terça-feira, 12 de março de 2013

Procurador-geral repete críticas do presidente do STF à "leniência" dos bancos

Brasília – O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse hoje (12) que a demora de algumas instituições financeiras em fornecer informações solicitadas pelas autoridades encarregadas de investigar crimes de lavagem de dinheiro tem dificultado o trabalho do Ministério Público Federal (MPF) no combate a esse tipo de atividade ilícita.

“Muitas das nossas investigações são atrasadas pela dificuldade de obtermos informações que deveriam estar disponíveis de forma imediata”, disse Gurgel, ao deixar o seminário Inovações e Desafios da Nova Lei sobre Crimes de Lavagem de Dinheiro, evento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília. “No momento em que precisamos das informações bancárias, existe sim uma certa leniência das instituições financeiras no sentido de fornecer esses dados”.

Gurgel reforçou as críticas feitas ontem (11), pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, segundo o qual algumas instituições bancárias agem de forma “leniente” com relação a crimes como a lavagem de dinheiro. De acordo com dados apresentados por Barbosa, também houve redução, no ano passado, do número de processos que tratam desse crime julgados pelos tribunais de Justiça dos estados.

Para o procurador-geral, as instituições bancárias precisam aprimorar e agilizar o fornecimento de informações em casos de investigação sobre lavagem de dinheiro, sob o risco de, não o fazendo, serem vistos como coniventes com o crime. Segundo Gurgel, mesmo no caso de processos apreciados pela mais alta corte de Justiça do país, o Supremo Tribunal Federal (STF), a resposta costuma demorar.

“Normalmente, o atendimento é lento e precário. Muitas vezes são precisas três ou quatro diligências complementares, até que as informações cheguem como deveriam ter sido fornecidas desde o primeiro momento”, disse Gurgel, atribuindo tal comportamento às deficiências do sistema financeiro que, segundo ele, compete ao próprio sistema financeiro sanar.

“Acho que [a solução do problema] independe de mudanças legislativas. É algo que depende do Banco Central, que tem sido e deve ser cada vez mais rigoroso, ao cobrar das instituições bancárias o atendimento [do pedido oficial] de informações. Afinal de contas, elas não estão fazendo nenhum favor. Estão apenas cumprindo a lei”, disse o procurador-geral.

Gurgel lembrou ainda que vários dirigentes de banco figuraram no julgamento da Ação Penal 470, o processo do mensalão, por ações “inaceitáveis” que os transformaram em “verdadeiros parceiros do crime”.

As críticas do presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, aos bancos foram feitas ontem (11), durante o mesmo seminário. Barbosa também usou o termo “leniência” para criticar a postura dos bancos e defendeu penas mais rigorosas para crimes como a lavagem de dinheiro.  

"Embora a nova legislação [sobre os crimes de lavagem, a Lei 12.683, que entrou em vigor no ano passado] contenha avanços, ela ainda se ressente da responsabilização penal da pessoa jurídica que tenha concorrido para a prática do crime de lavagem de dinheiro”, disse Barbosa, que também preside o CNJ.

“Enquanto instituições financeiras não visualizarem a possibilidade de serem drasticamente punidas por servirem para a ocultação ilícita de valores que se encontram sob sua responsabilidade, persistirá o estímulo à busca do lucro, visto como combustível ao controle leniente que os bancos fazem sobre a abertura de contas e a transferências de valores", acrescentou o ministro.

Procurada pela Agência Brasil, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) disse que a entidade não irá responder às críticas do presidente do STF, Joaquim Barbosa, e que ainda está analisando eventual resposta para as declarações do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.

Tribunais estaduais julgaram em 2012 menos processos por lavagem de dinheiro, diz Barbosa

No ano passado, quando entrou em vigor no Brasil a nova lei sobre crimes de lavagem de dinheiro, os tribunais de Justiça estaduais informaram ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ter julgado menos da metade do total de processos envolvendo esse tipo de ilícito apreciados em 2011.

Segundo o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do CNJ, ministro Joaquim Barbosa, a informação de que, juntos, os tribunais das 27 unidades da Federação apreciaram em 2012, 61 processos relacionados a esse tipo de prática ilícita, contra 183, em 2011, deve ser vista com ressalvas, pois a queda de 67% pode ser atribuída à inconsistência dos dados fornecidos pelos tribunais estaduais. A mesma precaução serve para os resultados fornecidos pelos tribunais federais das cinco regiões que, juntos, informaram ter julgado 64 processos em 2012, o que representa aumento de 700% na comparação com 2011, quando foram analisadas oito ações por lavagem de dinheiro.

Os próprios responsáveis por reunir os resultados apresentados pelo ministro destacam em seus relatórios que há grandes chances de os dados estarem subestimados ou errados. A hipótese é decorrente do fato de alguns tribunais não terem respondido corretamente ao questionário do CNJ em um dos dois anos, ou terem dado respostas conflitantes, como é o caso do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul), que mesmo informando não ter julgado nenhum caso de lavagem de dinheiro em 2012, comunicou ter condenado cinco réus.

“A incoerência nas informações exemplificam a cautela necessária no exame dos dados, mas não impedem que eles sejam utilizados numa primeira prospecção sobre o tema”, declarou Barbosa, destacando que, os dados reunidos pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ permitem identificar “o quadro preocupante na forma como a investigação, a propositura de ações penais e o julgamento destas respectivas ações têm se dado no Brasil”.

Os dados foram apresentados durante a abertura do seminário Inovações e Desafios da Nova Lei sobre Crimes de Lavagem de Dinheiro, que acontece até amanhã (12), no auditório do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em Brasília (DF). Durante o evento vão ser discutidos, além dos avanços e desafios resultantes da entrada em vigor da Lei nº 12.683, as dificuldades das investigações deste tipo de contravenção e outros tópicos, como a necessidade de maior interação no uso dos mecanismos de controle das atividades financeiras e bancárias. Esse último aspecto motivou o ministro a defender penas mais rigorosas para este tipo de crime e a criticar a "leniência" de algumas instituições financeiras.

"Embora a nova legislação contenha avanços, ela ainda se ressente da responsabilização penal da pessoa jurídica que tenha concorrido para a prática do crime de lavagem de dinheiro. Enquanto instituições financeiras não visualizarem a possibilidade de serem drasticamente punidas por servirem para a ocultação ilícita de valores que se encontram sob sua responsabilidade, persistirá o estímulo à busca do lucro, visto como combustível ao controle leniente que os bancos fazem sobre a abertura de contas e a transferências de valores", disse Barbosa.
Entre 2011 e 2012, o número de denúncias recebidas pelos tribunais estaduais caiu 9%, baixando de 381 para 347 registros. O número de pessoas condenadas também foi menor: 175, em 2011, contra 29 condenações em 2012.  Já no âmbito federal, o número de denúncias apresentadas aos tribunais das cinco regiões aumentou 28%, saltando de 65 para 83 casos, enquanto o número de condenações passou de dois para 24.
Tanto na Justiça Estadual, quanto na Federal, a quantidade de procedimentos investigatórios arquivados aumentou: 75% na primeira e 11% na segunda. Conforme destacou Joaquim Barbosa, esses procedimentos, em regra, são arquivados, sendo exceções os que efetivamente geram denúncias. “O número de inquéritos arquivados, quando comparado com o número de denúncias recebidas indica a necessidade de uma pesquisa mais aprofundada para apurar se as causas dessas discrepâncias estão na deficiência da investigação ou no trabalho do Ministério Público.”

Nem todos os tribunais estaduais forneceram informações a respeito da estrutura de investigação, processamento e julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro, mas, segundo relatório do Departamento de Pesquisa Judiciária do CNJ, os poucos que responderam informaram não contar com varas especializadas nesse tipo de ilícito.

Já entre os tribunais regionais federais das cinco regiões existentes, apenas o da 1ª Região informou não dispor de vara especializada. Esse tribunal é justamente o que apresentou, em 2012, o maior número (496) de procedimentos envolvendo lavagem de dinheiro, mas em 2011 informou não ter julgado qualquer caso do tipo, o que despertou a prudência dos técnicos do CNJ em relação aos dados de 2011 e às variações do período.



Agência Brasil


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