Atualmente em 8% ao
ano e no menor nível da história, os juros básicos (taxa Selic) atravessam um
ciclo de redução que provocou um fenômeno nas contas públicas brasileiras. Pela
primeira vez na história, os títulos públicos deixaram de pagar juros de mais
de 10% ao ano. A queda beneficia não somente o governo, que gasta cada vez
menos para financiar a dívida pública, mas tem reflexos sobre toda a economia.
Segundo especialistas,
os juros menores dos títulos públicos desestimulam a especulação e incentivam a
economia produtiva. O dinheiro que antes obtinha rendimentos altos e seguros
nos papéis do governo precisa cada vez mais ser aplicado nas empresas para
alcançar o retorno antes conseguido apenas comprando papéis do governo. Aos
poucos, o país caminha para uma realidade financeira presente em nações
desenvolvidas.
“O que vai acontecer
no Brasil é o que ocorre fora do país. Com a inflação baixa, os títulos
públicos rendem pouco. Quem quiser ganhos maiores, precisa assumir risco e ir
para o mercado acionário ou investir diretamente em novas empresas. Se quiser
ganhar dinheiro, tem de produzir”, diz o vice-presidente da Associação Nacional
dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel de
Oliveira.
Professora de economia
monetária e financeira da Universidade de Campinas (Unicamp), Maryse Fahri diz
que a queda nos rendimentos dos títulos públicos representa uma conquista.
“Estava mais que do que na hora de o governo deixar de pagar mais de 10% [ao
ano] para rolar a dívida pública. Uma taxa como essa não fazia nenhum sentido
na situação em que o Brasil está. Sabia-se que era uma anomalia”, avalia.
A economista, no
entanto, faz uma ressalva. Para ela, os juros dos títulos públicos continuam
altos. “O Brasil é um dos poucos países com juros reais [considerando a
inflação] positivos. Nas economias desenvolvidas, os títulos públicos costumam
pagar taxas reais negativas”, observa Maryse. No último leilão de NTN-B com
vencimento em 2023, título público brasileiro que paga os juros mais altos
atualmente, o Tesouro Nacional vendeu os papéis com taxa de 9,66% ao ano, cerca
de 5 pontos percentuais acima da inflação esperada de 4,5% para 2012.
O vice-presidente da
Anefac concorda que os juros brasileiros ainda são altos, mas destaca a melhora
da situação. “Na verdade é um processo. Precisamos baixar muito os juros reais
para um intervalo de 0,5% para 1% ao ano. Mesmo assim, a situação está melhor
do que há dois ou três anos. Os juros estão em queda, e a inflação está mais
baixa”, aponta.
Maryse acredita que a
mudança é estrutural, e os títulos públicos dificilmente voltarão a render mais
de 10% ao ano. “Pode ser que, em algum momento, o governo volte a aumentar os
juros básicos como medida de política monetária [para conter a inflação], mas
os investidores começarão a perceber que não se justifica um risco tão alto
[para comprar papéis do governo]. Aos poucos, o Brasil deixa de ser o paraíso
dos juros altos.”
Por meio dos títulos
públicos, o governo pega emprestado dinheiro dos investidores para honrar
compromissos. Em troca, o Tesouro Nacional se compromete a devolver o dinheiro
com alguma correção. Essa diferença é expressa nos juros que
incidem sobre os papéis. Taxas mais altas refletem o risco de o
governo dar calote e não conseguir pagar os aplicadores.
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