Os dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) que apontam a baixa preocupação dos municípios
com ações destinadas à população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais,
travestis e transexuais) são um alerta para a falta de políticas públicas
específicas para essas pessoas, avaliam especialistas ouvidos pela Agência
Brasil.
De acordo com o superintendente da
Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos do Estado do Rio de
Janeiro, Cláudio Nascimento, apesar de a pesquisa constatar que apenas 79
municípios do Brasil têm legislação de combate à homofobia, já é uma conquista
o tema ter sido abordado no levantamento.
“É um avanço, já que pela primeira
vez esse levantamento fez a captação de dados específica da presença da
temática LGBT nas políticas públicas. [No entanto], do ponto de vista da
análise dos dados, é muito negativa ainda a pequena presença de resposta
governamental às demandas de enfrentamento da homofobia e de promoção dos
direitos LGBT em todo o Brasil, principalmente nos municípios.”
Segundo a Pesquisa de Informações
Básicas Municipais – Perfil dos Municípios (Munic), divulgada esta semana pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de um total de 5.565
cidades analisadas em 2011, somente 486 adotam ações para o enfrentamento da
violência contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Além
disso, apenas 14% dos órgãos gestores de políticas de direitos humanos têm
programas para a população LGBT.
Para o superintendente, os dados do
IBGE devem ser aproveitados pelos prefeitos que assumirão o comando das cidades
em janeiro. “Acho que [a pesquisa] traz um recado para os prefeitos eleitos da
necessidade de incluir, no novo governo, políticas específicas para atenção a
esse segmento. Por outro lado, também desafia os governos estaduais e o governo
federal a construir estratégias de incentivo, de estímulo, de cooperação
técnica com os municípios, para que essas cidades avancem na efetivação de
políticas públicas específicas voltadas para a comunidade LGBT.”
O deputado federal Jean Wyllys
(PSOL-RJ), que é homossexual, diz que os dados mostram a falta de políticas
públicas municipais voltadas para esse grupo. “A vida das pessoas acontece nos
municípios, então a defesa dos direitos humanos tem que acontecer no plano dos
municípios, não tem que acontecer só na União e no nível de estado. E a pesquisa
do IBGE mostra a completa ausência das políticas públicas.”
Para o parlamentar, falta
representatividade do movimento LGBT para mudar o atual quadro de segregação.
“A comunidade LGBT é ampla, mas o movimento não tem uma capilaridade e isso tem
um impacto político enorme, porque a gente não consegue eleger representantes
nas câmaras de vereadores, e, não precisa ser gay ou lésbica,
assumido ou não, mas a gente não consegue eleger nem um aliado. A comunidade
existe de uma maneira dispersa, tem problemas concretos nas cidades, mas não
consegue se organizar politicamente para votar em representantes que mudem essa
realidade apontada pelo IBGE.”
O presidente da Associação
Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni
Reis, lembra que as políticas públicas específicas começaram a ser construídas
há oito anos.
“As políticas públicas na questão
LGBT começaram com o Programa Brasil sem Homofobia, em 2004, em 2008 tivemos a
primeira Conferência Nacional LGBT e em 2011 tivemos a segunda conferência.
Então esse número é realmente muito pequeno, nós temos somente quatro estados
que têm o tripé da cidadania, que é o que nós queremos, que é um plano, um
conselho e uma coordenação, o que já existe no âmbito nacional.”
De acordo com ele, apenas os estados
do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Goiás e do Pará já montaram o chamado
tripé. Reis também aponta algumas conquistas alcançadas no Poder Judiciário,
como a autorização para a união estável homoafetiva.
O coordenador de projetos da organização
não governamental (ONG) Dom da Terra, que integra a ABGLT, Márcio Marins,
considera que as políticas públicas ainda estão aquém do necessário para
garantir cidadania a esse segmento da população.
“Nós precisamos de fato que os
municípios e estados reconheçam que esse segmento populacional de
lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais vive uma situação de
vulnerabilidade acrescida. E que muitas vezes leva a casos de violência
extrema, chegando muitas vezes ao homicídio”.
Marins cita avanços, como a
Coordenação Nacional LGBT, dentro da Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República, e o Conselho Nacional de Combate à Discriminação. “À
medida que resoluções, encaminhamentos e recomendações saem desse conselho e
dessa coordenação nacional, começam a ser replicadas nas unidades da Federação
e em muitos municípios.”
Mas ele defende a necessidade
urgente da aprovação de uma lei federal que criminalize a homofobia. “Só assim
vamos conseguir acabar com a impunidade e desmotivar indivíduos que cometem
crimes contra pessoas LGBT. Fica um alerta para essa população e aliados, que
denunciem toda forma de discriminação e violação de direitos, porque o silêncio
é igual à morte, quando nos calamos estamos incentivando o agressor.”
Akemi Nitahara - Agência Brasil
- Edição: Juliana Andrade
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