sábado, 20 de outubro de 2012

Em SP, manifestantes fazem protesto em frente a prédio onde mora acusado de tortura durante a ditadura


São Paulo – Movimentos sociais, liderados pelo Levante Popular da Juventude, fizeram hoje (20), na região da Avenida Paulista, no centro de São Paulo, uma manifestação para expor publicamente um ex-militar reformado acusado de ter comandado sessões de tortura e homicídios durante a ditadura militar. O tipo de manifestação é inspirada em ações similares feitas na Argentina e no Chile chamadas de Escracho.

Cerca de 60 pessoas, segundo a Polícia Militar, fizeram uma pequena caminhada pela Avenida Paulista até a Rua Manoel da Nóbrega, endereço onde vive atualmente o ex-militar Homero César Machado, que chefiou equipes de interrogatório no antigo DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna) entre os anos de 1969 e 1974.

“O que fazemos aqui é reivindicar a memória das pessoas que lutaram contra a ditadura militar e também reivindicar o presente, porque hoje vemos esses torturadores impunes. Este torturador [Machado] vive tranquilo em sua casa, não foi julgado e nem condenado, vive com aposentadoria paga com dinheiro público. O que ficou impune na ditadura dá carta branca para que esses crimes continuem acontecendo”, disse Paula Sacchetta, da Frente de Esculacho Popular.
Durante a caminhada, manifestantes colaram, em postes e latas de lixo, cartazes com fotos de pessoas que teriam sido torturadas por Machado na época da ditadura militar e distribuíram folhetos para a população informando que “um torturador mora neste bairro”.

Na frente do prédio onde Machado mora, parentes de Virgílio Gomes da Silva, que foi morto e torturado durante a ditadura militar, seguraram um megafone para dizer aos vizinhos que ali “mora um torturador”. Uma coroa de flores foi depositada em frente ao prédio e gritos e faixas lembravam um dos lemas do movimento: “Se não há Justiça, há esculacho popular”. 

A viúva de Virgílio Gomes da Silva, Ilda Martins da Silva, acompanhou a manifestação de hoje com seu filho, Virgílio Gomes da Silva Filho e uma neta. “Ele [Virgílio Gomes da Silva] foi morto e torturado [na ditadura militar] e está desaparecido há 42 anos”, disse ela. Ilda foi presa no dia seguinte com três de seus quatro filhos.

“Quando eu fui presa, ele já estava morto. E eu não sabia. Fiquei presa com meus três filhos. Levaram eles para o Dops e, de lá, para um juizado. Ofereceram eles [meus filhos] para doação. Fiquei presa por nove meses, quatro deles incomunicável, sem poder ver meus filhos. Fui torturada tanto fisicamente quanto psicologicamente”, disse.

O filho de Virgílio tinha 6 anos na época. “O que sabemos são relatos de companheiros que estavam presos na época. Sabemos que no dia 29 de setembro de 1969, ele foi preso numa emboscada. Levaram ele para o Dops [Departamento de Ordem Política e Social] e bastaram seis horas de tortura para conseguirem matá-lo”, disse Silva Filho. Segundo ele, Homero César Machado foi um dos torturadores de seu pai.

A família de Vírgilio Gomes da Silva disse esperar pela condenação judicial dos torturadores da época. “Espero sim [condenação]. Não importa o tempo que dure para a justiça chegar”, disse o filho.

O ato chamou a atenção de vários moradores da região. Vários deles apenas espreitavam a manifestação pela janela, mas alguns desceram de seus apartamentos para saber o que estava ocorrendo. “Cumprimento o cara [Machado] há anos e nunca imaginei. Fiquei com nojo. Quando vi as fotos [dos torturados estampadas nos cartazes] e li as histórias, fiquei mesmo revoltada”, disse Sandra Gaui, moradora de um prédio próximo.

“Acho esses escrachos fundamentais porque, não é coisa dos atingidos ou das famílias. É coisa da sociedade, principalmente de jovens que abraçaram essa causa. É um pessoal que diz que a violência policial de hoje é fruto do passado e que os desaparecidos precisam ser localizados para se acabar com a impunidade”, disse Ivan Seixas, da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos.

Segundo Seixas, o capitão Homero “era um dos militares mais furiosos nas torturas”. Para ele, movimentos como esse contribuem para se fazer uma condenação moral dos torturadores, enquanto a condenação judicial ainda não ocorreu.

A Agência Brasil não conseguiu falar com Machado. Um dos funcionários do prédio informou que Machado não estava no local no momento do ato. Uma vizinha de apartamento disse que há 15 dias ele não se está no prédio. “Ele sempre foi muito gentil e educado. Até tomei um susto agora com essas informações. Ele não está aí. As correspondências dele estão na mesinha do lado do nosso corredor”, disse Fernanda Teixeira de Carvalho Souza.
Elaine Patricia Cruz  Edição:  Fábio Massalli (Agência Brasil)

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