Tribunal adiou para junho a decisão
sobre mudança nos direitos dos homossexuais, assunto que mobiliza cada vez mais
sociedade americana. Apoio à causa é crescente, mas sentença a favor da união
gay ainda é incerta.
Ao concluir nas últimas horas da
quarta-feira (27/03) os dois dias de audiência sobre o casamento homossexual, a
Suprema Corte americana deixou transparecer estar tão dividida quanto o resto
dos Estados Unidos sobre o tema. A maioria dos noves juízes do tribunal
questionou a atual definição de matrimônio no país – como uma união apenas
entre um homem e uma mulher – mas não deu perspectiva de uma solução imediata
para a polêmica. Uma sentença não é esperada para antes de junho.
Em questão na Suprema Corte, a
máxima instância judicial do país, está se essa atual definição de casamento,
como estabelece a chamada Lei de Defesa do Casamento (Doma), de 1996, viola o
direito de igualdade dos cidadãos. Entre outras coisas, a norma nega a casais
gays e lésbicos os direitos e benefícios federais assegurados aos casais
heterossexuais – como isenções fiscais, benefícios sociais e acesso ao cônjuge
hospitalizado.
Atualmente, o casamento gay é
permitido apenas pelas legislações estaduais nos EUA. Ao todo, são nove estados
– além do distrito de Columbia – onde homossexuais podem se casar e ter seus
direitos reconhecidos. Defensores do casamento homossexual acreditam que a
vitória nacional é inevitável.
"Não importa a decisão da
Suprema Corte, em junho vamos estar mais forte do que já estávamos", disse
Evan Wolfson, presidente da associação Liberdade para Casar.
A autora da ação que foi parar na
Suprema Corte é Edith Windsor, de 83 anos. Ela foi condenada a pagar 363 mil
dólares em impostos para receber uma herança após a morte, em 2009, de Thea
Spyer, com quem havia se casado no Canadá. De acordo com a lei Doma, o cônjuge
sobrevivente de um casal heterossexual não teria que pagar tal carga
tributária.
Mesmo que a Suprema Corte não tome
uma decisão nacional a favor do casamento gay, sua sentença em junho poderia
ser um grande passo para os direitos dos homossexuais nos EUA. O governo de
Barack Obama, primeiro presidente americano a abordar diretamente o tema, se
opôs à proposta de Windsor enquanto o processo progrediu em tribunais menores.
Para Obama o casamento de pessoas do mesmo sexo é "compatível com a tradição americana" |
Porém, desde que o caso chegou à
Suprema Corte, a Casa Branca mudou de lado e agora defende a revogação da lei,
que, por sua vez, conta com apoio veemente de grande parte da bancada
republicana e de grupos religiosos e conservadores.
"Acho que está na hora de os
juízes analisarem essa questão. Em minha vida pessoal, eu conheço e sou próximo
de casais do mesmo sexo, que criam filhos, são amorosos e comprometidos uns com
os outros", disse Obama na quarta-feira. "Os estados têm definido o
casamento e o governo federal tem seguido o exemplo dos estados. A minha
esperança é que o tribunal atinja essas questões e que acabemos vivendo num
país onde todos são tratados de forma justa."
Saindo
do armário
Antes visto como tabu,
principalmente entre políticos, o tema ganhou força entre o alto escalão em
Washington e nos últimos anos tem tido mais espaço na mídia, com o retrato
positivo da comunidade gay nos filmes de Hollywood e nas séries de televisão.
A mudança é evidente em casos como o
de Dick Cheney. Conservador, o ex-vice-presidente tornou público que sua filha
Mary é lésbica e vive com uma companheira. Em 2011, ele e sua mulher, Lynne,
apoiaram publicamente o casamento gay. O senador republicano Rob Portman, antes
na oposição, mudou de opinião. Ele também tem um filho gay.
Durante os anos 1970 e começo dos
1980, homossexuais começaram a aparecer abertamente, ainda que de forma sutil,
na mídia americana. A explosão da aids contribuiu para discussões mais abertas
sobre relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo.
Marcos culturais, como a peça Angels
in America (1991) e o filme O Segredo de Brokeback Mountain(2005),
levaram o amor e as dores da repressão homossexual para grandes audiências. Nas
últimas duas décadas, a situação de gays e lésbicas começou a ser discutida
abertamente nos meios de comunicação, com grandes nomes como Jake Gyllenhaal,
Anne Hathaway e Lady Gaga apoiando aberta e publicamente a igualdade de
direitos.
Boicote
da oposição
Há uma década, a oposição fazia
campanha para a proibição nacional do casamento gay. Hoje, eles parecem
conformados com a ideia de uma nação dividida, com cada estado definindo as
leis em relação ao tema individualmente, deixando o debate local para famílias,
congregações e comunidades. Segundo John Eastman, da Organização Nacional para
o Casamento, essa solução seria "muito mais saudável".
Oposição quer que cada estado tenha suas próprias leis em relação ao casamento gay |
O site da conservadora Associação
Americana da Família, por exemplo, colocou no ar uma lista de empresas que
apoiam o casamento entre pessoas do mesmo sexo, que inclui Google, Microsoft,
Apple, Nike, Facebook e Starbucks. O site sugere que americanos que se opõem ao
casamento gay deveriam boicotar tais companhias.
No entanto, o presidente da
associação, Tim Wildmon, reconhece que o boicote seria impraticável. "São
muitas empresas, o que impediria um boicote efetivo", disse. Wildmon
espera que nem o congresso nem a Suprema Corte tentem interferir no poder dos
estados e em suas políticas. "Se você é um casal homossexual, mude para um
estado que aceite sua união", completou.
É improvável que estados
conservadores, que baniram o casamento gay, reconheçam a união entre pessoas do
mesmo sexo, a não ser que sejam obrigados pela Suprema Corte. Mas o assunto,
mesmo nesses estados, não deve sair de pauta – graças ao crescente número de
casais entrando na justiça por igualdade de direitos contra seus respectivos
estados.
Enquanto a questão ainda divide
muito americanos, uma pesquisa recente mostra que a opinião pública vem mudando
desde 2001. Cerca de 49% dos americanos são a favor da mudança da lei em
relação à união homossexual, comparados com 35% daquele ano. Ainda assim, 44%
acreditam que a proibição em diversos estados deve permanecer, contra 57% de 12
anos atrás.
MAS/ap/dpa - DW.DE
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