Por Mário Augusto Jakobskind*
no site Direto da Redação
Em 31 de março
de 1964, o então Presidente João Goulart se encontrava na Base Aérea de
Brasília. Tentava decolar em um avião que não levantava voo. Corria que ele
seria preso pelos golpistas apoiados pelos Estados Unidos. Naquele momento
vinha de avião do Rio de Janeiro o Ministro da Saúde, Wilson Fadul. Goulart
então conseguiu deixar Brasília e rumar para o Rio de Janeiro e em seguida para
Porto Alegre no mesmo avião que conduzia Fadul.
Na capital
gaúcha, depois de receber a informação do Ministro San Tiago Dantas sobre a
presença da frota norte-americana - Operação Brother Sun - nas costas
brasileiras, preparada para entrar em ação caso fosse necessário dar apoio aos
golpistas, Jango, como era também conhecido o Presidente constitucional,
decidiu não opor resistência e seguir para o Uruguai.
No restante da
informação de Dantas, Jango ficou sabendo também que havia um plano
norte-americano de reconhecer a capital de Minas Gerais como sede do novo
governo e como presidente o golpista civil, então governador Magalhães Pinto. E
o Brasil se dividiria em duas partes, como aconteceu com a Coreia em 1953.
Tais fatos
pertencem a história. Quarenta e nove anos, oito meses e 14 dias depois, os
restos mortais de Jango chegaram à Base Aérea de Brasília em uma cerimônia
emocionante e que contou com a presença de familiares do Presidente deposto, da
atual Presidenta Dilma Rousseff, de todo o seu Ministério e ainda de
parlamentares e convidados.
Aconteceu
naquela área militar, agora em 14 de novembro de 2013, o que os detentores do
poder à força não permitiram em 6 de dezembro de 1976, ou seja, o
reconhecimento oficial da morte de um Presidente. Os golpistas brasileiros e
seus apoiadores na Argentina, onde Jango morreu, impediram até mesmo a
realização de uma autopsia.
Nestes quase
37 anos decorridos, fortes indícios indicam que Jango foi mesmo assassinado com
a troca de remédios. Desde pelo menos 2006, a família do Presidente deposto
tentava a exumação dos restos de Jango para esclarecer o que aconteceu
Finalmente,
depois de marchas e contramarchas, inclusive por relapso da Justiça brasileira,
a Comissão da Verdade acatou o pedido da família Goulart para a realização da
exumação, o que está sendo feito por peritos de países como o Brasil, Argentina
e, a pedido também da família, um de Cuba, o mesmo que realizou o
reconhecimento dos restos de Che Guevara na Bolívia.
Na manhã de 14
novembro, depois de mais de 12 horas do recolhimento de material necessário
para a exumação realizada no cemitério de São Borja, o Brasil também
reencontrou-se com a sua história, por sinal trágica, porque depois da queda de
Jango o país ingressou numa longa noite escura. Mesmo com um pouco de atraso,
os brasileiros estão sendo informados sobre os acontecimentos que em abril de
2014 completarão 50 anos.
O país hoje é
outro, diferente daquela época, embora muitos dos desafios que Jango enfrentava
continuam vigentes. Quem tiver dúvidas a esse respeito basta consultar o texto
das reformas de base tentadas pelo então Presidente.
A direita
golpista, militar e empresarial, juntamente com o governo estadunidense e a
mídia conservadora, temia que as reformas que passariam o país a limpo fossem
executadas.
Neste momento
em que o atual governo brasileiro reconheceu a figura do Presidente deposto, ou
como disse a própria Dilma Rousseff, se reescreveu a história, é necessário
também resgatar a figura política de Jango, que desde então vem sendo
apresentado à opinião pública de forma deturpada.
Jango agora
precisa ser reconhecido como governante que à frente de sua época tentava de
forma pacífica transformar o Brasil em um país mais justo socialmente.
Foi derrubado,
como disse Darci Ribeiro, não por seus defeitos, mas por suas qualidades. E
agora, ao se reescrever a história brasileira, é preciso mostrar, sobretudo às
novas gerações, o que significavam exatamente as qualidades do governo Jango.
Para ser ter
uma ideia, por exemplo, a reforma agrária então proposta tinha sido a mais
consistente apresentada até hoje, segundo reconhece o coordenador do MST, João
Pedro Stédile.
Para analisar
esse tópico é importante, claro, guardar as devidas proporções com os tempos
atuais, porque uma reforma agrária hoje deve ser distinta da proposta naquela
época.
Dos efetivos
militares das três Armas, destacados para oferecer as honras na Base Aérea de
chefe de Estado ao Presidente deposto, fora um ou outro comandante, a maioria
nem era nascida em abril de 1964.
Mas, devido a
ação de uma minoria de torturadores neste setor, que permanece impune, da mesma
forma que os efetivos civis violadores dos direitos humanos, até hoje a imagem
das Armas está sendo afetada negativamente. E para acabar com isso, vale
repetir, é fundamental separar o joio do trigo.
Para evitar
que prossiga a imagem negativa das três Armas, é preciso contar a verdade dos
fatos e separar da instituição notórios torturadores e assassinos que se valem
da própria instituição para evitar eles mesmos serem atingidos e punidos.
Um passo
adiante nesse sentido seria a revisão da lei da anistia, promulgada de forma a
garantir a impunidade de quem nunca foi julgado pelas violações dos direitos
humanos cometidas.
Em tempo: a
direita midiática não escondeu a alegria com a prisão de José Dirceu e José
Genuino. Merval Pereira e cia ltda não fazem jornalismo, fazem política
partidária em favor da direita.
Mário
Augusto Jakobskind*
- É correspondente no Brasil do semanário
uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e
editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do
seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está
na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE
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