Segundo Daniel Iliescu, quatro meses
após fala de ex-ministro, entidade ignora pedido por defesa nas ruas, mas
reivindica ‘respeito’ pela história dele
Para Iliescu, 'não se pode negar papel de
Dirceu na história' |Beto Barata/Estadão
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Isadora Peron, de O Estado de S.
Paulo
O pedido do ex-ministro José Dirceu
para que estudantes fossem às ruas defendê-lo, feito um mês antes de o Supremo
Tribunal Federal começar a julgar o processo do mensalão, está fora das
prioridades da União Nacional dos Estudantes (UNE). "Não está em nossa
pauta realizar qualquer manifestação nesse sentido", disse ao Estado o
presidente da entidade, Daniel Iliescu, de 28 anos.
Ex-líder estudantil nos anos 1960,
Dirceu fez o pedido em julho, no Rio, ao discursar em congresso da União da
Juventude Socialista (UJS), da qual Iliescu faz parte. Ligada ao PC do B, a UJS
controla a UNE consecutivamente desde os anos 1990. Embora diga que não há
nenhum ato de desagravo na agenda, o presidente da UNE afirma que nem o
"mais fragoroso opositor de Dirceu" pode negar o papel que o
ex-ministro, hoje condenado por corrupção e formação de quadrilha, teve na luta
pela redemocratização.
A
UNE planeja algum ato em prol do ex-ministro José Dirceu?
Daniel Iliescu - Como entidade, não
está em nossa pauta hoje realizar nenhuma manifestação nesse sentido. Mas nem o
mais fragoroso opositor de Dirceu pode negar o papel que ele teve na luta
democrática, no movimento estudantil contra a ditadura militar. Isso, no
entanto, não o exime dos erros que cometeu, assim como não nos exime de
reconhecer o papel que ele teve na história. A gente deve conseguir ter a
maturidade e a generosidade de atribuir o tamanho do erro de cada pessoa e
também dos seus acertos. O Dirceu é uma figura polêmica, uns amam, outros odeiam.
A UNE nem ama nem odeia, mas reivindica respeito por sua história. Não
interessa à UNE o achincalhamento ou a crucificação de qualquer pessoa no
Brasil.
A
entidade chegou a ser procurada pelo ex-ministro?
Daniel Iliescu - A UNE nunca foi
abordada por Dirceu como entidade, isso não aconteceu. O que Dirceu pediu (no
congresso da UJS), na verdade, foi que houvesse algum contraponto na opinião
pública e eu acho que esse contraponto está sendo oferecido. A própria UNE,
quando problematiza a politização do julgamento do mensalão do STF, oferece,
não individualmente ao Dirceu, mas para o debate democrático no Brasil, esse
contraponto que o ex-ministro pediu.
Então,
institucionalmente, não haverá manifestações em favor de nenhum condenado?
Daniel Iliescu - Até aqui não surgiu
nenhuma opinião de um militante ou de um dirigente da UNE que levasse a uma
moção de desagravo, por exemplo. O que não impede que, numa próxima reunião da
entidade, alguma pessoa proponha algo nesse sentido. Sempre há essa
possibilidade, mas esse não é centro das nossas preocupações como entidade.
Como
a UNE avalia o julgamento do mensalão pelo STF?
Daniel Iliescu - O fato de o
julgamento ter sido um processo casado com o período eleitoral fez com que
houvesse politização do julgamento, o que trouxe prejuízos, pois poucas
instituições conseguem levar a cabo suas opiniões com 100% de imparcialidade.
Você
acredita que a opinião pública influenciou a decisão dos ministros do Supremo?
Daniel Iliescu - Eu diria que houve
uma influência, mas não diria do público, que é um conceito muito amplo. Houve
influência de atores da sociedade, atores políticos, atores da mídia.
Essa
suposta influência faz a UNE questionar a condenação de Dirceu ou de algum
outro membro da base aliada?
Daniel Iliescu - Quem tem
competência para condenar ou julgar é o STF e a UNE reconhece esse poder e tem
a responsabilidade de respeitar as instituições democráticas. Mas é importante
que a gente vá a fundo nesse debate, porque a impressão que tenho é que, para
muitos, basta que se identifiquem os culpados e decretem uma pena para o
problema estar resolvido. O que me preocupa é essa sanha condenatória, pois o
fundamental não é condenar, o fundamental é deixar um legado para a sociedade
brasileira. O importante é que o Brasil possa ter um saldo desse episódio para
que consiga se prevenir de futuros casos como esse ou ainda piores.
E
qual seria esse legado?
Daniel Iliescu - O que é mais
importante para a UNE é qual o saldo, quais são as contribuições que esse
episódio vai trazer para o Brasil. Eu acredito sinceramente que os crimes que
foram identificados e que vão ser agora punidos pelo STF, nesse episódio que se
convencionou chamar de mensalão, não é exceção no Brasil. Ele é um episódio de
uma prática que é recorrente, que é praticada, eu não diria por todos, porque
seria leviano da minha parte, mas por uma boa parte dos partidos políticos,
tanto de esquerda quanto de direita, tanto do governo ou de oposição. Então é
uma prática recorrente que se utiliza para financiar a atividade política,
formar maiorias, financiar campanhas.
Qual
a sugestão da entidade nesse sentido?
Daniel Iliescu - Para a UNE não
basta julgar um político ou um empresário ou um publicitário. A gente reivindica
que, neste momento, o País tenha coragem de pautar o debate sobre quais são as
condições estruturais ao combate à corrupção. A primeira é a reforma política
com foco no financiamento público de campanha, pois entendemos que hoje o poder
econômico tem uma influência sobre as campanhas eleitorais muito desmedido.
Você
acredita que a vitória de Fernando Haddad em São Paulo foi uma espécie de
absolvição do PT nas urnas?
Daniel Iliescu - Não. Eu acho que a
maior parte dos cidadãos conseguiu diferenciar a discussão. O cidadão não usou
o mensalão para punir o PT, como esperava a oposição, mas também não acredito
que o cidadão se conformou com o mensalão e absolveu o PT. O que o eleitor fez
foi debater problemas da cidade, programas de governo, e escolher um candidato.
Isso significa que o eleitor está mais crítico e menos suscetível a ser
manipulado.
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