 8 mil reais.
“Quando estávamos no terceiro andar, o movimento era muito fraco, não dava nem
R$ 2 mil”, conta Camila. “Aqui é bem melhor, mas o aluguel também é mais caro,
mas compensa.” O espaço onde a está a loja da família Causo custa R$ 2,5 mil ao
mês – mais uma luva que, mesmo sendo ilegal, chega a R$ 40 mil.
Católicos
fora do foco
Em Campo
Grande (MS), o Judah Shopping Gospel vende produtos religiosos, mas o público
evangélico é o que mais compra. Segundo Gerusa Maria de Oliveira,
sócia-proprietária da loja, são cerca de 200 pessoas que vão pessoalmente às
compras no local.
Apesar do
nome, não se trata exatamente de um shopping, mas de uma única loja que vende
todo o tipo de produto, como brinquedos. No entanto, Gerusa conta que as
bíblias são as mais procuradas. “É de longe o produto mais vendido por aqui,
seguido pelos CD”, afirma.
Desde que foi
fundada, três anos atrás, o fluxo de clientes quase triplicou. “Precisamos
aumentar a quantidade de produtos e também foi necessário contratar
funcionários”, explica Gerusa. Atualmente, trabalham cinco pessoas na loja –
dois funcionários, Gerusa, o marido e mais um familiar que ajuda nas
contas.
Não fosse pela
Jornada Mundial da Juventude, que contou com a visita do Papa Francisco I no
ano passado – e injetou R$ 1,2 bilhão na economia carioca –, o mercado de
produtos católicos poderia ter tido um 2013 mais tímido. A Expo-Católica
aproveitou a visita do líder religioso para impulsionar o número de visitantes.
Foram seis dias de evento, com 500 mil pessoas. "Normalmente, recebemos
umas 30 mil pessoas nos dias abertos ao público. Esse volume todo não vai
voltar a acontecer", diz Kiara Castro e Castro, da Promocat, que promove o
evento.
Para Klara, o
crescimento do mercado evangélico tem sido um fator de profissionalização
também dos produtos católicos. "Agora que os padres e os músicos estão investindo
em divulgação e no trabalho de marketing", diz. A curva é tímida, mas de
crescimento.
Bíblias
em queda
Quem não tem
muito o que comemorar são os fabricantes de bíblias. Segundo o maior fabricante
do livro sagrado no País, a Sociedade Bíblica Brasileira (SBB), o número de
unidades distribuídas em 2013 deve ser igual ao de 2012, de pouco mais de 7,4
milhões unidades – entre livros entre católicos, evangélicos e ortodoxos. No
ano passado, o faturamento da empresa foi de R$ 88,8 milhões.
O secretário
de Comunicação e Ação Social da Sociedade Bíblica Brasileira (SBB), Erní
Seibert, estima que o País imprima hoje cerca de 12 milhões de bíblias por ano,
considerando também a produção de outras editoras – o equivalente a um lvro a
cada 2,6 segundos.
No entanto,
essas são apenas estimativas do executivo. Além de pouco profissionalizado,
esse mercado não tem muito controle sobre o que é produzido e distribuído.
"Eu tento fazer algum monitoramento, mas não adianta, essas empresas não
têm esses números – e as que têm não divulgam", afirma.
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Dag Vulpi